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obras internacionais
www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2022/11/por-que-o-mercado-de-hqs-no-brasil-tem-cada-vez-mais-obras-
internacionais.shtml
11 de novembro de 2022
Quem entra hoje numa livraria e vai parar, por acaso ou interesse, na seção de
quadrinhos, viaja pelo mundo. Pode ir para a França e além, guiado pelos seios à mostra
de "A Louca do Sagrado Coração", clássico erótico de Moebius e Jodorowsky.
Ou então fazer uma viagem mais curta —no sentido geográfico, mas não no sentido
psicológico— para a Argentina de Alberto Breccia e Héctor Oesterheld, que provocam o
leitor com o traço mais comportado de Sherlock Time ou com o chiaroscuro inebriante de
"Mort Cinder".
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Detalhe da capa da HQ 'Mort Cinder', da editora Figura - Divulgação
A cada dia HQs de mais países alcançam o mercado brasileiro, o que poderia ser
impensável tempos atrás. Essa diversificação nas nacionalidades de obras publicadas aqui
tem muito a ver com a chegada dessas obras às livrarias, diz Paulo Ramos, professor da
Unifesp e pesquisador da área de quadrinhos. Até os anos 1990, diz ele, HQs eram nativas
das bancas de jornal.
Com a exceção de poucos títulos, como o francês "Asterix" e o belga "Tintim", que saem
em formato de livro desde os anos 1970, o mercado era dominado por publicações em
revista. Esse espaço era dividido principalmente entre as americanas Marvel, DC e
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Disney.
Quando o formato em livro começa a ganhar força, sem exigir a periodicidade das
publicações em revista, editoras especializadas como a Conrad, a Devir e a Ópera
Graphica passam a explorar novos quadrinhos americanos e japoneses e as HQs italianas
e francesas ganham atenção.
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Com o sucesso desse movimento, grandes casas editoriais passam a ver um novo nicho de
leitores, dando origem a iniciativas como o selo Quadrinhos na Cia., da Companhia das
Letras, e a editora Nemo, do Grupo Autêntica. Também surgem novas editoras dedicadas
apenas às HQs em formato de livro, como a Veneta. O resultado é a pujança que vemos
hoje.
"A produção de quadrinhos está maravilhosa", diz Rogério de Campos, criador e editor-
chefe da Veneta, a despeito do que ele chama de "desastre econômico promovido por esse
governo, com censura, com o desmonte das estruturas de cultura, dos subsídios, dos
incentivos".
Campos diz que o interesse por novas obras começou de baixo para cima. Jovens com o
acesso à internet começam a se informar sobre o que acontecia lá fora e até mesmo a
consumir essas obras pela internet, criando um nicho que viria a ser reconhecido. Ele
também atribui ao setor público esse êxito.
A partir de 1988, com a Constituição Federal, "uma política de Estado incluiu quadrinhos
e os reconheceu como uma forma de linguagem artística legítima e importante para o
país". "E mesmo que o Estado tenha parado agora, não tenha política cultural nenhuma,
os artistas pegaram o impulso e continuaram", afirma.
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Veja trechos da HQ
Junto às grandes editoras e a editoras especializadas como a Veneta, surgem casas como a
Pipoca & Nanquim e a Comix Zone, que viabilizam a publicação de HQs com a pré-venda
das edições na Amazon, e como a Risco e a Figura, que lançam suas obras através de
financiamento coletivo pelo Catarse.
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Com mais casas editoriais no jogo, aumenta a procura por obras novas,
que ainda não tenham seus direitos de publicação comprados —o que
promove um novo fôlego de diversificação.
A escolha por começar com a obra desse mestre dos quadrinhos até então pouco
conhecido no Brasil vai ao encontro do projeto editorial da Figura, que busca publicar
grandes autores que não receberam a devida atenção aqui.
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Página da HQ 'Sharaz-De', de Toppi
"Autores europeus vêm sendo publicados no Brasil de uma forma um pouco errática
desde os anos 1980, mas eu acho que é algo que foi tomar força mesmo a partir dos anos
2000", diz Rosa, que já publicou nomes como a chinesa Zao Dao e o argentino Alberto
Breccia.
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Não só publicou Breccia como trouxe ao Brasil seu grande clássico,
"Mort Cinder", que narra o encontro de um homem com o imortal
"homem de mil mortes" que dá título à obra. A publicação chamou a
atenção de outras editoras para o autor e para os quadrinhos argentinos,
que se destacam nesse novo cenário de importações.
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"Nunca se publicou tantos quadrinhos argentinos como agora. Existe
uma pulverização de conteúdo, a ponto de termos quase toda a obra do
Breccia publicada no Brasil, uma coisa que seria impensável há cinco
anos", diz Paulo Ramos, professor da Unifesp e pesquisador do tema.
"Isso é algo que estamos tentando fazer nos últimos anos, direcionar a atenção também
para artistas europeus e latino-americanos, além do trabalho feito com os brasileiros",
explica Emilio Fraia, editor do selo Quadrinhos na Cia., da Companhia das Letras.
Fraia conta que aprendeu a ler com quadrinhos e desde cedo teve contato com obras que
fugiam do cenário mainstream, como a adaptação de Franz Kafka feita pelo argentino Leo
Durañona. "Assim como na literatura, esse tipo de variedade sem dúvida enriquece o
olhar e a experiência do leitor. A ideia é tentar seguir explorando essa variedade."
Questionados sobre até onde esse melhor momento do mercado de quadrinhos vai durar,
os entrevistados ficam divididos.
Paulo Ramos não é completamente otimista e receia que esse cenário possa ter prazo de
validade. "O mercado dos quadrinhos é muito caro. Essa equação talvez se torne
insustentável em algum momento." Já Rosa é mais otimista e acha que a tendência é que
o cenário se consolide. Lembra que os leitores têm se mostrado bastante resilientes.
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