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Lições do Martírio: Um Exemplo de Fidelidade e Perseverança (Parte 1)

Atos 7.1-18

Introdução:

Na primavera de 1521, um monge católico romano e professor de teologia foi


convocado para comparecer perante o imperador Carlos V e a Dieta Imperial do
Sacro Império Romano. Nos anos anteriores, Martinho Lutero criticou
destemidamente os abusos da Igreja Romana. As suas críticas incendiaram os
antigos ressentimentos do povo alemão em relação a Roma.

Determinado a pôr fim à revolta religiosa popular desencadeada por Lutero,


o jovem imperador convocou-o a Worms. Lá ele seria julgado e, se condenado,
enfrentaria a execução. Um século antes, John Hus havia sido queimado na fogueira
no Concílio de Constança.

Em resposta, Lutero escreveu que entraria em Worms apesar dos “portões


do inferno e dos poderes das trevas”, mesmo que houvesse “tantos demônios nela
quanto telhas nos telhados das casas.

Ele compareceu perante a Dieta e recusou-se a retratar o que havia escrito.


Ele afirmou que não retiraria nada que seus acusadores não pudessem provar que
estavam errados com base nas Escrituras.

A fala de Lutero repercutiu: A menos que eu seja convencido pelo


testemunho das Escrituras ou por uma razão clara (pois não confio nem no papa
nem nos concílios apenas, visto que é bem sabido que eles muitas vezes erraram e se
contradizem), estou vinculado às Escrituras que citei e minha consciência está cativa
da Palavra de Deus. Não posso e não vou me retratar de nada, pois não é seguro nem
certo ir contra a consciência. Não posso fazer de outra forma, aqui estou, que Deus
me ajude, amém.

Mil e quinhentos anos antes, um servo de Cristo, um jovem diácono da igreja


primitiva, foi julgado e morto. Tal como Lutero, Estêvão permaneceu solidamente
apoiado na rocha da revelação divina. E tal como Lutero, a sua posição ousada iria
mudar o curso da história.
O seu discurso foi um relato magistral da história de Israel e da Redenção.
Nele ele defendeu habilmente a si mesmo e, por extensão, a todos os cristãos, contra
as falsas acusações de que havia blasfemado contra Deus, Moisés, a lei e o templo. O
fiel evangelista Estêvão partiu então para a ofensiva, encerrando o seu discurso com
uma denúncia contundente da hipocrisia do Sinédrio. Ao fazer isso, ele virou o jogo
contra seus acusadores. Foram eles, e não ele, que foram condenados por blasfêmia.

Estêvão foi escolhido como diácono, junto com outros seis, para ajudar a
cuidar das necessidades práticas da comunidade cristã, garantindo que os pobres e
viúvas fossem atendidos. No entanto, sua dedicação, sabedoria e fé o destacaram
como alguém chamado para um ministério mais amplo.

Conforme Lucas dá continuidade à sua narrativa da igreja primitiva, ele se


detém em Estevão, em Atos 6 ele nos relata o início do ministério de Estêvão. Ele não
se limitou apenas a distribuir alimentos, mas também proclamou a Palavra de Deus
com grande autoridade e sabedoria. Sua pregação, contudo, provocou a oposição da
sinagoga dos libertos, e eles começaram a levantar falsas acusações contra ele, veja
Atos 6.8-10.

O texto nos mostra que Estevão fazia coisas maravilhosas no meio do povo,
mas havia entre eles um grupo da comunidade de língua grega que fazia oposição ao
seu ensino e pregação, e entraram numa disputa com ele. Lucas nos diz que eles não
eram capazes de resistir à sua sabedoria ou ao espírito pelo qual ele falava.

De início envolveram Estevão num debate honesto, mas sua honestidade não
durou muito. Quando viram que não seriam capazes de aniquilar seus argumentos,
eles passaram a usar meios corruptos com o fim de silenciá-lo. Eles encontraram
algumas pessoas dispostas a prestar falso testemunho contra Estevão. Uma a uma as
falsas testemunhas vieram e o acusaram.

Nenhuma só palavra do que disseram as falsas testemunhas era verdadeira,


exceto que Jesus de fato disse que iria destruir o templo. No entanto, torceram as
palavras de Jesus como parte de sua grande conspiração contra Estevão, este
eloquente porta-voz de Cristo.
Então chegamos no capitulo 7 que vai nos relatar a defesa de Estevão. Bom,
ao olharmos este capítulo, podemos notar que o discurso de Estevão não era uma
pregação habitual, nem tão pouco foi proclamado no culto ou no meio de uma ação
evangelística.

