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Atividades Lúdicas e Experimentação -

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UMA ANÁLISE FENOMENOLÓGICA SOBRE AS


TERMINOLOGIAS “JOGO EDUCATIVO”, “JOGO DIDÁTICO”
E “JOGO PEDAGÓGICO” NO ENSINO DE QUÍMICA
Ricardo Silvério Gomes Pinheiro1* (PG); Márlon Herbert Flora Barbosa Soares2 (PQ).

1Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia; *ricardosilverio@discente.ufg.br


2Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia; marlon@ufg.br

Palavras-Chave: jogo, educação, fenomenologia.

Resumo: Neste trabalho realizamos uma análise fenomenológica para compreensão das estruturas
significativas de “jogo educativo”, “jogo didático” e “jogo pedagógico”, que são termos empregados por
Soares (2015; 2016) e Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018). De início revelamos as essências de jogo
e educação para, em seguida, compreender as três citadas. Foi possível fundamentar e explicitar
significados e critérios para uso das terminologias, além de ressaltar a importância de uma distinção que
possa facilitar a comunicação e não causar poluição da linguagem. Defendemos que quando precisamos
de novas denominações, é mais adequado que reciclemos aquelas que são usuais. No caso de jogo
didático e jogo pedagógico, tratam-se de jogos educativos formalizados, cujos significados não estão
relacionados apenas com Didática e Pedagogia, mas com uma questão de ineditismo. E jogos podem
ser educativos ou não educativos, sendo que o primeiro depende de um mínimo de aprendizagem,
resultante de ensino ou não.

INTRODUÇÃO
Quando diferentes terminologias carregam o mesmo significado, a
comunicação se torna mais complicada e até confusa, pois as pessoas podem estar
falando de mesmas coisas sem haver consenso quanto a denominação, o que causa
uma “poluição da linguagem” e não contribui para a compreensão. Assim, tornam-se
necessários novos significados, classificações e combinações para diferenciar termos
usuais e com sentidos generalizantes. Esse é o caso das terminologias “jogo
educativo”, “jogo didático” e “jogo pedagógico”, muito utilizadas para designar o uso de
jogos no contexto educacional, bem como no ensino de química, mas sem uma
distinção clara entre elas, segundo Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018).
Diante dessa preocupação, esses autores apresentaram uma proposição que
permite diferenciá-las. Tanto “jogo” quanto “educação” carregam amplos significados,
por isso jogo educativo e suas variações precisam ser criteriosamente elucidados para
que não haja margem de dúvidas sobre seus sentidos. Com isso, nosso objetivo é
realizar uma discussão de natureza fenomenológica sobre jogo educativo, jogo didático
e jogo pedagógico, bem como elucidar suas estruturas significativas, seu sentido
essencial e compreender os porquês da necessidade de uma diferenciação. O que
propomos é uma discussão e busca da essência dos termos que aparecem nos
trabalhos de Soares (2015; 2016) e de Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018). Teremos
como questão norteadora: quais as estruturas significativas que sustentam jogo,
educação e jogos educativos, didáticos e pedagógicos?
CAMINHO METODOLÓGICO
A fenomenologia estuda os fenômenos, isto é, aquilo que é dado como
consciência a partir da percepção, imaginação, intuição ou qualquer outro ato. Isso
inclui desde objetos até sentimentos. Não é objetivo da fenomenologia negar a
existência do mundo e das pessoas, mas sim compreender como estes nos são
revelados (ZAHAVI, 2019b; MOREIRA, 2002). O método fenomenológico husserliano é
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basicamente composto por: epoché, redução transcendental e redução eidética.


Entendemos, com base em Sokolowski (2012) e Zahavi (2019b), que a epoché diz
respeito à suspensão dos juízos, enquanto redução transcendental refere-se
propriamente à reflexão que permite compreender as estruturas da consciência. A
redução eidética, conforme Sokolowski (2012) e Moreira (2002), nos conduz às
essências dos fenômenos, que são irredutíveis, sendo aquilo que os fenômenos são e
não podem deixar de ser. No método fenomenológico saímos de uma atitude natural,
que é ingênua e habitual, em direção a uma atitude fenomenológica, que é
questionadora, reflexiva e analítica. Nessa última citada, tudo pode ser colocado em
questionamento, exceto o sujeito que questiona, pois é ele quem vivencia e dá
significado aos fenômenos.
Conforme Moreira (2002), quando realizamos epoché e redução transcendental
estamos suspendendo a validade de tudo aquilo que tínhamos como certo e absoluto,
para voltarmos a nós mesmos e compreendermos como as coisas nos são dadas
enquanto atos de consciência. O grande dilema de aplicar epoché, redução
transcendental e redução eidética com essa rigorosidade, é que teríamos de suspender
de forma radical a atitude natural, levando-nos à suspensão de todo e qualquer
significado pré-concebido. Acreditamos que não é possível termos uma atitude
fenomenológica integral, visto que tomaremos certos pressupostos e certezas
necessárias para a revelação.
Para resolvermos esse imbróglio, recorremos a Zahavi (2019a) quando afirma
que Husserl fala da volta à atitude natural mesmo após uma virada transcendental, sem
que o processo deixe de ter natureza fenomenológica. Com isso, mesmo após uma
virada transcendental, podemos ainda retornar à atitude natural em alguns pontos e
nos mantermos reduzidos numa atitude fenomenológica em outros. É preferível
denominar isso de “atitude fenomenológica naturalizante”, em que mesmo nos
momentos de reflexão voltados a nós mesmos, o mundo, as pessoas, as relações
sociais e certas teorias resistem à suspensão. O que faremos aqui não é epoché e
redução transcendental, mas sim redução eidética, cujo intuito é revelar e compreender
as essências de certas terminologias, partindo de alguns pressupostos e suspendendo
a validade de outros.
A redução eidética terá como fundamento as ideias de Sokolowski (2012), que
a desenvolve com base em três níveis: tipicalidade, universal empírico e variação
imaginativa. A tipicalidade se dá pela associação de um número de coisas
experienciadas com base na similaridade que possuem. No universal empírico
percebemos que as coisas experienciadas são similares por que é uma única coisa. E
na variação imaginativa buscamos alcançar características que seriam indispensáveis
para a coisa ser o que é. Para isso, deixamos a imaginação correr livre de forma a
dilatar as fronteiras da coisa em questão, permitindo-nos ver quais elementos podemos
remover antes da coisa destruir-se enquanto o tipo de coisa que é.
Em nossa proposta trazemos ainda três aspectos para aplicação da
abordagem fenomenológica, segundo Bicudo (2011): interrogação, descrição e
interpretação. A interrogação é a busca por uma perspectiva de onde podemos olhar o
fenômeno. Por meio da descrição explicitamos nossas vivências, utilizando escrita,
filmagens, etc. E para revelar as essências, precisamos interpretar, isto é, realizar uma
análise hermenêutica que visa demonstrar os significados dos fenômenos presente nas
palavras e sentenças. Por isso, a análise fenomenológica parte de questionamentos e
alguns pressupostos para descrever, interpretar e compreender os fenômenos “jogo
educativo, “jogo didático” e “jogo pedagógico”, permanecendo ao final aquilo que tais
terminologias são e não podem deixar de ser.

