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Contextualização histórico-literária
O século XVII é uma época de grandes crises a nível europeu e nas terras colonizadas, como se
observa a seguir:
Culturalmente, Portugal afasta-se dos restantes países da Europa, em grande parte por culpa
da Inquisição. O Homem racionalista do século XVI deu lugar ao Homem do século XVII, mais
ligado ao sensitivo do que ao racional.
O final do séc. XVI foi marcado a nível religioso pela violenta reação da Igreja Católica à
Reforma Protestante. O Concílio de Trento é o ponto de lançamento da Contrarreforma,
caracterizado pelo reforço da Inquisição e pelo aparecimento do Barroco. O Concílio definiu
que a arte (neste contexto a barroca) deveria estar ao serviço dos ritos da Igreja, através de
imagens e do deslumbramento ornamental.
• Nasce em Lisboa a 06/02/1608 e parte com os pais para o Brasil em 1614, onde
ingressa como noviço na Companhia de Jesus
• O contacto direto com os índios e o seu conhecimento proporcionaram-lhe uma nova
visão do ser humano, que determinará a sua ação na defesa dos direitos dos índios e
que lhe trará muitos conflitos com os colonos
• Regressa a Lisboa em 1641, após a Restauração da
Independência de Portugal face à coroa
espanhola, integrado numa delegação da colónia
brasileira, que vem prestar a sua solidariedade ao
novo rei D. João IV
• A Inquisição considera-o um herege por ter
sugerido o surgimento de um “Quinto Império”,
liderado por D. João IV sendo encarcerado em
Coimbra e proibido de pregar
• Anos mais tarde regressa ao Brasil e desenvolve-se missionário, no Maranhão e no
Grão-Pará e assume-se defensor incansável dos direitos dos índios, que o apelidam de
“Padre grande”
• Em 1654, dias antes de regressar a Lisboa, profere o “Sermão de Santo António aos
Peixes”, denunciando os comportamentos corruptos dos colonos do Maranhão
• Organiza e colige os seus sermões em 15 volumes, morrendo na Baía em 1697
Padre António Vieira vai censurar o comportamento dos colonos portugueses no Maranhão e
defender o direito dos índios, como vimos. Assim, apresenta uma intenção persuasiva,
procurando convencer o seu público a mudar de comportamento.
A crítica social é feita através de uma alegoria, recorrendo ao exemplo de Santo António que,
face à revolta dos habitantes de Arimino em Itália, que não queriam ver os seus pecados
expostos, optou por pregar aos peixes, que o escutaram dando origem a um dos seus milagres.
No dia em que se celebra este santo, Vieira dirige, alegoricamente, o seu sermão aos peixes,
servindo-se dos seus direitos e virtudes para denunciar os pecados do Homem.
Crítica social e alegoria
A 13 de junho de 1654, prega o “Sermão de Santo António”, no qual de forma alegórica tenta
denunciar comportamentos. Observando o seu tempo e sentindo-se desiludido com o Homem,
Vieira decide voltar-se da terra para o mar e dirigir a sua pregação aos peixes. Metaforicamente
diz que os pregadores são “o sal da terra”, cujo efeito deve ser impedir a corrupção. No entanto,
ao ver que a terra está tão corrupta, interroga-se sobre a causa.
Capítulo I:
Conceito predicável → Texto bíblico que serve de tema e que irá ser desenvolvido de acordo
com a intenção e objetivo do autor; assenta em figuras ou alegorias através das quais se
pretende alcançar uma demonstração da fé, ou verdades morais, ou até juízos proféticos. “Vós
sois o sal da terra” é o conceito predicável, isto é, a pequena frase retirada do Evangelho de S.
Mateus, que servirá de tema/tese ao Sermão de Santo António e a partir do qual Viera irá
argumentar: os pregadores são o sal, a terra os homens. O sal impede que os alimentos se
estraguem, ou seja os pregadores impedem a corrupção. Assim, os pregadores são importantes
na transmissão da mensagem evangélica, na preservação da moralidade e da integridade dos
homens – “terra”. Porém, àqueles que não querem ouvir a palavra de Deus, o que se faz? O
orador diz que “este ponto não resolveu Cristo Senhor nosso no Evangelho”.
O capítulo 1 termina com um pedido de auxílio divino que pode ser entendido como invocação,
à Virgem Maria.
Capítulo II:
A glorificação dos peixes e a crítica aos homens é ilustrada por exemplos bíblicos, que
credibilizam e reforçam a argumentação do pregador, nomeadamente:
Capítulo IV:
• Não só se comem uns aos outros, como os grandes comem os pequenos → Crítica à
prepotência dos grandes que “se alimentam “ do sacrifício dos mais pequenos, tal como
os peixes (antropofagia social – também os homens “se comem”) → Ex: “Comem-no os
herdeiros, os testamenteiros, os legatários, os acredores; os oficiais dos órfãos e os dos
defuntos e ausentes; o médico”; “enfim, ainda o pobre defunto o não comeu a terra, e
já o tem comido toda a terra”). Vieira apela para que os peixes não se comam uns aos
outros, usando o exemplo de que na arca de Noé, os animais da terra e do ar, que
costumavam comer-se uns aos outros, não o fizeram por uma questão de sobrevivência
e todos viveram em paz
• Ignorância e cegueira → Caracterização do homem da cidade: prepotente, vaidoso,
parasita, ambicioso, hipócrita, traidor. O peixe é facilmente enganado por um anzol e
um pedaço de pano. Assim, este é ignorante porque não entende o significado do pano
e cego porque se atira cegamente e fica preso. Já os homens “bonitos ou os que querem
parecer” não conseguem resistir à tentação e à vaidade, ficando engasgados e presos
com dívidas de um ano para outro ano. Ou seja, os homens endividavam-se por causa
de “um triste farrapo com que saem à rua, e para isso se matam todo o ano”
Assim, neste capítulo há uma crítica aos peixes para melhor explicitar a condição dos homens
no que diz respeito à antropofagia social e à vaidade no vestuário. Santo António abandonou as
vaidades e com as suas roupas simples e as suas palavras, “pescou muitos homens”.
Capítulo V:
O capítulo termina com uma crítica feroz aos portugueses. Partindo do exemplo de Santo
António, Vieira refere a degenerescência dos valores nacionais, uma vez que no passado as
características exemplares de Santo António eram extensivas a todo o povo português, não
sendo atributos dos santos.
Capítulo VI:
Conclusão → Última advertência aos peixes; retrato de Vieira como pecador; hino de louvor