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Gabarito do Simulado

Data Nome Tipo questão Ano Questões

20/04/2023 empresarial 21 Jurisprudência 2021 51

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Questão 1

A empresa faturizada não responde pela insolvência dos créditos cedidos, sendo nulos a disposição contratual em sentido contrário e
eventuais títulos de créditos emitidos com o fim de garantir a solvência dos créditos cedidos no bojo de operação de factoring.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Factoring

Factoring (ou faturização) é o contrato por meio do qual um empresário (faturizado) cede a uma instituição de
factoring (faturizadora), total ou parcialmente, os títulos de créditos recebidos com a atividade empresária para que a
factoring antecipe os pagamentos a prazo ou faça apenas a administração desses créditos.

Personagens

· Faturizador: empresa de factoring.

· Faturizado: cliente.

Terminologias

O contrato de factoring é também chamado de faturização ou fomento mercantil.


Atividades desempenhadas pela factoring

Existem duas modalidades principais de factoring, que se diferenciam, entre si, pelas atividades desempenhadas pela
instituição faturizadora.

a) Factoring tradicional (conventional factoring):

O empresário cede à factoring os títulos de crédito que recebeu em sua atividade empresária e que somente irão
vencer em uma data futura, e a empresa de factoring antecipa esse pagamento, recebendo, como contraprestação, um
percentual desses créditos. Trata-se de uma forma de o empresário obter capital de giro nas vendas a prazo. Ex: uma
loja recebe um cheque “pré-datado” (pós-datado) para 90 dias no valor de R$ 10 mil. Ocorre que a loja precisa de
dinheiro logo. Então, ela cede o cheque para a empresa de factoring, que irá pagar à vista para a loja R$ 9.700,00 e,
daqui a 90 dias, irá descontar o cheque, ficando com os R$ 10 mil. A loja recebeu o crédito à vista e teve que pagar um
percentual à factoring.

É como se o cliente tivesse “vendido” o título para a factoring, que irá cobrar do devedor no momento do vencimento
da dívida.

b) Factoring de vencimento (maturity factoring):

Aqui, a faturizadora não antecipa qualquer pagamento ao empresário. O faturizado somente irá receber realmente na
data do vencimento. Nesta modalidade de factoring, a faturizadora apenas fica responsável pela prestação de serviços
de administração do crédito. Ex: o faturizado recebe inúmeros cheques pós-datados e duplicatas que somente
vencerão daqui a alguns dias, cada um em uma data diferente. Para evitar preocupações com esse controle das datas
e das cobranças, o empresário manda esses títulos para a factoring, que ficará responsável por gerenciar esses
créditos e fazer a cobrança nas datas de vencimento. Na data do vencimento de cada título, a factoring paga o crédito
ao empresário e vai cobrar dos devedores originários, dispensando o faturizado desse trabalho.

Factoring não é instituição financeira

O conceito legal de instituição financeira está previsto no art. 17, da Lei n.° 4.595/64, e a factoring não se enquadra em
tal definição. A factoring não faz a captação de dinheiro de terceiros, como acontece com os bancos, nem realiza
contratos de mútuo. A empresa de factoring utiliza recursos próprios em suas atividades.

Logo, a factoring não integra o Sistema Financeiro Nacional nem necessita de autorização do Banco Central para
funcionar.

As empresas popularmente conhecidas como factoring desempenham atividades de fomento mercantil, de cunho
meramente comercial, em que se ajusta a compra de créditos vencíveis, mediante preço certo e ajustado, e com
recursos próprios, não podendo ser caracterizadas como instituições financeiras.

STJ. 3ª Seção. CC 98.062/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 25/08/2010.


O contrato de conventional factoring é um contrato de mútuo?

NÃO. Em verdade, consiste em uma compra e venda de créditos (direitos), por um preço ajustado entre as partes.

Qual é o limite de juros das factorings?

As empresas de "factoring" não se enquadram no conceito de instituições financeiras e, por isso, os juros
remuneratórios estão limitados em 12% ao ano, nos termos da Lei de Usura (STJ. 4ª Turma. REsp 1048341/RS, Rel.
Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 10/02/2009).

Riscos do inadimplemento

Caso a faturizadora não consiga receber do devedor o valor do título, ela poderá cobrar essa quantia do faturizado que
lhe cedeu esse crédito? Ex: mulher foi até a loja de sapatos e pagou com um cheque pós-datado de R$ 1.000,00. A loja
“vendeu” esse cheque para a factoring. Ocorre que o cheque não foi descontado por falta de fundos. A faturizadora
poderá cobrar a quantia do faturizado (loja)?

NÃO.

A faturizadora não tem direito de regresso contra o faturizado com base no inadimplemento dos títulos transferidos,
uma vez que esse risco é da essência do contrato de factoring e por ele o faturizado paga preço mais elevado do que
pagaria, por exemplo, em um contrato de desconto bancário, no qual a instituição financeira não garante a solvência
dos títulos descontados.

O risco advindo dessa operação de compra de direitos creditórios, consistente justamente na eventual inadimplência
do devedor/sacado, constitui elemento essencial do contrato de factoring, não podendo ser transferido ao
faturizado/cedente, sob pena de desnaturar a operação de fomento mercantil.

Assim, o faturizado não pode ser demandado regressivamente pelo pagamento da dívida.

Contrato de factoring não é uma simples cessão de crédito

Essa é a principal diferença entre o contrato de factoring e o de desconto bancário:

· No desconto bancário, o cedente responde em caso de inadimplência do devedor.

· No contrato de factoring, o faturizado não responde em caso de inadimplência do devedor.

“Enfim, a diferença fundamental entre o fomento mercantil e o desconto bancário, forma de empréstimo de dinheiro,
reside no fato de que, no primeiro, inexiste direito de regresso e, no segundo, encontra-se garantido o referido direito,
podendo, entretanto, a instituição financeira abrir mão desse regresso (...)” (Min. Antonio Carlos Ferreira).
Se o contrato contiver previsão de responsabilidade do faturizado, esta cláusula é nula

Mesmo que o contrato de factoring preveja a responsabilidade do faturizado nesses casos, tal cláusula deverá ser
considerada nula:

O risco assumido pelo faturizador é inerente à operação de factoring, não podendo o faturizado ser demandado para
responder regressivamente, salvo se tiver dado causa ao inadimplemento dos contratos cedidos.

STJ. 4ª Turma. REsp 949.360/RN, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 17/12/2013.

Na hipótese de mera inadimplência do devedor, a possibilidade de a faturizadora reaver do faturizado o que lhe pagou
pela cessão do crédito desnatura o contrato de fomento mercantil, confundindo-se com o contrato de desconto
bancário.

Assim, a natureza do contrato de factoring, diversamente do que se dá no contrato de cessão de crédito puro, não
permite que os contratantes, ainda que sob o argumento da autonomia de vontades, estipulem a responsabilidade do
cedente (faturizado) pela solvência do devedor/sacado.

Desse modo, não se aplica para o contrato de factoring, a primeira parte do art. 296 do Código Civil abaixo sombreada:

Art. 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor.

No contrato de factoring, não existe a possibilidade de haver essa “estipulação em contrário”.

Eventual título de crédito emitidos pelo faturizado como garantia da solvência também é nulo

As empresas de factoring, como forma de tentar superar esse entendimento do STJ, começaram a exigir que a
empresa faturizada emitisse nota promissória no mesmo valor do título que estava sendo “vendido”. Assim, se a
factoring não conseguisse receber do devedor do título “comprado”, ela executava a nota promissória emitida pela
faturizada.

Ex: mulher foi até a loja de sapatos e pagou com um cheque pós-datado de R$ 1.000,00. A loja “vendeu” esse cheque
para a factoring. Para aceitar adquirir esse “cheque”, a factoring exigiu que a loja (faturizada) emitisse uma nota
promissória de R$ 1.000,00. Desse modo, se a factoring não conseguir cobrar da mulher a quantia que está no cheque,
ela pretende executar a nota promissória emitida pela faturizada.

Ocorre que o STJ também não aceitou essa prática.

Em suma:
A empresa faturizada não responde pela insolvência dos créditos cedidos, sendo nulos a disposição contratual em
sentido contrário e eventuais títulos de créditos emitidos com o fim de garantir a solvência dos créditos cedidos no
bojo de operação de factoring.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.711.412-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 04/05/2021 (Info 695).

O faturizado responde perante a faturizadora caso o título cedido “não exista” juridicamente ou caso ele seja
inválido?

SIM. O faturizado, ao ceder os títulos, assume a garantia de que eles são existentes. Trata-se de previsão expressa do
art. 295 do CC, que pode ser aplicado aos contratos de factoring:

Art. 295. Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que não se responsabilize, fica responsável ao
cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lhe cedeu; a mesma responsabilidade lhe cabe nas
cessões por título gratuito, se tiver procedido de má-fé.

Desse modo, a faturizadora possui direito de regresso contra o faturizado quando estiver em questão não um mero
inadimplemento, mas sim a própria existência do crédito.

Assim, o faturizado se responsabiliza, por exemplo, pelo saque, fraudulento, da chamada “duplicata fria”, sem causa
legítima subjacente.

Não reconhecer tal responsabilidade quando o cedente vende crédito inexistente ou ilegítimo representa compactuar
com a fraude e a má-fé.

Questão 2

Se uma marca não teve reconhecido o status de alto renome, ainda que seja famosa, não pode impedir o registro da mesma marca em
segmentos mercadológicos distintos, sem que haja possibilidade de confusão.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Marca

Marca é um sinal, identificável visualmente, por meio do qual os produtos ou serviços são identificados e, assim,
podem ser distinguidos dos demais.

“Amarca,cujapropriedadeéconsagradapeloart.5º,XXIX,daCF,seconstitui em
umsinaldistintivodepercepçãovisualqueindividualizaprodutose/ouserviços.Oseuregistroconfereao
titularodireitodeusar,comcertaexclusividade, umaexpressãoousímbolo.” (Min. Nancy Andrighi).
Vale destacar, mais uma vez, que “marca”, segundo a legislação brasileira, é obrigatoriamente um sinal identificável
pela visão, ou seja, não existe “marca sonora” ou “marca olfativa”. Justamente por isso, o famoso som “plim plim” que
a rede Globo® de televisão utiliza não pode ser registrado como marca no Brasil. É comum a seguinte afirmação:
“marca no Brasil é somente aquilo que a pessoa pode ver”.

Importância

A marca é extremamente importante para a atividade empresarial, considerando que, muitas vezes, ela é decisiva no
momento em que o consumidor irá optar por escolher entre um ou outro produto ou serviço. Justamente por isso são
desenvolvidas inúmeras ações de marketing para divulgar e tornar conhecida e respeitada a marca.

“Asuaproteção,paraalémdegarantirdireitosindividuais,salvaguardainteressessociais,namedidaemqueauxilianamelhoraferiçã
(Min. Nancy Andrighi).

Proteção da marca

Por ser importante à atividade empresarial, a marca é protegida pela legislação.

A Lei nº 9.279/96 afirma que a marca pode ser registrada para que não seja utilizada indevidamente em outros
produtos ou serviços:

Art. 122. São suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não
compreendidos nas proibições legais.

Art. 129. A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições
desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às
marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148.

Onde é realizado este registro?

No Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI). Trata-se de uma autarquia federal que possui a atribuição de
conceder privilégios e garantias aos inventores e criadores em âmbito nacional.

Os direitos de propriedade industrial são concedidos, no Brasil, pelo INPI.

Princípio da especialidade ou especificidade

Depois da marca ter sido registrada no INPI, apenas o titular desta marca poderá utilizá-la em todo o território
nacional.
Contudo, em regra, no Brasil, a proteção da marca impede que outras pessoas utilizem esta marca apenas em
produtos ou serviços similares, podendo a mesma marca ser usada por terceiros em produtos ou serviços distintos.

Assim, a proteção da marca se submete, portanto, ao princípio da especialidade, ou seja, a marca registrada somente
é protegida no ramo de atividade que o seu titular atua.

“Peloprincípiodaespecialidade,oregistrodamarcaconfereexclusividadedeusoapenasnoâmbitodomercadorelevanteparaoram
(Min. Nancy Andrighi).

Veja julgados do STJ aplicando o sobredito princípio:

(...) Segundo o princípio da especialidade das marcas, não há colidência entre os signos semelhantes ou até mesmo
idênticos, se os produtos que distinguem são diferentes. (...)

STJ. 4ª Turma. REsp 1079344/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 21/06/2012.

(...) A marca é um sinal distintivo, visualmente perceptível, que visa a identificar um produto ou serviço no mercado
consumidor. Para se obter o registro da marca e, consequentemente, sua propriedade, é necessária a observância de
certos requisitos como a novidade relativa, distinguibilidade, veracidade e licitude, de molde a evitar que o
consumidor seja induzido a engano, ante a existência de repetições ou imitações de signos protegidos.

2. Produtos ou serviços diferentes podem apresentar marcas semelhantes, dado que incide, no direito marcário, em
regra, o princípio da especialidade; ou seja, a proteção da marca apenas é assegurada no âmbito das atividades do
registro, ressalvada a hipótese de marca notória. (...)

STJ. 3ª Turma. REsp 862.067/RJ, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), julgado em
26/04/2011.

A proteção à marca pela Lei n. 9.279/96 não é absoluta, pois “segundo o princípio da especialidade ou da
especificidade, a proteção ao signo, objeto de registro no INPI, estende-se somente a produtos ou serviços idênticos,
semelhantes ou afins, desde que haja possibilidade de causar confusão a terceiros.”

STJ. 4ª Turma. REsp 333105/RJ, Rel. Min. Barros Monteiro, julgado em 02/06/2005.

Exceção ao princípio da especialidade (“extravasamento do símbolo”)

Existe uma exceção ao princípio da especialidade. Trata-se do caso da marca de “alto renome”, que tem proteção em
todos os ramos de atividade. Diz a Lei:
Art. 125. À marca registrada no Brasil considerada de alto renome será assegurada proteção especial, em todos
os ramos de atividade.

A Resolução nº 107/2013 do INPI, em seu art. 1º, fornece um conceito para marca de alto renome:

Art. 1º Para efeitos desta Resolução, considera-se de alto renome a marca registrada cujo desempenho em
distinguir os produtos ou serviços por ela designados e cuja eficácia simbólica levam-na a extrapolar seu
escopo primitivo, exorbitando, assim, o chamado princípio da especialidade, em função de sua distintividade, de
seu reconhecimento por ampla parcela do público, da qualidade, reputação e prestígio a ela associados e de
sua flagrante capacidade de atrair os consumidores em razão de sua simples presença.

Exemplos de marcas já declaradas pelo INPI como sendo de alto renome: Pirelli®, Kibon®, Natura®, Moça®, Chica
Bon®, Banco do Brasil®, Diamante Negro®, Nike®, Sadia®.

Como se obtém o reconhecimento de que uma marca é de alto renome?

A Lei nº 9.279/96 não esclareceu a formapela qual a marca alcançaria o status de alto renome.

Essa situação fez nascer, inicialmente, duas correntes de pensamento:

·umadefendendo que o reconhecimento do alto renome dependeria de um procedimento prévio juntoao INPI que, para
tanto, iria estabelecer critérios, cujo atendimento caberia ao titular da marcacomprovar;

· a outra, segundo a qual, bastava que o consumidor identificasse na marca umarelação de qualidade dos produtos e
serviços, sendo desnecessário qualquer tipo de prova ouprocedimento especial.

Prevaleceu a primeira corrente, tendo o INPI definido os critérios para aferir anotoriedade da marca e lhe conferir a
qualificação de alto renome, o que ocorreu com a ediçãodas Resoluções nº 110/2004, 121/2005 e 107/2013 (alterada
pela Resolução nº 172/2016).

As duas primeiras resoluções sofreram severas críticas, pois apenas permitiam oreconhecimento do alto renome
como matéria de defesa, incidentalmente.

Diante disso, diversas ações foram propostas perante o Poder Judiciário para quefosse declarado o alto renome,
ocasião em que o STJ, no julgamento do REsp nº1.162.281/RJ, concluiu que o detentor da marca tem direito a obter a
declaração de que suamarca é de alto renome, sob pena de ter apenas um direito em tese, cabendo exclusivamenteao
INPI a análise do mérito administrativo, ainda que sujeito a controle posterior do PoderJudiciário:

O titular de uma marca detém legítimo interesse em obter, por via direta, uma declaração geral e abstrata de que sua
marca é de alto renome. Cuida-se de um direito do titular, inerente ao direito constitucional de proteção integral da
marca.
O art. 125 da LPI não estabeleceu os requisitos necessários à caracterização do alto renome de uma marca,
sujeitando o dispositivo legal à regulamentação do INPI.

A sistemática imposta pelo INPI por intermédio da Resolução nº 121/05 somente admite que o interessado obtenha
o reconhecimento do alto renome de uma marca pela via incidental.

Há, portanto, uma lacuna existente na Resolução nº 121/05 considerando que ela prevê a declaração do alto renome
apenas pela via incidental. Essa omissão do INPI na regulamentação do art. 125 da LPI justifica a intervenção do
Poder Judiciário.

Vale ressaltar, no entanto, que ainda que haja inércia da Administração Pública, o Poder Judiciário não pode suprir
essa omissão e decidir o mérito do processo administrativo, mas apenas determinar que o procedimento seja
concluído em tempo razoável. Dessa forma, até que haja a manifestação do INPI pela via direta, a única ilegalidade
praticada será a inércia da Administração Pública, sendo incabível, nesse momento, a ingerência do Poder Judiciário
no mérito do ato omissivo.

Por outro lado, os atos do INPI relacionados com o registro do alto renome de uma marca, por derivarem do exercício
de uma discricionariedade técnica e vinculada, encontram-se sujeitos a controle pelo Poder Judiciário, sem que isso
implique violação do princípio da separação dos poderes.

STJ. 3ª Turma. REsp 1162281-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/2/2013 (Info 517).

A situação foi resolvida com a Resolução nº 107/2013, estabelecendo um procedimentoautônomo para a anotação do
status de alto renome de marcas registradas.

De acordo com anorma, reconhecido o alto renome, essa condição será anotada no registro da marca, tendovalidade
pelo período de 10 (dez) anos, com efeitos a partir da publicação, sendo aplicáveis àsimpugnações pendentes de
decisão.

Observa-se que a proteção obtida é de caráter objetivo, isto é, há uma presunçãolegal de que o registro de marca
idêntica causaria dano ao titular da marca de alto renome, semhaver necessidade de que se prove a diluição.A questão
que se põe a debate, então, é definir se a única forma de as marcasalcançarem a proteção contra a diluição seria obter
o status de alto renome perante o INPI ouse, com fundamento no artigo 130, III, da LPI, que garante ao titular zelar pela
integridadematerial ou reputação da marca, seria possível obter tal proteção para outras marcas comdiferentes graus
de distintividade e fama.

Feita essa revisão, vamos analisar o seguinte caso concreto, com simplificações para facilitar o entendimento:

Hanfer Ltda. é uma indústria de calçados que funciona no Município de Perdigão, interior de Minas Gerais.

Em 1996, a Hanfer pediu para registrar a marca Perdigão, na classe 25:10, que é utilizada para designar roupas e
acessórios.

Em palavras mais simples, a Hanfer pediu para registrar a marca Perdigão a fim de poder utilizá-las nas botinas que ela
produz e vende.

Ocorre que, como você deve saber, existe uma grande empresa brasileira chamada Perdigão, que produz alimentos
frigoríficos e que existe desde 1934.
A Perdigão S/A (empresa frigorífica) se opôs ao pedido de registro argumentando que ela é uma marca de alto
renome, que goza de fama mundial. Inclusive, seus produtos são exportados para mais de 140 países, tendo diversas
fábricas e escritórios no país e no exterior. Logo, o pedido de registro da Hanfer deveria ser indeferido.

A questão chegou até o STJ.

Em 1996, quando houve o pedido de registro da Hanfer, a Perdigão já ostentava o status de marca de alto renome?

NÃO. Em 1996, a Perdigão ainda não gozava de alto renome. A Perdigão só adquiriu o status de marca de alto renome
em 2006.

A decisão administrativa de reconhecimento de uma marca como sendo de alto renome possui eficácia ex tunc
(retroativa)?

NÃO.

A decisão administrativa do INPI, reconhecendo o alto renome de uma marca, tem apenas efeitos prospectivos.

O alto renome de uma marca não tem o condão de atingir as marcas já depositadas à data em que publicada a
decisão administrativa que o reconheceu, salvo se o depositante tiver agido de má-fé.

STJ. 3ª Turma. REsp 1893426/RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 08/06/2021.

Sendo assim, embora a marca Perdigão atualmente goze de alto renome, ela não poderia impedir o registro da marca
da Hanfer, depositada antes do reconhecimento desse status especial.

Tudo bem. Em 1996, a Perdigão não era uma marca de alto renome, mas já era, indiscutivelmente, uma marca muito
famosa. Vou mudar então a pergunta:

Era possível impedir o registro da marca da Hanfer, nãoem razão do alto renome, mas sob o argumento de que se
tratava de uma marca famosa e a concessão do registro iria causar diluição da marca?

NÃO.

A diluição, no Direito de Marcas, consiste na perda gradual da força distintiva de determinado signo, decorrente do uso,
por terceiros, da mesma marca para produtos ou serviços distintos, ainda que não haja confusão, tornando cada vez
menos exclusivo o uso do signo, que virtualmente se dilui em meio a tantos outros usos.

Segundo explica Fábio Ulhoa Coelho, a diluição consiste na prática adotada por outros empresários que se beneficiam
indevidamente do prestígio associado a marcas conhecidas, fazendo com que haja uma perda de valor da marca
notória. (Curso de Direito Comercial. Volume 1: Direito de Empresa. 4ª edição em e-book baseada na 23ª edição
impressa. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019).
Conforme explica o Min. Paulo de Tarso Sanseverino:

“É o caso, por exemplo, de determinada marca X que se tornou conhecida por se referir a determinado
refrigerante. Tempos depois, a marca X também passa a ser utilizada, por terceiros, para designar artigos de
papelaria, e depois, por terceiros, para casa de espetáculos, para artigos para animais, e assim por diante. A
marca X, que antes remetia o consumidor direta e imediatamente a refrigerantes, paulatinamente se torna
referência de várias outras coisas, sendo o refrigerante apenas uma delas.”

A proteção contra a diluição surgiu da verificação de que as marcas, além de exercerem a função de identificar a
origem comercial de produtos e de serviços, também podem servir de veículo de comunicação ao consumidor,
veiculando valores, imagens e sensações, tornando-se agente criador de sua própria fama e reputação.

Ocorre que a teoria da diluição está ligada às marcas de alto renome

Para o Min. Paulo de Tarso Sanseverino, no direito brasileiro, a proteção contra a diluição está prevista no art. 125 da
LPI, estando restrita às marcas consideradas de alto renome.

Assim, ao contrário do que defendia a Perdigão, a proteção contra eventual diluição não tem fundamento no art. 130,
III, da LPI:

Art. 130. Ao titular da marca ou ao depositante é ainda assegurado o direito de:

(...)

III - zelar pela sua integridade material ou reputação.

Conforme esclareceu o Min. Ricardo Villas Bôas Cueva:

“No Brasil, a regulamentação existente é aquela que trata das marcas de alto renome (art. 125 da LPI e
Resoluções do INPI), não parecendo possível, por ora, emprestar interpretação extensiva ao artigo 130, III, da LPI
para que marcas sem esse status alcancem proteção tão ampla, tendo em vista a insegurança jurídica que esse
entendimento pode gerar.”

Em uma simples frase: a proteção contra diluição não pode ser aplicada fora do âmbito de incidência do art. 125 da
LPI.

Logo, como na época do depósito da marca (em 1996), a Perdigão ainda não gozava do status de alto renome, ela não
poderia impedir o registro na classe 25:10, para designar roupas e acessórios do vestuário comum.

Nas palavras do Min. Paulo de Tarso Sanseverino:

“A sentença e o acórdão recorrido basearam-se na chamada “teoria da diluição” e no art. 130, III, da LPI, que,
segundo afirmaram, seria a positivação da proteção contra a diluição no Direito Brasileiro.
Ocorre que não há propriamente – ao menos não atualmente – uma “teoria da diluição”. A diluição, enquanto
teoria, foi defendida, como já afirmado, por Frank Schechter há mais de cem anos. De lá para cá, passou-se a
reconhecer, no Direito Marcário, a diluição como fenômeno existente e verificável, contra o qual, no entanto,
apenas há proteção específica garantida às marcas que atinjam determinado grau de reconhecimento perante o
público consumidor.

Não atingidos os requisitos mínimos exigidos pelo ordenamento jurídico para proteção em todos os ramos de
atividade (reconhecimento de alto renome pelo INPI), não há falar em “teoria da diluição” para estender indevida
e indistintamente essa proteção, de caráter excepcional, a marcas que não sejam de alto renome.

Tampouco o art. 130, IIII, da LPI garante a possibilidade de proteção contra a diluição fora do âmbito do art. 125
da LPI. Tal dispositivo garante ao titular da marca e também ao depositante o direito de zelar pela sua
integridade material ou reputação.

Tal dispositivo legal se aplica, de forma irrestrita, a todo e qualquer titular de marca, ainda que não goze de fama
notável, e mesmo ao depositante, ou seja, mesmo que a marca ainda não tenha sido concedida. Essa norma,
portanto, não pode ser interpretada como garantia contra a diluição.”

Em suma:

A decisão administrativa do INPI de reconhecimento de alto renome a uma marca tem apenas efeitos prospectivos.

No direito brasileiro, a proteção contra a diluição está prevista no art. 125 da LPI, estando restrita às marcas
consideradas de alto renome. Logo, só se pode falar em proteção contra diluição para marcas de alto renome.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.787.676-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 14/09/2021 (Info 709).

Questão 3

O símbolo partidário não pode ser registrado como marca.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
A situação concreta foi a seguinte:

Em 2005, o Partido Federalista registrou como marca, no INPI, uma árvore estilizada, formada por caule simples, sem
galhos e com copa feita de três círculos alinhados triangularmente:

Logotipo<br /> <br /> Descrição gerada automaticamente

Em 2007, o antigo Partido da Frente Liberal (PFL) foi transformado em Democratas (DEM).
O DEM passou a adotar, como símbolo, uma árvore estilizada, formada por caule simples, sem galhos e com copa feita
de três círculos irregulares, alinhados triangularmente:

Logotipo, nome da empresa<br /> <br /> Descrição gerada automaticamente

O Partido Federalista, que tem esse nome, mas não é um partido político ainda por falta de registro no TSE, ajuizou
ação contra o Democratas pedindo que ele fosse condenado a não utilizar o símbolo porque seria uma imitação da
marca registrada em 2005.

O juiz julgou o pedido improcedente (julgamento antecipado do art. 355, I, do CPC), sob o argumento de que o autor
não detém marca de produto ou serviço considerando que não exerce atividade empresarial ou industrial.

O STJ concordou com os argumentos do magistrado?

NÃO.

Segundo decidiu o STJ, é possível que símbolos políticos sejam registrados como marca e que as agremiações
políticas, sejam elas associações civis ou partidos, explorem economicamente o uso de marca de produto, apesar de
não exercerem diretamente atividade empresarial.

A identificação de um partido político ocorre não apenas na esfera pública, mas também na esfera privada.

Diante disso, podemos dizer que os símbolos dos partidos possuem dois regimes de proteção, a depender da sua
finalidade:

· se o uso do símbolo tiver uma finalidade eleitoral, seu regime de proteção será o da Lei nº 9.096/95 (Lei dos Partidos
Políticos);

· por outro lado, a proteção será conferida pela Lei nº 9.279/96, se estivermos diante da exploração econômica da
marca.

Nesse contexto, é possível falarmos em dupla proteção legal, considerando que, mesmo fora do período e da esfera
eleitoral, o partido político, como forma de autofinanciamento, pode explorar economicamente o seu símbolo mediante
o licenciamento de produtos ou serviços dos quais tenha registro marcário. Ex: o partido pode fazer camisas com sua
marca para serem comercializadas.

Proteção dos símbolos partidários com finalidade eleitoral

O símbolo partidário está regulado no art. 7º, § 3º, da Lei nº 9.096/95, sendo-lhe assegurado, após o registro no
Tribunal Superior Eleitoral, proteção no âmbito eleitoral com a finalidade única de evitar a confusão de siglas
partidárias perante os eleitores durante o processo democrático de votação:
Art. 7º (...)

§ 3º Somente o registro do estatuto do partido no Tribunal Superior Eleitoral assegura a exclusividade da sua
denominação, sigla e símbolos, vedada a utilização, por outros partidos, de variações que venham a induzir a
erro ou confusão.

Esse é o alcance da legislação eleitoral: a vedação de utilização de signos de identificação que possam induzir o
eleitorado ao erro ou à confusão. Seu espectro de delimitação se circunscreve, portanto, à identificação com os
eleitores, inexistindo qualquer restrição expressa nesse regramento legal que impeça de modo específico sua proteção
quanto ao uso e exploração nos atos submetidos à regulação da lei civil.