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JOGOS EDUCATIVOS, DIDÁTICOS E PEDAGÓGICOS: INTERSECÇÕES ENTRE JOGO E EDUCAÇÃO


Desde criança temos várias experiências com jogos, como: jogos de palitos,
jogos de cartas, jogos de tabuleiro, jogos pela internet, jogos de futebol, jogos de vôlei,
entre outros. E jogar sempre foi divertido para nós e para os demais jogadores, que
tinham a sede de vencer. Algo comum em todos os jogos que participávamos era a
presença de regras, que tinha o intuito de evitar que algum jogador se beneficiasse de
forma injusta, ou seja, ter regras e segui-las estava relacionado a um senso de justiça.
Alguns jogos eram jogados até o final, porém outros eram paralisados na metade por
não serem divertidos ou por algum participante não aceitar a derrota, chegando ao
ponto de burlar as regras e causar desavenças. Não podemos deixar de mencionar
outros atos que chamávamos de brincadeiras e que hoje nos parecem muito
semelhante ao jogo, como: esconde-esconde, pega-pega, apostar corrida, bandeirinha
estourou, etc. Todos eram jogos porque tinham regras consensuais, mas sempre
dizíamos que iríamos brincar e não jogar. Soares (2015) explica que jogo e brincadeira
são utilizados no contexto brasileiro de formas distintas, sendo este com regras
estabelecidas em sociedade e aquela com regras que variam de região para região. O
autor conclui que ambos levam ao prazer e diversão e podem ser caracterizados como
sendo unicamente “jogo”. Então, brincadeira é jogo ou não?
Da forma como expusemos nossas vivências, tudo o que conhecemos como
brincadeira tinha regras, sejam elas nossas ou em grupo. Quando fingíamos que havia
homenzinhos dirigindo nossos carrinhos ou quando imaginávamos sermos
apresentadores de um programa de TV, estávamos regidos pela nossa própria regra.
Uma regra que valia apenas para nós. Recordamo-nos que conseguíamos imaginar as
fazendinhas, cada uma com seus donos que eram vizinhos e tinham diálogos entre si.
Isso era um jogo de imaginação, que em Piaget (2014, apud SOARES, 2018)
caracteriza um jogo simbólico. Esse mesmo autor ainda fala numa modalidade que é o
jogo de regras e se baseia na relação entre indivíduos. Entendemos que a noção de
regra em Piaget é mais restrita ao que é social, ao que é relação entre sujeitos, porém
não conseguimos pensar num jogo de imaginação sem regras. Embora seja uma
atividade de nossa livre e espontânea vontade, somos nós quem a governamos e
damos as coordenadas. Nós regulamos o que os personagens dirão ou farão. São
regras que criamos e nós mesmos respeitamos.
E o prazer e a diversão? Primeiro que podemos reduzir diversão ao prazer,
porque quem diverte sente prazer. Definimos o prazer como um sentimento de
satisfação, como o preenchimento de um vazio, de algo que completa. E podemos
sentir isso tanto na calma, como na euforia. Tanto ao comer um chocolate quanto ao
escorregar por um toboágua. Tanto ao fazer um gol quanto ao entrar debaixo da água
morna após sentir frio. Tanto ao ser elogiado quanto ao relaxar após o trabalho. Tudo
isso causa prazer. Vemos claramente que para senti-lo é necessária uma mudança de
conduta e estímulos corretos. O jogo ou brincadeira, por algum motivo, nos induz a
isso. E não é só pelo sentimento de querer vencer, mas é uma necessidade de
completude, pois muitos se contentam somente com o ato, sem ser premiado ou sem
ter atenção a mais. Prazer é uma resposta biológica que procuramos sempre repetir. O
sentido essencial de jogo parece estar cada vez mais reduzido a tudo o que tem regras
e dá prazer simultaneamente. E se o jogador não sente prazer? E se ele joga
obrigado?
A questão de ser jogo depende do sentimento de quem joga. Imaginemos um
jogo jogado por dez pessoas em que nove se divertem e uma não. Ainda sim é jogo,
porque gera prazer na maioria. Se uma pessoa sente prazer e nove não sentem, ainda
sim poderíamos dizer que é um jogo ruim, visto que uma pessoa sentiu prazer e a
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maioria não. Se todas jogassem e não sentissem prazer, não mais poderia ser jogo.
Seria somente a tentativa de um jogo. Isso levaria as pessoas a não mais quererem
jogar e, se mais ninguém quer jogar, não podemos mais chamar de jogo. Jogo só é
jogo se for jogado. Um objeto que falhou em ser jogo pode ser reformulado e vir a dar
prazer, recebendo novamente a alcunha de jogo. E um jogo pode deixar de ser jogo,
assim como qualquer outro objeto pode vir a ser.
Ao invés de dizermos que algo é jogo, é mais adequado dizer que algo “está
jogo”, porque a denominação jogo depende do prazer de quem o joga. Todo jogo é
pensado e produzido com a intenção de dar prazer. Se o jogo não dá prazer, só fica a
intenção de ter tentado ser jogo. Dessa forma, quanto mais pessoas jogam um jogo,
maiores as chances de continuar sendo jogo, visto que sempre vai haver alguém que
sinta prazer. Por isso a validação do jogo enquanto jogo depende de jogadores
jogando. Não seria adequado dizermos que estamos construindo um jogo, mas sim que
estamos construindo um objeto com a intenção de ser jogo e somente terá essa
alcunha se os jogadores sentirem prazer. Não entramos no aspecto das regras porque
toda intenção de jogo é acompanhada de regras, senão também não poderá ser jogo.
O fator mais variante e instável na decisão do jogo é o prazer, que muda muito
facilmente de pessoa para pessoa.
Soares (2015) defende que o jogo deve ser jogado de forma voluntária, isto é,
o jogador deve ter escolhido jogar. Mas se alguém é obrigado a jogar e no decorrer do
ato sente prazer, poderíamos ainda chamar de jogo? A questão da voluntariedade nos
parece difícil para determinar um jogo enquanto jogo, pois se tem regra e gera prazer,
é jogo. Pode em alguns momentos estar jogo e em outros não. Dizemos que o mais
importante é saber qual foi a última visão do sujeito para realmente determinarmos a
validade. É preferível que o jogador escolha jogar, porque isso significa que algo já o
estimula para a busca da completude que é o prazer. Podemos pensar que dificilmente
um ser humano vá sentir prazer sendo obrigado a algo, porém não podemos afirmar
isso com certeza absoluta.
Em resumo, só podemos dizer que algo é jogo em determinada condição. Por
isso, é mais adequado dizer que algo está jogo. Jogo é tudo que tem regras e dá
prazer em determinado momento, podendo deixar de ser jogo caso qualquer uma
das duas condições não sejam preenchidas. Brincadeira nos parece mais uma
modalidade de jogo com regras pouco rígidas e em que a imaginação é fértil, sem um
espírito competitivo tão aparente, muito diferente do rigor dos jogos de truco, xadrez,
sinuca, etc. O que fazíamos com nossos carrinhos quando éramos bem pequenos, era
uma forma de jogo, que denominávamos brincadeira. A terminologia “atividade lúdica”
é definida por Soares (2015) como atividades que dão prazer e são livres, o que inclui
jogo e brincadeira. No entanto, temos percebido o uso de “atividade lúdica” para todo
jogo que não visa à competição. Quando alguém fala em atividade lúdica, parece
simplesmente uma interação sem que haja um vencedor. Dessa forma, preferimos
reservar o termo jogo para tudo o que dá prazer e tem regras, o que inclui atividades
lúdicas e brincadeiras.
É comum as pessoas utilizarem a terminologia “educação” para o que ocorre
na escola. Contudo, ouvimos muito os termos “educação de berço” e “educação
familiar”. Esses dois atuam como sinônimos um do outro e correspondem ao tipo de
educação que começa no convívio da família, onde os pais ensinam aos filhos as
noções básicas de respeito, do que é considerado certo e errado, das formas de
tratarem as pessoas, etc. Ela ocorre fora da escola. Então, se reduzirmos a
denominação “educação” ao seio escolar, teríamos que criar outras denominações
para o que ocorre no seio familiar. Além disso, a educação abrange mais que família e