Estevão se encontra no papel de um réu, acusado de blasfêmia. Diante do


Sinédrio, o tribunal judaico, Estevão fez uma defesa apaixonada da fé cristã,
lembrando a história de Israel e como muitos profetas, incluindo Moisés, foram
rejeitados por seu próprio povo.

Ele defendeu uma causa, a causa de Cristo. Ele argumentou que Jesus era o
Messias prometido e que os líderes judeus estavam repetindo os erros do passado.
Seu discurso é uma defesa da fé Cristã a luz da história de Israel. Estevão passa por
períodos marcantes da história de Israel: Período patriarcal, exílio, peregrinação e
monarquia. Períodos estes representados por Abraão, José, Moisés, Davi e Salomão.

A mensagem de Estevão então provocou a ira dos líderes religiosos, e ele foi
acusado de blasfêmia e apedrejado até a morte. Ele confronta as autoridades de
Israel e os culpa pela morte de Jesus, que a Lei e os Profetas haviam anunciado que
era o Messias. Alguns comentaristas apontam a semelhança do discurso de Estevão
com os julgamentos dos profetas no Antigo Testamento, que chamavam o povo ao
arrependimento por quebrarem a aliança.

O desfecho disto foi o martírio. Durante seu martírio, Estêvão teve uma visão
de Jesus à direita de Deus e orou para que seus assassinos não fossem considerados
culpados. Seu martírio é o primeiro registrado na história cristã e é um testemunho
impressionante de sua fidelidade inabalável a Cristo.

A história de Estêvão, como o primeiro mártir cristão, deixou um legado


duradouro na igreja primitiva. Sua coragem, fé e disposição para morrer por Cristo
e o Seu Evangelho inspiraram gerações de cristãos a permanecerem firmes em sua
fé, independentemente das circunstâncias.

Estêvão é lembrado como um exemplo de fidelidade e perseverança diante da


perseguição, e sua história continua a nos desafiar e encorajar.
E por que isto nos é importante? Veja, a bíblia não é um livro de informações
passadas para sabermos o que aconteceu na história do povo de Deus, apenas. Ela é
a revelação de Deus para que vivamos uma vida de acordo com a sua vontade. Sendo
assim, este relato tem muito a nos ensinar. Hoje cada um de nós somos chamados a
sermos Estevão.

Veja, embora tenha vivido uma vida relativamente curta, Estêvão


demonstrou como a fidelidade a Cristo pode triunfar sobre a adversidade, e seu
exemplo perdura como um farol de inspiração para todos nós que buscamos seguir
a Jesus com todo o nosso coração. E justamente, sobre as lições do martírio sobre
como defender e viver a fé na vida de Estevão que iremos nos debruçar esta noite.

1. Lição 1 (v.1-7)

Note o versículo 1, Estevão, você ouviu as acusações. São corretas? Está você
blasfemando contra Moisés, contra Deus e a lei? Você é culpado ou inocente? A título
de resposta, Estevão deu-lhes uma lição sobre a história da redenção.

Vamos analisando os ensinos e aplicações que o texto nos mostra.

1. Resposta com Sabedoria e Conhecimento: Estêvão não respondeu às


acusações de blasfêmia de forma impulsiva ou emocional. Em vez disso, ele
respondeu com conhecimento das Escrituras e uma compreensão profunda da
história da redenção. Isso nos lembra da importância de responder às críticas à fé
cristã com sabedoria, conhecimento e uma compreensão sólida da Palavra de Deus.

2. Defesa do Evangelho: Estevão começa a defender sua fé falando da história


da Redenção começando por Abraão. Ele não está preocupado em se defender das
falsas acusações contra ele. Ele quer defender o Evangelho das falsas acusações.

É importante ter em mente a natureza e o propósito do discurso de Estêvão.


Veja, os judeus haviam interpretado erradamente a Palavra de Deus, julgando que
a presença de Deus estava limitada e circunscrita a Israel e a seu templo.

Estêvão não estava apenas defendendo a si mesmo, mas também o Evangelho


das falsas acusações. Ele estava preocupado em corrigir a má interpretação das
Escrituras e apresentar a verdade sobre a história da redenção. Isso nos desafia a
não apenas nos defender, mas a defender o Evangelho e a verdade da fé cristã
quando confrontados com críticas.