A lei não proíbe o registro do símbolo partidário como marca

Nada impede, portanto, ante a inexistência de vedação legal expressa, que o símbolo de uma agremiação política seja
registrado como marca para o fim de se resguardar a sua exploração econômica.

E, nos termos dos arts. 122 e 123 da Lei nº 9.279/96, a marca é todo sinal distintivo, visualmente perceptível, que
identifica e distingue produtos e serviços, de origem diversas de outro idêntico ou semelhante de origem diversa.

A legislação de regência, ao dispor sobre a legitimidade dos requerentes do registro em capítulo próprio, não limita de
forma expressa a proteção da marca, enquanto signo distintivo, às atividades empreendidas ou exercidas apenas por
pessoas empresárias. Não há essa restrição, pois a forma empresarial é apenas uma das maneiras para se exercer a
atividade econômica que terá a marca protegida.

Mas e o art. 124, XIII, da Lei nº 9.279/96? Ele não vedaria esse registro?

Veja o que diz esse dispositivo:

Art. 124. Não são registráveis como marca:

(...)

XIII - nome, prêmio ou símbolo de evento esportivo, artístico, cultural, social, político, econômico ou técnico,
oficial ou oficialmente reconhecido, bem como a imitação suscetível de criar confusão, salvo quando
autorizados pela autoridade competente ou entidade promotora do evento;

Conforme se entende da análise gramatical do art. 124, XIII, da Lei nº 9.279/96, o que se veda é o registro do nome, do
prêmio ou do símbolo de eventos, sejam eles na modalidade esportiva, artística, cultural, social, política, econômica ou
técnica. Tanto é assim que o trecho ao final ressalva a possibilidade de seus registros, caso seja autorizado pela
autoridade competente ou entidade promotora do evento.
Logo, o art. 124, XIII, não está vedando o registro de símbolos políticos.

Não há, em conclusão, qualquer vedação prevista em lei que impossibilite o registro de símbolos partidários enquanto
marcas, nos termos de ambas as leis de regência.

Em suma:

O símbolo partidário pode ser registrado como marca para que se resguarde a exploração econômica por
agremiações políticas (associações civis ou partidos) do uso de marca de produtos/serviços, ainda que não
exerçam precipuamente atividade empresarial.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.353.300-DF, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 22/06/2021 (Info 702).

Mas, afinal de contas, houve, ou não, violação da marca?

Isso ainda não foi decidido. O STJ determinou que o processo retorne a 1ª instância para fazer a instrução processual.

Questão 4

A assinatura do sacador/emitente da duplicata é requisito que pode ser suprido por outro meio.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Conceito de duplicata

Duplicata é...

- um título de crédito

- que consiste em uma ordem de pagamento emitida pelo próprio credor

- por conta de mercadorias que ele vendeu ou de serviços que prestou

- e que estão representados em uma fatura

- devendo ser paga pelo comprador das mercadorias ou pelo tomador dos serviços.

Título de crédito genuinamente brasileiro

A duplicata foi criada pelo direito brasileiro, sendo considerada um título genuinamente brasileiro.
Regulamentação

A duplicata é regida pela Lei nº 5.474/68 e pela Lei nº 13.775/2018.

Requisitos

O § 1º do art. 2º da Lei nº 5.474/68 prevê os requisitos da duplicata. Confira:

Art. 2º (...)

§ 1º A duplicata conterá:

I - a denominação “duplicata”, a data de sua emissão e o número de ordem;

II - o número da fatura;

III - a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista;

IV - o nome e domicílio do vendedor e do comprador;

V - a importância a pagar, em algarismos e por extenso;

VI - a praça de pagamento;

VII - a cláusula à ordem;

VIII - a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada pelo
comprador, como aceite, cambial;

IX - a assinatura do emitente.

Assinatura do emitente

Conforme vimos acima, um dos requisitos da duplicata é a assinatura do emitente.

O STJ, contudo, entendeu que esse requisito não é essencial, ou seja, mesmo sem a assinatura é possível considerar o
título como válido. Trata-se de “defeito suprível”.

O requisito da assinatura do emitente deve ser considerado suprível nessa específica modalidade de título de crédito,
sobretudo quando não ocorre sua circulação.

Existem dois principais argumentos que permitem chegar a essa conclusão:


1º) A apresentação física da duplicada pode ser dispensada

com fundamento no protesto por indicação previsto no art. 13, § 1º da Lei nº 5.474/68, entende-se que é dispensável a
apresentação física da duplicata, bastando, para a constituição do título executivo extrajudicial:

· os boletos de cobrança bancária;

· os protestos por indicação; e

· os comprovantes de entrega de mercadoria ou de prestação de serviços.

Com base nisso, se permitiu a execução da denominada duplicata virtual.

Veja como o § 1º do art. 13 autoriza o protesto sem a apresentação física da duplicata:

Art. 13 (...)

§ 1º Por falta de aceite, de devolução ou de pagamento, o protesto será tirado, conforme o caso, mediante
apresentação da duplicata, da triplicata, ou, ainda, por simples indicações do portador, na falta de devolução do
título.

Conforme explica a Min. Nancy Andrighi:

“(...) se o boleto que subsidia o protesto por indicação é suficiente para o protesto, o qual, somado ao
comprovante da entrega de mercadorias, justifica o ajuizamento de ação executiva, deve-se entender que alguns
dos elementos mencionados no art. 2º, § 1º, da Lei 5.474/68 admitem suprimento, podendo ser corrigidos por
formas que não prejudiquem a segurança na tramitação da duplicata.”

2º) A duplicata, por ser um título causal, admite a incidência da literalidade indireta

A ideia de que a assinatura do sacador seria essencial decorre do princípio da literalidade, segundo o qual os títulos de
crédito devem possuir todas as informações necessárias ao exercício do direito nela mencionado.

Ocorre que a duplicata, por ser um título causal, permite a incidência da literalidade indireta, que autoriza a
identificação de seus elementos no documento da compra e venda mercantil ou da prestação de serviços que lhe
serve de ensejo.

Conforme ensina a doutrina, a duplicata, por ser causal, está “ligada a um contrato de compra e venda ou de prestação
de serviços, deve[ndo] a duplicata mencionar ainda os nomes das partes do referido contrato, dada a sua função de
documentar o crédito nascido desse contrato” (TOMAZETE, Marlon. A duplicata virtual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, v. 92, n. 807, p. 725-740, jan. 2003).
Assim, é possível a aplicação da literalidade indireta, na possibilidade de a cártula fazer expressa remissão a um
elemento constante em documento referente ao negócio jurídico que lhe serve de causa.

Mesmo sem a assinatura do sacador, fica evidente que o devedor tem a ciência de que aquela obrigação também tem
seus limites definidos em outro documento.

Em suma:

A assinatura do sacador/emitente da duplicata é requisito que pode ser suprido por outro meio.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.790.004-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/10/2020 (Info 681).

Questão 5

O terceiro de boa-fé, endossatário, em operação de endosso-caução, não perde seu crédito de natureza cambial em vista da quitação feita ao
endossante (credor originário), sem resgate da cártula.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Endosso

Ocorre o endosso quando o credor do título de crédito transmite seus direitos a outra pessoa.

O credor que transmite seus direitos sobre o título é chamado de endossante (aquele que faz o endosso).

A pessoa que recebe os direitos sobre o título é denominada de endossatário (aquele que é beneficiado com o
endosso).

O endosso pode ser dividido em:

a) endosso próprio;

b) endosso impróprio.

Endosso próprio

É aquele que produz os dois efeitos próprios do endosso, que são:

a) transferir a titularidade do crédito do endossante para o endossatário;

b) transformar o endossante em codevedor do título (se o devedor principal não pagar o título, o endossatário poderá
cobrar o valor do endossante).
Endosso impróprio

O endosso impróprio não transfere o crédito para o endossatário, mas apenas permite que este (o endossatário) tenha
a posse do título para:

· agir em nome do endossante (endosso-mandato); ou

· como garantia de uma dívida que o endossante tenha com o endossatário (endosso-caução).

Imagine agora a seguinte situação hipotética:

João emitiu um título de crédito (duplicata) em favor de Pedro, no valor de R$ 100 mil.

Pedro estava devendo R$ 90 mil a Carlos.

Pedro (endossante) fez o endosso-caução da duplicata em favor de Carlos (endossatário), como garantia da dívida.

João pagou os R$ 100 mil que estava devendo para Pedro. Ocorre que João não pediu de volta a duplicata.

Pedro sumiu e Carlos não conseguiu cobrar dele os R$ 90 mil devidos.

Diante disso, Carlos ajuizou execução de título extrajudicial contra João cobrando o valor contido na duplicata.

João apresentou embargos à execução argumentando que já pagou a dívida e que a execução deveria ser extinta.

O argumento de João deverá ser acolhido?

NÃO.

Nas operações de endosso-caução – nas quais a parte endossante transmite um título ao endossatário como forma
de garantia da dívida, mas sem a transferência da titularidade da cártula –, o endossatário de boa-fé não tem seu
direito de crédito abalado no caso de eventual quitação realizada ao endossante (credor originário), sem resgate do
título.

STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1.635.968/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/04/2021 (Info 691).

Lei Uniforme de Genebra

O art. 19 da Lei Uniforme de Genebra (Decreto nº 57.663/66) estabelece que, quando o endosso contém qualquer
menção que implique uma caução, o portador pode exercer todos os direitos emergentes do título.
O mesmo dispositivo prevê que os coobrigados (ex: João) não podem invocar contra o portador (ex: Carlos) as
exceções fundadas nas relações pessoais com o endossante (ex: Pedro), a menos que o portador, ao receber a letra
cambiária, tenha praticado ato consciente em detrimento do devedor.

Incentivo à ampla circulação

Existe um interesse social no sentido de que haja a ampla circulação dos títulos de crédito, permitindo aos terceiros de
boa-fé a plena garantia e a segurança na sua aquisição.

A inoponibilidade das exceções fundadas em direito pessoal do devedor é, portanto, uma importante garantia em favor
da segurança da circulação e da negociabilidade dos títulos de crédito.

O título de crédito nasce para circular, não para ficar restrito à relação entre o devedor principal e o credor originário.

Abstração

O art. 15, I, da Lei das Duplicatas (Lei nº 5.474/68) estabelece que a cobrança judicial de duplicata será efetuada
conforme processo aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, não havendo necessidade de qualquer outro
documento além do título.

Apesar de a duplicata possuir natureza causal – ou seja, depende da prestação de um serviço para ser constituída –,
essa característica não lhe retira o caráter de abstração: uma vez que o título tenha circulado, não podem ser opostas
exceções pessoais a terceiros de boa-fé, como a ausência da entrega das mercadorias compradas.

Pretender discutir o negócio subjacente para admitir oposição de exceções pessoais em face do endossatário terceiro
de boa-fé de duplicata aceita representaria significativa mudança na jurisprudência desde sempre pacífica acerca do
tema, ferindo de morte a circulabilidade dos títulos de crédito, o princípio da abstração e o relevante instituto
cambiário do aceite.

Aceite

O caso não discute o instituto de direito civil da cessão do crédito, mas as obrigações cambiárias autônomas do
endosso e, de forma específica, o aceite dado no título.

Uma vez aceito o título, o sacado vincula-se a ele como devedor principal, e a falta de entrega da mercadoria ou da
prestação do serviço, ou mesmo a quitação referente à relação fundamental ao credor originário, só são oponíveis ao
sacador, como exceção pessoal, mas não ao endossatário de boa-fé.

Desse modo, é temerário para a circulação dos títulos de crédito que se admita a quitação de crédito cambial sem a
exigência do resgate da cártula, especialmente se essa situação gerar prejuízo a terceiro de boa-fé. ?

Endosso-caução
Como vimos no início da explicação, o endosso-caução tem por finalidade garantir, mediante o penhor do título, uma
obrigação assumida pelo endossante perante o endossatário. Assim, o endossatário assume a condição de credor
pignoratício do endossante.

Se o endossante cumpre sua obrigação (ex: paga os R$ 90 mil), o título deve ser-lhe restituído pelo endossatário, razão
pela qual a doutrina afirma que, em regra, o endosso-caução não gera a transferência do crédito representado pelo
título.

No entanto, é preciso ressaltar que o endossatário pignoratício é detentor dos direitos emergentes do título, não
podendo os coobrigados (ex: João) invocar contra ele exceções fundadas sobre relações pessoais com o endossante.
O endossante, apesar de, em tese, ainda ser o proprietário do título, transmitiu os direitos emergentes desse título ao
endossatário, como acontece no endosso comum.

Art. 905 do Código Civil

O art. 905 do CC, caput, estabelece que o possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada,
mediante a sua simples apresentação ao devedor, e o parágrafo único estipula que a prestação é devida ainda que o
título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente:

Art. 905. O possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples
apresentação ao devedor.

Parágrafo único. A prestação é devida ainda que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do
emitente.

Portanto, é temerário para o direito cambial, para a circulação dos títulos de crédito, que se admita a quitação de
crédito cambial, sem a exigência do resgate da cártula, notadamente se ensejar prejuízo a terceiro de boa-fé.

Questão 6

O crédito fiscal não tributário, ao contrário do crédito fiscal tributário, submete-se aos efeitos do plano de recuperação judicial.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
O crédito fiscal tributário não se submete aos efeitos do plano de recuperação judicial

A Fazenda Pública não é obrigada a habilitar seus créditos fiscais no processo falimentar ou de recuperação judicial. O
art. 187 do CTN afirma expressamente que o crédito tributário não é sujeito a concurso de credores:

Art. 187. A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em
falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento.
O STJ entende, contudo, que esse dispositivo não proíbe que a Fazenda Pública faça a habilitação dos créditos
tributários na falência. O art. 187 do CTN garante ao ente público a prerrogativa de escolher entre receber o
pagamento de seu crédito pelo rito da execução fiscal ou mediante habilitação nos autos da falência.

Assim, muito embora o processamento e o julgamento das execuções fiscais não se submetam ao juízo universal da
falência, compete à Fazenda Pública optar por ingressar com a cobrança judicial ou requerer a habilitação de seu
crédito na ação falimentar.

A Lei nº 14.112/2020, alterando a Lei nº 11.101/2005, criou, inclusive, um incidente de classificação de crédito público
para que a Fazenda Pública informe ao juízo da falência a relação completa de seus créditos inscritos em dívida ativa:

Art. 7º-A. Na falência, após realizadas as intimações e publicado o edital, conforme previsto, respectivamente,
no inciso XIII do caput e no § 1º do art. 99 desta Lei, o juiz instaurará, de ofício, para cada Fazenda Pública
credora, incidente de classificação de crédito público e determinará a sua intimação eletrônica para que, no
prazo de 30 (trinta) dias, apresente diretamente ao administrador judicial ou em juízo, a depender do momento
processual, a relação completa de seus créditos inscritos em dívida ativa, acompanhada dos cálculos, da
classificação e das informações sobre a situação atual. (Incluído pela Lei nº 14.112/2020)

(...)

E o crédito fiscal não tributário, segue a mesma regra? O crédito fiscal não tributário se submete, ou não, aos efeitos
do plano de recuperação judicial? Ex: a ANVISA aplicou multa administrativa contra a ML Operações Logísticas Ltda;
posteriormente, foi deferida a recuperação judicial da empresa; esse crédito terá que, obrigatoriamente, ser cobrado
na recuperação judicial?

NÃO.

O crédito fiscal não tributário não se submete aos efeitos do plano de recuperação judicial

STJ. 3ª Turma. REsp 1.931.633-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703).

Como vimos acima, o art. 187, caput, do Código Tributário Nacional exclui os créditos de natureza tributária dos
efeitos da recuperação judicial do devedor. Esse dispositivo, contudo, nada fala sobre os créditos de natureza não
tributária.

A despeito disso, os créditos de natureza não tributária não se submetem aos efeitos do plano de recuperação judicial,
por força do art. 6º, § 7º-B da Lei nº 11.101/2005.

Explicando melhor.

O art. 6º, II, da Lei nº 11.101/2005 afirma que, em regra, todas as execuções ajuizadas contra o devedor deverão ficar
suspensas:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:


I - suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime desta Lei;

II - suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio
solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência;

III - proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição
judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos
créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência.

O § 7º-B do art. 6º, contudo, prevê uma exceção. Esse dispositivo prevê que essa suspensão não se aplica às
execuções fiscais:

Art. 6º (...)

§ 7º-B. O disposto nos incisos I, II e III do caput deste artigo não se aplica às execuções fiscais, admitida,
todavia, a competência do juízo da recuperação judicial para determinar a substituição dos atos de constrição
que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da
recuperação judicial, a qual será implementada mediante a cooperação jurisdicional, na forma do art. 69 da Lei
nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), observado o disposto no art. 805 do referido
Código. (Incluído pela Lei nº 14.112/2020)

Logo, as execuções fiscais não ficam sobrestadas mesmo que tenha havido o deferimento de recuperação judicial.

Entendi até aqui... as execuções fiscais não são suspensas... no entanto, estamos falando de um crédito não
tributário...

É neste ponto que reside um erro comum de muitos: considerar que a execução fiscal cobra apenas créditos fiscais
(créditos tributários). Isso não é verdade.

Execução fiscal é a ação judicial proposta pela Fazenda Pública (União, Estados, DF, Municípios e suas respectivas
autarquias e fundações) para cobrar do devedor créditos (tributários ou não tributários) inscritos em dívida ativa,
conforme se observa pelo art. 1º c/c art. 2º da Lei nº 6.830/80:

Art. 1º A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

Art. 2º Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº
4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro
para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito
Federal.
§ 1º Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado
Dívida Ativa da Fazenda Pública.

§ 2º A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização
monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.

(...)

Assim, o art. 6º, § 7º-B da Lei nº 11.101/2005, ao se referir a “execuções fiscais”, está tratando do instrumento
processual que o ordenamento jurídico disponibiliza aos respectivos titulares para cobrança dos créditos públicos,
independentemente de sua natureza, podendo ser créditos tributários ou não tributários.

Desse modo, se, por um lado, o art. 187 do CTN estabelece que os créditos tributários não se sujeitam ao processo de
soerguimento - silenciando quanto àqueles de natureza não tributária -, por outro lado verifica-se que a Lei nº
11.101/2005 não estabeleceu distinção entre a natureza dos créditos que deram ensejo ao ajuizamento do executivo
fiscal para afastá-los dos efeitos do processo de soerguimento.

Como reforço de argumentação, veja que a Lei nº 10.522/2002 - que trata do parcelamento especial previsto no art. 68,
caput, da LFRE - prevê, em seu art. 10-A, que tanto os créditos de natureza tributária quanto não tributária poderão ser
liquidados de acordo com uma das modalidades ali estabelecidas, de modo que admitir a submissão destes ao plano
de soerguimento equivaleria a chancelar a possibilidade de eventual cobrança em duplicidade.

Outro ponto muito importante está no fato de que o art. 29 da Lei nº 6.830/80 afirma, de forma ampla, que a cobrança
judicial da dívida ativa da Fazenda Pública não está sujeita a habilitação em concordata (atual recuperação judicial):

Art. 29. A cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública não é sujeita a concurso de credores ou
habilitação em falência, concordata, liquidação, inventário ou arrolamento.

A dívida ativa, como já vimos, abrange tanto débitos tributários como não tributários.

Assim, em que pese a dicção aparentemente restritiva da norma do caput do art. 187 do CTN, a interpretação
conjugada das demais disposições que regem a cobrança dos créditos da Fazenda Pública insertas na Lei de
Execução Fiscal, bem como daquelas integrantes da própria Lei nº 11.101/2005 e da Lei nº 10.522/2002, autorizam a
conclusão de que, para fins de não sujeição aos efeitos do plano de recuperação judicial, a natureza tributária ou não
tributária do valor devido é irrelevante.

Questão 7

Não é possível a inclusão de valor relativo a honorários advocatícios contratuais previamente ajustados pelas partes na execução de contrato
de locação de espaço em shopping center.

CERTO

ERRADO Resposta correta


Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

“Morena Modas” (“JM Comércio Ltda”) celebrou contrato com a administradora do shopping center “Iguateré” para
locação de espaço para funcionamento de loja.

No contrato de locação, havia uma cláusula prevendo que, em caso de não pagamento dos encargos contratuais, o
locatário arcaria com todas as despesas e custas judiciais, assim como honorários advocatícios na base de 20% (vinte
por cento) sobre o total do débito, se houver intervenção do advogado.

Em outras palavras, o contrato firmado entre as partes previa que o locatário deveria pagar os honorários contratuais
de seu advogado, assim como os do advogado do locador (shopping).

Essa cláusula é válida?

SIM.

É possível a inclusão de valor relativo a honorários advocatícios contratuais previamente ajustados pelas partes na
execução de contrato de locação de espaço em shopping center.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.644.890-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/08/2020 (Info 678).

Em regra, os honorários contratuais são devidos por aquele que contrata o advogado para atuar em seu favor,
respondendo cada uma das partes pelos honorários contratuais de seu advogado.

A parte vencida, além dos honorários contratuais do seu advogado, também arcará com o pagamento dos honorários
sucumbenciais devidos ao patrono da parte vencedora.

No caso concreto, o contrato firmado entre as partes previa que o locatário deveria pagar os honorários contratuais de
seu advogado, assim como os do advogado do locador. Isso não configura bis in idem, pois não se trata do
pagamento da mesma verba, mas do repasse de custo do locador para o locatário.

A atividade empresarial é caracterizada pelo risco e regulada pela lógica da livre-concorrência, devendo prevalecer
nesses ajustes, salvo situação excepcional, a autonomia da vontade e o princípio pacta sunt servanda.

Não há como afastar a incidência de cláusula de contrato de locação de espaço em shopping center com base em
alegação genérica de afronta à boa-fé objetiva, devendo ficar demonstrada a situação excepcional que autoriza a
intervenção do Poder Judiciário.

Vale destacar, ainda, que a onerosidade excessiva pressupõe a superveniência de uma circunstância extraordinária e
imprevista de ordem geral, que torne a prestação excessivamente onerosa para uma das partes.

Assim, como o repasse de custos do locador ao locatário não ultrapassa o que usualmente se espera nos contratos de
locação de espaço em shopping center e não há outras circunstâncias excepcionais que autorizem a intromissão do
Judiciário no negócio firmado, deve ser permitida a inclusão dos honorários na execução.
Questão 8

Compete à Justiça do Trabalho julgar a participação de trabalhadores ativos e aposentados no conselho de administração de sociedades
anônimas.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
O caso concreto, com adaptações, foi o seguinte:

O art. 140, parágrafo único, da Lei nº 6.404/76 prevê a possibilidade de participação de representantes dos
empregados no conselho de administração da sociedade anônima:

Art. 140 (...)

Parágrafo único. O estatuto poderá prever a participação no conselho de representantes dos empregados,
escolhidos pelo voto destes, em eleição direta, organizada pela empresa, em conjunto com as entidades
sindicais que os representem.

A Usiminas (sociedade anônima) realizou eleição para o seu conselho de administração, tendo sido escolhidos os
representantes dos empregados no colegiado.

Foram propostas duas ações contra essa eleição:

1) ação anulatória proposta pela candidata não eleita, no Juízo cível estadual.

2) ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho com o fim também de anular a eleição do
representante da classe dos trabalhadores, na Justiça do Trabalho.

Ambos os juízos se consideraram competentes (conflito positivo de competência).

Quem vai dirimir esse conflito de competência?

O STJ, considerando que se trata de conflito envolvendo juízos vinculados a tribunais diversos, nos termos do art. 105,
I, “d”, da CF/88:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

I - processar e julgar, originariamente:

(...)
d) os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, “o”, bem como
entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos;

O que o STJ decidiu? Quem tem competência para julgar essa demanda?

A Justiça comum.

Compete à Justiça Comum julgar a participação de trabalhadores ativos e aposentados no conselho de


administração de sociedades anônimas.

STJ. 2ª Seção. CC 164.709/MG, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 28/04/2021 (Info 694).

A participação de trabalhadores ativos e aposentados no conselho de administração de sociedades anônimas ou na


gestão de qualquer sociedade empresária é garantida na parte final do inciso XI do art. 7º da Constituição da
República como direito excepcional dos trabalhadores:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição
social:

(...)

XI – participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na


gestão da empresa, conforme definido em lei;

Ainda não existe lei disciplinando isso.

O STJ afirma que se trata de um direito trabalhista extraordinário (excepcional). Assim, a lei que vier a regulamentar,
não poderá impô-lo como regra, mas sim como exceção.

Então, ao ser instituído por lei aquele direito excepcional em favor dos trabalhadores, seu exercício se dará conforme
ali disciplinado, observadas as restrições decorrentes da previsão constitucional.

No caso concreto em que se discute a anulação da eleição, não há propriamente discussão a respeito de um direito
trabalhista em sentido estrito. Não se está discutindo relação de trabalho (art. 114, I, da CF/88), representação sindical
(art. 114, III) nem mesmo “outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho” (art. 114, IX).

A causa de pedir das ações gira em torno da relação de natureza estatutária, civil e empresarial.

Como se sabe, o Conselho de Administração das Companhias, como órgão de deliberação colegiada, é regulado pelo
direito empresarial, na Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/76), enquanto o direito facultativo e excepcional de
participação dos empregados no aludido conselho tem expressa previsão no parágrafo único do art. 139 da Lei das
S/A.
A legislação de Direito Empresarial, a Lei das S/A, rege a vida das companhias que disputam o mercado,
especialmente das chamadas companhias abertas que angariam recursos no mercado de ações, de modo a
cumprirem requisitos de governança e transparência para enfrentar adequadamente a acirrada concorrência no
mercado nacional e internacional, no qual atuem.

A referida lei, ao estabelecer, em seu art. 139, parágrafo único, que o estatuto poderá prever a participação dos
empregados no conselho de administração, faculta às companhias ensejar esse direito excepcional aos trabalhadores,
mediante previsão nos respectivos estatutos, por ato de liberalidade dessas empresas.

Assim, a criação desse direito trabalhista, de índole não obrigatória e extraordinária, não pode ser imposta às
sociedades anônimas. Fica a depender destas a concepção do benefício no âmbito de cada sociedade empresária.
Uma vez criado o direito pelo respectivo estatuto social, os representantes dos empregados deverão ser escolhidos
pelo voto destes, em eleição direta, organizada pela própria companhia, em conjunto com as entidades sindicais
representativas da categoria.

Questão 9

A pretensão de cobrança, por meio de ação monitória, de dívida representada por cédula de crédito bancário prescreve em três anos.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
O que é a cédula de crédito bancário?

A Cédula de Crédito Bancário é...

-um título de crédito

-emitido por pessoa física ou jurídica

-em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada

-representando promessa de pagamento em dinheiro,

-decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.

Exemplo:

Pedro vai até o Banco para abrir uma conta corrente. O gerente lhe oferece um contrato bancário de abertura de
crédito. Por meio desse contrato, o Banco irá colocar certa quantia de dinheiro à disposição de Pedro, que pode ou não
se utilizar desses recursos, caso necessite. O lucro do Banco será nos juros cobrados de Pedro caso ele use a quantia
disponibilizada.

O contrato de abertura de crédito não é considerado título executivo extrajudicial (Súmula 233-STJ). Desse modo, para
conferir maior segurança ao Banco caso Pedro tome emprestado o dinheiro, a assinatura do contrato fica
condicionada à emissão, por Pedro, de uma Cédula de Crédito Bancário, na qual ele promete pagar ao Banco o valor
que tomar emprestado. Na hipótese de não pagar, o Banco executa essa Cédula de Crédito, sem precisar de um
processo de conhecimento.
Previsão legal

A Cédula de Crédito Bancário foi criada pela Medida Provisória 1.925/99, convertida, após inúmeras reedições, na Lei
nº 10.931/2004.

A Cédula de Crédito é título executivo extrajudicial?

SIM. A Lei nº 10.931/2004 confere à Cédula de Crédito Bancário natureza de título executivo extrajudicial:

Art. 28. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa,
líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou
nos extratos da conta corrente, elaborados conforme previsto no § 2º.

Assim, se a Cédula de Crédito Bancário não for paga, o portador poderá ajuizar ação de execução contra o emitente e
eventuais codevedores (endossantes, avalistas).

Essa ação de execução é conhecida como “ação cambial”.

A ação cambial pode ser traduzida na nossa legislação, em regra, como sendo a execução forçada, pois os títulos de
crédito são definidos como títulos executivos extrajudiciais (art. 784 do CPC/2015).

Qual é o prazo prescricional para a execução da Cédula de Crédito Bancário?

3 anos, nos termos do art. 70 da Lei Uniforme de Genebra (Decreto nº 57.663/66) c/c o art. 44 da Lei nº 10.931/2004:

Art. 44. Aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que não contrariar o disposto nesta Lei, a legislação
cambial, dispensado o protesto para garantir o direito de cobrança contra endossantes, seus avalistas e
terceiros garantidores.