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escola, ocorrendo em igrejas, movimentos sociais, num simples ato de assistir TV ou


mesmo conversar com alguém na rua. No Dicionário Aurélio, educar é “promover o
desenvolvimento da capacidade intelectual, moral e física de alguém ou de si mesmo”
(FERREIRA, 2001, p. 272). Libâneo (2013, p. 22) apresenta uma definição parecida,
ao dizer que a educação é o “desenvolvimento onilateral da personalidade, envolvendo
a formação de qualidades humanas – físicas, morais, intelectuais, estéticas – tendo em
vista a orientação da atividade humana na sua relação com o meio social”.
Concordamos que educação está ligada aos desenvolvimentos físico, moral e
intelectual, bem como à formação da personalidade humana em determinado contexto,
seja esse contexto a escola, a igreja, em casa, os movimentos sociais, etc.
Há duas modalidades de educação: não intencional e intencional. A primeira é
aquela que ocorre de forma espontânea, como numa simples conversa de rua, sem
intenção de educar, sendo também denominada informal. A segunda ocorre quando há
uma intenção clara de educar, com objetivos e métodos específicos explícitos, como na
escola (LIBÂNEO, 2013). Entendemos que a intencionalidade em educar não é
integralmente específica de um lugar ou outro. Podemos pensar no exemplo de um pai
colocar o filho de castigo após uma teimosia, estabelecendo certas condições, de modo
que fique clara a intenção de educar, o que leva o filho a entender a intenção em ser
educado. Ainda no seio familiar, pode acontecer dos membros terem o hábito de
dialogar em grupo antes de dormir para falar de seu dia, das novidades e dos
sentimentos, tornando-se algo espontâneo, sem objetivos claros, o que é não
intencional.
Situação muito parecida ocorre na escola, pois durante uma aula específica o
professor ensina algo previamente planejado com determinados objetivos, sendo
intencional. No intervalo entre as aulas, durante as recreações, os alunos podem
aprender coisas uns com outros de forma espontânea, isto é, não intencional. Tanto na
família como na escola ocorrem situações intencionais e não intencionais, mas na
escola a intencionalidade é majoritária quando comparada a não intencionalidade,
enquanto que no convívio familiar a não intencionalidade é majoritária. É mais
adequado dizermos que temos mais momentos de educação intencional na escola do
que no convívio familiar.
A educação intencional é classificada em não formal e formal, sendo a primeira
aquela que ocorre fora do sistema escolar convencional (movimentos sociais e meios
de comunicação de massa) e a segunda é aquela que ocorre dentro do sistema escolar
convencional (escolas, igrejas, empresas, etc) (LIBÂNEO, 2013). Um sistema escolar
convencional é aquele que possui planejamento e objetivos bem definidos, com
profissionais que atuam na formação de outras pessoas, como na escola. O termo
formal se refere ao ambiente e à forma específica, isto é, nas escolas, igrejas e
empresas existe uma forma pela qual as pessoas devem se portar, diferentemente de
quando estão em qualquer outro ambiente mais descontraído ou em casa. O que
determina a formalidade ou informalidade é a conduta mais padronizada ou menos
padronizada das pessoas. É fato que quando falamos em educação formal na
atualidade, a escola é a primeira a ser citada, pois mesmo que haja momentos de
educação não intencional nesse ambiente, a educação intencional formal é majoritária
e explícita.
Quando falamos em educação, automaticamente estabelecemos uma relação
com ensino e aprendizagem. Entendemos que ensino é a difusão de informações,
conhecimentos, técnicas, valores ou hábitos, conforme elementos de Ferreira (2001) e
Libâneo (2013). Esse processo requer uma linguagem para que haja comunicação
entre pessoas, seja diretamente pelo diálogo ou indiretamente através de objetos. O

