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Resumo: Este artigo apresenta aspectos do texto jurídico, suas especificidades e interseções
com aspectos do texto legal, ambos aqui tratados como gêneros textuais. Ainda, dentro dos
gêneros citados, analisaremos duas espécies peculiares de subgêneros textuais, quais sejam o
acórdão e o texto legislativo penal, sobre cujos elementos específicos discutiremos no
decorrer da pesquisa, a fim de os colocarmos em patamares diferenciados no âmbito de seus
contextos.
Abstract: This article present aspects of the legal text, its specificities and intersections with
aspects of the legal text, both here treated as textual genres. Also, within the mentioned
genres, we will analyze two peculiar species of textual subgenres, which are the judgment and
the criminal legislative text, on whose specific elements we will discuss in the course of the
research, in order to place them in differentiated levels within their contexts.
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1. INTRODUÇÃO
A escolha do proposto tema para análise e discussão não é aleatória. Não somente pela
riqueza material de dados acerca da natureza discursiva e textual desses gêneros, e como eles
dialogam entre si, estabelecendo relações de similaridade, diversidade e dependência, mas
também por ser uma área da qual faço parte em meu dia-a-dia, e com cujos profissionais
convivo – no concernente à área judiciária – e convivi – com respeito aos operadores
legislativos.
Em face do exposto, nosso trabalho objetiva mostrar de que forma os textos legal e
jurídico emergem como gêneros textuais, e como, e em que grau, aqueles envolvidos nos
procedimentos inerentes às suas naturezas podem ser considerados parte de uma comunidade
discursiva de fato. Para tanto, confrontaremos as literaturas acerca dos assuntos, a fim de que,
por meio das semelhanças e diferenças entre esses dois gêneros, levantemos as características
mais latentes para sua compreensão como gêneros textuais.
Por fim, faremos a análise do texto acórdão e texto legislativo penal, com o objetivo
de, enumerando suas particularidades principais, confirmá-los como subgêneros textuais dos
gêneros dos quais são integrantes, e não somente como meros procedimentos jurídicos. Para
isso, utilizaremos aqui exemplos factuais, e não meramente genéricos, para que fique
caracterizada a especificidade desses dois tipos de texto.
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Para o estudo a que nos propusemos, dois foram os principais textos utilizados como
objeto de reflexão acerca do tema deste trabalho, o intitulado “Uma descrição da comunidade
discursiva jurídica”, de Elisabeth Linhares Catunda 1, onde ela faz uma análise da comunidade
em pauta, através dos seis critérios de John Swales caracterizadores de uma comunidade
discursiva 2. Dessa forma, a autora vai traçando os objetivos e propósitos dessa comunidade,
seus mecanismos de intercomunicação e participação, a seleção crescente de gêneros utilizada
pela comunidade, além de sua terminologia específica – esses dois últimos aspectos serão de
maneira mais profícua tratados aqui -, e, por fim, a estrutura hierárquica da comunidade.
Esses critérios swalesianos vão corroborar as afirmativas de que, considerada em seu restrito
âmbito, ou seja, somente entre os operadores do direito, há sim no que se falar em
comunidade discursiva jurídica.
1
Sousa, Socorro Claudia Tavares de; Araújo, Julio César; Rodrigues, Bernardete Biasi. Gêneros Textuais e
Comunidades Discursivas – Um diálogo com John Swales. Autêntica Editora. Belo Horizonte/MG. 2009
2
1- Os objetivos públicos e os propósitos da comunidade, os mecanismos de intercomunicação da comunidade,
os mecanismos de participação utilizados pela comunidade, o uso de uma seleção crescente de gêneros pela
comunidade, a terminologia específica da comunidade e a estrutura hierárquica da comunidade discursiva
jurídica.
3
PIMENTA-BUENO, M. do N. S. A evolução do pensamento lingüístico. 2 ed. Rio de Janeiro: Papel Virtual
Ed., 2004.
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A partir daí, concluímos que existe, socialmente, uma diferença entre os membros das
referidas comunidades, o que de fato influenciará também nas produções textuais dos
mesmos.
4
CF/88, art. 5°, LX: a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade
ou o interesse social o exigirem.
5
LICC, art. 3°: Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.
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objetivos da comunidade discursiva jurídica é ser conforme as leis. Então, em verdade, existe
essa extrema ligação entre ambas, pois quem elabora as leis, frequentemente, é o poder
Legislativo, e quem as executa é o Judiciário. Pode-se dizer que, o texto legislativo é uma
garantia que o indivíduo tem contra o arbítrio do Estado, representado pelo membro do
judiciário.