Considerando o disposto no art. 44 daLei nº 10.931/2004, aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que couber,a
legislação cambial, de modo que, à falta de prazo específico na mencionadanorma, mostra-se de rigor a incidência
do art. 70 da LUG, que se apresenta,no cenário jurídico, como uma espécie de norma geral do direito cambiário.

STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1.525.428/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 5/11/2019.
Conforme estabelece o art. 44 da Lei nº 10.931/2004, aplica-se às Cédulasde Crédito Bancário, no que couber, a
legislação cambial, de modo que semostra de rigor a incidência do art. 70 da Lei Uniforme de Genebra, queprevê o
prazo prescricional de 3 (três) anos a contar do vencimento dadívida.

STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1.675.530/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 26/2/2019.

Mesmo que tenha transcorrido esse prazo e a Cédula de Crédito Bancário tenha perdido sua força executiva (esteja
prescrita), ainda assim será possível a sua cobrança?

SIM.

Uma vez prescrita a pretensão executória, ainda é possível que a cobrança do crédito se dê por meio de ações causais,
pelo procedimento comum ou monitório, no qual o título serve apenas como prova (documento probatório) e não mais
como título executivo extrajudicial (documento dispositivo), resumindo-se a discussão à causa da obrigação.

Qual é o prazo máximo para ajuizar a ação monitória de nota promissória prescrita?

Esse prazo é de 5 anos, com base no art. 206, § 5º, I, CC:

Art. 206. Prescreve:

§ 5º Em cinco anos:

I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;

(...)

A Cédula de Crédito Bancário prescrita é considerada um instrumento particular que representa uma obrigação líquida.
Logo, enquadra-se no dispositivo acima.

A pretensão de cobrança, por meio de ação monitória, de dívida representada por cédula de crédito bancário
prescreve em cinco anos.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.940.996-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 21/09/2021 (Info 711).

Aprofundando um pouco mais os argumentos


A ação causal é aquela baseada no negócio jurídico subjacente, que deu origem ao título, tendo como causa de pedir o
descumprimento do referido negócio. Nela não se discute o cumprimento da obrigação emergente do título de crédito,
mas o cumprimento da relação jurídica fundamental.

Sendo assim, o prazo prescricional para o ajuizamento das ações causais não é o mesmo da ação cambial, daí porque
é inaplicável o prazo de 3 de que trata a LUG. A prescrição, na hipótese, irá ser regulada pelo prazo que incide sobre o
negócio jurídico subjacente.

A Cédula de Crédito Bancário, nos termos do art. 26 da Lei nº 10.931/2004, representa promessa de pagamento em
dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.

O art. 28 da referida lei acrescenta que a cédula representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma
nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente.

Conclui-se, diante disso, que se trata de dívida líquida constante de instrumento particular. Nesse contexto, a
pretensão de sua cobrança prescreve em 5 anos, nos termos do art. 206, § 5º, I, do CC.

Qual é o termo inicial desse prazo, isto é, a partir de quando ele é contado?

O prazo de 5 anos para a ação monitória começa a correr a partir do vencimento da obrigação inadimplida.

O prazo prescricional para exercício da pretensão de cobrança de débitoconstituído por cédula de crédito - deduzida
mediante ação de conhecimentoou monitória - é de cinco anos (art. 206, § 5º, I, do CC/2002), começando afluir do
vencimento da obrigação inadimplida.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.403.289/PE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgadoem 5/11/2013.

Questão 10

Não é legítima a restituição em dinheiro de valor adiantado ao devedor-falido, oriundo de adiantamento de contrato de câmbio para
exportação.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
O caso concreto foi o seguinte:

Em 2005, foi aprovada a Lei nº 11.101, conhecida como Lei de Falências e Recuperação Judicial.

No mesmo ano, a Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade
no Supremo, com pedido de liminar, contra dispositivos da Lei nº 11.101/2005.

A entidade sindical impugnou os seguintes dispositivos:

· art. 83, I e VI, alínea “c”;


· art. 83, § 4º;

· art. 84, V (atual art. 84, I-E);

· art. 86, II.

Vejamos o que decidiu o STF:

Art. 83, I e VI, alínea “c”

Esses dispositivos estabelecem que os créditos derivados da legislação trabalhista têm prioridade na ordem
classificatória de atendimento, porém limita-os a 150 salários-mínimos por credor. Os demais são considerados
credores quirografários:

Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:

I - os créditos derivados da legislação trabalhista, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por
credor, e aqueles decorrentes de acidentes de trabalho;

(...)

VI - os créditos quirografários, a saber:

c) os saldos dos créditos derivados da legislação trabalhista que excederem o limite estabelecido no inciso I do
caput deste artigo;

A autora questionou esse limite, afirmando que ele ofenderia “o princípio da igualdade, haja vista que todos os
trabalhadores são trabalhadores, e não é constitucional assegurar a alguns a possibilidade de auferir a integralidade
de seus direitos e a outros, uma parcela limitada”.

Esse dispositivo é constitucional. O STF já havia decidido assim em 2009: STF. Plenário. ADI 3934, Rel. Ricardo
Lewandowski, julgado em 27/05/2009. Na ocasião, afirmou o Min. Lewandowski:

“A própria legislação internacional de proteção ao trabalhador contempla a possibilidade do estabelecimento de


limites legais aos créditos de natureza trabalhista, desde que preservado o mínimo essencial à sobrevivência do
empregado

Esse entendimento encontra expressão no art. 7.1 da Convenção 173 da Organização Internacional do Trabalho -
OIT (Convenção sobre a Proteção dos Créditos Trabalhistas em Caso de Insolvência do Empregador), segundo o
qual a “legislação nacional poderá limitar o alcance do privilégio dos créditos trabalhistas a um montante
estabelecido, que não deverá ser inferior a um mínimo socialmente aceitável”.

Embora essa Convenção não tenha sido ainda ratificada pelo Brasil, é possível afirmar que os limites adotados
para a garantia dos créditos trabalhistas no caso de falência ou recuperação judicial de empresas encontram
respaldo nas normas adotadas no âmbito da OIT, entidade integrante da Organização das Nações Unidas que
tem por escopo fazer com que os países que a integram adotem padrões mínimos de proteção aos
trabalhadores.

Nesse aspecto, as disposições da Lei nº 11.101/2005 abrigam uma preocupação de caráter distributivo,
estabelecendo um critério o mais possível equitativo no que concerne ao concurso de credores. Em outras
palavras, ao fixar um limite máximo – bastante razoável - para que os créditos trabalhistas tenham um
tratamento preferencial, a Lei nº 11.101/2005 busca assegurar que essa proteção alcance trabalhadores, ou seja,
justamente aqueles que auferem os menores salários.

Procurou-se, assim, preservar, em uma situação de adversidade econômica por que passa a empresa, o caráter
isonômico do princípio da par condicio creditorum, segundo o qual todos os credores que concorrem no
processo de falência devem ser tratados com igualdade, respeitada a categoria que integram.”

Assim, sendo a causa de pedir aberta e não havendo motivos de fato ou de direito que autorizem a superação do
entendimento firmado no julgamento da referida ação direta, o STF ratificou a constitucionalidade do art. 83, I e IV, c,
da Lei 11.101/2005.

São constitucionais o estabelecimento de um limite máximo de 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos aos
créditos de natureza trabalhista, bem como a definição de créditos com privilégio especial, conforme previsto no
art. 83, I, e IV, “c”, da Lei 11.101/2005.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

Art. 83, § 4º

O § 4º do art. 83 dizia que os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão quirografários (não terão preferência em
relação aos demais), na hipótese de cessão de crédito:

Art. 83 (...)

§ 4º Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.

Para a CNPL, isso afrontaria o direito de propriedade (art. 5º, XII da Constituição Federal), “visto restringir a
disponibilidade da coisa”.

Esse dispositivo foi revogado pela Lei nº 14.112/2020.

Diante disso, o STF declarou a perda do objeto quanto a esse § 4º do art. 83.

Art. 84, V (atual art. 84, I-E)


O art. 84 lista os créditos que serão considerados extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os
mencionados no art. 83 da lei impugnada, colocando, em seu inciso V, as obrigações resultantes de atos jurídicos
válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 da lei, ou após a declaração de falência, e
tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência:

LEI DE FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL (LEI 11.101/2005)

Antes da Lei 14.112/2020 Depois da Lei 14.112/2020

Art. 84. Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos


com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na
ordem a seguir, os relativos a:

V – obrigações resultantes de I-E - às obrigações resultantes de


atos jurídicos válidos praticados atos jurídicos válidos praticados
durante a recuperação judicial, durante a recuperação judicial,
nos termos do art. 67 desta Lei, nos termos do art. 67 desta Lei,
ou após a decretação da ou após a decretação da
falência, e tributos relativos a falência;
fatos geradores ocorridos após a
decretação da falência,
respeitada a ordem estabelecida
no art. 83 desta Lei.

Para a CNPL, as despesas decorrentes da etapa recuperatória ou após a decretação da quebra não podem ter o
mesmo tratamento das despesas obrigatórias da massa falida - remuneração dos administradores, quantias
fornecidas à massa pelos credores, custas processuais etc. Nas palavras da autora:

“Dir-se-á que, sem isso, não haverá estímulo à recuperação da empresa, mas esta, por mais estimulável que seja, não
pode ter lugar às expensas do sacrifício geral de todos os créditos, em especial os trabalhistas, aqui defendidos”.

O STF rejeitou os argumentos da entidade:


É constitucional a precedência conferida aos créditos “extraconcursais” decorrentes de obrigações resultantes de
atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, ou após a decretação da falência, e de tributos
relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

A regra tem por objetivo estimular os fornecedores de bens e serviços a negociar com a empresa em recuperação, a
despeito da fragilidade de sua situação financeira, confessada e divulgada publicamente quando do requerimento de
recuperação.

A preservação da empresa depende da continuidade dos negócios e, para tanto, é necessário que os novos credores
tenham garantia de que serão pagos. Caso contrário, não haverá interessados em continuar contratando com a
empresa em recuperação judicial.

Ademais, diante da função de promover a justiça social da tributação, justifica-se também a precedência em relação
aos tributos cujos fatos geradores tenham ocorrido durante a recuperação judicial ou após a decretação da falência.

Art. 86, II

O inciso II do art. 86 determina que será feita a restituição em dinheiro da importância entregue ao devedor, decorrente
de adiantamento a contrato de câmbio para exportação:

Art. 86 (...)

II - da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de


câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o
prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da
autoridade competente;

Para a CNPL, o pedido de restituição é medida portadora de potencialidade esvaziadora dos recursos da massa falida.

O STF, contudo, não concordou com os argumentos da autora.

A restituição de adiantamento de contrato de câmbio para a exportação não trata de um mero contrato de mútuo, em
que a quantia emprestada pelo banco mutuante se incorporaria — imediatamente — ao patrimônio do mutuário no
momento da contratação.

O adiantamento a contrato de câmbio é, em verdade, um contrato de compra e venda de moeda a termo, uma vez que
a concretização da operação de câmbio somente ocorrerá no momento em que o exportador cumprir com a obrigação
(enviando o bem ou prestando o serviço no exterior) e for paga a contraprestação (em moeda estrangeira) pelo
importador. Assim, a instituição financeira repassa recursos em moeda nacional ao exportador antes que ele efetive a
transação internacional de venda de mercadorias ou prestação de serviços.
Cuida-se, portanto, de um mecanismo de grande valia para que as transações internacionais se perfectibilizem,
possibilitando aos exportadores utilizarem as quantias antecipadas para produção dos bens que serão enviados ao
exterior, como capital de giro ou, ainda, para aproveitamento de melhores oportunidades negociais.

Desse modo, caso a empresa exportadora não entregue a moeda estrangeira à instituição financeira que a comprou
antecipadamente, a riqueza previamente aportada pelo banco não pode ser considerada como patrimônio da massa
falida, sendo absolutamente razoável e devida a previsão legal que determina a sua restituição ao verdadeiro titular
antes do pagamento dos demais credores.

Em suma:

É legítima a restituição em dinheiro de valor adiantado ao devedor-falido, oriundo de adiantamento de contrato de


câmbio para exportação.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

Na mesma assentada, o STF também declarou compatível com a CF/88 a regra do art. 75, § 3º da Lei nº 4.728/65, que
diz:

Art. 75. O contrato de câmbio, desde que protestado por oficial competente para o protesto de títulos, constitui
instrumento bastante para requerer a ação executiva.

§ 1º Por esta via, o credor haverá a diferença entre a taxa de câmbio do contrato e a da data em que se efetuar
o pagamento, conforme cotação fornecida pelo Banco Central, acrescida dos juros de mora.

§ 2º Pelo mesmo rito, serão processadas as ações para cobrança dos adiantamentos feitos pelas instituições
financeiras aos exportadores, por conta do valor do contrato de câmbio, desde que as importâncias
correspondentes estejam averbadas no contrato, com anuência do vendedor.

§ 3º No caso de falência ou concordata, o credor poderá pedir a restituição das importâncias adiantadas, a que
se refere o parágrafo anterior.

Assim, o STF decidiu que:

É constitucional o art. 86, II, da Lei nº 11.101/2005.

O art. 75, § 3º, da Lei nº 4.728/65 foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988.

STF. Plenário. ADPF 312/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 16/4/2021
(Info 1013).
Com a decisão acima, o STF afirma que é válido o entendimento manifestado na Súmula 307 do STJ:

Súmula 307-STJ: A restituição de adiantamento de contrato de câmbio, na falência, deve ser atendida antes de
qualquer crédito.

Questão 11

O endosso de duplicata mercantil com aceite a terceiro de boa-fé, dispensa a necessidade de demonstração, pela endossatária, da
consumação de negócio de compra e venda de mercadorias subjacente.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Conceito

Duplicata é...

- um título de crédito

- que consiste em uma ordem de pagamento emitida pelo próprio credor

- por conta de mercadorias que ele vendeu ou de serviços que prestou

- e que estão representados em uma fatura

- devendo ser paga pelo comprador das mercadorias ou pelo tomador dos serviços.

Genuinamente brasileiro

A duplicata foi criada pelo direito brasileiro, sendo considerada um título genuinamente brasileiro.

Regulamentação

A duplicata é regida pela Lei nº 5.474/68 e, agora, também pela Lei nº 13.775/2018.

Exemplo de emissão de duplicata

O distribuidor “Silva & Souza Ltda.” vendeu para a loja “Bompé” 70 pares de sapatos.

O distribuidor (vendedor) extrai uma fatura dos produtos e emite uma duplicata mercantil dando uma ordem à loja
(compradora) para que pague a ele (vendedor) o preço dos pares de sapato e eventuais encargos contratuais.
Espécies de duplicata

• Duplicata mercantil: emitida por causa da compra e venda mercantil.

• Duplicata de serviços: emitida por causa da prestação de serviços.

Características da duplicata

a) Título causal: a duplicata só pode ser emitida para documentar o crédito decorrente de dois negócios jurídicos: a
compra e venda mercantil ou a prestação de serviços. Essa causa da duplicata é mencionada no próprio título. Por
conta dessa característica, alguns autores afirmam que se trata de um título impróprio. Obs: o contrário dos títulos
causais são os “não causais” ou “abstratos”, como o caso da nota promissória.

b) Ordem de pagamento.

c) Título de modelo vinculado (título formal): os padrões de emissão da duplicata são fixados pelo Conselho Monetário
Nacional. A duplicata somente produz efeitos cambiais se observado o padrão exigido para a constituição do título.

Emissão da duplicata

O vendedor ou prestador dos serviços emite a fatura discriminando as mercadorias vendidas ou os serviços
prestados. Com base nessa fatura, esse vendedor ou prestador poderá emitir a duplicata.

Remessa da duplicata para ACEITE

Aceite é o ato por meio do qual o sacado (comprador ou tomador dos serviços) assina o título se obrigando a pagar o
crédito ali descrito, na data do vencimento.

Assim, emitida a duplicata, nos 30 dias seguintes o sacador (quem emitiu o título) deve remeter o título ao sacado
(comprador ou tomador dos serviços) para que ele assine a duplicata no campo próprio para o aceite, restituindo-a ao
sacador no prazo de 10 dias.

O aceite na duplicata é obrigatório

Na duplicata, o título documenta uma obrigação surgida a partir de um contrato de compra e venda mercantil ou de
prestação de serviços.

Desse modo, se o vendedor/prestador do serviço, que no caso foi o sacador, cumpriu as suas obrigações contratuais,
não há motivo para o devedor recusar o aceite.

Em virtude dessa circunstância, a doutrina afirma que o aceite na duplicata é, em regra, obrigatório, somente podendo
ser recusado nas hipóteses previstas nos arts. 8º e 21 da Lei nº 5.474/68.
Recusa do aceite

Como vimos, o aceite é, em regra, obrigatório.

As hipóteses previstas na lei em que o aceite pode ser recusado estão relacionadas com situações em que o sacador
(vendedor ou prestador dos serviços) não cumpriu corretamente suas obrigações contratuais ou em que há
divergência entre aquilo que foi combinado no contrato e o que consta da duplicata.

Estão previstas nos arts. 8º e 21 da Lei nº Lei nº 5.474/68.

Tipos de aceite

a) aceite ORDINÁRIO: ocorre quando o sacado (comprador ou tomador dos serviços) não encontra nenhum problema
em aceitar e, por isso, assina em um campo próprio localizado na frente (anverso) do título, devolvendo-o em seguida.

b) aceite PRESUMIDO: ocorre quando o sacado resolve não assinar ou não devolver a duplicata assinada, no entanto,
ao receber as mercadorias compradas, ele assinou o comprovante de recebimento, sem fazer qualquer ressalva
quanto aos bens adquiridos. Ora, se ele recebeu normalmente as mercadorias, é porque se presume que o vendedor
cumpriu sua obrigação contratual. Logo, esse comprador deveria ter feito o aceite da duplicata. Nesses casos, o
sacador deverá fazer o protesto do sacado por falta de aceite ou por falta de pagamento.

Diante disso, é admitido como aceite presumido da duplicata:

O comprovante de entrega das mercadorias assinado pelo sacado acompanhado do instrumento do protesto do título
por falta de aceite ou falta de pagamento.

c) aceite por COMUNICAÇÃO: ocorre quando o sacado retém o título e expressa o aceite em carta ou comunicado.
Essa comunicação, mesmo escrita fora do título, produz os mesmos efeitos do aceite.

Endosso

Ocorre o endosso quando o credor do título de crédito transmite seus direitos a outra pessoa.

O credor que transmite seus direitos sobre o título é chamado de endossante (aquele que faz o endosso).

A pessoa que recebe os direitos sobre o título é denominada de endossatário (aquele que é beneficiado com
o endosso).

O endosso pode ser dividido em:

a) endosso próprio;
b) endosso impróprio.

Endosso próprio

É aquele que produz os dois efeitos próprios do endosso, que são:

a) transferir a titularidade do crédito do endossante para o endossatário;

b) transformar o endossante em codevedor do título (se o devedor principal não pagar o título, o endossatário poderá
cobrar o valor do endossante).

Endosso impróprio

O endosso impróprio não transfere o crédito para o endossatário, mas apenas permite que este (o endossatário) tenha
a posse do título para:

· agir em nome do endossante (endosso-mandato); ou

· como garantia de uma dívida que o endossante tenha com o endossatário (endosso-caução).

Feita essa revisão, imagine agora a seguinte situação hipotética:

João comprou móveis residenciais de uma empresa, que ficou de entregar e instalar os modulados na casa do cliente
no prazo de 5 meses.

Ficou combinado que João pagaria R$ 50 mil, divididos em 5 meses.

Para instrumentalizar esse crédito, foram emitidas 5 duplicatas no valor de R$ 10 mil cada, a serem pagas por João
assim que os serviços fossem entregues, mês a mês.

No sistema da duplicata, com base neste exemplo, João recebe o nome de “sacado” (comprador) e a movelaria é
denominada de sacador (emitente).

• Sacado (comprador): é a pessoa que recebe a ordem de pagamento. É aquela que compra a mercadoria ou o serviço
e paga para o beneficiário, que é o próprio vendedor.

• Sacador (emitente): é quem dá a ordem de pagamento (emite a duplicata). É aquele que vende a mercadoria ou o
serviço.

Vale ressaltar que João, sem conhecer muito bem as regras de direito cambiário, deu aceite nas cinco duplicatas, ou
seja, assinou-as na frente do título, comprometendo-se a pagá-las mesmo sem ter ainda recebido os móveis
comprados.
Venda das duplicatas para uma outra empresa

A loja de modulados, precisando de dinheiro imediatamente para ter capital de giro, “vendeu” essas duplicatas. Em
outras palavras, a loja de modulados fez um endosso próprio das duplicatas e, quando ocorresse o dia do vencimento
de cada uma delas, quem receberia o valor pago pelo cliente seria a empresa endossatária (empresa beneficiada com
o endosso), e não mais a movelaria.

Atraso nos móveis

A empresa de modulados entregou as duas primeiras partes dos móveis nos dois primeiros meses, tendo João
pagado as duas primeiras duplicatas.

A partir do terceiro mês, no entanto, a empresa, alegando atraso na produção, não entregou a terceira parte. Diante
disso, João também não pagou a terceira duplicata. Isso se repetiu no quarto e quinto meses.

Desse modo, a empresa cumpriu dois meses de seu compromisso contratual e, como não mais entregou os móveis a
partir daí, o cliente deixou de pagar as três duplicatas restantes.

Ocorre que a empresa endossatária, que já havia “comprado” as duplicatas, não quis saber de nada e, como não houve
o pagamento, levou os títulos para protesto.

Exceções pessoais

Juridicamente, um dos sentidos da palavra “exceção” é o de defesa. Assim, o termo “exceção” pode ser utilizado como
sinônimo de defesa em alguns casos.

Em direito cambiário, quando falamos em “exceções pessoais”, estamos querendo dizer que são defesas que a
pessoa que emitiu o título de crédito possui em relação àquele em favor de quem foi emitido o título de crédito.

Ex: Pedro quer comprar um celular de Mário e emite uma nota promissória. A origem da nota promissória é a compra e
venda (trata-se da causa subjacente/causa debendi). O celular apresenta vício e, por isso, Pedro não paga o valor da
nota promissória e devolve o celular. Se Mário executar essa nota promissória, Pedro poderá invocar, como exceção
pessoal, que a causa subjacente não se concretizou. Trata-se de uma exceção pessoal do emitente em relação ao
beneficiário do título.

As exceções pessoais podem ser invocadas (alegadas) pelo emitente para deixar de pagar o beneficiário do título. No
entanto, em regra, as exceções pessoais não podem ser utilizadas contra pessoas de boa-fé que receberam o título.
Isso está previsto no art. 916 do Código Civil:

Art. 916. As exceções, fundadas em relação do devedor com os portadores precedentes, somente poderão ser
por ele opostas ao portador, se este, ao adquirir o título, tiver agido de má-fé.

Assim, se Mário já havia passado a nota promissória para Juliana, uma terceira pessoa, e ela estava de boa-fé, Juliana
poderá executar o título cobrando o valor de Pedro. Este, coitado, ficará sem o celular e terá que pagar o valor do título
para Juliana. Obviamente que, depois, Pedro poderá tentar cobrar de Mário aquilo que foi pago. No entanto, repito, não
poderá invocar contra Juliana sua exceção pessoal porque o título circulou e agora encontra-se com alguém
considerado terceiro de boa-fé.

Voltando ao exemplo da Loja de Modulados. A empresa endossatária está cobrando de João o valor das três
duplicatas não pagas. João não quer pagar porque a mercadoria não foi entregue. João (sacado) poderá invocar isso
como exceção pessoal para não pagar à empresa endossatária?

NÃO.

Alguém poderia falar: mas a duplicata é um título causal, ou seja, ela está relacionada com um negócio jurídico. Se
este negócio jurídico não foi cumprido, mesmo assim a duplicata terá que ser paga?

A duplicata é um título causal no momento da sua emissão. No entanto, ela conserva essa característica apenas até a
emissão do aceite, expresso ou ficto, quando adquire feição e qualidades próprias dos demais títulos de crédito, tanto
que se admite a sua circulação, por cessão ou endosso.

Isso porque o aceite confere ao adquirente da duplicata uma segurança jurídica de que o negócio que justificou a
emissão do título foi cumprido. A certeza é transmitida pelo próprio devedor (sacado) que, podendo recusar, aceitou o
título.

Assim, depois do aceite, a duplicata perde o caráter causal, ou seja, desvincula-se do negócio jurídico que lhe deu
causa.

Além disso, com a circulação (que ocorre com o endosso do título para terceiros), a duplicata passa a ter duas outras
características muito relevantes para o direito cambiário: autonomia e abstração.

a) Autonomia: o possuidor de boa-fé (possuidor do título de crédito), ao cobrar esse título, está exigindo um direito
próprio (direito seu), que não pode ser atrapalhado por conta de relações jurídicas anteriores entre o devedor e antigos
possuidores do título. Assim, o possuidor de boa-fé do título de crédito não tem nada a ver com o fato de o título ter
vícios ou defeitos anteriores. Se ele é o atual possuidor e está de boa-fé, tem direito ao crédito (obs.: existem algumas
exceções ao princípio da autonomia, que não interessam no momento).

b) Abstração: significa que os títulos de crédito, quando circulam, ficam desvinculados da relação que lhe deu origem.
Ex: João comprou um notebook de Ricardo, entregando-lhe uma nota promissória. Ricardo endossou a nota
promissória para Rui. Ricardo acabou nunca levando o computador para João. Rui (que estava de boa-fé) poderá
cobrar de João o crédito constante da nota promissória e o fato de o contrato não ter sido cumprido não poderá ser
invocado para evitar que João pague o débito. Isso porque, como o título circulou, ele já não tem mais nenhuma
vinculação com o negócio jurídico que lhe deu origem.

Esses dois princípios acima elencados têm por objetivo conferir segurança jurídica ao tráfego comercial e à circulação
do crédito. Se a pessoa que recebeu um título de crédito (aparentemente válido) pudesse ficar sem o dinheiro por
força de vícios anteriores ou por conta de uma quitação que não consta na cártula, isso geraria um enorme risco ao
portador, o que desestimularia as pessoas a aceitarem títulos de crédito.

João invocou os arts. 288 e 290 do Código Civil para não pagar. Esse argumento, no presente caso, poderá ser
acolhido?

NÃO. Veja o que dizem esses dispositivos:


Art. 288. É ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante
instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1º do art. 654.

Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por
notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.

Embora o endosso, no interesse do endossatário terceiro de boa-fé, tenha efeito de cessão, não se aplica e não se
confunde com o instituto civilista da cessão de crédito. Em razão disso, não são aplicáveis os arts. 288 e 290 do
Código Civil para a obtenção, por meio tão somente do endosso de título de crédito à ordem, dos mesmos efeitos de
cessão de crédito.

Por um lado, como a duplicata tem aceite, o art. 15 da Lei das Duplicatas (Lei nº 5.474/68) estabelece que a cobrança
judicial de duplicata ou triplicata será efetuada de conformidade com o processo aplicável aos títulos executivos
extrajudiciais, não havendo necessidade de quaisquer outros documentos, além do título. O inciso II do mesmo
dispositivo estabelece que, apenas se a duplicata ou triplicata não for aceita, é necessário, cumulativamente, que haja
sido protestada e esteja acompanhada de documento hábil comprobatório da entrega e do recebimento da
mercadoria.

Por outro lado, o art. 25 da Lei da Duplicata esclarece que se aplicam à duplicata e à triplicata, no que couber, os
dispositivos da legislação sobre emissão, circulação e pagamento das Letras de Câmbio.

Em suma:

O endosso de duplicata mercantil com aceite a terceiro de boa-fé dispensa a necessidade de demonstração, pela
endossatária, da consumação de negócio de compra e venda de mercadorias subjacente.

Uma vez aceita, o sacado vincula-se ao título como devedor principal e a ausência de entrega da mercadoria ou de
prestação de serviços, ou mesmo quitação referente à relação fundamental ao credor originário, somente pode ser
oponível ao sacador, como exceção pessoal, mas não a endossatários de boa-fé.

A duplicata é título de crédito causal. Isso significa que, para sua regular constituição, deve haver uma prestação de
serviço. Essa causalidade, todavia, não lhe retira o caráter de abstração. Uma vez circulando o título, ao
endossatário não podem ser opostas as exceções.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.518.203-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/04/2021 (Info 694).

Questão 12

O crédito decorrente das astreintes aplicadas no bojo de processo trabalhista deve ser habilitado na recuperação judicial na classe dos
quirografários, e não na dos créditos trabalhistas.

CERTO Resposta correta


ERRADO

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

João, ex-empregado da Cerâmica Chiarelli S.A., ajuizou reclamação trabalhista contra a empresa.

Durante o curso do processo, o juiz do trabalho ordenou que a empresa cumprisse determinada ordem judicial, sob
pena de multa diária (astreintes) de R$ 5 mil.