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intuito de ensinar é para que alguém possa aprender, mas tendo convicção que nem
todo ensino leva à aprendizagem e nem toda aprendizagem é decorrente de ensino.
Uma pessoa pode aprender sem que receba instruções ou informações de outra,
apenas estabelecendo relações com objetos e desenvolvendo certos reflexos ou
mesmo noções nunca antes difundidas por alguém. Um exemplo disso é quando uma
criança manuseia um brinquedo e se desenvolve a partir dele sem que alguém tenha
lhe ensinado a brincar de tal forma. A aprendizagem se dá a partir do desenvolvimento,
podendo até dizer que esta é produto daquele. Quando falamos em desenvolvimento
nos referimos aos aspectos biológico, psicológico e social que, segundo Piaget (1973),
mantém entre si relações de equilíbrio. E só estamos convictos de que houve
aprendizagem depois que a identificamos.
Ainda com base em Piaget (1967; 1973), para aprender precisamos assimilar
as coisas, isto é apropriar-se delas, de forma que possam modificar ou combinar com o
que já sabemos para construirmos novos significados e fazerem sentido para nós, ou
seja, acomodar. Enquanto o ensino é a difusão de informações que intenciona um
aprender, o aprender é o produto do desenvolver, sendo este decorrente de
assimilação e acomodação. Há como aprender sem ensino e ensinar sem que haja
aprendizagem, embora na maioria das vezes a aprendizagem é precedida de ensino.
Caso um objeto traga instruções escritas ou representadas por qualquer símbolo
desenvolvido por outra pessoa ou mesma outra pessoa instrua diretamente um sujeito,
teremos o processo de ensino. Se educação é o desenvolvimento intelectual, moral e
físico e a aprendizagem é fruto de um desenvolvimento resultante majoritariamente de
ensino, então educação está ligada ao ensino e aprendizagem, com a observação de
que nem todo ato de ensinar é educar. Logo, aprendizagem é uma consequência
indispensável para dizer que houve educação e ensinar só pode ser educar se
promove um mínimo de aprendizagem. Em síntese, educar é oferecer condições e
estímulos (sendo o ensino o principal) que culminem no mínimo
desenvolvimento intelectual, moral e físico (aprendizagem) de si mesmo ou de
outros, abrangendo a educação nas escolas, igrejas, empresas, famílias etc.
Recordamos que jogo é tudo o que tem regras e dá prazer, enquanto que educar
envolve ensino que culmina em aprendizagem e/ou aprendizagem sem ensino.
Perguntar pelo jogo educativo é indagar sobre aquilo que tem regras, dá prazer e
ensina culminando em aprendizagem ou promove aprendizagem sem ensino. Isso
abre margem para questionar: existe jogo não educativo? Segundo Cleophas,
Cavalcanti e Soares (2018), o jogo de forma geral não pode ser considerado educativo,
mas todo jogo educativo é jogo. Isso quer dizer que existem jogos que não são
educativos, como certos movimentos corporais que estamos muito acostumados.
Esses são apenas reflexos que dão certo prazer e seguem alguma regra, porém não
pensamos mais nessas regras para execução do ato. Em Piaget (2014 apud SOARES,
2018) é o que se denomina jogo de exercício, o qual pode não levar a desenvolver-se
ou aprender, sendo somente a expressão da educação enquanto aprendizagem, ou,
são simplesmente atos de inteligência prática de um bebê.
O jogo, em sua essência, está presente nos movimentos corporais porque um
reflexo é regulado por uma regra de interação entre organismo e meio, mesmo que não
tenhamos convicção disso. Um exemplo citado por Soares (2018) é de uma pessoa
rebatendo bola na parede repetidamente com o intuito de relaxar. Há uma regra que
mantém o ritmo em bater a bola na parede, assim como há prazer sentido pelo sujeito.
O ser humano não estará aprendendo nada, mas expressando o que já aprendeu,
sendo um jogo pelo jogo. Não significa que não possa ser educativo, pois se tentarmos
variá-lo, dando-lhe outras características e testando outras formas, estaremos