Conforme vimos na seção passada, a comunidade discursiva jurídica se utiliza das leis
produzidas pelo Poder Legislativo para manter a autoridade do Estado, no caso daqueles que
o representam, e também para exigir reparação de danos, causados em situações de conflito,
no caso de advogados. Porém, não são somente as leis contidas nos códigos que regerão o
comportamento dos envolvidos nos processos jurídicos. Há, como bem citaram Silva e
Pimenta-Bueno, a jurisprudência, que é constituída pelas manifestações reiteradas dos
Tribunais, ao interpretarem e aplicarem as leis aos casos concretos que são levados ao Poder
Judiciário, e a doutrina, que consiste na reflexão teórica empreendida pelos juristas, nas obras
que escrevem, ou em seus pronunciamentos e pareceres sobre temas jurídicos polêmicos.
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Uma das características do texto legal é o fluxo que ele estabelece com outros textos
da mesma natureza, buscando a remissão perfeita, a fim de que o texto possa sanar
integralmente a dúvida acerca do assunto daquele que o lê. Essas articulações podem ser
internas, como quando um artigo de lei se refere a outro, dentro do mesmo Código, como por
exemplo:
a) Código Civil – Art. 1.223. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do
possuidor, o poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196.
Art. 237 – Contrair casamento, conhecendo a existência de impedimento que lhe cause a
nulidade absoluta:
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Sob os padrões devidos, uma petição deve ser redigida desta forma (anexo 2):
c) Título da ação
d) Qualificação do réu
f) Do fundamento jurídico
g) Do pedido
Entretanto, como não há uma “fiscalização” quanto à forma com que o autor dos
gêneros em pauta os escreve, há possibilidade de desvios à norma (anexo 3).
Quanto aos textos jurídicos, cabe-nos observar, além dos padrões estruturais, a
maneira hierárquica como são elaborados. Conforme dito, a petição inicial representa o
primeiro passo de um processo, portanto, é o primeiro elemento da hierarquia. Após uma série
de acontecimentos, onde o primeiro é o despacho do juiz, seguido da contestação da parte ré,
documentos comprobatórios, enfim, temos a sentença do magistrado, que, à primeira
instância, é o elemento último de um processo. Hierarquicamente, uma sentença, por ser
elaborada por um membro de escala superior a um advogado, merece ainda mais formalidade,
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o que Marcuschi chama de “aspecto formulaico” dos gêneros jurídicos, haja vista não haver
espaço para a criatividade do produtor, devido às regulamentações do sistema. Uma sentença,
em um grau maior que a petição, apresenta aspecto formal e padronizado (anexo 4), porém,
diferentemente do texto legal, como não necessita de etapas para que se torne oficial, existe
possibilidade de que esses padrões sejam quebrados, tornando essas sentenças, e
principalmente os seus produtores, objeto de preconceito dentro da comunidade discursiva
(anexo 5).
Algumas diferenças são mais acentuadas entre os dois textos em debate neste trabalho,
como a obtenção da clareza e da precisão. No texto legal, há preferência pelo uso de e
expressões em seu uso comum, enquanto que no texto jurídico há um acentuado uso de
arcaísmos, brocardos latinos e termos jurídicos, mostrando a especificidade lexical dentro
dessa comunidade e seu alto teor de conservadorismo lingüístico. Segundo Bezerra, 1998;
Cornu, 2000; Damião, 2000; Bittar, 2001, o fato de a legalidade dos textos jurídicos ser
diretamente condicionada à escrita faz com que a formalidade ganhe espaço e, de certa
maneira, mantenha a hierarquização da comunidade e afaste a linguagem jurídica da
ordinária, e isso, de certa maneira, também se aplica à comunidade discursiva legislativa. A
diferença reside, talvez, no fato de as leis serem feitas para ser cumpridas pela sociedade,
enquanto que petições, sentenças, recursos, acórdãos, sejam especificamente direcionadas a
operadores do direito.
Outra diferença seria o uso nos textos legais das mesmas palavras na expressão das
mesmas idéias, evitando-se o emprego de sinonímia, ao passo que nos textos jurídicos há um
rigor em evitar-se a repetição de palavras. Além disso, há bastante o uso de conectivos que
localizam o leitor no texto, como “anterior”, “seguinte”, enquanto que o texto legal prefere
designar expressamente o dispositivo objeto da remissão.
Acerca dos modos de expressão, os textos jurídicos são de natureza descritiva, narram
os fatos, decidem ou não pela homologação de um acordo ou de uma pena, pedem
reapreciação de pedido, e confirmam ou retificam uma decisão anterior. Ao contrário, os
textos legais usam da imperatividade em seu discurso, principalmente no que concerne ao
Direito Público, onde a vontade soberana do Estado se impõe, em nome do interesse público.