Como a empresa atrasou 4 dias para cumprir a ordem, ela foi multada em R$ 20 mil.

Ao final, na sentença, o juiz condenou a empresa a pagar:

· R$ 100 mil, a título de verbas trabalhistas; e

· confirmou o pagamento de R$ 20 mil como astreintes.

Assim, o título executivo (sentença trabalhista) corresponde a um total de R$ 120 mil.

A sentença transitou em julgado.

Ocorre que, logo depois, foi decretada a recuperação judicial da Cerâmica Chiarelli S.A.

Diante disso, João habilitou seu crédito para ser recebido no processo de recuperação judicial.

Vale ressaltar que João pediu para os R$ 120 mil serem habilitados como crédito de natureza trabalhista.

A relevância disso está no fato de que os créditos trabalhistas possuem preferência em relação às outras classes de
crédito.

O pedido de João deve ser integralmente acolhido? Os R$ 120 mil deverão ser habilitados como crédito trabalhista?

NÃO. Os R$ 100 mil devem ser habilitados como crédito trabalhista e os R$ 20 mil relativos às astreintes enquadram-
se como créditos quirografários.

Por quê?

As astreintes possuem o propósito específico de coagir a parte a cumprir determinada obrigação imposta pelo juízo,
incutindo, em seu psicológico, o temor de sofrer sanção pecuniária decorrente de eventual inadimplemento. Desse
modo, as astreintes possuem um caráter coercitivo e intimidatório.

Trata-se, portanto, de técnica executiva, de viés puramente instrumental, destinada a instar a parte a cumprir,
voluntariamente (ainda que sem espontaneidade), a obrigação judicial.
O objetivo, portanto, é fazer com que se cumpra a ordem judicial. Vale ressaltar, no entanto, que se essa técnica
executiva se mostrar inócua, ou seja, se mesmo assim o devedor não cumprir a obrigação judicial, a multa será
aplicada como uma sanção. Assim, a multa efetivamente aplicada é uma penalidade processual imposta à parte. Não
haverá nenhuma finalidade ressarcitória pelos prejuízos eventualmente percebidos pela parte adversa em razão do
descumprimento da determinação judicial ou correlação com a prestação, em si, não realizada.

Resumindo:

- as astreintes, em princípio, têm uma finalidade coercitiva (intimidatória);

- se a ordem for descumprida e a multa aplicada, a finalidade passa a ser a de impor uma sanção pelo
descumprimento (caráter sancionatório);

- as astreintes não têm finalidades ressarcitória e não tem relação direta com o direito material que está sendo
discutido em juízo.

Desse modo, fato de a multa processual ter sido imposta em uma reclamação trabalhista não faz com que esta multa
passe a ter a mesma natureza jurídica do direito material ali discutido. Em outras palavras, as astreintes não terão
caráter trabalhista porque não possuem origem remuneratória ou indenizatória.

Primeiro, porque a obrigação judicial inadimplida, ensejadora da imposição de sanção pecuniária, não se confunde,
necessariamente, com o direito ao final reconhecido na reclamação trabalhista.

Segundo e principalmente, porque a sanção pecuniária imposta em razão do descumprimento da obrigação judicial, de
natureza processual, não possui nenhum conteúdo alimentar, que é, justamente, o critério justificador do privilégio
legal dado às retribuições trabalhistas de origens remuneratória e indenizatória.

Se for feita uma interpretação muito alargada do que seja “crédito trabalhista” isso pode até servir para beneficiar um
trabalhador em específico, mas, por outro lado, irá gerar indesejado desequilíbrio no processo concursal de credores,
sobretudo na classe dos trabalhistas, em manifesta violação ao princípio da par conditio creditorum (princípio da
igualdade entre os credores).

Em suma:

O crédito decorrente das astreintes aplicadas no bojo de processo trabalhista deve ser habilitado na recuperação
judicial na classe dos quirografários, e não na dos créditos trabalhistas.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.804.563-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 25/08/2020 (Info 679).

Questão 13

Em se tratando de pedido de patente de fármacos, competia à Anvisa analisar, nos termos do art. 229-C da Lei nº 9.279/96, previamente à
análise do INPI, quaisquer aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos - ainda que extraídos dos requisitos de patenteabilidade
(novidade, atividade inventiva e aplicação industrial) - que lhe permitam inferir se a outorga de direito de exclusividade (de produção, uso,
comercialização, importação ou licenciamento) poderá ensejar situação atentatória à saúde pública.

CERTO Resposta correta


ERRADO

Comentários
INPI

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da Economia,
sendo responsável, no Brasil, pela concessão e garantia dos direitos de propriedade intelectual para a indústria.

Patente

Patente é um título de propriedade temporária concedido pelo INPI para a pessoa que inventou um novo produto, um
novo processo ou para quem fez aperfeiçoamentos destinados à aplicação industrial.

A patente, concedida ao autor de uma invenção ou de um modelo de utilidade, é o direito de, durante determinado
tempo, só ele explorar economicamente essa invenção ou modelo de utilidade. Veja o que diz o art. 6º Lei nº 9.279/96:

Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe
garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei.

Existe, no Brasil, patente de produtos ou processos farmacêuticos?

Para responder isso, é importante fazermos um breve histórico:

· a concessão de patentes de produtos e processos farmacêuticos era proibida no Brasil, por força do art. 9º, letra “c”,
da Lei nº 5.772/71 (antigo Código da Propriedade Industrial);

· no final dos anos 1980, em virtude da não patenteabilidade de produtos e processos farmacêuticos — o que
contrariava os interesses de muitos laboratórios internacionais —, o País passou a sofrer sanções comerciais
unilaterais, na forma de sobretaxa de 100% sobre a importação de produtos brasileiros dos setores farmacêutico,
eletroeletrônico e de papel e celulose. O impasse entre Brasil e Estados Unidos gerou a abertura de processo de
solução de controvérsia no âmbito do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), sistema econômico multilateral de
normas e concessões tarifárias criado em 1947, cujas regras e

princípios foram incorporados pela Organização Mundial de Comércio (OMC), fundada em 1995;

· a superação dessa controvérsia começou a se resolver em 1994, quando o Estado brasileiro assinou o Acordo sobre
Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio (o chamado Acordo TRIPS);

· o Decreto nº 1.355/94 incorporou no Brasil o Acordo TRIPS (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade
Intelectual Relacionados ao Comércio);

· O que foi o Acordo TRIPS? Eminglês: “Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights”.Em
português: Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Foi um tratado
Internacional, integrante do conjunto de acordos assinados por diversos países, em 1994, que encerrou a “Rodada
Uruguai” e criou a Organização Mundial do Comércio (OMC). O Acordo TRIP estabeleceu, em seu artigo 27.1, a
proibição de se discriminarem áreas tecnológicas para fins de patente. Isso obrigou os Estados-membros a considerar
patenteável qualquer invenção, de produto ou processo, em todos os setores tecnológicos, sem restrições.

· O Brasil precisou se adaptar ao artigo 27.1 do Acordo TRIPS. Em razão desse compromisso assumido no plano
internacional, o Brasil precisou adaptar sua legislação para permitir a patente de produtos ou processos nas áreas
agroquímica e farmacêutica. Isso porque, como já mencionado, a Lei brasileira proibia essa patente.

· em 1996, foi editada a Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), que revogou a Lei nº 5.772/71 e incorporou as
disposições protetivas dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio previstas no Acordo TRIPS,
passando, a partir de então, a se admitir, no Brasil, a patente de produtos e processos farmacêuticos.

· em 1999, o Presidente da República editou a Medida Provisória 2.006, de 14 de dezembro de 1999 — convertida,
posteriormente, na Lei nº 10.196/2001 —, que introduziu o art. 229-C na Lei de Propriedade Industrial, condicionando a
concessão de patentes de fármacos à anuência prévia da ANVISA;

· em 2021, após o julgado do STJ que está sendo aqui comentado, a Lei nº 14.195/2021 revogou o art. 229-C da Lei nº
9.279/96.

Como era a concessão de patente de produtos e processos farmacêuticos com base no art. 229-C da Lei nº
9.279/96?

Oart. 229-C da Lei nº 9.279/96 dizia que a concessão de patentes para produtos e processos farmacêuticos dependia
da prévia anuência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

Assim, a indústria farmacêutica pedia o registro do produto ou processo farmacêutico no INPI.

Em seguida, o INPI emitia parecer técnico sobre o pedido de patente.

Se este fosse favorável, ainda se tinha que aguardar a manifestação da ANVISA, que era exigida com base no art. 229-
C da Lei nº 9.279/96, que dizia o seguinte:

Art. 229-C. A concessão de patentes para produtos e processos farmacêuticos dependerá da prévia anuência
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA.

(Incluído pela Lei nº 10.196/2001)

(Posteriormente revogado pela Lei nº 14.195/2021)

Existia uma gigantesca discussão jurídica sobre a abrangência desse art. 229-C. Qual era o grau de análise da
ANVISA a respeito do pedido? A agência tinha uma atuação restrita avaliando apenas eventuais riscos do produto à
saúde humana ou fazia uma análise ampla, que incluía outros aspectos?

O exame feito pela ANVISA era amplo. Conforme decidiu o STJ:


Em se tratando de pedido de patente de fármacos, compete à Anvisa analisar - previamente à análise do INPI -
quaisquer aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos - ainda que extraídos dos requisitos de
patenteabilidade (novidade, atividade inventiva e aplicação industrial) - que lhe permitam inferir se a outorga de
direito de exclusividade (de produção, uso, comercialização, importação ou licenciamento) poderá ensejar situação
atentatória à saúde pública.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.543.826-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 05/08/2021 (Info 703).

A ANVISA, mesmo sendo uma agência detentora de conhecimento especializado no setor de saúde, quando fazia a
análise para esse “ato de anuência prévia” do art. 229-C da Lei nº 9.279/96, podia adentrar no exame de quaisquer
aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos, ainda que relacionados com a análise dos requisitos de
patenteabilidade (novidade, atividade inventiva e aplicação industrial). Isso porque essa análise era fundamental para a
ANVISA examinar se a outorga do direito de exclusividade representaria potencial prejuízo às políticas públicas do SUS
voltadas a garantir a assistência farmacêutica à população.

A atuação da ANVISA neste caso tinha, portanto, uma função redistributiva, na qual se procurava conciliar o interesse
privado (relacionado com o direito de exclusividade da exploração lucrativa da invenção) com as metas e os objetivos
de interesses públicos relacionados com as políticas de saúde.

O mister institucional da ANVISA no processo de concessão de patentes farmacêuticas não se confunde com o
controle sanitário de medicamentos, drogas e insumos farmacêuticos, realizado no âmbito do procedimento de
registro.

Interpretação baseada na conjugação das Leis 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), 9.782/99 (Lei da ANVISA) e
10.742/2003 (Lei do setor farmacêutico)

O art. 18, I, da Lei nº 9.279/96 afirma que não pode ser patenteado aquilo que for contrário à saúde pública.

A expressão “saúde pública” tem significado mais amplo que “saúde individual”. Não se resume a tratamento ou a
recuperação de doença, mas sim compreende o conjunto de medidas preventivas e de controle de enfermidades
destinadas a garantir o bem-estar físico, mental e social de todos e de cada um dos membros da coletividade, o que
inclui ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica e a formulação de política de medicamentos.

O art. 6º da Lei nº 9.782/99 prevê que a finalidade institucional da ANVISA é a de promover a proteção da saúde da
população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos
à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem
como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras.

O art. 7º também da Lei nº 9.782/99 afirma que compete à ANVISA a correção de falhas de mercado do setor de
fármacos, mediante o monitoramento da evolução dos preços de medicamentos, podendo a agência reguladora, para
tanto, requisitar informações, proceder ao exame de estoques ou convocar os responsáveis para explicarem conduta
indicativa de infração à ordem econômica, tais como a imposição de preços excessivos ou aumentos injustificados
(inciso XXV).

A Lei nº 10.742/2003, por sua vez, estabelece normas de regulação do setor farmacêutico, com a finalidade de
promover a assistência farmacêutica à população, por meio de mecanismos que estimulem a oferta de medicamentos
e a competitividade do setor.
ANVISA fazia a regulação econômico-social do setor de medicamentos

Nessa perspectiva, a estipulação da “anuência prévia” da autarquia especial, como condição para a concessão da
patente farmacêutica, tem por base o seu papel de regulação econômico-social - ou socioeconômica - do setor de
medicamentos, que se justifica pelos mandamentos extraídos da Carta Magna, no sentido da necessária
harmonização do direito à propriedade industrial com os princípios da função social, da livre concorrência e da defesa
do consumidor, assim como o interesse social encartado no dever do Estado de, observada a cláusula de reserva do
possível, conferir concretude ao direito social fundamental à saúde (arts. 5º, incisos XXIII, XXIX, 6º, 170, incisos III, IV e
V, e 196).

O parecer negativo da ANVISA era meramente opinativo ou tinha caráter vinculativo?

Tinha caráter vinculativo.

À luz da norma legal analisada (art. 229-C da Lei nº 9.279/96), a exigência de anuência prévia da ANVISA constituía
pressuposto de validade da concessão de patente de produto ou processo farmacêutico. Logo, o parecer negativo da
ANVISA, em casos nos quais demonstrada a contrariedade às políticas de saúde pública, não deveria ser considerado
como um simples “subsídio” à tomada de decisão do INPI. Essa recusa da ANVISA tinha caráter vinculativo.

Nas palavras do Min. Luis Felipe Salomão:

“Desse modo, reconhecendo-se a anuência prévia da Anvisa como pressuposto de validade da concessão de
patente de produto ou processo farmacêutico, é certo que o respectivo parecer negativo, em casos nos quais
demonstrada a contrariedade às políticas de saúde pública, não pode ser adotado apenas como subsídio à
tomada de decisão do INPI. O caráter vinculativo da recusa de anuência é, portanto, indubitável.”

Questão 14

(Delegado PC/BA 2018 VUNESP) Poderá requerer a recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas
atividades empresariais pelo período mínimo de seis meses.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Recuperação judicial

A recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da situação
de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam preservados os
empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.

A recuperação judicial consiste, portanto, em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com
o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência.

Fases da recuperação
De forma resumida, a recuperação judicial possui três fases:

a) postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho de processamento;

b) processamento: vai do despacho de processamento até a decisão concessiva;

c) execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação judicial.

Requisitos para a recuperação judicial

A recuperação judicial é um processo judicial, ou seja, é um pedido que será formulado ao juiz.

Para isso, no entanto, é necessário que a devedora cumpra alguns requisitos previstos no art. 48 da Lei nº
11.101/2005:

Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas
atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:

I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as
responsabilidades daí decorrentes;

II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;

III - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial
de que trata a Seção V deste Capítulo;

IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por
qualquer dos crimes previstos nesta Lei

Requisito temporal de 2 anos

O primeiro requisito para que a empresa possa requerer a recuperação judicial é que ela esteja exercendo regulamente
suas atividades há, no mínimo, 2 anos (caput do art. 48) no momento do pedido.

O prazo de 2 anos tem como objetivo principal conceder a recuperação judicial apenas a empresários ou a sociedades
empresárias que se acham, de certo modo, consolidados no mercado e que apresentem certo grau de viabilidade
econômico-financeira capazes de justificar o sacrifício dos credores.

Segundo Marlon Tomazzete, apenas em relação a empresas sérias, relevantes e viáveis “é que se justifica o sacrifício
dos credores em uma recuperação judicial. Uma empresa exercida há menos de dois anos ainda não possui relevância
para a economia que justifique a recuperação.” (Curso de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. São
Paulo: Atlas, 2011, p. 60).

Questão 15
(Juiz TJ/MT 2018 VUNESP) O possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples apresentação ao
devedor, exceto se o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Art. 905 do Código Civil

O art. 905 do CC, caput, estabelece que o possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada,
mediante a sua simples apresentação ao devedor, e o parágrafo único estipula que a prestação é devida ainda que o
título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente:

Art. 905. O possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples
apresentação ao devedor.

Parágrafo único. A prestação é devida ainda que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do
emitente.

Portanto, é temerário para o direito cambial, para a circulação dos títulos de crédito, que se admita a quitação de
crédito cambial, sem a exigência do resgate da cártula, notadamente se ensejar prejuízo a terceiro de boa-fé.

Questão 16

O STF declarou a constitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96, que preconiza: “O prazo de vigência não será inferior a
10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a
hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força
maior.”

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
INPI

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da Economia,
sendo responsável, no Brasil, pela concessão e garantia dos direitos de propriedade intelectual para a indústria.

Patente

Patente é um título de propriedade temporária concedido pelo INPI para a pessoa que inventou um novo produto, um
novo processo ou para quem fez aperfeiçoamentos destinados à aplicação industrial.
A patente, concedida ao autor de uma invenção ou de um modelo de utilidade, é o direito de, durante determinado
tempo, só ele explorar economicamente essa invenção ou modelo de utilidade. Veja o que diz o art. 6º Lei nº 9.279/96:

Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe
garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei.

Direitos

A patente confere os seguintes direitos ao seu titular:

Art. 42. A patente confere ao seu titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir,
usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos:

I - produto objeto de patente;

II - processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado.

§ 1º Ao titular da patente é assegurado ainda o direito de impedir que terceiros contribuam para que outros
pratiquem os atos referidos neste artigo.

§ 2º Ocorrerá violação de direito da patente de processo, a que se refere o inciso II, quando o possuidor ou
proprietário não comprovar, mediante determinação judicial específica, que o seu produto foi obtido por
processo de fabricação diverso daquele protegido pela patente.

Depósito do pedido junto ao INPI

O procedimento para obtenção da patente tem início com o depósito do pedido no INPI, que deverá ser instruído com
uma série de documentos e informações.

Em regra, a patente deverá ser requerida junto ao INPI pelo próprio autor, em nome próprio.

Poderá também ser requerida pelos herdeiros ou sucessores do autor, pelo cessionário ou por aquele a quem a lei ou o
contrato de trabalho ou de prestação de serviços determinar que pertença a titularidade (art. 6º, § 2º, da Lei nº
9.279/96).

Proteção conferida pela patente retroage

É importante destacar que, expedida a carta-patente, surge para o titular o direito de obter indenização pela exploração
indevida do objeto patenteado, inclusive em relação ao período entre a publicação do pedido e a concessão da
patente, como preceitua o art. 44 da Lei:
Art. 44. Ao titular da patente é assegurado o direito de obter indenização pela exploração indevida de seu
objeto, inclusive em relação à exploração ocorrida entre a data da publicação do pedido e a da concessão da
patente.

Assim sendo, uma vez concedida a patente, a proteção por ela conferida retroage a momento inicial do processo, o
que funciona como uma contenção (um desestímulo) aos concorrentes que cogitem explorar indevidamente o objeto
protegido durante a tramitação do pedido.

A proteção patentária, portanto, não se inicia apenas com a decisão final de deferimento do pedido, sendo
interessante notar que a lei considera o requerente como presumivelmente legitimado a obter a patente, salvo prova
em contrário, conforme o art. 6º, § 1º, da LPI.

Prazo de vigência das patentes

Em regra, a vigência da patente observará os prazos fixos de 20 anos para invenções e de 15 anos para modelos de
utilidade, contados da data de depósito, conforme o caput do art. 40 da Lei:

Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15
(quinze) anos contados da data de depósito.

A Lei de Propriedade Intelectual prevê, contudo, uma regra adicional no parágrafo único do mesmo dispositivo: a
contar da data de concessão da patente, o prazo de vigência não será inferior a 10 anos para a patente de invenção e a
7 anos para a patente de modelo de utilidade:

Art. 40 (...)

Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete)
anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI
estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de
força maior.

Assim, por exemplo, se o INPI demorar 10 anos para deferir um requerimento de patente de invenção, essa patente
vigerá por mais 10 anos, de modo que, ao final do período de vigência, terão transcorrido 20 anos desde o depósito.
Repare que, neste caso, o prazo do caput foi respeitado.

Por outro lado, se a autarquia demorar 15 anos para deferir o pedido, estando garantido que a patente vigerá por mais
10 anos desde a concessão (regra do parágrafo único), ao final do período de vigência terão transcorrido 25 anos
desde a data do depósito. Repare que, neste segundo caso, o titular terá gozado dos privilégios da patente por mais
tempo do que o previsto no caput do art. 40.
Problema do parágrafo único: gera um prazo variável de proteção

Vê-se, portanto, que o parágrafo único do art. 40 estabelece um prazo variável de proteção, pois esse depende do
tempo de tramitação de cada processo administrativo.

Ademais, caso o INPI demore mais de 10 anos, no caso da invenção, ou mais de 8 anos, no caso do modelo de
utilidade, para proferir uma decisão final, o período total do privilégio ultrapassará o tempo de vigência previsto no
caput do art. 40.

E depois que terminar o prazo da patente?

Findo o prazo de vigência da patente, a proteção extingue-se e seu objeto passa a ser considerado de domínio público,
conforme o art. 78, I e parágrafo único, da Lei:

Art. 78. A patente extingue-se:

I - pela expiração do prazo de vigência;

(...)

Parágrafo único. Extinta a patente, o seu objeto cai em domínio público.

ADI

O Procurador-Geral da República ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra o parágrafo único do art. 40 da Lei
nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial).

O PGR alegou que o parágrafo único, ao impor esse prazo mínimo de vigência contado depois da concessão, acaba
por tornar o prazo de proteção indeterminado, já que não se sabe quanto tempo demorará para o INPI conceder.

Em caso de atraso na análise dos pedidos por muitos anos (o que acontece em alguns casos), a patente ultrapassaria
os prazos máximos previstos no caput do art. 40.

Para o autor, essa indeterminação do prazo viola o art. 5º, XXIX, da CF/88, que afirma que o privilégio de utilização dos
inventos deve ser temporário:

Art. 5º (...)

XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como
proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos
distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;
O STF concordou com os argumentos do PGR?

SIM. O STF, por maioria, julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40
da Lei nº 9.279/96. Vencidos os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux.

A norma impugnada contraria a segurança jurídica, a temporalidade da patente, a função social da propriedade
intelectual, a duração razoável do processo, a eficiência da administração pública, a livre concorrência e a defesa do
consumidor e o direito à saúde.

Segurança jurídica

Como o prazo do parágrafo único só começa a ser contado a partir da data de concessão da patente e como não se
sabe quando o INPI terminará a análise do pedido, a conclusão que se chega é a de que o parágrafo único do art. 40
traz a previsão de um prazo indeterminado.

Ocorre que isso gera insegurança jurídica e ofende o próprio Estado Democrático de Direito.

A previsibilidade quanto ao prazo de vigência das patentes é essencial para que os agentes de mercado (depositantes,
potenciais concorrentes e investidores) possam fazer escolhas racionais.

A ausência de regras claras dá margem ao arbítrio e à utilização oportunista e anti-isonômica das regras do jogo, tais
como as estratégias utilizadas pelos depositantes para prolongar o período de exploração exclusiva dos produtos.

Temporalidade da patente

Para além de representar ofensa à segurança jurídica, a norma questionada subverte a própria essência do art. 5º,
XXIX, da Constituição Federal, que determina que seja assegurada por lei a proteção à propriedade industrial mediante
um privilégio temporário, com observância do interesse social e do desenvolvimento tecnológico e econômico do País.

Conforme já demonstrado, o parágrafo único do art. 40 da Lei de Propriedade Industrial (LPI) não observa o quesito da
temporariedade, pois, ao se vincular a vigência da patente à data de sua concessão, ou seja, indiretamente, ao tempo
de tramitação do respectivo processo no INPI, se indetermina o prazo de vigência do benefício, o que concorre para a
extrapolação dos prazos previstos no caput do art. 40 e para a falta de objetividade e previsibilidade de todo o
processo.

Função social da propriedade

A norma questionada também enseja violação da função social da propriedade intelectual:

Art. 5º (...)

XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;


Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)

III - função social da propriedade;

Bens incorpóreos não são exceção à imposição constitucional de observância à função social da propriedade e, como
tais, demandam a harmonização de interesses individuais e coletivos.

A temporariedade da patente permite a harmonização da proteção à inventividade com o cumprimento da função


social da propriedade, pois, apesar de resguardar os direitos dos autores de inventos ou modelos de utilidade por um
período determinado, incentivando e remunerando os investimentos em inovação, garante ao restante da indústria e à
sociedade a possibilidade de se apropriar dos benefícios proporcionados pelos produtos da criatividade, a partir da
extinção dos privilégios de sua exploração.

Se por um lado a CF/88 concede o privilégio da proteção à propriedade industrial, por outro, garante que, a partir de
determinado prazo, os demais agentes da indústria venham a se igualar ao titular da patente na possibilidade de
exploração do objeto protegido, liberando-o à lógica concorrencial do mercado.

O prolongamento arbitrário do privilégio vem em prejuízo do mercado como um todo, pois proporciona justamente o
que a Constituição buscou reprimir, ou seja, a dominação dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento
arbitrário dos lucros, aprofundando a desigualdade entre os agentes econômicos e transformando o que era
justificável e razoável em inconstitucional.

Livre concorrência e a defesa do consumidor

A falta de justa limitação temporal das patentes evidencia contrariedade à livre concorrência e à defesa do
consumidor, pois o adiamento da entrada da concorrência no mercado possui sérios impactos sobre os preços dos
produtos e, consequentemente, sobre o acesso dos consumidores a tais produtos.

A CF/88, ao promover uma ordem econômica em que haja competição entre os agentes do mercado de forma
igualitária, busca garantir, também, a liberdade de escolha dos consumidores, cujo exercício depende da multiplicidade
de opções.

Duração razoável do processo e eficiência da administração pública

Observa-se, ademais, que a prorrogação do prazo de vigência da patente prevista no parágrafo único do art. 40 da LPI,
ao tempo em que não contribui para a solução do atraso crônico dos processos submetidos ao INPI, acaba por induzir
o descumprimento dos prazos previstos no caput do dispositivo.

A norma ameniza as consequências da mora administrativa e prolonga o período de privilégio usufruído pelos
depositantes, em prejuízo dos demais atores do mercado, além da Administração Pública, incorrendo, assim, em direta
afronta aos princípios da razoável duração do processo e da eficiência administrativa.
Direito à saúde

Por fim, é necessário mencionar que o parágrafo único gera um prolongamento excessivo de patentes relacionadas
com a indústria farmacêutica, o que faz com que haja uma violação ao direito à saúde.

O domínio comercial proporcionado pela patente por períodos muito longos tem impacto no acesso da população a
serviços públicos de saúde, uma vez que onera o sistema ao eliminar a concorrência e impor a aquisição de itens
farmacêuticos por preço estipulado unilateralmente pelo titular do direito, acrescido do pagamento de royalties sobre
os itens patenteados que o Poder Público adquire e distribui. Consequentemente, a extensão do prazo de vigência das
patentes afeta diretamente as políticas públicas de saúde do País e obsta o acesso dos cidadãos a medicamentos,
ações e serviços de saúde, dando concretude aos prejuízos causados não apenas a concorrentes e consumidores,
mas principalmente àqueles que dependem do SUS para garantir sua integridade física e sua sobrevivência.

Em suma:

É inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96, segundo o qual os prazos de vigência de
patentes e de modelos de utilidade podem ser prorrogados na hipótese de o Instituto Nacional de Propriedade
Industrial (INPI) estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou
por motivo de força maior.

STF. Plenário. ADI 5529/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 12/5/2021 (Info 1017).

Modulação dos efeitos

O Plenário, por maioria, modulou os efeitos da decisão de declaração de inconstitucionalidade, nos seguintes termos:

Em regra, a decisão proferida nesta ADI 5529 terá eficácia ex nunc.

Assim, os efeitos da decisão de declaração de inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da LPI são ex nunc,
contados a partir da publicação da ata de julgamento. Logo, ficam mantidas as extensões de prazo concedidas com
base no art. 40, parágrafo único, mantendo, assim, a validade das patentes já concedidas e ainda vigentes em
decorrência do aludido preceito.

Exceções. Existem duas situações nas quais a decisão produzirá efeitos ex tunc:

a) em relação às ações judiciais propostas até o dia 7 de abril de 2021, inclusive (data da concessão parcial da medida
cautelar no presente processo); e

b) as patentes que tenham sido concedidas com extensão de prazo relacionadas a produtos e processos
farmacêuticos e a equipamentos e/ou materiais de uso em saúde.
Em ambas as situações, opera-se o efeito ex tunc, o que resultará na perda das extensões de prazo concedidas com
base no parágrafo único do art. 40 da LPI, respeitado o prazo de vigência da patente estabelecido no caput do art. 40
da Lei nº 9.279/96 e resguardados eventuais efeitos concretos já produzidos em decorrência da extensão de prazo
das referidas patentes.

