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A importância do sono

na infância

De acordo com a revisão Sleep disturbance and psychiatric disorders publicada no


The Lancet Psychiatry em 2020, os autores começam o artigo pontuando que os
efeitos de uma noite mal dormida são conhecidos por todos e mencionam que muitas
pessoas também estão familiarizadas com os efeitos de uma sequência de noites
interrompidas.1

Horas noturnas sem dormir podem trazer mudanças de humor, confiança e nitidez no
dia seguinte. As experiências naturais da vida com alterações do sono, apoiadas
pelas conclusões de experiências científicas, levam a conclusão que as
perturbações do sono provocam piora na saúde mental.1

O sono não é um estado passivo e a obtenção de sono suficiente demonstrou ser


importante para o bem-estar físico e mental. Ao longo de ciclos de aproximadamente
90 minutos, o sono alterna entre estados de movimento rápido dos olhos (REM) e não-
REM. Nos adultos, o sono REM compreende cerca de ¼ do total de uma noite de sono,
tornando-se mais comum em ciclos de sono posteriores; enquanto o não-REM tem 3
estágios e está associado a profundidade do sono.1

O sono é o resultado de uma combinação de fatores, incluindo o tempo gasto


acordado, a hora do dia e a quantidade de excitação. Esses processos de interação
são regulados por múltiplas regiões neuronais, sistemas e neurotransmissores em todo
o cérebro.1

É provável que o sono desempenhe muitas funções, como:

• apoiar a consolidação da memória


• ajudar a processar emoções
• restaurar (incluindo talvez a eliminação de resíduos do cérebro)

Muitos dos efeitos da perda de sono podem aumentar a vulnerabilidade a transtornos


mentais, como;

• aumento de ansiedade
• depressão
• alterações do humor
• piora da regulação emocional
• percepção negativa de estímulos neutros
• aumento da percepção da dor
• fraca inibição de respostas
• comprometimento da memória de trabalho
• dificuldade de resolução de problemas

A restrição do sono também traz efeitos fisiológicos, incluindo alterações na função


endócrina e imunológica. Deve-se notar, entretanto, que condições como a insônia não
são simplesmente distúrbios de perda de sono, mas normalmente incluem elementos
adicionais, como sono fragmentado, má qualidade de sono e reações psicológicas
negativas.1

Fatores ambientais de risco para transtornos de saúde mental, como traumas, também
perturbam o sono. Os distúrbios do sono sem outros sintomas de saúde mental são
uma exceção nas apresentações clínicas. Uma meta-análise de estudos de
polissonografias mostrou que alterações do sono estavam presentes na maioria
dos problemas de saúde mental. Os principais investigadores do sono e do ciclo
circadiano defenderam a influência fundamental do sono na saúde mental. 1
O estudo preliminar A study of association between sleep habits and problematic
behavior in preschool children examinou a associação entre hábitos de sono e
comportamentos problemáticos em crianças pré-escolares saudáveis, utilizando um
método padronizado internacionalmente.2

Dois grupos de crianças japonesas saudáveis de 4 a 6 anos de idade foram recrutados.

Crianças do Grupo A (n = 68) cumpriam uma ou mais das três condições seguintes:

• saíam de casa com os adultos depois das 21h00 duas ou mais vezes por
semana,
• tinham hábito de ir para a cama depois das 23h00 quatro ou mais vezes por
semana
• voltavam para casa depois das 21h três ou mais vezes por semana

Enquanto os do Grupo B (n = 67) não cumpriam nenhuma dessas condições.

Os registros de sono-vigília e a Child Behavior Checklist (CBCL)/4–18 foram


preenchidos diariamente durante duas semanas.

O CBCL é composto por questões com 113 itens categorizados em 8 itens da


subescala: 2

✓ Retraimento
✓ Queixas somáticas
✓ Ansioso/deprimido
✓ Problemas sociais
✓ Problemas de pensamento
✓ Problemas de atenção
✓ Comportamento delinquente
✓ Comportamento agressivo

As pontuações da escala internalizante e externalizante e total também foram


derivadas. Geralmente, quanto maior a pontuação, maior a probabilidade de
comportamentos problemáticos nessa escala. Foram comparados os escores do CBCL
e a distribuição do escore do CBCL determinou a classificação clínica do
comportamento (normal, limítrofe e anormal) entre os grupos.2