Percebe-se uma freqüência no uso do verbo dever, ou do uso do verbo poder precedido de
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não, no lugar do verbo poder; ocorrência de estruturas iniciadas por é obrigatório, em vez de
é permitido.
Devido ao fato de que a lei se reporta a situações em tese, e não a situações concretas,
existe nos textos legais uma abstração, ao contrário dos textos jurídicos, que versam sobre
questões factuais, verídicas, sendo necessária a menção de sujeitos. Isso também nos remete à
outra característica do texto legal: a impessoalidade/generalidade. Nele há ausência de
qualquer referência a autor da norma, bem como a receptor da mesma, pois, conforme muitos
artigos de lei, ela se dirige a toda pessoa, todo aquele, etc. Há, em alguns casos, referência a
uma classe genérica de pessoas, como em o menor, os tutores, o adquirente, ou àqueles que se
encontram em determinada situação, como em o militar em serviço ativo, a pessoa natural
sem residência habitual, etc., mas nunca a um sujeito especificamente.
a) Em antigo acórdão o STF já assentava: “Código Civil, art. 1.525. Cód. Proc. Pen., art.
66. Actio civilis ex delicto...” (ACTJC09)
c) ...de modo a não fugir do compromisso devido ao princípio contido na cláusula pacta
sunt servanda...(ACTJC10)
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Segundo Catunda, há uma crença dentro da comunidade discursiva jurídica que diz
que quanto mais o operador do direito usar termos em latim, brocardos e arcaísmos, mais
domínio dessa ciência ele detém. Por isso, o índice de freqüência de uso de brocardos e
termos latinos, por parte dos produtores do acórdão, é significativo.
Corrupção passiva
Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora
da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa
de tal vantagem:
No que concerne aos aspectos sintáticos, observemos que os verbos assumem posição
central no enunciado, aparecem primeiro e no infinitivo, além de, em muitas vezes, em longas
séries, como no caso a seguir:
Receptação
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Art. 180 – Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio,
coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba
ou oculte:
Ex: Código Penal – Art. 219 – Raptar mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou
fraude, para fim libidinoso: [...], onde “mulher honesta” complementa o verbo anterior,
especificando o tipo de raptada, “mediante violência, grave ameaça ou fraude”, é adjunto
adverbial de modo, e “para fim libidinoso” o adjunto adverbial de finalidade.
A formulação das normas penais toma como base condutas ilícitas, daí a importância
que esses verbos com valoração negativa assumem ao iniciar o período. Estando eles no
infinitivo, refletem o caráter abstrato das normas, e a imperatividade das mesmas. A ausência
de sujeito se dá por conta da impessoalidade das leis, ou por serem destinadas a todas as
pessoas, ou um grupo de pessoas em determinada situação, como vimos anteriormente. E
mesmo nos casos onde aparece o sujeito do verbo – casos raros -, os mesmos surgem após o
verbo. A longa sequência de verbos, como no exemplo acerca da receptação, é conseqüência
da maior informatividade que essas leis precisam ter, em comparação com as outras, daí as
minuciosas enumerações de ações semelhantes e, às vezes, até sinônimas ao primeiro verbo,
com objetivo de instruir de maneira precisa o leitor.
Por fim, falando sobre os aspectos semânticos do texto legislativo penal, convém
destacar que, não por tratar de matéria de crime, os verbos possuem todos eles
intrinsecamente um conteúdo de desvalor. Por esse ponto de vista, podemos dizer que em
certos casos o desvalor reside no resultado da conduta – momento em que a carga negativa
estará repartida entre o verbo e seus complementos/adjuntos, como no caso de morte ou
homicídio -, e não na conduta em si – ocasião em que o desvalor está totalmente depositado
no verbo (ex.: invasão de domicílio).
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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
6. REFERÊNCIAS BIBLIÓGRAFICAS
BHATIA, Vijay Kumar. Legal discourse in professional settings. In___: Analysing genre:
language use in professional settings. New York: Longman Publishing, 1993
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SOUSA, Socorro Claudia Tavares de; araújo, Julio César; RODRIGUES, Bernardete Biasi.
Gêneros Textuais e Comunidades Discursivas – Um diálogo com John Swales. Autêntica
Editora. Belo Horizonte/MG. 2009 – Uma descrição da comunidade discursiva jurídica, por
Elisabeth Linhares Catunda.
TOLEDO, F. A. Princípios básicos de direito penal. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 1994.
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Anexo2
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Anexo 4
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