Questão 17

Não é possível o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente da pessoa jurídica originalmente executada pela suposta prática
de crime falimentar se ainda não houve o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
É possível o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente da pessoa jurídica originalmente executada pela suposta
prática de crime falimentar mesmo que não tenha havido ainda o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Se há indícios e/ou provas de prática de ato de infração à lei (penal), a hipótese se subsume ao art. 135 do CTN.

Importante acrescentar que mesmo a eventual absolvição em ação penal não conduz necessariamente à revogação do
redirecionamento, pois o ato pode não constituir ilícito penal, e, mesmo assim, continuar a representar infração à lei civil,
comercial, administrativa, etc. (independência das esferas civil, lato sensu, e penal).

É por essa razão que caberá ao juiz natural, competente para processar e julgar a execução fiscal, analisar, caso a caso, o conteúdo
da denúncia pela prática de crime falimentar e decidir se cabe ou não o redirecionamento. Não é necessário, portanto, aguardar o
trânsito em julgado da sentença penal condenatória para que o Juízo da Execução Fiscal analise o pleito de redirecionamento da
execução contra o sócio.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.792.310-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 04/02/2020 (Info 678).

Questão 18

O teto cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) se aplica ao montante total do fundo instituído por concessionárias, não à quota-parte
devida a cada associado.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Fundo Garantidor de Créditos (FGC)

Fundo Garantidor de Créditos (FGC) é uma entidade privada, sem fins lucrativos, que administra um mecanismo de
proteção às pessoas que possuem depósitos ou investimentos no Sistema Financeiro Nacional.

Assim, por exemplo, se um banco passa por um processo de intervenção, de liquidação extrajudicial ou mesmo de
falência, o FGC assegura que os correntistas irão receber de volta os valores depositados. Vale ressaltar, no entanto,
que existe um limite (um “teto”) que é garantido pelo FGC.

Atualmente, o valor máximo garantido é de R$ 250 mil. Desse modo, se a pessoa tinha R$ 300 mil depositados no
banco que “quebrou”, ela receberá R$ 250 mil do FGC e deverá tentar buscar os R$ 50 mil restantes da instituição
financeira (se conseguir).
Imagine agora a seguinte situação hipotética:

Foi instituído um fundo formado por 10 concessionárias de veículos, sendo administrado pela associação que
representa essas concessionárias.

Esse fundo foi constituído para aglutinar todo o dinheiro que as concessionárias utilizariam para fazer marketing na
imprensa sobre os carros que elas vendem.

Assim, todos contribuíam e o fundo contratava as peças publicitárias.

Os recursos financeiros desse fundo eram depositados numa conta do Banco BMD.

Ocorre que essa instituição financeira entrou em liquidação extrajudicial e as concessionárias não conseguiram
receber do banco o valor depositado.

O FGC foi acionado.

Suponhamos que havia R$ 2 milhões depositados.

As concessionárias argumentaram que deveriam receber do FGC os R$ 2 milhões considerando que o fundo é
composto por 10 concessionárias. Logo, cada uma delas teria direito ao teto cobertura de R$ 250 mil (250 mil x 10 = 2
milhões e 500 mil).

A tese das concessionárias encontrou abrigo no STJ?

NÃO. O pedido não foi acolhido pelo STJ.

O teto cobertura do FGC deverá ser aplicado para o fundo (e não para cada concessionária que dele faz parte).

STJ. 3ª Turma. REsp 1.758.951-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 04/08/2020 (Info 678).

Assim, em nosso exemplo, o fundo todo terá direito de receber R$ 250 mil e ele (fundo) deverá dividir essa quantia
entre as concessionárias.

No caso, embora os valores depositados na conta corrente não integrassem o patrimônio da associação, eles também
não integravam o patrimônio individual dos associados, mas o patrimônio do fundo.

Desse modo, a associação não agiu diretamente como mandatária ou representante dos associados, mas como
administradora do fundo instituído pelas concessionárias associadas.

A associação deve ser considerada uma única investidora, para fins de cobertura, fazendo jus somente ao teto do FGC.

Outro julgado com o mesmo raciocínio


O STJ já havia decidido que, se um fundo de previdência possui aplicações em uma instituição que “quebra”, o teto de
cobertura do FGC se aplica para o montante do fundo (e não para cada um dos investidores individualmente
considerado):

(...) 1. Pretensão de entidade fechada de previdência complementar de que o valor resguardado pelo Fundo
Garantidor de Créditos (FGC) seja considerado individualmente para cada um dos seus participantes, em face da
falência do Banco Santos.

2. O Fundo Garantidor de Créditos, entidade privada sem fins lucrativos, com criação autorizada pelo Conselho
Monetário Nacional, tem por finalidade proteger titulares de créditos contra instituições financeiras a ele associadas,
prestando aos pequenos investidores suporte financeiro mediante as contribuições que reúne dos integrantes do
sistema.

3. O FGC integra uma rede de proteção bancária para a garantia do equilíbrio do sistema, atuando como um seguro
de depósitos dos pequenos investidores.

4. Estabelecido no regulamento do FGC que as entidades investidoras, como a demandante, terão o total dos seus
investimentos salvaguardados até o limite de vinte mil reais ( R$ 20.000,00), a pulverização dessa garantia a cada um
dos participantes do plano de previdência, além de afrontar o regulamento, pode conduzir ao indesejável
desequilíbrio do fundo, comprometendo os seus fins institucionais. (...)

STJ. 3ª Turma. REsp 1453957/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 02/06/2015.

FGC destina-se a proteger os “pequenos” investidores

O FGC exerce uma função social de proteção do pequeno investidor, que tem condições limitadas de avaliação de
risco, estimulando, assim, a participação do cidadão comum no mercado financeiro.

Verifica-se, portanto, que a pretendida garantia de grandes valores, aplicados por investidores qualificados, como é o
caso de uma instituição de previdência complementar, não se insere nos objetivos da garantia ordinária do FGC,
podendo prejudicar a finalidade para a qual foi criado o Fundo, criando risco moral, na medida em que incentivaria o
investimento em instituições financeiras de conduta arrojada e arriscada, em detrimento de bancos que efetuam
aplicações mais responsáveis e, por esse motivo, em geral, menos lucrativas.

Questão 19

São constitucionais o estabelecimento de um limite máximo de 150 (cento e cinquenta) salários mínimos aos créditos de natureza trabalhista,
bem como a definição de créditos com privilégio especial, conforme previsto no art. 83, I, e IV, “c”, da Lei 11.101/2005.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
O caso concreto foi o seguinte:

Em 2005, foi aprovada a Lei nº 11.101, conhecida como Lei de Falências e Recuperação Judicial.
No mesmo ano, a Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade
no Supremo, com pedido de liminar, contra dispositivos da Lei nº 11.101/2005.

A entidade sindical impugnou os seguintes dispositivos:

· art. 83, I e VI, alínea “c”;

· art. 83, § 4º;

· art. 84, V (atual art. 84, I-E);

· art. 86, II.

Vejamos o que decidiu o STF:

Art. 83, I e VI, alínea “c”

Esses dispositivos estabelecem que os créditos derivados da legislação trabalhista têm prioridade na ordem
classificatória de atendimento, porém limita-os a 150 salários-mínimos por credor. Os demais são considerados
credores quirografários:

Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:

I - os créditos derivados da legislação trabalhista, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por
credor, e aqueles decorrentes de acidentes de trabalho;

(...)

VI - os créditos quirografários, a saber:

c) os saldos dos créditos derivados da legislação trabalhista que excederem o limite estabelecido no inciso I do
caput deste artigo;

A autora questionou esse limite, afirmando que ele ofenderia “o princípio da igualdade, haja vista que todos os
trabalhadores são trabalhadores, e não é constitucional assegurar a alguns a possibilidade de auferir a integralidade
de seus direitos e a outros, uma parcela limitada”.

Esse dispositivo é constitucional. O STF já havia decidido assim em 2009: STF. Plenário. ADI 3934, Rel. Ricardo
Lewandowski, julgado em 27/05/2009. Na ocasião, afirmou o Min. Lewandowski:

“A própria legislação internacional de proteção ao trabalhador contempla a possibilidade do estabelecimento de


limites legais aos créditos de natureza trabalhista, desde que preservado o mínimo essencial à sobrevivência do
empregado
Esse entendimento encontra expressão no art. 7.1 da Convenção 173 da Organização Internacional do Trabalho -
OIT (Convenção sobre a Proteção dos Créditos Trabalhistas em Caso de Insolvência do Empregador), segundo o
qual a “legislação nacional poderá limitar o alcance do privilégio dos créditos trabalhistas a um montante
estabelecido, que não deverá ser inferior a um mínimo socialmente aceitável”.

Embora essa Convenção não tenha sido ainda ratificada pelo Brasil, é possível afirmar que os limites adotados
para a garantia dos créditos trabalhistas no caso de falência ou recuperação judicial de empresas encontram
respaldo nas normas adotadas no âmbito da OIT, entidade integrante da Organização das Nações Unidas que
tem por escopo fazer com que os países que a integram adotem padrões mínimos de proteção aos
trabalhadores.

Nesse aspecto, as disposições da Lei nº 11.101/2005 abrigam uma preocupação de caráter distributivo,
estabelecendo um critério o mais possível equitativo no que concerne ao concurso de credores. Em outras
palavras, ao fixar um limite máximo – bastante razoável - para que os créditos trabalhistas tenham um
tratamento preferencial, a Lei nº 11.101/2005 busca assegurar que essa proteção alcance trabalhadores, ou seja,
justamente aqueles que auferem os menores salários.

Procurou-se, assim, preservar, em uma situação de adversidade econômica por que passa a empresa, o caráter
isonômico do princípio da par condicio creditorum, segundo o qual todos os credores que concorrem no
processo de falência devem ser tratados com igualdade, respeitada a categoria que integram.”

Assim, sendo a causa de pedir aberta e não havendo motivos de fato ou de direito que autorizem a superação do
entendimento firmado no julgamento da referida ação direta, o STF ratificou a constitucionalidade do art. 83, I e IV, c,
da Lei 11.101/2005.

São constitucionais o estabelecimento de um limite máximo de 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos aos
créditos de natureza trabalhista, bem como a definição de créditos com privilégio especial, conforme previsto no
art. 83, I, e IV, “c”, da Lei 11.101/2005.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

Art. 83, § 4º

O § 4º do art. 83 dizia que os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão quirografários (não terão preferência em
relação aos demais), na hipótese de cessão de crédito:

Art. 83 (...)

§ 4º Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.

Para a CNPL, isso afrontaria o direito de propriedade (art. 5º, XII da Constituição Federal), “visto restringir a
disponibilidade da coisa”.
Esse dispositivo foi revogado pela Lei nº 14.112/2020.

Diante disso, o STF declarou a perda do objeto quanto a esse § 4º do art. 83.

Art. 84, V (atual art. 84, I-E)

O art. 84 lista os créditos que serão considerados extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os
mencionados no art. 83 da lei impugnada, colocando, em seu inciso V, as obrigações resultantes de atos jurídicos
válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 da lei, ou após a declaração de falência, e
tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência:

LEI DE FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL (LEI 11.101/2005)

Antes da Lei 14.112/2020 Depois da Lei 14.112/2020

Art. 84. Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos


com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na
ordem a seguir, os relativos a:

V – obrigações resultantes de I-E - às obrigações resultantes de


atos jurídicos válidos praticados atos jurídicos válidos praticados
durante a recuperação judicial, durante a recuperação judicial,
nos termos do art. 67 desta Lei, nos termos do art. 67 desta Lei,
ou após a decretação da ou após a decretação da
falência, e tributos relativos a falência;
fatos geradores ocorridos após a
decretação da falência,
respeitada a ordem estabelecida
no art. 83 desta Lei.
Para a CNPL, as despesas decorrentes da etapa recuperatória ou após a decretação da quebra não podem ter o
mesmo tratamento das despesas obrigatórias da massa falida - remuneração dos administradores, quantias
fornecidas à massa pelos credores, custas processuais etc. Nas palavras da autora:

“Dir-se-á que, sem isso, não haverá estímulo à recuperação da empresa, mas esta, por mais estimulável que seja, não
pode ter lugar às expensas do sacrifício geral de todos os créditos, em especial os trabalhistas, aqui defendidos”.

O STF rejeitou os argumentos da entidade:

É constitucional a precedência conferida aos créditos “extraconcursais” decorrentes de obrigações resultantes de


atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, ou após a decretação da falência, e de tributos
relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

A regra tem por objetivo estimular os fornecedores de bens e serviços a negociar com a empresa em recuperação, a
despeito da fragilidade de sua situação financeira, confessada e divulgada publicamente quando do requerimento de
recuperação.

A preservação da empresa depende da continuidade dos negócios e, para tanto, é necessário que os novos credores
tenham garantia de que serão pagos. Caso contrário, não haverá interessados em continuar contratando com a
empresa em recuperação judicial.

Ademais, diante da função de promover a justiça social da tributação, justifica-se também a precedência em relação
aos tributos cujos fatos geradores tenham ocorrido durante a recuperação judicial ou após a decretação da falência.

Art. 86, II

O inciso II do art. 86 determina que será feita a restituição em dinheiro da importância entregue ao devedor, decorrente
de adiantamento a contrato de câmbio para exportação:

Art. 86 (...)

II - da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de


câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o
prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da
autoridade competente;

Para a CNPL, o pedido de restituição é medida portadora de potencialidade esvaziadora dos recursos da massa falida.

O STF, contudo, não concordou com os argumentos da autora.


A restituição de adiantamento de contrato de câmbio para a exportação não trata de um mero contrato de mútuo, em
que a quantia emprestada pelo banco mutuante se incorporaria — imediatamente — ao patrimônio do mutuário no
momento da contratação.

O adiantamento a contrato de câmbio é, em verdade, um contrato de compra e venda de moeda a termo, uma vez que
a concretização da operação de câmbio somente ocorrerá no momento em que o exportador cumprir com a obrigação
(enviando o bem ou prestando o serviço no exterior) e for paga a contraprestação (em moeda estrangeira) pelo
importador. Assim, a instituição financeira repassa recursos em moeda nacional ao exportador antes que ele efetive a
transação internacional de venda de mercadorias ou prestação de serviços.

Cuida-se, portanto, de um mecanismo de grande valia para que as transações internacionais se perfectibilizem,
possibilitando aos exportadores utilizarem as quantias antecipadas para produção dos bens que serão enviados ao
exterior, como capital de giro ou, ainda, para aproveitamento de melhores oportunidades negociais.

Desse modo, caso a empresa exportadora não entregue a moeda estrangeira à instituição financeira que a comprou
antecipadamente, a riqueza previamente aportada pelo banco não pode ser considerada como patrimônio da massa
falida, sendo absolutamente razoável e devida a previsão legal que determina a sua restituição ao verdadeiro titular
antes do pagamento dos demais credores.

Em suma:

É legítima a restituição em dinheiro de valor adiantado ao devedor-falido, oriundo de adiantamento de contrato de


câmbio para exportação.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

Na mesma assentada, o STF também declarou compatível com a CF/88 a regra do art. 75, § 3º da Lei nº 4.728/65, que
diz:

Art. 75. O contrato de câmbio, desde que protestado por oficial competente para o protesto de títulos, constitui
instrumento bastante para requerer a ação executiva.

§ 1º Por esta via, o credor haverá a diferença entre a taxa de câmbio do contrato e a da data em que se efetuar
o pagamento, conforme cotação fornecida pelo Banco Central, acrescida dos juros de mora.

§ 2º Pelo mesmo rito, serão processadas as ações para cobrança dos adiantamentos feitos pelas instituições
financeiras aos exportadores, por conta do valor do contrato de câmbio, desde que as importâncias
correspondentes estejam averbadas no contrato, com anuência do vendedor.

§ 3º No caso de falência ou concordata, o credor poderá pedir a restituição das importâncias adiantadas, a que
se refere o parágrafo anterior.

Assim, o STF decidiu que:


É constitucional o art. 86, II, da Lei nº 11.101/2005.

O art. 75, § 3º, da Lei nº 4.728/65 foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988.

STF. Plenário. ADPF 312/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 16/4/2021
(Info 1013).

Com a decisão acima, o STF afirma que é válido o entendimento manifestado na Súmula 307 do STJ:

Súmula 307-STJ: A restituição de adiantamento de contrato de câmbio, na falência, deve ser atendida antes de
qualquer crédito.

Questão 20

Para o fim de submissão aos efeitos da recuperação judicial, considera-se que a existência do crédito é determinada pela data em que ocorreu
o seu fato gerador.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Imagine agora a seguinte situação hipotética:

Em janeiro de 2017, Lucas consumiu leite estragado comprado no Supermercado BR.

Em fevereiro de 2017, ele ajuizou ação de indenização por danos morais contra o Supermercado.

Ocorre que a referida empresa vinha enfrentando realmente sérias dificuldades econômicas e, em setembro de 2017,
ingressou com pedido de recuperação judicial, que foi aceito.

Em outubro de 2017, o juiz julgou o pedido de Lucas procedente e condenou a empresa a pagar R$ 50 mil ao
consumidor. Houve o trânsito em julgado.

Diante disso, Lucas ingressou com pedido de habilitação de seu crédito no processo de recuperação judicial.

No entanto, o juiz da recuperação judicial não aceitou o pedido sob a alegação de que o crédito do consumidor se
constituiu com a sentença, o que ocorreu em data posterior ao ajuizamento da recuperação judicial. Assim, para o
magistrado, o crédito de Lucas não está sujeito à recuperação judicial, conforme prevê o art. 49 da Lei nº 11.101/2005:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não
vencidos.

Agiu corretamente o magistrado?


NÃO. Realmente, por força do art. 49 da Lei nº 11.101/2005, os créditos posteriores ao pedido de recuperação judicial
não se submetem aos seus efeitos. Nesse sentido: STJ. 4ª Turma. AgRg no AgRg no REsp 1494870/DF, Rel. Min. Marco
Buzzi, julgado em 06/09/2016. Assim, o juiz está certo quando afirma isso.

Qual foi, no entanto, o equívoco do magistrado? Considerar que o crédito de Lucas surgiu apenas com a sentença. Isso
não é verdade.

O crédito de Lucas decorreu do ato ilícito praticado pelo Supermercado, fato ocorrido antes do pedido de recuperação
judicial.

A constituição de um crédito pressupõe a existência de um vínculo jurídico entre as partes e não se encontra
condicionada a uma decisão judicial. Em outras palavras, o crédito surge antes da sentença, que apenas declara a
existência do crédito.

Assim, tratando-se de vínculo jurídico decorrente de evento que causou dano ao consumidor, a constituição do crédito
correspondente não se dá com a prolação da decisão judicial que o reconhece e o quantifica, mas com a própria
ocorrência daquele evento.

O sujeito prejudicado (em nosso exemplo, Lucas) assume a posição de credor da reparação civil derivada de ato lesivo
contra ele intentado desde sua prática, e não com a declaração judicial de sua ocorrência. Tanto é assim que, nas
hipóteses de responsabilidade civil extracontratual, o marco inicial de fluência dos juros decorrentes da mora do
devedor são contados da data do evento danoso (Súmula 54/STJ).

Para fins de submissão à recuperação judicial (art. 49), considera-se existente o crédito na data de seu fato gerador

A partir da interpretação do art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005, conclui-se que a existência do crédito é determinada
pela data de seu fato gerador (e não pela data do trânsito em julgado da sentença que o reconhece).

Isso fica muito evidente quando se imagina o seguinte: o crédito poderia ter sido satisfeito independentemente de
sentença judicial, bastando que houvesse um acordo entre as partes. Disso decorre que a existência do crédito não
depende de declaração judicial.

Obrigação é diferente de responsabilidade

Não se pode confundir os conceitos de obrigação e de responsabilidade.

A existência do crédito está diretamente ligada à relação jurídica que se estabelece entre o devedor e credor. A partir
do momento em que ocorre o fato gerador (no caso, esse fato gerador foi o consumo do leite estragado) é formada
uma relação jurídica entre as partes e surge o direito de exigir a prestação (direito de crédito).

Exemplos de fato gerador que fazem surgir a obrigação:

· na relação trabalhista, é a prestação do trabalho (com a realização do trabalho, surge o direito ao crédito);

· na relação de prestação de serviços, o fato gerador é a realização do serviço;

· na responsabilidade civil contratual, o vínculo jurídico precede a ocorrência do ilícito que faz surgir o dever de
indenizar.
· na responsabilidade jurídica extracontratual, o liame entre as partes se estabelece no instante da ocorrência do
evento danoso. Assim, ocorrido o ato lesivo, surge o direito ao crédito relativo à reparação dos danos causados.

Desse modo, os créditos submetidos aos efeitos da recuperação judicial são aqueles decorrentes da atividade do
empresário antes do pedido de recuperação, isto é, fatos praticados ou negócios celebrados pelo devedor em
momento anterior ao pedido de recuperação judicial, excetuados aqueles expressamente apontados na lei de
regência.

Conforme explica Marlon Tomazette:

“(...) A princípio, sujeitam-se à recuperação judicial todos os créditos existentes à data do pedido, ainda que não
vencidos (Lei n. 11.101/2005 – art. 49). A aferição da existência ou não do crédito na data do pedido levará em
conta o fato gerador do crédito, isto é, a data da fonte da obrigação. Assim, serão levadas em conta as datas de
emissão de títulos de crédito, de conclusão dos contratos e da prestação de serviços pelos empregados. Os
créditos posteriores ao pedido também têm sua importância, mas os titulares desses créditos não são sujeitos à
recuperação judicial”. (Curso de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. Vol. 3. 7ª ed. São
Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 100

Nessa linha, foi editado o Enunciado n. 100 da III Jornada de Direito Comercial, que tem o seguinte teor: “Consideram-
se sujeitos à recuperação judicial, na forma do art. 49 da Lei n. 11.101/2005, os créditos decorrentes de fatos
geradores anteriores ao pedido de recuperação, independentemente da data de eventual acordo, sentença ou trânsito
em julgado.”

Em resumo, ocorrido o fato gerador, surge o direito de crédito, sendo o adimplemento e a responsabilidade elementos
subsequentes, não interferindo na sua constituição.

Diante disso, conclui-se que a submissão do crédito aos efeitos da recuperação judicial não depende de sentença que
o declare ou o quantifique, menos ainda de seu trânsito em julgado, bastando a ocorrência do fato gerador.

A tese fixada pelo STJ foi a seguinte:

Para o fim de submissão aos efeitos da recuperação judicial, considera-se que a existência do crédito é
determinada pela data em que ocorreu o seu fato gerador.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.842.911-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 09/12/2020 (Recurso Repetitivo –
Tema 1051) (Info 684).

Questão 21

Na Sociedade Anônima de capital fechado, não fixado prazo para que seja lavrado o termo no Livro de Transferência de Ações Nominativas, é
indispensável a interpelação do devedor para que fique caracterizada a mora.

CERTO Resposta correta


ERRADO

Comentários
Sociedade anônima (SA)

Sociedade anônima é...

- uma espécie de sociedade de capital (em regra),

- que tem seu capital social dividido em ações,

- sócios com responsabilidade limitada e

- que tem natureza sempre empresarial (art. 982, parágrafo único, do CC).

A sociedade anônima é também chamada de “companhia”.

Regulamentação

As sociedades anônimas são regulamentadas pela Lei nº 6.404/76 (Lei das SA).

Nesse sentido, veja o que diz o art. 1.809 do Código Civil:

Art. 1.089. A sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se-lhe, nos casos omissos, as disposições
deste Código.

Responsabilidade dos sócios

Cada sócio da sociedade anônima é titular de determinado número de ações, sendo chamado de acionista.

A responsabilidade dos sócios (acionistas) é limitada ao preço de emissão das ações, conforme previsto no art. 1º da
Lei nº 6.404/76:

Art. 1º A companhia ou sociedade anônima terá o capital dividido em ações, e a responsabilidade dos sócios
ou acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas.

Aberta ou fechada

A sociedade anônima pode ser:


a) aberta: existe a possibilidade de que seus valores mobiliários sejam negociados no mercado de capitais (formado
pela bolsa de valores e pelo mercado de balcão). Para tanto, é necessária uma prévia autorização e registro perante a
Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

b) fechada: não existe possibilidade de negociar seus valores mobiliários no mercado de capitais. Um exemplo de
sociedade anônima fechada é o Grupo Globo.

Existem outras diferenças entre elas, no entanto, essa é, sem dúvidas, a mais relevante.

Confira o art. 4º da Lei das SA:

Art. 4º Para os efeitos desta Lei, a companhia é aberta ou fechada conforme os valores mobiliários de sua
emissão estejam ou não admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários.

Ações

O capital social da companhia é dividido em ações, segundo previsto no estatuto.

Por exemplo, a Petrobrás – que é uma sociedade anônima aberta – possui pouco mais de 13 bilhões de ações
negociáveis no mercado.

Ações nominativas e escriturais

Existem várias classificações das ações. Uma delas divide as ações em nominativas e escriturais.

a) nominativas: ocorre quando as ações são transferidas por meio de termo lavrado em um livro próprio da sociedade
anônima denominado “Livro de Transferência de Ações Nominativas”.

Nesse sentido, confira o que diz o § 1º do art. 31 da Lei das SA:

Art. 31 (...)

§ 1º A transferência das ações nominativas opera-se por termo lavrado no livro de “Transferência de Ações
Nominativas”, datado e assinado pelo cedente e pelo cessionário, ou seus legítimos representantes.

Na prática, somente encontramos ações nominativas em sociedades anônimas fechadas. Isso porque exige-se um
grande trabalho manter esses livros, sendo inviável em uma companhia aberta.
b) escriturais: ocorre quando as ações são transferidas mediante registro feito por uma instituição financeira em uma
conta de depósito aberta em nome dos titulares das ações.

Em regra, as ações escriturais são utilizadas pelas sociedades anônimas abertas.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:

A parte A1 e a parte A2 celebraram contrato por meio do qual a parte A1 combinou de transferir para a parte A2 ações
nominativas de uma sociedade anônima fechada.

A parte A2 pagou o preço combinado pelas ações.

Ocorre que a parte A1. até o presente momento, não lavrou o termo no Livro de Transferência de Ações Nominativas.

Nem a lei nem o contrato firmado entre as partes preveem prazo para que seja feita essa lavratura.

Neste caso, como não há prazo estipulado, a partir de que momento pode-se dizer que a parte cedente (A1) está
inadimplente? A partir de que momento a inércia do cedente passou a significar inadimplemento?

Como não há prazo previsto nem no estatuto nem no contrato, o credor (A2) terá que fazer uma interpelação do
devedor (A1) para que ele cumpra a sua parte e lavre o termo. Somente a partir dessa notificação, pode-se dizer que o
devedor está em mora.

Foi o que decidiu o STJ:

Na Sociedade Anônima de capital fechado, não fixado prazo para que seja lavrado o termo no Livro de Transferência
de Ações Nominativas, é indispensável a interpelação do devedor para que fique caracterizada a mora.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.645.757, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 06/04/2021 (Info 693).

E qual é a importância de se definir o momento da mora do cedente?

Constituído em mora o devedor, surge para o credor (cessionário) o direito de:

· pedir a resolução do contrato; ou

· exigir-lhe o cumprimento, com a cumulação de perdas e danos.

Questão 22

O Ministério Público não é parte legítima para recorrer da decisão que fixa os honorários do administrador na recuperação judicial.

CERTO

ERRADO Resposta correta


Comentários
Administrador judicial

Administrador judicial é uma pessoa escolhida pelo juiz para auxiliá-lo na condução do processo de falência
praticando determinados atos que estão elencados no art. 22 da Lei nº 11.101/2005.

Na antiga Lei de Falências, o administrador judicial era chamado de “síndico”.

O administrador judicial deve ser um profissional idôneo, preferencialmente advogado, economista administrador de
empresas ou contador. Pode ser também uma pessoa jurídica especializada neste tipo de atividade (art. 21 da Lei).

Remuneração do administrador judicial

O administrador judicial é um profissional (ou uma empresa e precisará, obviamente, ser remunerado pelos serviços
que prestar em prol do processo de falência.

O valor e a forma de pagamento da remuneração do administrador judicial são fixados pelo juiz, observados alguns
critérios estabelecidos pelo art. 24 da Lei:

· capacidade de pagamento do devedor;

· grau de complexidade do trabalho; e

· os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes.

Os parágrafos do art. 24 trazem outras regras específicas sobre a remuneração do administrador judicial.

Quem é responsável pelo pagamento da remuneração do administrador judicial?

Caberá ao devedor ou à massa falida arcar com as despesas relativas à remuneração do administrador judicial e das
pessoas eventualmente contratadas para auxiliá-lo (art. 25 da Lei).

Se o juiz fixar a remuneração do administrador judicial e o Ministério Público não concordar com os critérios
estabelecidos, o Promotor de Justiça tem legitimidade para recorrer contra essa decisão?

SIM.

O Ministério Público é parte legítima para recorrer da decisão que fixa os honorários do administrador na
recuperação judicial.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.884.860-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/10/2020 (Info 682).
O art. 52, V, da Lei nº 11.101/2005 afirma que o Ministério Público deve ser intimado da decisão que defere o
processamento da recuperação judicial:

Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da
recuperação judicial e, no mesmo ato:

(...)