Coeficientes de correlação entre os escores do CBCL e cada um dos sete índices dos
hábitos de sono estudados (horários de acordar, horários de dormir, duração do sono
noturno, duração do cochilo, duração total do sono e variação na hora de acordar e
dormir) também foram avaliados.2

Os resultados mostraram que as crianças do Grupo A apresentaram média


significativamente mais curta de sono noturno, cochilo e duração total do sono, horários
médios de dormir e acordar significativamente mais tardios e uma variação
significativamente maior nos horários de dormir e acordar do que as crianças do Grupo
B. A pontuação CBCL da escala total foi significativamente maior nas crianças do
Grupo A do que nas crianças do Grupo B. 2

O editorial publicado no JAMA Pediatrics em 2022 Children’s Sleep and Our Power to
Improve mostrou uma das duas descobertas da revisão sistemática e meta-análise
sobre intervenções publicadas nesta edição, os autores reforçam que a duração do
sono das crianças é importante e está ao alcance dos responsáveis alterá-la. A
revisão incluiu 45 ensaios clínicos randomizados e quase 14.000 crianças e
adolescentes de 1 a 18 anos.3

O sono pode ser prolongado em cerca de meia hora por noite, simplesmente
incentivando a hora de dormir mais cedo. Nessa revisão, após a remoção dos 4
ensaios centrados na hora de dormir mais cedo, todas as outras abordagens (incluindo
a atividade física, estratégias de melhoria do sono, redução da obesidade e alterações
ambientais) tiveram impactos mínimos na duração do sono, com um aumento médio
global de apenas 8 minutos de sono adicional por noite – provavelmente um
incremento não benéfico. Os resultados não diferiram por faixa etária (pré-escola,
ensino fundamental ou ensino médio), desvantagem social, intensidade da aplicação
das intervenções, inclusão apenas de crianças com problemas de sono, local de
intervenção (casa, escola), envolvimento dos pais, se a intervenção foi realizada
presencialmente, ou se a intervenção foi fundamentada teoricamente ou não. 3
Os ensaios que se concentraram apenas no sono foram mais eficazes do que
aqueles com intervenções complexas e um foco amplo. Esta mensagem prática e
focada deve ser uma boa notícia para os médicos e para as famílias.3

Embora a revisão não especifique nenhuma abordagem para atingir a hora de dormir
mais cedo, os 4 estudos relevantes ofereceram uma série de estratégias simples que
poderiam ser facilmente utilizadas:


Os pesquisadores de um dos estudos simplesmente deram aos pais 3
mensagens educativas (hora de dormir antes das 23:00 horas, sem cafeína e
mantenha os eletrônicos fora do quarto).


Em outro estudo, em 2 ocasiões para pais de crianças de 2 a 12 anos que vivem
em situação desfavoráveis, os pesquisadores ofereceram uma intervenção
comportamental de 4 sessões para crianças de 8 a 11 anos de idade, usando
estratégias como estabelecimento de metas, controle de estímulos e reforço
positivo que focavam apenas na mudança da duração do sono, aumentando o
tempo na cama em 1 a 1,5 horas por noite.

✓ Outra pesquisa teve como alvo adolescentes de 14 a 18 anos que dormiam


rotineiramente de 5 a 7 horas nas noites escolares, concentrando-se em
aumentar o tempo na cama em 1,5 horas por noite escolar através de formas de
resolução de problemas para prolongar esse sono, usando princípios
comportamentais estabelecidos e trabalhando com a díade pais/adolescente
para priorizar e reorganizar atividades para permitir uma hora de dormir mais
cedo.


E os pesquisadores de outro ensaio incluído tiveram como alvo adolescentes de
12 a 19 anos de idade com redução crônica sintomática do sono, instruindo-os a
avançar gradualmente a hora de dormir durante a semana em 5 minutos a cada
noite e evitar mudanças na hora de dormir nas noites de fim de semana.3
Referências Bibliográficas

1. Freeman D, Sheaves B, Waite F, Harvey AG, Harrison PJ. Sleep disturbance and
psychiatric disorders. Lancet Psychiatry. 2020;7(7):628-637.

2. Yokomaku A, Misao K, Omoto F, et al. A study of the association between sleep


habits and problematic behaviors in preschool children. Chronobiol Int.
2008;25(4):549-564.

3. Wake M, Hiscock H. Children's Sleep and Our Power to Improve It. JAMA
Pediatr. 2022;176(11):1070-1071.

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