3. A promessa de Cristo: Então nos versículos 2 e 4, ele relembra ao povo que


Deus fez uma aliança com Abraão. Ele relembra-os que Deus fez uma aliança com
Abraão, e que em sua idade avançada ele foi abençoado com um filho, Isaque, e a
aliança da promessa havia passado através de Isaque para Jacó e para seus filhos.

A história da redenção que Estêvão apresentou apontava para Cristo. Ele


mostrou como a história do Antigo Testamento estava relacionada à obra de
redenção realizada por Jesus. Isso destaca a importância de apontar para Cristo
como o cumprimento das Escrituras e o centro da nossa fé ao defender o
cristianismo.

4. Ênfase na Iniciativa Divina: Estêvão enfatizou que a obra da redenção foi


iniciada por Deus, desde a aliança com Abraão até a libertação do Egito. Isso nos
permite lembrar que a fé cristã não é apenas uma construção humana, mas uma
obra divina. Podemos destacar como Deus age na história e na vida das pessoas para
trazer redenção e salvação.

5. Reconhecimento da Soberania de Deus: O discurso de Estêvão destaca a


soberania de Deus sobre a história e Seu papel ativo na redenção de Seu povo. Isso
nos lembra que Deus está no controle, mesmo quando enfrentamos desafios e críticas
à nossa fé. Podemos apontar para a soberania de Deus como parte de nossa defesa
da fé.

6. Justificação pela Fé: Estêvão mencionou a justificação pela fé ao falar de


Abraão. Isso nos permite enfatizar o princípio fundamental da fé cristã, que não
somos justificados por nossas obras, mas pela nossa fé em Cristo. Isto nos aponta
para a natureza da salvação.

Estevão fala da obediência de Abraão (v. 2-9). Mostra que Abraão não
questionou e nem duvidou do chamado divino. Estevão fala da fé de Abraão, que
mesmo sem saber para onde ia, ele cria que a direção de Deus era boa. Mesmo não
tendo filhos, creu na promessa, conforme a Bíblia nos ensina, aquilo foi lhe imputado
por Justiça, ou seja, Abraão foi justificado pela fé.

A ênfase que Estevão põe em seu discurso é a iniciativa divina na obra da


redenção. Foi Deus quem apareceu, falou, enviou, prometeu, julgou e libertou.

Estevão mostra que Deus estava dirigindo cada etapa da peregrinação do seu
povo. Isso porque Deus lhes dera a aliança da circuncisão. Assim, muito antes de
existir um lugar santo, existia um povo santo, com o qual Deus havia se
comprometido.

2. Lição 2 (v.8-18)

Estêvão faz a transição de Abraão para José. Notamos imediatamente que, se


a Mesopotâmia foi o contexto surpreendente no qual Deus apareceu a Abraão, o
Egito foi o cenário igualmente surpreendente em que Deus lidou com José.

O cenário dessa libertação divina também foi o Egito e não Canaã. Estêvão
colocou mais uma pedra no alicerce de sua argumentação, derrubando a falácia das
infundadas teses de seus juízes.

1. A Providência de Deus em Meio às Circunstâncias Desafiadoras: A história


de José destaca como Deus trabalha de maneira surpreendente e providencial
mesmo em circunstâncias difíceis e adversas. Isso pode ser uma poderosa resposta
aos críticos que questionam a existência de Deus ou Sua intervenção na vida
humana.

Podemos usar a história de José para ilustrar como Deus pode transformar
o mal em bem e cumprir Seus propósitos mesmo quando tudo parece desfavorável.

A chave da vida de José pode ser encontrada em suas próprias palavras: Vós,
na verdade, intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer,
como vedes agora, que se conserve muita gente em vida (Gn 50.20).

José foi um homem para quem o desastre se converteu em triunfo: odiado


por seus irmãos, vendido aos estrangeiros como mercadoria barata, escravo traído
por sua patroa, encarcerado injustamente, esquecido por aquele a quem havia
ajudado porém, no tempo oportuno de Deus, saiu da prisão e tornou-se governador
do Egito. Estêvão resume as características de José, dizendo que Deus lhe deu graça
e sabedoria.

2. Contraste Entre a Visão Humana e a Agenda de Deus: A história de José


destaca o contraste entre a visão humana limitada e a agenda de Deus. Enquanto os
irmãos de José o odiavam e conspiravam contra ele, Deus estava usando essas
circunstâncias para cumprir Seus propósitos. Isso nos desafia a reconhecer que,
muitas vezes, não entendemos os planos de Deus e que Sua sabedoria é superior à
nossa.