V - ordenará a intimação eletrônica do Ministério Público e das Fazendas Públicas federal e de todos os
Estados, Distrito Federal e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento, a fim de que tomem
conhecimento da recuperação judicial e informem eventuais créditos perante o devedor, para divulgação aos
demais interessados. (Redação dada pela Lei nº 14.112/2020)

Isso significa que o Ministério Público intervém na recuperação judicial.

O art. 179, II, do CPC, por sua vez, prevê que o Ministério Público pode recorrer em todos os processos nos quais
intervir:

Art. 179. Nos casos de intervenção como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público:

(...)

II - poderá produzir provas, requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer.

Desse modo, a interpretação conjunta da regra do art. 52, V, da LFRE com o que prevê o art. 179, II, do CPC/2015
evidencia a legitimidade do Ministério Público para recorrer contra a decisão que fixa os honorários do administrador
na recuperação judicial.

No caso concreto, o Parquet recorreu porque considerou muito elevada a remuneração fixada ao administrador da
recuperação judicial. Logo, está plenamente justificada a interposição do recurso pelo MP como decorrência de sua
atuação como fiscal da ordem jurídica, pois é seu papel institucional zelar, em nome do interesse público (função
social da empresa), para que não sejam constituídos créditos capazes de inviabilizar a consecução do plano de
soerguimento.

Questão 23

A cártula, contendo todos os requisitos essenciais previstos no art. 2º, § 1º, da Lei das Duplicatas, tem validade e eficácia de duplicata,
mesmo que não siga rigorosamente as medidas do modelo estabelecido na Resolução do Bacen nº 102/1968 e tenha, também, a descrição
da mercadoria objeto da compra e venda e uma fatura da mercadoria objeto da negociação.

CERTO Resposta correta

ERRADO
Comentários
Conceito de duplicata

Duplicata é...

- um título de crédito

- que consiste em uma ordem de pagamento emitida pelo próprio credor

- por conta de mercadorias que ele vendeu ou de serviços que prestou

- e que estão representados em uma fatura

- devendo ser paga pelo comprador das mercadorias ou pelo tomador dos serviços.

Título de crédito genuinamente brasileiro

A duplicata foi criada pelo direito brasileiro, sendo considerada um título genuinamente brasileiro.

Regulamentação

A duplicata é regida pela Lei nº 5.474/68 e pela Lei nº 13.775/2018.

Requisitos

O § 1º do art. 2º da Lei nº 5.474/68 prevê os requisitos da duplicata. Confira:

Art. 2º (...)

§ 1º A duplicata conterá:

I - a denominação “duplicata”, a data de sua emissão e o número de ordem;

II - o número da fatura;

III - a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista;

IV - o nome e domicílio do vendedor e do comprador;

V - a importância a pagar, em algarismos e por extenso;

VI - a praça de pagamento;

VII - a cláusula à ordem;


VIII - a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada pelo
comprador, como aceite, cambial;

IX - a assinatura do emitente.

Resolução BACEN 102/1968

O art. 27 da Lei das Duplicatas (Lei nº 5.474/68) previu que o Conselho Monetário Nacional (CMN) deveria editar
norma definindo como deveria ser o padrão formal das duplicatas.

Cumprindo essa determinação, foi editada a Resolução nº 102, do Bacen, que divulgou o modelo de duplicata
aprovado pelo CMN.

Essa Resolução traz a imagem de como deve ser a duplicata e prevê, inclusive, os tamanhos que deverão ser adotados
pela cártula:

· Altura: mínima de 148mm e máxima de 152mm.

· Largura: mínima de 203mm e máxima de 210mm.

Apenas a título de curiosidade, esta é a imagem que consta na Resolução para a duplicata de venda mercantil:

Imagem em preto e branco<br /> <br /> Descrição gerada automaticamente

Vejamos, agora, o caso concreto:

O STJ enfrentou um caso concreto no qual foi emitida uma duplicata que continha todos os requisitos do art. 2º, § 1º,
da Lei nº 5.474/68.

Ocorre que essa duplicata possuía dois “problemas”:

· continha, em seu corpo, a descrição da mercadoria objeto da compra e venda e uma fatura da mercadoria objeto da
negociação. Isso, contudo, não é previsto nem na Lei nem na Resolução como informação que deva estar presente;

· além disso, ela não respeitava rigorosamente as dimensões máxima e mínima exigidas pela Resolução.

Essa duplicata, mesmo com as irregularidades acima mencionadas, continua sendo válida e eficaz?

SIM.
A cártula, contendo todos os requisitos essenciais previstos no art. 2º, § 1º, da Lei das Duplicatas, tem validade e
eficácia de duplicata, mesmo que não siga rigorosamente as medidas do modelo estabelecido na Resolução do
Bacen nº 102/1968 e tenha, também, a descrição da mercadoria objeto da compra e venda e uma fatura da
mercadoria objeto da negociação.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.518.203-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/04/2021 (Info 694).

Modalidades de duplicata

Existem três modalidades de duplicata:

a) a cartular, assinada em papel;

b) as assinadas por certificado digital, denominadas no mercado de securitização de recebíveis de “duplicata digital”;

c) as correspondentes às informações presentes nos boletos bancários, inicialmente denominadas de “duplicata


virtual” ou “eletrônica”, a teor da mais técnica nominação atribuída pela Lei nº 13.775/2018, “duplicata sob a forma
escritural”.

Na prática, com o desenvolvimento da tecnologia, houve a desmaterialização da duplicata, que deixou de ser feita em
papel e foi transformada em “registros eletromagnéticos”, transmitidos por computador pelo comerciante ao banco.

O banco, por seu turno, faz a cobrança, mediante expedição de simples aviso ao devedor (os chamados boletos), de tal
modo que o título em si, na sua expressão de cártula, somente vai surgir se o devedor se mostrar inadimplente.

Na imensa maioria dos casos, contudo, a duplicata mercantil será “virtual”.

Requisitos estão previstos no art. 2º, § 1º da Lei

Vale observar que os requisitos essenciais da duplicata, os quais devem ser devidamente supridos sob pena de retirar
o valor de título de crédito do documento estão claramente previstos no art. 2º, § 1º, da Lei das Duplicatas.

Assim, a imprecisão das medidas formais da cártula caracteriza mera e irrelevante irregularidade, cuja pecha de
inexistência não encontra respaldo nos usos e costumes, caracterizando formalismo totalmente incompatível com o
direito empresarial, isto é, não caracteriza vício que afete a validade e eficácia do título de crédito.

Vale ressaltar que não é compatível com a boa-fé objetiva que a sacada dê o aceite sem nenhuma oposição e,
contraditoriamente, venha a dizer que o documento não caracteriza duplicata.

O art. 113 do Código Civil dispõe que os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do
lugar de sua celebração.

Não é comum que o sacado e endossatários se valham de régua, por ocasião, respectivamente, do aceite e da
operação de endosso, para aferição do preenchimento preciso das dimensões de largura e altura da cártula.
Igualmente, não parece razoável o entendimento de que, como a cártula apresenta também a descrição da mercadoria
objeto da compra e venda e uma fatura da mercadoria objeto da negociação, desnatura e descaracteriza por completo
o título como duplicata.

Questão 24

Não se pode arguir como matéria de defesa, em impugnação de crédito incidente à recuperação judicial, a existência de abusividade em
cláusulas dos contratos de que se originou o crédito impugnado.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

A sociedade empresária “ABC” está sofrendo processo de recuperação judicial.

O Banco habilitou um crédito para receber no processo de recuperação judicial.

A empresa recuperanda questionou o crédito do Banco, apresentando ao juiz uma impugnação do crédito, nos termos
do art. 8º e do art. 13 da Lei nº 11.101/2005:

Art. 8º No prazo de 10 (dez) dias, contado da publicação da relação referida no art. 7º, § 2º, desta Lei, o Comitê,
qualquer credor, o devedor ou seus sócios ou o Ministério Público podem apresentar ao juiz impugnação contra a
relação de credores, apontando a ausência de qualquer crédito ou manifestando-se contra a legitimidade,
importância ou classificação de crédito relacionado.

Parágrafo único. Autuada em separado, a impugnação será processada nos termos dos arts. 13 a 15 desta Lei.

Art. 13. A impugnação será dirigida ao juiz por meio de petição, instruída com os documentos que tiver o
impugnante, o qual indicará as provas consideradas necessárias.

Parágrafo único. Cada impugnação será autuada em separado, com os documentos a ela relativos, mas terão
uma só autuação as diversas impugnações versando sobre o mesmo crédito.

Na impugnação, a empresa “ABC” afirma que os R$ 300 mil cobrados pelo Banco são decorrente de um contrato
assinado entre elas. Ocorre que esse contrato seria nulo por conter uma cláusula abusiva quanto aos juros cobrados.

O Banco refutou o argumento afirmando que essa matéria (abusividade de cláusula contratual) não poderia ser
discutida em impugnação de crédito.
Quem tem razão: a empresa “ABC” ou a “RZZ”? Em uma impugnação de crédito incidente à recuperação judicial é
possível que a empresa recuperanda alegue e que o juiz reconheça a existência de abusividade na cláusula do
contrato de que se originou o crédito impugnado?

SIM.

Pode-se arguir como matéria de defesa, em impugnação de crédito incidente à recuperação judicial, a existência de
abusividade em cláusulas dos contratos de que se originou o crédito impugnado.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.799.932-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 01/09/2020 (Info 679).

O incidente de impugnação de crédito configura procedimento de cognição exauriente, possibilitando o pleno


contraditório e a ampla instrução probatória, em rito semelhante ao ordinário (arts. 13 e 15 da Lei nº 11.101/2005).

Não há, na Lei nº 11.101/2005, qualquer restrição à defesa que pode ser apresentada na impugnação de crédito, não
se tratando de procedimento simplificado ou mais célere, mas de procedimento semelhante ao ordinário.

Diante disso, devem ser examinadas todas as alegações trazidas pela recuperanda, o que inclui a eventual existência
de abusividades nas cláusulas contratuais relativas aos encargos moratórios que o impugnante busca acrescer aos
seus créditos.

Questão 25

Em ação de infração de patente e desenho industrial, não é possível a arguição incidental de nulidade de tais direitos de propriedade industrial,
como matéria de defesa, perante a justiça estadual.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários

Competência para declarar a nulidade do registro de MARCA

Imagine a seguinte situação:

A empresa Goiás Refrigerantes S/A registrou, no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), a marca JOCA
COLA.

Ao tomar conhecimento disso, a “The Coca Cola Company” ajuizou ação contra a empresa Goiás Refrigerantes S/A e
contra o INPI pedindo a nulidade desse registro.

A autora alegou que a marca impugnada JOCA COLA causa confusão nos consumidores com a marca COCA-COLA,
registrada anteriormente.

A competência para julgar essa demanda será da Justiça Federal.

A competência para examinar qualquer alegação de nulidade do registro de uma marca é da Justiça Federal. Isso
porque, nessa situação, haverá interesse jurídico do INPI na demanda, considerando que foi essa autarquia federal que
concedeu o registro, incidindo, portanto, na hipótese do art. 109, I, da CF/88:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição
de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à
Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

No mesmo sentido, prevê a Lei nº 9.279/96:

Art. 175. A ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor,
intervirá no feito.

Vale ressaltar que a Justiça Estadual não pode declarar a nulidade do registro da marca nem mesmo incidentalmente
em uma ação na qual dois particulares discutem quem pode usar a marca

Imagine agora outra situação:

A Escola de Educação Infantil Poliedro Ltda. propôs ação contra o Sistema de Ensino Poliedro Vestibulares Ltda.
pedindo que o réu fosse proibido de utilizar o termo “Poliedro” como marca.

A competência para julgar essa ação é da Justiça Estadual porque não há interesse direto e específico do INPI, sendo
uma disputa entre particulares.

O réu apresentou reconvenção alegando que ele é quem é o titular (detentor) da marca “Poliedro”.

A Justiça Estadual, incidentalmente, decidiu que essa palavra (“Poliedro”) não poderia ter sido registrada como marca.
Logo, o registro seria nulo.

Essa decisão não foi acertada porque a Justiça Estadual não tem competência para declarar a nulidade do registro de
marca, mesmo que incidentalmente em uma ação de obrigação de não fazer. Nesse sentido:

Não pode o Tribunal de Justiça Estadual, em ação de abstenção de uso de marca, afastar o pedido da proprietária da
marca declarando a nulidade do registro ou irregularidade da marca, eis que lhe carece competência.

STJ. 4ª Turma. REsp 1393123-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 18/02/2020 (Info 667).

Competência para declarar a nulidade do registro de PATENTE E DESENHO INDUSTRIAL

Patente
Patente é um título de propriedade temporária concedido pelo INPI para a pessoa que inventou um novo produto, um
novo processo ou para quem fez aperfeiçoamentos destinados à aplicação industrial. Em outras palavras, a patente é
concedida ao autor de uma invenção ou de um modelo de utilidade.

Desenho industrial

O desenho industrial protege a configuração externa de um objeto tridimensional ou um padrão ornamental


(bidimensional) que possa ser aplicado a uma superfície ou a um objeto. O desenho industrial insere no mercado uma
inovação estética em objeto comum ou facilmente reproduzível em escala industrial.

Para que um desenho possa ser registrado como “desenho industrial”, ele deverá preencher os seguintes requisitos:

a) Novidade (é um conceito difícil de explicar; significa que o desenho não pode ser nenhum que já existe segundo o
estado atual da técnica);

b) Originalidade (deve ter uma configuração visual diferente dos outros já existentes);

c) Utilização ou aplicação industrial (deve ser possível reproduzir este desenho industrialmente).

Obs: tanto a patente como o desenho industrial são registrados no INPI.

De quem é a competência para julgar ação na qual se pede a nulidade do registro de patente ou a nulidade de
desenho industrial?

Justiça Federal. A ação na qual se pede a nulidade do registro de patente ou de desenho industrial deve ser proposta
contra o INPI e julgada na Justiça Federal (art. 109, I, da CF/88 e art. 175 da Lei nº 9.279/96).

E se o pedido de nulidade for incidental, será possível que seja apreciado pela Justiça Estadual?

Imagine a seguinte situação hipotética:

Alan é um inventor. Ele idealiza coisas novas.

Alan registrou, no INPI, uma patente e um desenho industrial.

Determinado dia, Alan percebeu que uma empresa estava utilizando, sem a sua autorização, produto que violava a sua
patente. Além disso, a mesma empresa usava, indevidamente, o seu desenho industrial em um produto.

Diante disso, ele ajuizou ação de infração contra a empresa pedindo para que a ré se abstenha de fabricar e
comercializar qualquer produto relacionado com a sua patente e com seu desenho industrial.

A empresa se defendeu alegando a nulidade do registro da patente e a nulidade do registro do desenho industrial.
Essa alegação pode ser feita na Justiça Estadual? O juiz estadual poderá julgar a ação de infração levando em
consideração essa alegação de nulidade do registro?

SIM.

Em ação de infração de patente e desenho industrial, é possível a arguição incidental de nulidade de tais direitos de
propriedade industrial, como matéria de defesa, perante a justiça estadual.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.843.507-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 06/10/2020 (Info 682).

Quanto à MARCA, vimos acima que o art. 175 da Lei de Propriedade Industrial exige que a ação de nulidade do registro
de marca seja ajuizada no foro da Justiça Federal, devendo o INPI, quando não for o autor, necessariamente intervir no
feito. Não há, na lei, qualquer exceção a essa regra.

Quanto à PATENTE e ao DESENHO INDUSTRIAL, a situação é diferente.

O art. 56, § 1º e o art. 118, da Lei nº 9.279/96 preveem a possibilidade de arguição da nulidade de patentes e de
desenhos industriais como matéria de defesa em ações de infração, de competência da Justiça Estadual,
dispensando, nesses casos, a participação do INPI. Veja:

Art. 56. A ação de nulidade poderá ser proposta a qualquer tempo da vigência da patente, pelo INPI ou por
qualquer pessoa com legítimo interesse.

§ 1º A nulidade da patente poderá ser arguida, a qualquer tempo, como matéria de defesa.

(...)

Art. 118. Aplicam-se à ação de nulidade de registro de desenho industrial, no que couber, as disposições dos
arts. 56 e 57.

O STJ, ao interpretar esses dispositivos, entende que, embora, não seja possível o reconhecimento incidental da nulidade
de marcas, o exame incidenter tantum da nulidade de patentes e de desenhos industriais se mostra perfeitamente
possível, decorrendo essa possibilidade de determinação expressa de lei.

Não haveria aí uma violação à competência da Justiça Federal?


NÃO. Isso porque a competência federal para julgamento das ações de nulidade de registro de patente ou de desenho
industrial é uma competência determinada em razão da pessoa (presença do INPI), e não em razão da matéria.

Não é a Constituição Federal, mas sim a própria Lei nº 9.279/96 quem determina a participação do INPI nas ações de
nulidade de marcas, patentes e desenhos industriais, respectivamente nos arts. 175, 57 e 118.

Não há qualquer óbice, portanto, a que essa mesma lei preveja uma exceção a essa regra nos arts. 56, § 1º, e 118,
ressalvando expressamente a possibilidade de arguição da nulidade de patentes e de desenhos industriais como
matéria de defesa em ações de infração, de competência da Justiça Estadual, dispensando, nesses casos, a
participação do INPI.

Não faz coisa julgada material

Vale ressaltar, por fim, que o reconhecimento da nulidade de patentes e de desenhos industriais pelo juízo estadual,
por ocorrer apenas incidenter tantum, não faz coisa julgada e não opera efeitos para fora do processo, tendo apenas o
condão de levar à improcedência do pedido veiculado na ação de infração.

Questão 26

Não é cabível a fixação de honorários advocatícios sucumbenciais em procedimento de homologação do plano de recuperação extrajudicial.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Recuperação extrajudicial

Além da recuperação judicial e da falência, a Lei nº 11.101/2005 (LFRE) trouxe outra solução para que sociedades
empresárias em situação de crise econômico-financeira possam se reabilitar e continuar suas atividades: a
recuperação extrajudicial, prevista nos arts. 161 a 167 do diploma legal em questão:

Art. 161. O devedor que preencher os requisitos do art. 48 desta Lei poderá propor e negociar com credores
plano de recuperação extrajudicial.

(...)

Trata-se, em linhas gerais, de um meio formal de acordo especial entabulado entre o devedor e seus credores que, sob
certas circunstâncias, pode ser imposto a uma minoria que oferecer resistência à sua efetivação, haja vista o fato de a
LFRE privilegiar o interesse social na manutenção da atividade empresarial sobre os interesses específicos de cada
um dos credores.
Imagine agora a seguinte situação hipotética:

Leader S/A ingressou com pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial perante o Juízo da 3ª Vara
Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro - RJ, apontando um endividamento de R$ 200 milhões e afirmando que
credores que representam mais da metade dos créditos anuíram com a reestruturação financeira proposta:

Art. 163. O devedor poderá tambe?m requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial que obriga
todos os credores por ele abrangidos, desde que assinado por credores que representem mais da metade dos
créditos de cada espécie abrangidos pelo plano de recuperação extrajudicial.

Houve várias impugnações apresentadas pelos credores, conforme autoriza o art. 164 da LFRE:

Art. 164. Recebido o pedido de homologação do plano de recuperação extrajudicial previsto nos arts. 162 e 163
desta Lei, o juiz ordenará a publicação de edital eletrônico com vistas a convocar os credores do devedor para
apresentação de suas impugnações ao plano de recuperação extrajudicial, observado o disposto no § 3º deste
artigo.

(...)

§ 3º Para opor-se, em sua manifestação, à homologação do plano, os credores somente poderão alegar:

I – não preenchimento do percentual mínimo previsto no caput do art. 163 desta Lei;

II – prática de qualquer dos atos previstos no inciso III do art. 94 ou do art. 130 desta Lei, ou descumprimento
de requisito previsto nesta Lei;

III – descumprimento de qualquer outra exigência legal.

§ 4º Sendo apresentada impugnação, será aberto prazo de 5 (cinco) dias para que o devedor sobre ela se
manifeste.

O juiz decidiu rejeitar o plano, nos termos do § 5º do art. 164:

Art. 164 (...)

§ 5º Decorrido o prazo do § 4º deste artigo, os autos serão conclusos imediatamente ao juiz para apreciação
de eventuais impugnações e decidirá, no prazo de 5 (cinco) dias, acerca do plano de recuperação extrajudicial,
homologando-o por sentença se entender que não implica prática de atos previstos no art. 130 desta Lei e que
não há outras irregularidades que recomendem sua rejeição.

A empresa interpôs apelação (art. 164, § 5º) e o Tribunal de Justiça, reconhecendo a presença dos requisitos legais,
deu provimento ao recurso e, com base nisso, homologou o plano.
Vale ressaltar, contudo, que o TJ deixou de fixar honorários sucumbenciais em favor dos advogados da empresa
recuperanda, argumentando que:

- não haveria previsão na Lei nº 11.101/2005 para condenação em honorários; e

- a decisão proferida seria meramente homologatória de transação.

Agiu corretamente o TJ ao rejeitar o pedido de honorários advocatícios?

NÃO.

Havendo impugnação pelos credores, é cabível a fixação de honorários advocatícios sucumbenciais em


procedimento de homologação do plano de recuperação extrajudicial.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.924.580-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/06/2021 (Info 702).

De fato, a Lei nº 11.101/2005 é silente quanto à possibilidade ou não de arbitramento de honorários advocatícios
sucumbenciais nas hipóteses de deferimento ou de rejeição do pedido de homologação do plano de recuperação
extrajudicial apresentado pelo devedor.

Todavia, o art. 189 desse diploma legal determina que, aos procedimentos nela previstos (recuperação judicial,
extrajudicial e falência), devem ser aplicados de forma supletiva (“no que couber”) as disposições do Código de
Processo Civil. Como se sabe, o art. 85, caput, do CPC/2015 estabelece que “[a] sentença condenará o vencido a pagar
honorários ao advogado do vencedor”.

Assim, o vetor primordial que orienta a imposição ao pagamento de verba honorária sucumbencial, portanto, é o fato
da derrota na demanda, cujo pressuposto é a existência de litigiosidade.

Outro ponto que merece realce é o fato de a Lei nº 11.101/2005 conferir ao ato judicial que decide acerca do pedido de
homologação do plano de recuperação extrajudicial a natureza de sentença (arts. 161, § 6º, e 164, §§ 5º e 7º),
circunstância que, a se considerar a literalidade da norma do precitado art. 85, caput, do CPC/2015, impõe ao julgador
a condenação do vencido ao pagamento de honorários ao advogado do vencedor.

Importa consignar, ainda, que a LFRE não prevê - diferentemente do que ocorre com as impugnações de crédito
apresentadas em procedimento de recuperação judicial (art. 13, parágrafo único) - que as impugnações ao plano de
recuperação extrajudicial sejam autuadas em apartado, de modo que, nestas hipóteses, incumbe ao juiz apreciar as
objeções deduzidas pelos credores na própria sentença.

Se o plano foi impugnado, passa a existir litigiosidade, a ensejar condenação em honorários

Quando não impugnado, o pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial apresenta características
análogas a de um procedimento de jurisdição voluntária, nos quais, não havendo vencedores ou vencidos (dada a
ausência de litigiosidade), afigura-se despropositado o arbitramento de honorários sucumbenciais. Todavia, a
apresentação de impugnação ao pedido homologatório por parte de credores é circunstância que confere litigiosidade
ao procedimento, razão pela qual a regra de não cabimento da condenação em honorários deve ceder. E, nesse
panorama, o fato de se tratar de pedido homologatório, por si só, não autoriza a conclusão de que é incabível o
arbitramento de honorários advocatícios de sucumbência

O legislador, quando pretendeu que não houvesse a fixação de honorários advocatícios, assim previu expressamente,
como nas hipóteses de seus arts. 7º-A, § 8º, e 88, parágrafo único, da Lei nº 11.101/2005.

A judicialização do procedimento, no caso, afigurava-se imprescindível para a obtenção do resultado desejado -


eficácia do plano recuperacional sobre a totalidade dos créditos passíveis de serem a ele submetidos -, haja vista que
o devedor não conseguiu alcançar, na esfera extrajudicial, a unanimidade necessária para dispensar a intervenção
judicial.

Assim, considerando que a decisão homologatória do pedido de recuperação extrajudicial possui natureza de
sentença, pondo fim à atividade jurisdicional, e que, no particular, as diversas impugnações apresentadas conferiram
litigiosidade ao procedimento, inexiste razão jurídica apta a desautorizar o arbitramento dos honorários de
sucumbência.

Questão 27

É constitucional a precedência conferida aos créditos “extraconcursais” decorrentes de obrigações resultantes de atos jurídicos válidos
praticados durante a recuperação judicial, ou após a decretação da falência, e de tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a
decretação da falência.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
O caso concreto foi o seguinte:

Em 2005, foi aprovada a Lei nº 11.101, conhecida como Lei de Falências e Recuperação Judicial.

No mesmo ano, a Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade
no Supremo, com pedido de liminar, contra dispositivos da Lei nº 11.101/2005.

A entidade sindical impugnou os seguintes dispositivos:

· art. 83, I e VI, alínea “c”;

· art. 83, § 4º;

· art. 84, V (atual art. 84, I-E);

· art. 86, II.

Vejamos o que decidiu o STF:

Art. 83, I e VI, alínea “c”


Esses dispositivos estabelecem que os créditos derivados da legislação trabalhista têm prioridade na ordem
classificatória de atendimento, porém limita-os a 150 salários-mínimos por credor. Os demais são considerados
credores quirografários:

Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:

I - os créditos derivados da legislação trabalhista, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por
credor, e aqueles decorrentes de acidentes de trabalho;

(...)

VI - os créditos quirografários, a saber:

c) os saldos dos créditos derivados da legislação trabalhista que excederem o limite estabelecido no inciso I do
caput deste artigo;

A autora questionou esse limite, afirmando que ele ofenderia “o princípio da igualdade, haja vista que todos os
trabalhadores são trabalhadores, e não é constitucional assegurar a alguns a possibilidade de auferir a integralidade
de seus direitos e a outros, uma parcela limitada”.

Esse dispositivo é constitucional. O STF já havia decidido assim em 2009: STF. Plenário. ADI 3934, Rel. Ricardo
Lewandowski, julgado em 27/05/2009. Na ocasião, afirmou o Min. Lewandowski:

“A própria legislação internacional de proteção ao trabalhador contempla a possibilidade do estabelecimento de


limites legais aos créditos de natureza trabalhista, desde que preservado o mínimo essencial à sobrevivência do
empregado

Esse entendimento encontra expressão no art. 7.1 da Convenção 173 da Organização Internacional do Trabalho -
OIT (Convenção sobre a Proteção dos Créditos Trabalhistas em Caso de Insolvência do Empregador), segundo o
qual a “legislação nacional poderá limitar o alcance do privilégio dos créditos trabalhistas a um montante
estabelecido, que não deverá ser inferior a um mínimo socialmente aceitável”.

Embora essa Convenção não tenha sido ainda ratificada pelo Brasil, é possível afirmar que os limites adotados
para a garantia dos créditos trabalhistas no caso de falência ou recuperação judicial de empresas encontram
respaldo nas normas adotadas no âmbito da OIT, entidade integrante da Organização das Nações Unidas que
tem por escopo fazer com que os países que a integram adotem padrões mínimos de proteção aos
trabalhadores.

Nesse aspecto, as disposições da Lei nº 11.101/2005 abrigam uma preocupação de caráter distributivo,
estabelecendo um critério o mais possível equitativo no que concerne ao concurso de credores. Em outras
palavras, ao fixar um limite máximo – bastante razoável - para que os créditos trabalhistas tenham um
tratamento preferencial, a Lei nº 11.101/2005 busca assegurar que essa proteção alcance trabalhadores, ou seja,
justamente aqueles que auferem os menores salários.

Procurou-se, assim, preservar, em uma situação de adversidade econômica por que passa a empresa, o caráter
isonômico do princípio da par condicio creditorum, segundo o qual todos os credores que concorrem no
processo de falência devem ser tratados com igualdade, respeitada a categoria que integram.”
Assim, sendo a causa de pedir aberta e não havendo motivos de fato ou de direito que autorizem a superação do
entendimento firmado no julgamento da referida ação direta, o STF ratificou a constitucionalidade do art. 83, I e IV, c,
da Lei 11.101/2005.

São constitucionais o estabelecimento de um limite máximo de 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos aos
créditos de natureza trabalhista, bem como a definição de créditos com privilégio especial, conforme previsto no
art. 83, I, e IV, “c”, da Lei 11.101/2005.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

Art. 83, § 4º

O § 4º do art. 83 dizia que os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão quirografários (não terão preferência em
relação aos demais), na hipótese de cessão de crédito:

Art. 83 (...)