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aprendendo sem que alguém esteja nos ensinando. É uma aprendizagem por
tentativas e erros. Pode que outra pessoa venha e ensine o rebatedor a realizar outros
movimentos, o que também o torna educativo, porque alguém está ensinando e outra
pessoa está aprendendo. Se tiver um sujeito observando a pessoa a rebater a bola,
estará havendo ensino não intencional a quem observa, o que não é garantia de
aprendizagem e nem de um processo educativo.
O jogo é capaz de educar se oferece algum tipo de condição para o mínimo de
desenvolvimento humano. E a educação é capaz de dar prazer, embora na maioria das
vezes os processos educativos sejam sérios e cansativos. Assim, nem todo jogo está
educativo e nem toda educação está lúdica. Lembramos aqui que Soares (2016) nos
ensina que os termos “jogo” e “lúdico” possuem o mesmo significado, então não faz
sentido falar em “jogo lúdico” ou “brincadeira lúdica”. Por isso há necessidade de um
cuidado com as terminologias.
Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018) denominam jogo educativo como aquele
que ensina algo. E o ensino pode ser não intencional ou intencional. Os autores fazem
a seguinte classificação: quando há ensino não intencional por meio do jogo,
denomina-se jogo educativo informal (JEI); e quando há ensino intencional por meio do
jogo, recebe a denominação jogo educativo formalizado (JEF). Isso lembra a
classificação da educação conforme Libâneo (2013). Há ainda um entendimento de
jogo no sentido geral ou stricto, que é o jogo propriamente dito enquanto objeto com
regras e que dá prazer, que pode ser educativo ou não. Os autores são categóricos ao
dizerem que somente podemos falar em jogo educativo se este for um arremedo do
próprio jogo e que o jogo em si de forma geral não tem a intenção de ensinar algo a
alguém, mas pode ensinar.
A intencionalidade que caracteriza a divisão do jogo educativo em JEI e JEF é
relacionada ao fato de haver objetivos claros, procedimentos e conhecimentos
sistematizados e momentos específicos para ensinar alguma coisa a alguém. O jogo
que apresenta essas características é o JEF e o jogo que não apresenta essas
características, embora ensine algo a alguém, é o JEI. Faz um grande sentido essa
classificação quando enxergamos a educação como não intencional ou informal e
intencional formal. Um JEI é um objeto que tem regras e dá prazer num momento em
que não há intenção de ensinar, podendo ser em casa, na praça ou até mesmo na
escola, durante a recreação fora das aulas convencionais. Nesse caso, o ensino
também acompanha a ideia de majoração, pois o ensino intencional implica em
educação intencional e o ensino não intencional implica em educação não intencional.
Mesmo assim, tanto o JEI quanto o JEF ensinam algo, o que não significa a garantia de
aprendizagem integral. O ensino ocorre porque alguém difunde alguma informação por
meio do jogo, que consiste em conhecimentos, hábitos ou valores, os quais exigem
assimilação e acomodação pelo sujeito para que possa jogar.
Um mesmo jogo que é educativo em algum momento pode tornar-se apenas
jogo não educativo em outro momento. Por isso acrescentamos ao conceito dos
autores que para ser jogo educativo precisa ensinar algo que culmine no mínimo de
aprendizagem, com a possibilidade de aprendizagem integral. Isso significa que ao
jogar, mesmo que o sujeito não aprenda tudo, mas aprenda ao menos as regras do
jogo, dizemos que foi educativo. Caso não haja aprendizagem alguma, mesmo diante
da difusão de informações, ou seja, o ensino, então não é educativo. Imaginemos o
jogo Banco Imobiliário, que é um exemplo de Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018).
Ele traz diversos conceitos sobre matemática, educação economia, administração
financeira, etc. Para quem nunca jogou e vai jogar a primeira vez, esse é um jogo
educativo, se ensina algo que promove o mínimo de aprendizagem. À primeira vista,

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não é um jogo escolar, pois pode ser jogado por qualquer pessoa em qualquer lugar.
De uma forma ou outra, mesmo sem um planejamento e objetivos claros, o sujeito que
joga apropria-se de certas informações difundidas por meio de códigos e símbolos, as
quais são acomodadas parcialmente ou integralmente.
Agora se imaginarmos alguém que já jogou esse jogo diversas vezes e
conhece todas as informações, possibilidades, ações e jogadas, sem ver alguma
novidade, essa pessoa passa a jogá-lo quase que de forma automática, porque
consegue prever todos os passos, momentos e consequências. Esse jogo para essa
pessoa perde a função educativa e torna-se apenas jogo. Embora o ato de jogar
continue difundindo informações, não mais resulta em aprendizagem. Há o ensino, mas
não o aprender e, com isso, não podemos dizer que é educativo. O jogo Banco
Imobiliário pode ser classificado como JEI e também pode vir a ser um JEF se houver
um planejamento com objetivos, métodos e momentos bem definidos, ou até mesmo
um simples jogo não educativo caso não culmine em aprendizagem alguma. Um JEF
surge da adaptação de um jogo qualquer com o objetivo de ensinar um conteúdo
específico. Por isso vemos que um JEI pode tornar-se um JEF e vice-versa. Essa
possibilidade está atrelada à intencionalidade em torno do jogo, a qual depende do
ambiente, das pessoas e de seus objetivos majoritários. Imaginemos um professor de
química que cria um jogo sobre modelos atômicos para sua aula. Até o momento que
ele o utiliza para ensinar química de forma intencional, trata-se de um JEF. Esse
professor pode levar o jogo para sua casa e jogar com amigos ou familiares, sem a
intenção de ensinar química, mas que acabando ensinando. Nessa última situação
teremos um JEI. Logo, a questão de ser JEI ou JEF é temporária e flexível.
Soares (2015; 2016) utiliza o termo “paradoxo do jogo educativo” para se referir
à incompatibilidade entre jogo e educação, sendo que paradoxo é a junção de duas
ideias opostas. Mas se jogo e educação são opostos, como pode existir um jogo
educativo? Nem todo jogo está educativo e nem toda educação está lúdica, embora
haja jogos educativos e educações lúdicas que foram assim constituídos. O termo
paradoxo do jogo aplica-se na possibilidade do jogo dá prazer e a educação não.
Entretanto, considerando o amplo sentido de educação, é possível que nem todo
processo educacional seja sério e não-prazeroso. Muitas conversas informais que
ocorrem em casa entre pais e filhos podem ser descontraídas, ensinar algo que
culmine em aprendizagem e ainda ser jogo. Outros processos educacionais podem ser
bem sérios e não-prazerosos, como quando a criança é castigada pelos pais e há uma
conversa séria no sentido de educá-la.
Quando olhamos para a educação formal escolar, a seriedade e o desprazer
são mais frequentes. Isso decorre do fato de ainda estar arraigada ao modelo
tradicional, em que o professor atua mais como um detentor do conhecimento, com
intuito de fazer com que os alunos memorizem fórmulas e conceitos de forma
mecânica. Mesmo que busquemos tornar as aulas mais flexíveis e o aluno mais
participativo, o caráter sério da educação permanece. A seriedade se apresenta porque
estamos lidando na maior parte do tempo com o ensino de conhecimento científico,
que é sistemático e requer todo um planejamento. Por isso a escola tem a educação
intencional formal como majoritária, pois a formalidade é devido à busca pela
padronização de certas condutas, com objetivo de ensinar as mesmas coisas a todos
que estão ali presentes. Esse ensino intencional é sério pelas pessoas envolvidas
terem convicção de que alguém ensina e alguém é ensinado. Apesar de certa
padronização no ensino, isso não quer dizer que a aprendizagem seja padronizada,
visto que cada sujeito tem sua forma peculiar de aprender.