William Barclay salienta que uma vez mais se vê o contraste: os judeus


estavam perdidos na contemplação de seu passado e engessados nos labirintos de
sua própria lei, enquanto José cumpria a agenda de Deus, ainda que em terra
estranha e de forma inusitada.

3. Semelhanças com a História de Cristo: Estêvão observa que a história de


José tem semelhanças notáveis com a história de Cristo. José foi amado por seu pai,
vendido por traição, sofreu injustiça, foi exaltado e se tornou o salvador de seu povo.
Essas semelhanças podem ser usadas na apologética para destacar como Jesus é o
cumprimento das Escrituras e como Sua vida e obra foram profetizadas no Antigo
Testamento.

No meio dessa saga dolorosa, José é o mais próximo tipo de Cristo que
encontramos na Bíblia: amado pelo pai e invejado pelos irmãos; vendido por vinte
moedas de prata; desceu ao Egito em tempos de prova; perseguido injustamente;
abandonado pelo amigo; exaltado depois da aflição; salvador do seu povo.

5. Cumprimento das Profecias e Promessas Divinas: José cumpriu as


profecias e promessas de Deus, mesmo que de maneira inesperada. Isso pode ser
usado para demonstrar como Deus é fiel às Suas promessas e como a Bíblia contém
profecias que se cumpriram ao longo da história.

José foi vítima de um terrível crime perpetrado por seus irmãos, instigado
pelo ciúme fraternal e seguido por imerecida aflição. Contudo, José foi também alvo
de uma maravilhosa intervenção divina, pois Deus o consolou em seus problemas,
libertou-o deles e depois o promoveu. Finalmente, José foi instrumento de uma
providencial libertação. Seus irmãos inconscientemente o mandaram para o Egito
como escravo, e José conscientemente os levou ao Egito para desfrutarem de plena
liberdade.

6. O Papel de Salvador de José e de Cristo: A história de José como salvador


de seu povo pode ser usada na apologética para ilustrar como Jesus é o Salvador da
humanidade. A jornada de José, do sofrimento à exaltação, espelha a obra redentora
de Cristo.

Conclusão

A história de Estêvão destaca a importância da fidelidade à fé cristã, mesmo


em face de perseguição e oposição. A igreja deve ser encorajada a permanecer firme
em suas convicções e a não comprometer os princípios fundamentais do Evangelho,
independentemente das circunstâncias.

Estêvão não se limitou a se defender das acusações falsas contra ele, mas
também defendeu o Evangelho e a verdade da fé cristã. Ele respondeu com
sabedoria e conhecimento das Escrituras, enfatizou o Evangelho, apontou para
Cristo como o cumprimento das Escrituras e destacou a iniciativa divina na obra da
redenção.

O sermão de Estêvão ilustra a necessidade de os cristãos serem capazes de


defender sua fé de maneira sábia e fundamentada. A igreja deve buscar um
entendimento profundo das Escrituras e desenvolver habilidades em apologética
para responder a críticas e perguntas sobre a fé cristã.

Assim como Estêvão destacou o Evangelho e apontou para Cristo em seu


discurso, a igreja deve continuar a enfatizar o Evangelho como o cerne de sua
mensagem. Isso não apenas fortalece a fé dos membros da igreja, mas também atrai
aqueles que estão em busca da verdade.
A história de José, apresentada por Estêvão em seu discurso, ilustrou a
providência de Deus em meio às circunstâncias desafiadoras, o contraste entre a
visão humana e a agenda de Deus, as semelhanças com a história de Cristo, a graça
e sabedoria dadas por Deus, o cumprimento das profecias e promessas divinas, e o
papel de Salvador desempenhado tanto por José quanto por Jesus.

A vida e o martírio de Estêvão têm inspirado gerações de cristãos a


permanecerem firmes em sua fé, mesmo diante da perseguição e da adversidade.
Seu exemplo nos desafia a sermos defensores da fé, a responder com sabedoria e
graça às críticas, a enfocar o Evangelho e a apontar para Cristo em todas as
situações.

Testemunho e Apologética: O discurso de Estêvão não era apenas um


exercício de apologética, mas também um testemunho poderoso da fé cristã. Ele usou
sua defesa da fé como uma oportunidade para compartilhar a mensagem do
Evangelho com os ouvintes. Isso nos encoraja a ver a apologética como uma forma
de testemunho e evangelismo.

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