§ 4º Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.

Para a CNPL, isso afrontaria o direito de propriedade (art. 5º, XII da Constituição Federal), “visto restringir a
disponibilidade da coisa”.

Esse dispositivo foi revogado pela Lei nº 14.112/2020.

Diante disso, o STF declarou a perda do objeto quanto a esse § 4º do art. 83.

Art. 84, V (atual art. 84, I-E)

O art. 84 lista os créditos que serão considerados extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os
mencionados no art. 83 da lei impugnada, colocando, em seu inciso V, as obrigações resultantes de atos jurídicos
válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 da lei, ou após a declaração de falência, e
tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência:
LEI DE FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL (LEI 11.101/2005)

Antes da Lei 14.112/2020 Depois da Lei 14.112/2020

Art. 84. Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos


com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na
ordem a seguir, os relativos a:

V – obrigações resultantes de I-E - às obrigações resultantes de


atos jurídicos válidos praticados atos jurídicos válidos praticados
durante a recuperação judicial, durante a recuperação judicial,
nos termos do art. 67 desta Lei, nos termos do art. 67 desta Lei,
ou após a decretação da ou após a decretação da
falência, e tributos relativos a falência;
fatos geradores ocorridos após a
decretação da falência,
respeitada a ordem estabelecida
no art. 83 desta Lei.

Para a CNPL, as despesas decorrentes da etapa recuperatória ou após a decretação da quebra não podem ter o
mesmo tratamento das despesas obrigatórias da massa falida - remuneração dos administradores, quantias
fornecidas à massa pelos credores, custas processuais etc. Nas palavras da autora:

“Dir-se-á que, sem isso, não haverá estímulo à recuperação da empresa, mas esta, por mais estimulável que seja, não
pode ter lugar às expensas do sacrifício geral de todos os créditos, em especial os trabalhistas, aqui defendidos”.

O STF rejeitou os argumentos da entidade:

É constitucional a precedência conferida aos créditos “extraconcursais” decorrentes de obrigações resultantes de


atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, ou após a decretação da falência, e de tributos
relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência.

STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

A regra tem por objetivo estimular os fornecedores de bens e serviços a negociar com a empresa em recuperação, a
despeito da fragilidade de sua situação financeira, confessada e divulgada publicamente quando do requerimento de
recuperação.
A preservação da empresa depende da continuidade dos negócios e, para tanto, é necessário que os novos credores
tenham garantia de que serão pagos. Caso contrário, não haverá interessados em continuar contratando com a
empresa em recuperação judicial.

Ademais, diante da função de promover a justiça social da tributação, justifica-se também a precedência em relação
aos tributos cujos fatos geradores tenham ocorrido durante a recuperação judicial ou após a decretação da falência.

Art. 86, II

O inciso II do art. 86 determina que será feita a restituição em dinheiro da importância entregue ao devedor, decorrente
de adiantamento a contrato de câmbio para exportação:

Art. 86 (...)

II - da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de


câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o
prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da
autoridade competente;

Para a CNPL, o pedido de restituição é medida portadora de potencialidade esvaziadora dos recursos da massa falida.

O STF, contudo, não concordou com os argumentos da autora.

A restituição de adiantamento de contrato de câmbio para a exportação não trata de um mero contrato de mútuo, em
que a quantia emprestada pelo banco mutuante se incorporaria — imediatamente — ao patrimônio do mutuário no
momento da contratação.

O adiantamento a contrato de câmbio é, em verdade, um contrato de compra e venda de moeda a termo, uma vez que
a concretização da operação de câmbio somente ocorrerá no momento em que o exportador cumprir com a obrigação
(enviando o bem ou prestando o serviço no exterior) e for paga a contraprestação (em moeda estrangeira) pelo
importador. Assim, a instituição financeira repassa recursos em moeda nacional ao exportador antes que ele efetive a
transação internacional de venda de mercadorias ou prestação de serviços.

Cuida-se, portanto, de um mecanismo de grande valia para que as transações internacionais se perfectibilizem,
possibilitando aos exportadores utilizarem as quantias antecipadas para produção dos bens que serão enviados ao
exterior, como capital de giro ou, ainda, para aproveitamento de melhores oportunidades negociais.

Desse modo, caso a empresa exportadora não entregue a moeda estrangeira à instituição financeira que a comprou
antecipadamente, a riqueza previamente aportada pelo banco não pode ser considerada como patrimônio da massa
falida, sendo absolutamente razoável e devida a previsão legal que determina a sua restituição ao verdadeiro titular
antes do pagamento dos demais credores.

Em suma:

É legítima a restituição em dinheiro de valor adiantado ao devedor-falido, oriundo de adiantamento de contrato de


câmbio para exportação.
STF. Plenário. ADI 3424/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/4/2021 (Info 1013).

Na mesma assentada, o STF também declarou compatível com a CF/88 a regra do art. 75, § 3º da Lei nº 4.728/65, que
diz:

Art. 75. O contrato de câmbio, desde que protestado por oficial competente para o protesto de títulos, constitui
instrumento bastante para requerer a ação executiva.

§ 1º Por esta via, o credor haverá a diferença entre a taxa de câmbio do contrato e a da data em que se efetuar
o pagamento, conforme cotação fornecida pelo Banco Central, acrescida dos juros de mora.

§ 2º Pelo mesmo rito, serão processadas as ações para cobrança dos adiantamentos feitos pelas instituições
financeiras aos exportadores, por conta do valor do contrato de câmbio, desde que as importâncias
correspondentes estejam averbadas no contrato, com anuência do vendedor.

§ 3º No caso de falência ou concordata, o credor poderá pedir a restituição das importâncias adiantadas, a que
se refere o parágrafo anterior.

Assim, o STF decidiu que:

É constitucional o art. 86, II, da Lei nº 11.101/2005.

O art. 75, § 3º, da Lei nº 4.728/65 foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988.

STF. Plenário. ADPF 312/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 16/4/2021
(Info 1013).

Com a decisão acima, o STF afirma que é válido o entendimento manifestado na Súmula 307 do STJ:

Súmula 307-STJ: A restituição de adiantamento de contrato de câmbio, na falência, deve ser atendida antes de
qualquer crédito.

Questão 28

O ajuizamento da ação de busca e apreensão fundada no inadimplemento da cédula de crédito comercial garantida por alienação fiduciária,
com a citação válida do devedor, interrompe o prazo para propor ação de execução com base no mesmo título de crédito.

CERTO Resposta correta


ERRADO

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

João recebeu mútuo bancário de R$ 100 mil e emitiu em favor da instituição financeira uma cédula de
crédito comercial.

Como garantia do empréstimo, João fez a cessão fiduciária para o banco de um caminhão. Em outras palavras, João
cedeu fiduciariamente a propriedade resolúvel do veículo para o banco.

Vale ressaltar que, na alienação fiduciária, o bem continua na posse direta do devedor.

O empréstimo deveria ser pago em 36 parcelas.

Ocorre que João tornou-se inadimplente.

Diante da inadimplência do mutuário, o credor deverá fazer a notificação extrajudicial do devedor de que este se
encontra em débito, comprovando, assim, a mora.

Ajuizamento de ação contra o devedor

Após comprovar a mora, o mutuante (banco) terá duas opções:

1) poderá ingressar com uma ação de busca e apreensão requerendo que lhe seja entregue o bem (art. 3º do DL
911/69). Essa busca e apreensão prevista no DL 911/69 é uma ação especial autônoma e independente de qualquer
procedimento posterior; ou

2) ajuizar uma ação de execução (arts. 4º e 5º do DL 911/69).

O STJ decidiu que o ajuizamento da ação de busca e apreensão, com a citação válida do devedor, interrompe o prazo
para propor a execução:

O ajuizamento da ação de busca e apreensão fundada no inadimplemento da cédula de crédito comercial garantida
por alienação fiduciária, com a citação válida do devedor, interrompe o prazo para propor ação de execução com
base no mesmo título de crédito.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.135.682-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 13/04/2021 (Info 692).

Conforme a regra do art. 202, V c/c parágrafo único, do Código Civil, qualquer ato judicial que constitua em mora o
devedor interrompe a prescrição, que voltará a ser contada somente após o trânsito em julgado da decisão judicial que
ponha fim ao processo que a interrompeu:
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:

(...)

V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

(...)

Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último
ato do processo para a interromper.

No caso, as partes celebraram uma cédula de crédito - pacto cuja finalidade é incentivar a atividade comercial através
do empréstimo remunerado de capital.

O objetivo do tomador do empréstimo é obter o crédito para fomentar sua atividade empresarial; já o objetivo da
instituição financeira é reaver o valor emprestado, com juros e demais acréscimos legais.

A cláusula de alienação fiduciária é acessória e serve de garantia para que o credor, diante do inadimplemento, receba
o capital emprestado.

Assim, afirmar que a ação de busca e apreensão tem como propósito obter o bem dado em garantia implica tomar o
acessório pelo principal.

Quando a instituição financeira ajuizou a ação de busca e apreensão e citou validamente o devedor, houve a
constituição em mora; isso significa dizer que o réu estava inadimplente com a obrigação principal da cédula de
crédito comercial.

Dessa feita, fica evidente que a finalidade da ação de busca e apreensão é o cumprimento da obrigação expressa na
cédula de crédito comercial - assim como o é a ação de execução, proposta com base no mesmo título.

Questão 29

Incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre o crédito sujeito ao processo de recuperação judicial, decorrente de ação que
demandava quantia ilíquida.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

João foi atropelado por um ônibus da Transportadora Vantroba Ltda.

A vítima ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra a empresa.

Antes que fosse julgada a demanda, a Transportadora ingressou com pedido de recuperação judicial, tendo sido
deferido seu processamento pelo juiz da vara empresarial.
O juiz da vara cível, responsável pela ação de indenização, condenou a ré a pagar R$ 100 mil em favor do autor.

João ingressou com pedido de cumprimento de sentença e o magistrado determinou a intimação da Transportadora
para pagar a dívida no prazo de 15 dias, nos termos do caput do art. 523 do CPC:

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre
parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o
executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

A Transportadora que, como vimos, estava em processo de recuperação judicial, não efetuou o pagamento, razão pela
qual o juízo da vara cível afirmou que o débito agora seria acrescido de multa e de honorários advocatícios, invocando
o § 1º do art. 523 do CPC:

Art. 523 (...)

§ 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento
e, também, de honorários de advogado de dez por cento.

Agiu corretamente o magistrado? Aplica-se o § 1º do art. 523 ao caso?

NÃO.

Não incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre o crédito sujeito ao processo de recuperação
judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.937.516-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703).

Primeira pergunta: esse crédito decorrente da indenização estava sujeito à recuperação judicial? Em outras palavras,
esse valor deverá ser pago pela Transportadora segundo as regras da recuperação judicial?

SIM.

Para saber se um crédito está, ou não, sujeito à recuperação judicial, deve-se analisar o art. 49 da Lei nº 11.101/2005,
que afirma:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não
vencidos.
Assim, em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação
judicial.

Para se aferir a existência ou não do crédito deve-se levar em consideração a data da ocorrência de seu fato gerador
(fonte da obrigação).

Como o acidente foi antes do pedido de recuperação, a fonte da obrigação (ato ilícito que gerou dano) foi anterior à
recuperação judicial e, portanto, está sujeito a ela.

E por que motivo a ação de indenização continuou tramitando normalmente? Por que a ação de conhecimento não foi
suspensa, nos termos do art. 6º da Lei nº 11.101/2005?

O art. 6º afirma o seguinte:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:

I - suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime desta Lei;

II - suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio
solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência;

III - proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição
judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos
créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência.

Ocorre que o § 1º do art. 6º traz uma exceção e diz que, se a ação busca uma obrigação ilíquida (como é o caso de
uma ação de indenização por danos morais), ela continua tramitando na fase de conhecimento:

Art. 6º (...) § 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia
ilíquida.

A execução (cumprimento de sentença) desse crédito também continua a correr no juízo cível independentemente da
recuperação judicial? João poderia executar o crédito fora da recuperação?

NÃO.

Tratando-se de crédito derivado de ação na qual se demandava quantia ilíquida, a Lei nº 11.101/2005 (LFRE)
estabelece que ele somente passa a ser passível de habilitação no quadro de credores a partir do momento em que
adquire liquidez, de modo que o prosseguimento da execução singular, desse momento em diante, deve ficar obstado
(inteligência do art. 6º, § 1º).

Logo, somente a fase de conhecimento poderia continuar (não a fase de execução).


Conforme expressamente pontuou a Min. Nancy Andrighi:

“No que concerne à habilitação, em processo de recuperação judicial, de quantias decorrentes de demandas
cujos pedidos são ilíquidos, esta Corte Superior entende que, nos termos do art. 6, § 1º, da Lei 11.101/05, a ação
de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta até a determinação do valor do crédito,
momento a partir do qual este deverá ser habilitado no quadro geral de credores da recuperanda.”

O art. 59, caput, da LFRE, prevê que o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido
e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos:

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e
todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei.

Desse modo, o adimplemento das dívidas da recuperanda deverá seguir as condições pactuadas entre os sujeitos
envolvidos no processo de soerguimento, sempre respeitando-se o tratamento igualitário entre os credores de cada
classe.

Assim, fica claro que a satisfação (execução) do crédito objeto da ação indenizatória deverá ocorrer, após
devidamente habilitado, de acordo com as disposições do plano de recuperação judicial.

Logo, João deverá habilitar seu crédito na recuperação judicial.

Não há que se falar na penalidade do § 1º do art. 523 do CPC se a Transportadora não podia pagar João fora do
plano de recuperação

Nesse contexto, não se pode considerar que a causa que dá ensejo à aplicação da penalidade prevista no § 1º do art.
523 do CPC/2015 - recusa voluntária ao adimplemento da obrigação constante de título executivo judicial - tenha se
perfectibilizado na hipótese.

Em outras palavras, não há como fazer incidir à espécie a multa estipulada no art. 523, § 1º do CPC, uma vez que o
pagamento do valor da condenação não era obrigação passível de ser exigida, por força da Lei nº 11.101/2005.

Estando em curso processo recuperacional, a livre disposição, pela devedora, de seu acervo patrimonial para
pagamento de créditos individuais sujeitos ao plano de soerguimento violaria o princípio segundo o qual os credores
devem ser tratados em condições de igualdade dentro das respectivas classes (princípio da par conditio creditorum).

Questão 30

O crédito extraconcursal devido por empresa em recuperação judicial, objeto de cumprimento de sentença em curso, pode ser acrescido das
penalidades previstas no art. 523, § 1º, do CPC/2015.

CERTO Resposta correta

ERRADO
Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

Cleber ajuizou ação de indenização contra empresa de telefonia Oi (em recuperação judicial).

Vale ressaltar que o ato ilícito que deu origem à ação de indenização ocorreu depois que já havia sido deferida a
recuperação judicial.

O juiz julgou o pedido procedente, condenado a Oi a pagar R$ 100 mil em favor do autor.

Foi iniciada a fase de cumprimento de sentença.

Por que foi iniciada a fase de cumprimento de sentença e o crédito não foi incluído no plano de credores?

Porque se trata de crédito surgido depois do deferimento da recuperação judicial. Logo, é um crédito extraconcursal,
nos termos do art. 49 da Lei nº 11.101/2005:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não
vencidos.

Voltando ao caso concreto:

Cleber ingressou com pedido de cumprimento de sentença e o magistrado determinou a intimação da Oi para pagar a
dívida no prazo de 15 dias, nos termos do caput do art. 523 do CPC:

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre
parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o
executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

A Oi que, como vimos, estava em processo de recuperação judicial, não efetuou o pagamento, razão pela qual o juízo
da vara cível afirmou que o débito agora seria acrescido de multa e de honorários advocatícios, invocando o § 1º do
art. 523 do CPC:

Art. 523 (...)

§ 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento
e, também, de honorários de advogado de dez por cento.

Agiu corretamente o magistrado? Aplica-se o § 1º do art. 523 ao caso?


SIM.

O crédito extraconcursal devido por empresa em recuperação judicial, objeto de cumprimento de sentença em
curso, pode ser acrescido das penalidades previstas no art. 523, § 1º, do CPC/2015.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.953.197-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/10/2021 (Info 713).

A multa e os honorários advocatícios previstos no art. 523, § 1º, do CPC/2015 somente incidem sobre o valor da
condenação nas hipóteses em que o executado não paga voluntariamente a quantia devida estampada no título
judicial no prazo de 15 dias.

Nos termos do art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes
na data do pedido (ainda que não vencidos), sendo certo que a aferição da existência ou não do crédito deve levar em
consideração a data da ocorrência de seu fato gerador (fonte da obrigação).

Na hipótese, contudo, o crédito em discussão possui caráter extraconcursal, não se sujeitando, desse modo, aos
efeitos do plano de soerguimento.

Conforme prevê o art. 59, caput, da LFRE, apenas as dívidas da recuperanda estão sujeitas ao plano de soerguimento
(créditos concursais) e necessitam ser adimplidas de acordo com as condições nele pactuadas:

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e
todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei.

As obrigações não atingidas pela recuperação judicial, consequentemente, devem continuar sendo cumpridas
normalmente pela devedora, uma vez que os créditos correlatos estão excluídos do plano e de seus efeitos.

Dessa forma, a recuperanda não está impedida de satisfazer voluntariamente créditos extraconcursais perseguidos
em execuções individuais, de modo que as consequências jurídicas previstas na norma do dispositivo precitado
devem incidir quando não pago o montante devido.

Não é, portanto, defeso à recuperanda dispor de seu acervo patrimonial para pagamento de créditos extraconcursais
(observada a exceção do art. 66 da LFRE), uma vez recebida a comunicação do juízo do soerguimento para depósito
da quantia objeto da execução, deve passar a correr o prazo de 15 dias estabelecido no art. 523, caput, do CPC/2015.

Não confundir com o Info 703 do STJ

Não incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre o crédito sujeito ao processo de recuperação
judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.937.516-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703).
Questão 31

A associação indevida a marca alheia, prevista no art. 124, XIX, da Lei nº 9.279/96, pode ser caracterizada pelo risco de vinculação equivocada
quanto à origem dos produtos contrafeitos, ainda que inexista confusão entre os conjuntos marcários.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte:

Red Bull é uma marca de energéticos, conhecidíssima tanto no Brasil como no restante do mundo.

A marca Red Bull foi registrada no INPI em 1993.

Em 2010, a empresa Funcional Drinks Ltda registrou, no INPI, a marca Power Bull, para também ser utilizada em
bebidas energéticas.

Ao tomar conhecimento disso, a Red Bull ajuizou ação contra a empresa Funcional Drinks Ltda e contra o INPI pedindo
a nulidade desse registro.

A ré afirmou que não há risco de os consumidores confundirem os produtos porque eles possuam diferenças de
embalagem e de layout.

A questão chegou até o STJ. Para o Tribunal, o registro da marca Power Bull deve ser anulado?

SIM.

Associação indevida

As empresas em conflito atuam no mesmo segmento mercadológico, fornecendo produto similar, que podem estar
presente nos mesmos locais de venda e que visam o mesmo público.

Existe uma proximidade grande nas marcas considerando que ambas utilizam o termo “bull”, diferenciando-se apenas
pelo acréscimo dos vocábulos “red” e “power”.

Diante desse quadro, o STJ reconheceu que havia o risco de a empresa Red Bull, notoriamente mais antiga e
conhecida, ser indevidamente associada ao produto concorrente.

Alguns consumidores poderiam achar que o produto Power Bull fosse um energético que faria parte da linha de
produtos da marca Red Bull.

Assim, embora não esteja caracterizada a possibilidade de confusão entre as marcas tendo em vista que possuem
embalagens e nomes diferentes, havia o risco de indevida associação entre os produtos.
Mesmo que não exista a possibilidade de confusão entre as marcas, considerando que o conjunto marcário (cor,
embalagem, layout, nome) é diferente, a Lei nº 9.279/96 também proíbe a reprodução parcial ou total de marca que
possa causar associação indevida com marca alheia. Confira o que diz o art. 124, XIX, da Lei de Propriedade Industrial:

Art. 124. Não são registráveis como marca:

(...)

XIX - reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para
distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou
associação com marca alheia;

A associação indevida a marca alheia, prevista no art. 124, XIX, da Lei nº 9.279/96, pode ser caracterizada pelo
risco de vinculação equivocada quanto à origem dos produtos contrafeitos, ainda que inexista confusão entre os
conjuntos marcários.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.922.135/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/04/2021 (Info 692).

Teoria da diluição

A Red Bull alegou que ao se permitir que a ré utilize, em sua marca, a palavra-chave “Bull”, isso faz com que este
elemento, de suma importância para a autora, seja diluído no mercado, o que abre precedente para que outros
comerciantes se sintam no direito de identificar seus produtos e serviços com esse mesmo elemento, fazendo com
que a marca Red Bull perca força.

Trata-se da chamada teoria da diluição.

Segundo explica Fábio Ulhoa Coelho, a diluição consiste na prática adotada por outros empresários que se beneficiam
indevidamente do prestígio associado a marcas conhecidas, fazendo com que haja uma perda de valor da marca
notória. (Curso de Direito Comercial. Volume 1: Direito de Empresa. 4ª edição em e-book baseada na 23ª edição
impressa. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019).

A ré argumentou, então, que o termo bull já se encontraria diluído em decorrência da sua ampla utilização para
identificar diversos produtos em âmbito internacional.

O STJ, contudo, deu razão à autora. Isso porque a diluição internacional ou, no caso, a ofensa à unicidade, não é
suficiente para afastar a distintividade da marca registrada no Brasil. Assim, permanece hígido o direito da empresa de
zelar pela sua unicidade, integridade ou reputação em território nacional.

Vale ressaltar que não existem, no Brasil, outras bebidas registradas com o elemento “bull”, de forma que não prospera
a argumentação de que já haveria um desgaste da referida expressão na classe de bebidas.

Em suma:
A diluição da marca no exterior não é suficiente para afastar a distintividade do registro no Brasil.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.922.135/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/04/2021 (Info 692).

Questão 32

A remuneração do administrador judicial nas recuperações judiciais envolvendo Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, com limitação
de 2% do valor dos créditos submetidos à recuperação ou dos bens alienados na falência (art. 24, § 5º, da Lei nº 11.101/2005), aplica-se às
recuperações judiciais em que haja a opção pelo plano especial (arts. 70 a 72) e, também, àquelas que adotem o procedimento ordinário de
recuperação judicial (arts. 51 e seguintes).

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Recuperação judicial

A recuperação judicial consiste em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com o objetivo
de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência.

Plano especial de recuperação judicial

A Lei nº 11.101/2005 afirmou que as microempresas e empresas de pequeno porte podem escolher:

· seguir o procedimento ordinário (comum) de recuperação judicial, previsto nos arts. 51 e seguintes; ou

· adotar um plano especial disciplinado nos arts. 70 a 72.

Nos termos do art. 70, § 1º, a microempresa poderá optar entre o plano especial de recuperação judicial dos arts. 70 a
72 ou seguir pelo rito comum dos arts. 51 e seguintes.

Esse tratamento favorecido atende a um mandamento constitucional previsto no art. 170, IX, da CF/88:

Art. 170 (...)

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham
sua sede e administração no País.

Além das informações acima, para entender o julgado, é necessário tratarmos sobre a remuneração do administrador
judicial.
Administrador judicial

Administrador judicial é uma pessoa escolhida pelo juiz para auxiliá-lo na condução do processo de falência ou de
recuperação judicial praticando determinados atos que estão elencados no art. 22 da Lei nº 11.101/2005.

Na antiga Lei de Falências, o administrador judicial era chamado de “síndico”.

O administrador judicial deve ser um profissional idôneo, preferencialmente advogado, economista administrador de
empresas ou contador. Pode ser também uma pessoa jurídica especializada neste tipo de atividade (art. 21 da Lei).

Remuneração do administrador judicial

O administrador judicial é um profissional (ou uma empresa e precisará, obviamente, ser remunerado pelos serviços
que prestar em prol do processo de falência.

Quem é responsável pelo pagamento da remuneração do administrador judicial?

Caberá ao devedor ou à massa falida arcar com as despesas relativas à remuneração do administrador judicial e das
pessoas eventualmente contratadas para auxiliá-lo (art. 25 da Lei).

Assim, na recuperação judicial quem paga o administrador judicial é a sociedade empresária recuperanda.

Qual é o valor da remuneração do administrador judicial?

O valor e a forma de pagamento da remuneração do administrador judicial são fixados pelo juiz, observados alguns
critérios estabelecidos pelo art. 24 da Lei:

· capacidade de pagamento do devedor;

· grau de complexidade do trabalho; e

· os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes.

Os parágrafos do art. 24 trazem outras regras específicas sobre a remuneração do administrador judicial.

Regra especial para microempresas e empresas de pequeno porte

A Lei nº 11.101/2005 prevê, no § 5º do art. 24, uma regra especial (mais favorável) às microempresas e empresas de
pequeno porte. Se elas estiverem em recuperação judicial, o valor máximo que terão que pagar ao administrador
judicial é de 2%:

Art. 24 (...)
§ 5º A remuneração do administrador judicial fica reduzida ao limite de 2% (dois por cento), no caso de
microempresas e de empresas de pequeno porte, bem como na hipótese de que trata o art. 70-A desta Lei.
(Redação dada pela Lei nº 14.112/2020)

A pergunta que o STJ enfrentou e respondeu é a seguinte: a regra do § 5º do art. 24 (que limita a remuneração do
administrador judicial em 2%) existe apenas no caso de a microempresa ou empresa de pequeno porte adotar o rito
especial de recuperação ou essa regra se aplica também no caso de a empresa escolher seguir no procedimento
ordinário?

Em ambos os casos.

A remuneração do administrador judicial nas recuperações judiciais envolvendo microempresas e empresas de


pequeno porte, com limitação de 2% do valor dos créditos submetidos à recuperação ou dos bens alienados na
falência (art. 24, § 5º, da Lei nº 11.101/2005), aplica-se às recuperações judiciais em que haja a opção pelo plano
especial (arts. 70 a 72) e, também, àquelas que adotem o procedimento ordinário de recuperação judicial (arts. 51 e
seguintes).

STJ. 4ª Turma. REsp 1.825.555-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 04/05/2021 (Info 695).

Seguindo os ditames constitucionais, a regra do § 5º do art. 24 teve por objetivo proteger a pessoa do devedor que se
enquadra nos requisitos legais de microempresa ou empresa de pequeno porte, dando o devido tratamento favorecido,
independentemente da sua opção pela adoção do plano especial de recuperação.

Quando o legislador quis, realmente, restringir determinada regra - somente para aqueles que optaram pelo rito
específico dos arts. 70 a 72 da LREF -, ele o fez expressamente.

Entender de forma diversa acabaria por privar a empresa de pequeno porte de todas as outras benesses previstas em
Lei, apenas pelo fato de que, estrategicamente, optou por não adotar o plano especial.

Questão 33

Para que um nome civil, ou patronímico, seja registrado como marca, impõe-se a autorização pelo titular ou sucessores, de forma limitada e
específica àquele registro, em classe e item pleiteados.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
O caso concreto, com adaptações, foi o seguinte:

O “Hospital Albert Einstein” (Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein) é um hospital brasileiro,
localizado na cidade de São Paulo (SP), sendo considerado um dos melhores da América latina.

Esse hospital foi fundado pela comunidade judaica em 4 de junho de 1955.


A autorização para que o nome do hospital fosse Albert Einstein foi dada pelo filho do físico, tendo em vista que o
cientista havia morrido cerca de um mês antes.

Vale ressaltar, inclusive, que o filho do cientista esteve presente na fundação do Hospital, oportunidade na qual
contribuiu financeiramente com a instituição.

No final da década de 1990, a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein conseguiu o registro
no INPI, da marca nominativa “Albert Einstein”, na classe 41, subitem 10, que corresponde a “serviços de ensino e
educação de qualquer natureza e grau”.

Explicando melhor este ponto: desde a fundação do hospital, a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira tinha
autorização para utilizar o nome Albert Einstein no hospital. Essa autorização, como vimos, foi dada pelo filho do
físico. Ocorre que, posteriormente, a Sociedade Beneficente (“hospital”) conseguiu o registro da marca Albert Einstein
em outra área diferente, qual seja, “serviços de ensino e educação de qualquer natureza e grau”.

Esse novo registro é válido? A Sociedade Beneficente poderia ter registrado a marca Albert Einstein também nessa
outra área de atuação (serviços de ensino e educação)?

O STJ entendeu que não.

Registro de nome civil como marca

O nome civil (ex: Einstein) é intimamente ligado à identidade da pessoa no meio social, sendo protegido pelos arts. 16
e seguintes do Código Civil. Trata-se de uma espécie de direito de personalidade, razão pela qual é absoluto,
obrigatório, indisponível, exclusivo, imprescritível, inalienável, incessível, inexpropriável, irrenunciável e intransmissível.