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A formalidade da educação escolar existe desde os anos iniciais, embora na


Educação Infantil o lúdico esteja muito mais presente. Observando uma professora
preparar suas aulas para a turma da Pré-Escola, vemos o quanto ser criança é algo
mágico. Tudo é mais colorido, engraçado, dinâmico e lúdico. Vendo uma professora
preparando as aulas do Ensino Médio, o nível de sistematização é mais presente,
assim como há uma busca maior pela padronização e atividades muito cansativas e
pouco prazerosas. Dessa forma, podemos questionar: onde e quando perdemos a
ludicidade no processo educativo escolar? Baseado em Piaget (2014, apud SOARES,
2018), entendemos que a função simbólica é que faz a mágica do “ser” criança. Esse é
um período de muita ingenuidade, falta de compreensão e imaginação frequente. O
mundo, as cores, as formas, tudo isso é contato primeiro, chamativo, que não fogem
aos nossos olhos. À medida que nos tornamos adultos esse mundo fica monótono e as
coisas deixam de ser novidade, levando-nos a criar concepções do que é “real” e
“imaginário”. Pensamos que essa crença do real é que dá fim à ludicidade frequente.
Não quer dizer que deixamos de ver ludicidade nas coisas, mas nossa vida adulta é na
maior parte do tempo de obrigações e regras não-prazerosas.
Seguindo essa lógica, enxergamos que há redução da ludicidade ao longo do
tempo do desenvolvimento de criança para o adulto. E a educação vai acompanhando
nossa mudança. Ela vai perdendo a ludicidade da Educação Infantil, a complexidade
do conhecimento aumenta e o tempo da diversão vai reduzindo. No fim das contas, a
educação e o jogo parecem mais distantes do que víamos. O paradoxo do jogo
educativo faz sentido quando nos aproximamos de uma educação da vida adulta, em
que o jogo e a educação mantêm-se distanciados, como dois polos. Existe um
paradoxo porque tentamos aproximá-los novamente, com intuito de tornar divertido
algo que geralmente é sério. Educar a criança após um ato de teimosia é algo que
geralmente ocorre com seriedade e desprazer, mas os pais podem encontrar uma
forma descontraída e lúdica para realizar essa educação. Muitos vão achar isso bem
difícil. E analogamente a essa questão, podemos pensar no professor que tenta
trabalhar o conhecimento químico de forma lúdica. É também um grande desafio.
O paradoxo do jogo não é explicitamente visível ou majoritário em todo jogo
educativo, pois alguns jogos são constituídos educacionalmente e algumas educações
são constituídas ludicamente. Nesses casos não há ou quase não há paradoxo,
valendo a mesma premissa para a Educação Infantil. À medida que vamos passando
pelos Ensino Fundamental, Médio e Superior, o paradoxo se faz mais presente devido
à redução de nossa ludicidade, que é consequência do desenvolvimento humano.
Juntar duas coisas que se tornaram tão distantes requer um equilíbrio que não penda
para nenhum dos lados, permitindo manter a unidade. O paradoxo do jogo é mais
visível e explícito no JEF, o que nos leva a crer que ele seja mínimo ou nem exista no
JEI. Queremos manter o foco aqui num “paradoxo do jogo educativo formalizado”, pois
este é um desafio ainda maior. Soares (2015; 2016) busca a superação desse
paradoxo, com base em Kishimoto (1996, apud SOARES, 2015; 2016), que apresenta
duas funções que todo jogo educativo possui: função lúdica e função educativa. Ambas
precisam estar em equilíbrio, porque se tender à função lúdica perde-se o caráter
educativo e caso tenda à função educativa perde-se o caráter lúdico.
Tratando-se da sala de aula, que é vista normalmente com muita seriedade e
certo desprazer, não podemos perder de vista o equilíbrio e deixar o paradoxo
predominar. Quando o paradoxo predomina, os momentos de diversão e educação
ficam visivelmente separados, sendo que o objetivo é mantê-los integrados, de forma
que ocorra ensino culminando em aprendizagem e haja prazer. Felício e Soares (2018)
acreditam que o paradoxo pode ser superado ou atenuado com a conscientização dos

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alunos sobre a função do jogo e a liberdade para escolherem se querem jogar. Mas
algum aluno pode escolher não jogar e isso deve ser respeitado. Talvez vendo os
demais jogando, ele se sinta motivado, por isso é importante pensar no jogo educativo
que possa despertar ao máximo a vontade dos sujeitos. É preciso que o jogo tome
emprestado da educação o status de seriedade, enquanto que a educação deve tomar
emprestado o prazer e o dinamismo do jogo.
Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018) classificam o JEF em: jogo didático (JD)
e jogo pedagógico (JP). Na visão dos autores essa classificação se faz necessária
porque muitos trabalhos têm utilizado jogo educativo, jogo didático e jogo pedagógico
como sinônimos, o que causa uma verdadeira “poluição da linguagem” e ruídos de
comunicação. Segundo os autores, o jogo didático (JD) é aquele adaptado de outro
jogo conhecido, enquanto o jogo pedagógico (JP) é aquele que apresenta elevado grau
de ineditismo. Observando os predicados “didático” e “pedagógico”, ambos lembram a
Didática e a Pedagogia. No Dicionário Aurélio, o termo “didática” refere-se à técnica
para dirigir a aprendizagem e Pedagogia é a teoria e ciência da educação (FERREIRA,
2001). Ambos são ligados à educação, sendo lógico que “didático” e “pedagógico”
sejam categorias do que é educativo. Libâneo (2013) apresenta a Didática como ramo
da Pedagogia que estuda os meios e condições para o processo de ensino, bem como
o planejamento para tal. E a Pedagogia é aquela que direciona o rumo da educação.
Ressaltamos que esse tipo de educação que a Pedagogia direciona é a formal, assim
como é o ensino intencional aquele que a Didática sistematiza, até porque se existe
uma Didática para sistematizar o ato, só pode ser intencional.
Essas definições nos induzem a pensar que o jogo didático é uma forma de
jogo pedagógico, já que a Didática é um ramo da Pedagogia. Se o JP englobasse o JD,
não faria sentido falar nesse último. Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018) ainda nos
apresentam uma relação entre ambos, dizendo que caso um JP seja adaptado, isto é,
alterado por meio da inserção ou mudança de elementos, ele passa a ser um JD. A
ressignificação das terminologias “didático” e “pedagógico” traz resquícios dos
significados de suas terminologias de origem, mas também resolvem um grande
dilema, pois o que antes era identificado como sendo jogo
educativo/didático/pedagógico, é agora somente jogo educativo, classificado em
informal e formalizado e, este último, em didático e pedagógico. O que diferencia o JD
do JP é um aspecto que não tem relação com Didática e Pedagogia: o ineditismo.
Trata-se de um enxerto de um significado a uma terminologia que antes não carregava
tal significado ou que nunca fora utilizado dessa forma. Ao invés de utilizar os termos
didático e pedagógico, os autores poderiam simplesmente falar em jogos adaptados e
jogos inéditos. Então porque insistir em “didático” e “pedagógico”?
Assim como mostrado anteriormente, são terminologias muito utilizadas nos
trabalhos sobre jogos, que poderiam ser ressignificadas sem quaisquer problemas para
o entendimento de jogo educativo. Não faria sentido continuar equiparando “educativo”,
“didático” e “pedagógico”, sendo que a educação é muito ampla e inclui os próprios
processos didáticos e pedagógicos. Os termos didático e pedagógico, pela proximidade
que apresentam, estariam livres para serem ressignificados. E é onde entra a ideia do
ineditismo. Um é considerado jogo adaptado e não inédito, enquanto o outro é inédito.
Utilizar terminologias conhecidas e usuais para englobar o ineditismo, nos parece mais
aceitável do que criar as terminologias jogo adaptado e jogo inédito. A linguagem foi
reciclada, de modo a facilitar a compreensão de quem lê. Com isso, se lemos a
terminologia “jogo didático” imediatamente associamos ao jogo adaptado e se lemos
“jogo pedagógico” associamos diretamente ao jogo inédito. Caso mantivéssemos três
terminologias para um mesmo sentido (jogo educativo/didático/pedagógico), muitos

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poderiam entender os seus usos associados diretamente à Didática e Pedagogia,


causando uma confusão maior ainda.
Em sua teoria, Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018) enfatizam e reservam os
termos didático e pedagógico à educação formal, pois não faz sentido falar de ensino
não intencional didático ou pedagógico para jogos que não tem a intenção de ensinar.
O enxerto não nega a relação entre as terminologias novas com suas origens, mas dão
um novo significado, que de alguma forma retiram a carga hierárquica entre Didática e
Pedagogia. Porém, essa carga, mesmo que mais leve, se mantém no fato de que um
JP pode se tornar um JD, contudo a situação oposta é impossível e colapsa a própria
definição.
O ineditismo é um aspecto que requer critério. Quando é que podemos dizer
que um JEF é JD ou JP? É um ineditismo de forma ou conteúdo ou ambos? Cleophas,
Cavalcanti e Soares (2018) nos dão pistas de que qualquer modificação de forma ou
conteúdo no JP, o torna um JD. Poderíamos deduzir que para ser JP é preciso
ineditismo de forma e conteúdo. Isso geraria outro problema, pois quando todos os
conteúdos fossem esgotados, não haveria mais possibilidade de ter um JP. Pensando
num jogo de modelos atômicos, há possibilidade de ter vários jogos com essa mesma
temática e formatos diferentes. O conteúdo é o mesmo, mas a forma de apresentação
é diferente. Teríamos um novo conteúdo se eu criasse uma coisa nova e a chamasse
de modelos atômicos. Dessa forma, se o ineditismo envolver forma e conteúdo, a
quantidade de jogos pedagógicos será extremamente limitada. Por isso o ineditismo
deve ser reservado à forma do jogo, que permite uma gama maior de variações e
menos complexas do que o próprio ato de criar um conteúdo novo. Resta-nos explicitar
qual o grau de ineditismo da forma do jogo, visto que qualquer jogo inédito ainda pode
carregar resquícios de outros.
O jogo da memória, muito popular, tem como finalidade a formação de pares
de coisas, seja com cartas ou qualquer outro objeto. Poderíamos incluir dados, pistas e
outros, que a característica de jogo da memória ainda seria lembrada, caracterizando
um JD. Agora se criamos um jogo que mistura tantas outras características de outros
jogos que não lembra especificamente nenhum deles ou se apresenta como um
verdadeiro híbrido, cuja forma é original, teremos um JP. Não é suficiente juntar apenas
duas formas distintas para criar um JP, pois ainda ficariam visíveis as referências
utilizadas. É preciso ter algo inédito ou uma forma híbrida construída com tantas outras
em que não é possível se lembrar de alguma. Pensando num JP sobre modelos
atômicos, caso mantivéssemos o conteúdo e mudássemos poucos aspectos da forma,
teríamos um JD. Se trocássemos o conteúdo por outro mantendo a forma original,
teríamos um JD. Somente será JP, se eu retirar a forma do jogo e dar-lhe outra que
não lembre nenhuma conhecida. Na prática, é mais fácil produzir um JD. Porém,
ambos requerem critérios rigorosos de validação para que possam ser o que são.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final retomamos que jogo educativo é a combinação entre jogo e educação,
que pode ser definido como: tudo que tem regras e dá prazer em determinado
momento, oferecendo condições (sendo o ensino a principal) que culminem num
mínimo de aprendizagem. Mas nem todo jogo está educativo e nem toda educação
está lúdica, embora alguns foram constituídos assim. Concordamos com a
classificação do jogo educativo em JEI e JEF, além de acreditar que no JEF é explícito
um “paradoxo do jogo educativo formalizado”. A classificação de JEF em JD e JP é
resultante de enxerto de terminologias, cuja combinação de significados caracteriza

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uma reciclagem de termos que despolui a linguagem. E ainda elucidamos os critérios


do ineditismo em torno de JD e JP.
Defendemos que o intuito de Cleophas, Cavalcanti e Soares (2018) foi utilizar
termos usuais para organizarem a linguagem em torno de jogos na educação.
Parafraseando os autores, “colocar os pingos no is” é necessário quando uma área
cresce muito e os termos começam a ser utilizados aleatoriamente. É algo válido não
somente para o Ensino de Ciências, mas pode ser ampliado para outras áreas
educacionais que lidam com jogos. Consideramos ainda a importância da redução
eidética na revelação de estruturas significativas, permitindo-nos refletir sobre vivências
e avaliar várias possibilidades de significados, de forma a demonstrar o que os termos
são e não podem deixar de ser.

REFERÊNCIAS
BICUDO, M. A. V. (org.). Pesquisa qualitativa segundo a visão fenomenológica. 1 ed. São
Paulo: Editora Cortez, 2011, 150 p.
CLEOPHAS, G.; CALVACANTI, E. L. D.; SOARES, M. H. F. B. Afinal de contas, é jogo
educativo, didático ou pedagógico no Ensino de Química/Ciências? Colocando os pingos nos
“is”. In: CLEOPHAS, M. G.;SOARES, M. H. F. B. (org.) Didatização Lúdica no Ensino
de Química/Ciências: Teorias da Aprendizagem e outras interfaces. São Paulo: Livraria da
física, p. 33-43, 2018.
FELÍCIO, C. M.; SOARES, M. H. F. B. Da Intencionalidade à Responsabilidade Lúdica:
Novos Termos para uma Reflexão Sobre o Uso de Jogos no Ensino de Química. Química
Nova na Escola, v. 40, n. 3, p. 160-168, 2018. Disponível em:
http://qnesc.sbq.org.br/online/artigos/05-EA-33-17.pdf. Acesso em: 11 de fev. 2022.
FERREIRA, A. B. H. Miniaurélio Século XXI: o minidicionário da língua portuguesa. 5 ed. rev.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, 873 p.
LIBÂNEO, J. C. Didática. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2013.
MOREIRA, D. A. O método fenomenológico na pesquisa. São Paulo: Pioneira Thomson,
2002, 152 p.
PIAGET, J. Biologie et connaissance: Essai sur les relations entre les régulations organiques
et les processus cognitifs. Paris: Gallimard, 1967. Disponível em:
https://www.fondationjeanpiaget.ch/fjp/site/textes/index_extraits_alpha1.php
PIAGET, J. Estudos sociológicos. Tradução: Reginaldo Di Piero. Rio de Janeiro: Forense,
1973.
SOARES, M. H. F. B. Jogos e Atividades Lúdicas no Ensino de Química: uma discussão teórica
necessária para novos avanços. Revista de Debates em Ensino de Química (REDEQUIM),
v.2, n.2, p. 5-13, 2016. Disponível em: http://www.journals.ufrpe.br/index.php/REDEQUIM/
article/view/2515/482483513. Acesso em: 11 de fev. 2022.
SOARES, M. H. F. B. Jogos e Atividades Lúdicas para o Ensino de Química. 2 ed. Goiânia:
Kelps, 2015, 196 p.
SOARES, M. H. F. B. Sobre os jogos e as possíveis relações com a epistemologia genética de
Jean Piaget: em um tabuleiro de xadrez. In: CLEOPHAS, M. G.; SOARES, M. H. F. B. (org.)
Didatização Lúdica no Ensino de Química/Ciências: Teorias da Aprendizagem e outras
interfaces. São Paulo: Livraria da física, p. 235-248, 2018.
SOKOLOWSKI, R. Introdução à fenomenologia. Tradução: Alfredo de Oliveira Moraes. 3 ed.
São Paulo: Edições Loyola, 2012.
ZAHAVI, D. Fenomenologia para iniciantes. Tradução: Marco Antonio Casanova. 1 ed. Rio
de Janeiro: Via Verita, 2019, 139 p.
ZAHAVI.D. Fenomenologia aplicada: porque é seguro ignorar a epoché. Traduzido por Victor
Portugal. Revista de Abordagem Gestáltica, v. 25, n.3, p. 332-341, 2019. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rag/v25n3/v25n3a12.pdf. Acesso em 10 de jul. 2022.
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