O nome civil não pode mesmo ser cedido, transferido ou comercializado, uma vez que não é viável separar o nome da
pessoa que ele designa. Apesar disso, o nome civil pode ser objeto de transação e disposição parcial, tal como se dá
na citação em publicações ou representações, bem como na extração de cunho econômico da utilização da imagem
associada ao nome.

Em razão disso, é possível o registro do nome como marca, nos termos do art. 124, XV, da Lei nº 9.279/96:

Art. 124. Não são registráveis como marca:

(...)

XV - nome civil ou sua assinatura, nome de família ou patronímico e imagem de terceiros, salvo com
consentimento do titular, herdeiros ou sucessores;

Ampliação da autorização dada pelo filho do físico ultrapassa os limites de proteção do nome civil

O filho de Albert Einstein conferiu a autorização para a utilização deste nome civil na fundação de um hospital.
Não houve, por outro lado, qualquer autorização para a sua utilização como marca em “serviços de ensino e educação
de qualquer natureza e grau”.

Assim, a nova marca que o Hospital pretende registrar desborda dos limites da proteção do nome civil, atingindo o
núcleo intangível do direito ao nome e à imagem vinculados à pessoa natural.

O direito brasileiro não admite a cessão de uso de nome civil de forma ampla. Essa cessão deverá sempre estar
adstrita à finalidade definida no ato do consentimento.

Não se pode pressupor que, àquela época, décadas atrás, o filho do cientista já teria autorizado essa nova utilização
do nome civil do físico.

A cada marca registrada, os requisitos devem ser analisados e preenchidos

Para o STJ, toda vez que uma nova marca for submetida a registro, será necessário analisar se estão preenchidos os
requisitos de registrabilidade. Neste caso, ao se registrar essa nova marca, percebe-se que não está preenchido um
dos requisitos, qual seja, o consentimento dos herdeiros ou sucessores para a utilização do nome civil de Einstein em
uma nova marca (art. 124, XV, parte final, a Lei nº 9.279/96).

Assim, para que um nome civil, ou patronímico, seja registrado como marca, impõe-se a autorização, pelo titular ou
sucessores, de forma limitada e específica àquele registro, em classe e item pleiteados.

Na hipótese, não é possível admitir que a presença do herdeiro do renomado cientista na solenidade de inauguração
de hospital e a realização de doação para sua edificação, represente uma autorização tácita ao registro do referido
nome civil nas mais variadas e diversas classes e itens e sem qualquer limitação temporal.

Em suma:

Para que um nome civil, ou patronímico, seja registrado como marca, impõe-se a autorização pelo titular ou
sucessores, de forma limitada e específica àquele registro, em classe e item pleiteados.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.354.473-RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 05/10/2021 (Info 712).

Questão 34

O fato de a sociedade ter somente dois sócios não é suficiente para afastar a proibição de o administrador aprovar suas próprias contas.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

Lucci Indústria e Comércio é uma sociedade anônima fechada.


Até 2012, essa sociedade possuía apenas 2 sócios: João, que detinha a maioria do capital social (2/3) e Pedro (1/3).

João sempre foi o diretor-presidente da companhia.

Pedro, por sua vez, exerceu o cargo de diretor administrativo e financeiro até março de 2011.

Em abril de 2012, foi realizada uma assembleia-geral ordinária (AGO) na qual foram aprovadas as contas do exercício
(ano) de 2011 da companhia.

Logo em seguida, Pedro ajuizou ação pedindo para se declarar a nulidade dessa AGO. O argumento foi o de que João,
diretor-presidente, proferiu voto na assembleia aprovando as suas próprias contas.

Pedro afirmou que não seria permitido que o sócio administrador da sociedade anônima participasse da votação na
qual foram aprovadas as suas contas. O fundamento legal invocado foi o art. 134, § 1º da Lei nº 6.404/76 (Lei das
Sociedades Anônimas – LSA):

Art. 134. Instalada a assembleia-geral, proceder-se-á, se requerida por qualquer acionista, à leitura dos
documentos referidos no artigo 133 e do parecer do conselho fiscal, se houver, os quais serão submetidos pela
mesa à discussão e votação.

§ 1º Os administradores da companhia, ou ao menos um deles, e o auditor independente, se houver, deverão


estar presentes à assembleia para atender a pedidos de esclarecimentos de acionistas, mas os
administradores não poderão votar, como acionistas ou procuradores, os documentos referidos neste artigo.

(...)

Em resposta, a sociedade anônima (ré na ação) contra argumentou afirmando que seria sim permitido o voto porque
como são apenas dois sócios, incide a exceção prevista no art. 134, § 6º da LSA:

Art. 134. (...)

§ 6º As disposições do § 1º, segunda parte, não se aplicam quando, nas sociedades fechadas, os diretores
forem os únicos acionistas.

O administrador poderia, ou não, ter votado?

Não poderia.

Nos termos do art. 115, § 1º, da LSA, o acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia-geral relativas à
aprovação de suas contas como administrador:

Art. 115. O acionista deve exercer o direito a voto no interesse da companhia; considerar-se-á abusivo o voto
exercido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem,
vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia ou para outros
acionistas.
§ 1º O acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia-geral relativas (...) à aprovação de suas
contas como administrador, nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em que
tiver interesse conflitante com o da companhia.

(...)

Voto conflitante e conflito de interesses

O voto de João, neste caso, é considerado “voto conflitante” porque seu interesse pessoal é diverso do interesse da
companhia na matéria. O interesse pessoal do acionista é que as contas sejam necessariamente aprovadas. O
interesse da companhia é o de que tais contas só sejam aprovadas se estiverem realmente corretas.

A aprovação das contas pelo sócio administrador está inserida nas hipóteses de conflito de interesse, existindo uma
presunção de sua ocorrência. O conflito de interesses pode ser formal ou material.

No formal, o conflito de interesses é apurado a priori, estando o acionista impedido de proferir seu voto (proibição de
voto).

Já no conflito material (ou substancial), o voto é manifestado, sendo objeto de controle posterior, quando será apurada
a efetiva ocorrência do conflito a partir da análise da situação fática.

A aprovação das próprias contas é caso típico de conflito formal (ou impedimento de voto), sendo vedado ao
acionista-administrador proferir voto acerca da regularidade de suas contas. Esse é o entendimento que prepondera
doutrina:

“Nas duas primeiras hipóteses do art. 115, § 1º, da Lei nº 6.404/76, não há dúvida de que se trata de hipótese de
conflito formal, isto é, o acionista não pode votar na avaliação de seus bens, nem para aprovar contas de sua
gestão como administrador. A existência do conflito não significa que ele atuará em detrimento do interesse
social, mas, a fim de evitar quaisquer problemas, a lei veda tal tipo de voto”. (Curso de Direito Empresarial. Teoria
Geral e Direito Societário. Volume 1. 11ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 546)

Mas e a exceção do § 6º do art. 134, ela poderia ser invocada, neste caso?

NÃO. O art. 134, § 6º realmente prevê uma exceção na qual os diretores, se forem os únicos acionistas da companhia
fechada, poderão participar da votação relativa aos documentos elencados no art. 133, dentre os quais, se inclui os
relatórios da administração, os demonstrativos financeiros e o parecer do conselho fiscal.

Vale ressaltar, no entanto, que Pedro não era mais diretor no momento da AGO, não se enquadrando na previsão do art.
134, § 6º.

O art. 134, § 6º não se aplica para a hipótese na qual os acionistas forem diretores somente em certo período do
exercício.

Se fosse ser ampliada a incidência do art. 134, § 6º seria iniciada uma discussão a respeito de qual o prazo mínimo
necessário para ser afastada a proibição do art. 115, § 1º, da LSA (uma semana, um mês, um trimestre), esvaziando o
conteúdo legal.
Dessa forma, o fato de a sociedade ter somente 2 sócios não é suficiente para afastar a proibição de o administrador
aprovar suas próprias contas, pois o acionista minoritário deverá proferir seu voto no interesse da sociedade, podendo
responder por eventual abuso.

Em suma:

O fato de a sociedade ter somente dois sócios não é suficiente para afastar a proibição de o administrador aprovar
suas próprias contas.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.692.803-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 23/02/2021 (Info 686).

Questão 35

É legal a Resolução nº 113/2013 do INPI que afasta a aplicação do direito de restauração de patente, previsto no art. 87 da Lei nº 9.279/96,
para as hipóteses de inadimplemento superior uma retribuição anual.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
INPI

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da Indústria,
Comércio Exterior e Serviços, sendo responsável, no Brasil, pela concessão e garantia dos direitos de propriedade
intelectual para a indústria.

Patente

Patente é um título de propriedade temporária concedido pelo INPI para a pessoa que inventou um novo produto, um
novo processo ou para quem fez aperfeiçoamentos destinados à aplicação industrial.

Em outras palavras, a patente é concedida ao autor de uma invenção ou de um modelo de utilidade.

Veja o que diz a Lei nº 9.279/96:

Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe
garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei.

Pedido junto ao INPI

Em regra, a patente deverá ser requerida junto ao INPI pelo próprio autor, em nome próprio.
Poderá também ser requerida pelos herdeiros ou sucessores do autor, pelo cessionário ou por aquele a quem a lei ou o
contrato de trabalho ou de prestação de serviços determinar que pertença a titularidade (art. 6º, § 2º, da Lei nº
9.279/96).

Retribuição anual

Com o objetivo de fornecer recursos financeiros para o INPI, a Lei exigiu que o depositante do pedido de patente ou a
pessoa que já seja titular da patente deverão pagar, anualmente, a partir do 3º ano, um valor chamado “retribuição
anual”:

Art. 84. O depositante do pedido e o titular da patente estão sujeitos ao pagamento de retribuição anual, a partir
do início do terceiro ano da data do depósito.

§ 1º O pagamento antecipado da retribuição anual será regulado pelo INPI.

(...)

Assim, o pagamento da retribuição anual configura requisito imprescindível para que o titular de uma patente goze do
monopólio, garantido pelo Estado, de exploração comercial do objeto patenteado durante o seu prazo de vigência.

A retribuição anual é devida a partir do início do terceiro ano do depósito e deve ser paga nos três primeiros meses de
cada período anual. Caso não ocorra tempestivamente, a retribuição pode ser realizada nos seis meses subsequentes,
desde que acrescida de retribuição adicional, nos termos do art. 84 da Lei nº 9.279/96.

O que acontece se a pessoa não pagar essa retribuição anual?

A falta do pagamento da retribuição acarreta:

• o arquivamento do pedido de patente (se o processo de concessão ainda estiver em tramitação); ou

• a extinção da patente (caso ela já tenha sido concedida).

É o que prevê o art. 86 da LPI:

Art. 86. A falta de pagamento da retribuição anual, nos termos dos arts. 84 e 85, acarretará o arquivamento do
pedido ou a extinção da patente.

Instituto da restauração
O art. 87 da LPI prevê, como forma de preservar o direito do titular da patente, o instituto da restauração. Assim, esse
artigo estabelece que, notificado do arquivamento do pedido ou da extinção da patente em razão do não pagamento
da retribuição anual, o depositante ou o titular poderá, no prazo de três meses contados dessa notificação, restaurar o
pedido ou a patente, por meio do pagamento de retribuição específica:

Art. 87. O pedido de patente e a patente poderão ser restaurados, se o depositante ou o titular assim o requerer,
dentro de 3 (três) meses, contados da notificação do arquivamento do pedido ou da extinção da patente,
mediante pagamento de retribuição específica.

Dessa forma, na hipótese de inadimplemento da retribuição anual, a notificação do arquivamento do pedido ou da


extinção da patente é obrigatória, nos termos do art. 87.

Não existe, portanto, a caducidade automática pela falta de pagamento de anuidade.

Resolução 113/2013, do INPI

O art. 13 da Resolução nº 113/2013, do INPI, afasta a aplicação do art. 87 da Lei nº 9.279/96 nas hipóteses de
inadimplemento em mais de uma retribuição anual. Veja a sua redação:

Art. 13. Os pedidos de patente ou as patentes que estiverem inadimplentes em mais de uma retribuição anual
serão arquivados ou extintos definitivamente, não se aplicando a esses casos a hipótese de restauração
prevista no artigo 87 da LPI.

Essa previsão é válida?

NÃO.

A partir da análise sistemática da LPI, verifica-se que nesse art. 13 da Resolução nº 113/2013, o INPI extrapolou seu
poder disciplinar.

O referido ato infralegal vai além da disciplina estabelecida no art. 87 da LPI, restringindo o cabimento da restauração
em uma hipótese não prevista na lei.

Enquanto o art. 87 da LPI permite ao titular ou ao depositante de patente requerer a restauração, dentro do período de
3 (três) meses a partir da notificação, a resolução do INPI limita a aplicação do instituto a um requisito não previsto na
LPI: o inadimplemento não superior a uma retribuição anual.

Assim, é evidente que, ao afastar o direito de restauração de patente em hipóteses não previstas na lei, o INPI
restringiu ilegalmente o direito de restauração.

Em suma:
É ilegal a Resolução nº 113/2013 do INPI que afasta a aplicação do direito de restauração de patente, previsto no
art. 87 da Lei nº 9.279/96, para as hipóteses de inadimplemento superior uma retribuição anual.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.837.439-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 01/09/2020 (Info 679).

Questão 36

Os valores pertencentes a terceiros que estão na posse da recuperanda por força de contrato inadimplido submetem-se aos efeitos da
recuperação judicial.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Recuperação judicial

A recuperação judicial consiste em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com o objetivo
de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência. Logo, em vez de a empresa ir à falência (o que
é nocivo para a economia, para os donos da empresa, para os funcionários etc.), tenta-se dar um novo fôlego para a
sociedade empresária, renegociando as dívidas com os credores.

Na antiga Lei de Falências, esse processo era chamado de “concordata” (DL 7.661/45).

A Lei nº 11.101/2005 acabou com a “concordata” e criou um novo instituto, com finalidade semelhante, chamado de
recuperação judicial.

Assim, a recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da
situação de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam
preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.

Créditos que estão sujeitos à recuperação judicial

Na recuperação judicial, a empresa devedora, que está “sufocada” por dívidas, irá pagar os seus credores de uma
forma mais “suave”, a fim de que consiga quitar todos os débitos e se manter funcionando.

Assim, os credores da empresa em recuperação judicial são inscritos no “quadro geral de credores”, e cada um
receberá seu crédito de acordo com o que for definido no plano de recuperação.

Um dos temas importantes sobre esse assunto é saber quais créditos estão sujeitos à recuperação judicial, ou seja,
quais credores irão ter que receber seus créditos conforme o plano de recuperação.

Regra

Em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial,
ainda que não vencidos (art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005).
Ex: a empresa tem que pagar uma dívida com um fornecedor daqui a 9 meses; se o pedido de recuperação foi feito
hoje, esse crédito já será incluído nas regras da recuperação judicial, mesmo que ainda não tenha chegado a data do
vencimento.

Consequência dessa regra:

Como vimos acima, tendo sido decretada a recuperação judicial, os credores irão receber conforme o plano. Como
consequência disso, em regra, as ações e execuções que tramitam contra a empresa em recuperação são suspensas
para poder não atrapalhar a execução do plano. Veja:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:

I - suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime desta Lei;

II - suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio
solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência;

III - proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição
judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos
créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência.

(...)

§ 4º Na recuperação judicial, as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste
artigo perdurarão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado do deferimento do processamento da
recuperação, prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não
haja concorrido com a superação do lapso temporal.

(com redação dada pela Lei nº 14.112/2020)

Esse prazo em que haverá a pausa momentânea das ações e execuções é chamado de stay period e tem por objetivo
permitir que o devedor em crise consiga negociar, de forma conjunta com todos os credores (plano de recuperação) e,
ao mesmo tempo, preservar o patrimônio do empreendimento, que ficará livre, por um determinado período de respiro,
de eventuais constrições (ex: penhora) de bens necessários à continuidade da atividade empresarial. Com isso,
minimiza-se o risco de haver uma falência.

Exceções à regra:

A regra acima exposta (caput do art. 49) possui exceções que estão elencadas nos §§ 3º e 4º.
Dessa feita, nesses parágrafos estão previstos determinados créditos que NÃO se sujeitam aos efeitos da
recuperação judicial.

Veja o § 3º, que interessa para explicar o julgado:

§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de


arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham
cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em
contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e
prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação
respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º
(chamado de “stay period”) desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital
essenciais a sua atividade empresarial.

Também se pode mencionar o art. 85 da Lei:

Art. 85. O proprietário de bem arrecadado no processo de falência ou que se encontre em poder do devedor na
data da decretação da falência poderá pedir sua restituição.

A despeito de o art. 85 falar em “processo de falência”, pode-se estender o mesmo raciocínio para a recuperação
judicial.

Feita essa breve revisão, imagine a seguinte situação hipotética:

Determinado supermercado queria fazer uma espécie de cartão de crédito para seus clientes.

Para isso, esse supermercado contratou a Mixcred Ltda que ficou responsável por administrar esse serviço.

Assim, se um cliente do supermercado pagasse as compras com esse cartão de crédito, isso ia sendo registrado pela
Mixcred. Posteriormente, quando o cliente pagasse a fatura, esses valores iam para a Mixcred que conferia tudo e
repassava ao supermercado os valores.

Assim, a Mixcred foi contratada para fazer serviços de administração financeira.

Recuperação judicial da Mixcred

Algum tempo depois, a empresa Mixcred ingressou com pedido de recuperação judicial.

Logo em seguida, a Mixcred deixou de repassar ao supermercado os valores que os clientes pagavam. Assim, os
clientes quitaram a fatura do cartão de crédito, mas a empresa não repassou ao supermercado. A Mixcred deixou de
repassar R$ 500 mil.
Diante disso, o supermercado ingressou com ação contra a Mixcred pedindo o pagamento desse valor decorrente do
contrato que a ré não cumpriu.

Surgiu, no entanto, uma dúvida: essa quantia pode ser entregue diretamente ao supermercado ou esses valores
devem se submeter aos efeitos da recuperação judicial e, neste caso, terão que pagos segundo o plano, dividido com
os demais credores?

Esses valores NÃO se submetem aos efeitos da recuperação judicial.

De acordo com o disposto no art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005, estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial
todos os créditos existentes na data do pedido. Porém, no caso, a empresa recuperanda está na posse de valores que
pertencem a terceiro (supermercado) em decorrência do descumprimento do contrato de prestação de serviços
firmado entre as partes, que previa o repasse dessas quantias.

A questão mais se assemelha a uma hipótese de restituição, prevista no art. 85 da Lei nº 11.101/2005, em que o
proprietário de bem que se encontra em poder do devedor na data da falência pode pedir a sua restituição.

Ainda que o pedido de restituição não se amolde perfeitamente à recuperação judicial já que o art. 85 fala em
“processo de falência”, é útil para demonstrar que na hipótese de a devedora se encontrar na posse de bens de
terceiros, esses não são considerados seus credores, não se podendo falar em habilitação, mas no exercício do direito
de sequela.

Observa-se, ademais, que a lei de regência prevê que os titulares de propriedade resolúvel não se submetem aos
efeitos da recuperação judicial, estabelecendo o § 3º do art. 49 que “prevalecerão os direitos de propriedade sobre a
coisa e as condições contratuais”. Se é assim com a propriedade resolúvel, com muito mais razão quanto à
propriedade plena, cabendo a busca dos valores retidos indevidamente.

Em suma:

Os valores pertencentes a terceiros que estão na posse da recuperanda por força de contrato inadimplido não se
submetem aos efeitos da recuperação judicial.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.736.887/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/04/2021 (Info 692).

Questão 37

O cômputo do período de dois anos de exercício da atividade econômica, para fins de recuperação judicial, nos termos do art. 48 da Lei
11.101/2005, aplicável ao produtor rural, inclui aquele anterior ao registro do empreendedor.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Recuperação judicial
A recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da situação
de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam preservados os
empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.

A recuperação judicial consiste, portanto, em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com
o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência.

Fases da recuperação

De forma resumida, a recuperação judicial possui três fases:

a) postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho de processamento;

b) processamento: vai do despacho de processamento até a decisão concessiva;

c) execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação judicial.

Requisitos para a recuperação judicial

A recuperação judicial é um processo judicial, ou seja, é um pedido que será formulado ao juiz.

Para isso, no entanto, é necessário que a devedora cumpra alguns requisitos previstos no art. 48 da Lei nº
11.101/2005:

Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas
atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:

I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as
responsabilidades daí decorrentes;

II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;

III - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial
de que trata a Seção V deste Capítulo;

IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por
qualquer dos crimes previstos nesta Lei

Requisito temporal de 2 anos

O primeiro requisito para que a empresa possa requerer a recuperação judicial é que ela esteja exercendo regulamente
suas atividades há, no mínimo, 2 anos (caput do art. 48) no momento do pedido.
O prazo de 2 anos tem como objetivo principal conceder a recuperação judicial apenas a empresários ou a sociedades
empresárias que se acham, de certo modo, consolidados no mercado e que apresentem certo grau de viabilidade
econômico-financeira capazes de justificar o sacrifício dos credores.

Segundo Marlon Tomazzete, apenas em relação a empresas sérias, relevantes e viáveis “é que se justifica o sacrifício
dos credores em uma recuperação judicial. Uma empresa exercida há menos de dois anos ainda não possui relevância
para a economia que justifique a recuperação.” (Curso de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. São
Paulo: Atlas, 2011, p. 60).

A partir de quando se começa a contar esse prazo de 2 anos?

Em regra, da data de inscrição na junta comercial competente.

Logo, no pedido de recuperação judicial, deverá ser juntada uma certidão emitida pela respectiva junta comercial na
qual conste a inscrição do empresário individual ou o registro do contrato social ou do estatuto da sociedade.

Desse modo, estão proibidos de requerer recuperação judicial, os empresários “de fato” ou “irregulares”, isto é, aqueles
que exercem a atividade empresarial de modo informal, sem registro na junta comercial.

Por que se falou “em regra”? Existe alguma exceção?

SIM. O caso do empresário rural.

Todo empresário, antes de iniciar suas atividades, deverá se inscrever no Registro Público de Empresas Mercantis da
respectiva sede, isto é, na Junta Comercial. É o que prevê o art. 967 do Código Civil:

Art. 967. É obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva
sede, antes do início de sua atividade.

Para o empresário rural, todavia, o Código Civil concedeu a faculdade de se registrar ou não perante a Junta da sua
unidade federativa. Por isso, o dispositivo utiliza o verbo “pode”:

Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades
de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da
respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito
a registro.

Ora, se pode ele requerer inscrição, significa que o empreendedor rural, diferentemente do empreendedor econômico
comum, não está obrigado a requerer inscrição antes de empreender.
Desse modo, o empreendedor rural, inscrito ou não, está sempre em situação regular; não existe situação irregular
para este, mesmo ao exercer atividade econômica agrícola antes de sua inscrição, por ser esta facultativa.

Por isso, se exerce atividade de produção de bens agrícolas, esteja inscrito ou não, estará em situação regular,
justamente porque poderia se inscrever ou não.

Assim, os efeitos decorrentes da inscrição são distintos para as duas espécies de empresário:

• Para o empreendedor rural, o registro, por ser facultativo, tem o efeito constitutivo de equipará-lo, para todos os
efeitos, ao empresário sujeito a registro, sendo tal efeito apto a retroagir (ex tunc), pois a condição regular de
empresário já existia antes mesmo do registro.

• Já para o empresário comum, o registro, por ser obrigatório, somente pode operar efeitos prospectivos (ex nunc),
pois apenas com o registro é que ingressa na regularidade e se constitui efetivamente e validamente, empresário.

O registro do produtor rural, portanto, apenas o transfere do regime do Código Civil para o regime empresarial, com
efeito ex tunc, pois não o transforma em empresário regular, condição que já antes ostentava apenas em decorrência
do anterior exercício da atividade econômica rural.

Assim, a qualidade de empresário rural regular já se fazia presente desde o início do exercício profissional de sua
atividade, sendo irrelevante, para fins de regularização, a efetivação da inscrição na Junta Comercial, pois não estava
sujeito a registro.

Então, o produtor rural é regido pelo Código Civil, enquanto não registrado e, querendo, passa ao regime jurídico
empresarial, após a inscrição é facultativa.

No caso de empresário rural, para fins de cômputo desses 2 anos, é possível aproveitar o tempo em que ele não
estava registrado

O empresário rural, para fazer o pedido de recuperação judicial, deve estar registrado.

Assim, o registro empresarial deve ser anterior ao pedido de recuperação judicial.

No entanto, pelas razões acima explicadas, esses 2 anos, exigidos pelo caput do art. 48, não precisam ser exercidos
após o registro. No caso de empresário rural, o exercício da atividade econômica rural pelo prazo de 2 anos pode ser
computado somando-se ao período anterior e posterior ao registro.

Em suma:

O cômputo do período de dois anos de exercício da atividade econômica, para fins de recuperação judicial, nos
termos do art. 48 da Lei nº 11.101/2005, aplicável ao produtor rural, inclui aquele anterior ao registro do
empreendedor.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.811.953-MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 06/10/2020 (Info 681).
STJ. 4ª Turma. REsp 1.800.032-MT, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. Acd. Min. Raul Araújo, julgado em 05/11/2019 (Info
664).

Questão 38

Na execução de cédula de produto rural em formato escritural é necessária a juntada do original do título de crédito, salvo se comprovado que
o título não circulou.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Títulos de crédito

O título de crédito é um documento por meio do qual se prova que existe uma obrigação entre o(s) credor(es) e o(s)
devedor(es), nos termos do que ali está escrito.

O conceito tradicional de título de crédito foi dado há décadas por um jurista italiano chamado Cesare Vivante: “título
de crédito é o documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele contido ou mencionado”.

Essa definição foi adotada pelo CC-2002:

Art. 887. O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido,
somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.

Os títulos de crédito são muito importantes para a economia porque eles facilitam a obtenção e a circulação do
crédito, além de conferirem maior segurança para os credores. Ex: se a pessoa quer comprar uma mercadoria, mas
não tem dinheiro no momento, ela poderá assinar uma nota promissória e entregá-la ao vendedor, comprometendo-se
a pagar a quantia em 30 dias. Houve a concessão de um crédito de forma simplificada e o credor terá em mãos uma
garantia de pagamento. Com isso, mais negócios podem ser realizados.

Títulos rurais

Existem alguns títulos de crédito que são gerais e mais conhecidos, como é o caso da letra de câmbio, duplicata,
cheque etc.

No entanto, a experiência mostrou que seria interessante que fossem criados alguns títulos de crédito com
características específicas, para facilitar as negociações envolvendo determinados setores da economia.

Em suma, verificou-se a necessidade de criar títulos de crédito específicos para algumas transações empresariais.

No caso da atividade rural, por exemplo, foram idealizados quatro títulos de crédito específicos, chamados de “títulos
rurais”. São eles:
a) Cédula de crédito rural;

b) Cédulas de produto rural;

c) Nota promissória rural;

d) Duplicata rural.

Cédulas de Produto Rural (CPR)

As cédulas de produto rural foram criadas pela Lei nº 8.929/94 com o objetivo de estimular o financiamento privado da
atividade rural. Existem duas espécies de CPR:

· CPR física (art. 1º da Lei);

· CPR financeira (art. 4º-A da Lei).

CPR física CPR financeira


A cédula de produto rural física Na CPR financeira, o produtor
(CPR física) é um título de crédito rural ou a associação de
por meio do qual o produtor rural produtores emite a CPR,
ou a associação de produtores recebendo o dinheiro
rurais (inclusive cooperativas) se correspondente a “X” produtos
compromete, em um documento, rurais (ex: 100kg de café, tipo tal)
a entregar produtos rurais em um e comprometendo-se a fazer a
momento futuro, recebendo, liquidação financeira da CPR
desde já, o pagamento por essa (pagar a quantia emprestada) em
venda. determinada data e segundo os
juros ali estipulados.
No dia do vencimento, o produtor
rural entregará ao credor os Em vez de entregar o produto
produtos rurais prometidos. rural, o produtor irá pagar ao
credor o valor do que tomou
emprestado.

Em outras palavras, a CPR física Em outras palavras, a CPR


representa a documentalização financeira representa a
de um contrato de compra e documentalização de um contrato
venda de produtos rurais, por de financiamento, por meio do
meio do qual o vendedor recebe o qual o produtor rural (ou
pagamento antecipadamente, associação) recebe um valor em
comprometendo-se a entregar os dinheiro, comprometendo-se a
produtos rurais em uma pagar em uma determinada data
determinada data. futura.

Caso o emitente seja Caso o emitente seja


inadimplente, o credor poderá inadimplente, o credor poderá
ajuizar ação de execução para a ajuizar ação de execução por
entrega de coisa. quantia certa.

É parecida com uma duplicata É parecida com uma nota


mercantil. promissória.
Art. 1º Fica instituída a Cédula de Art. 4º-A. Fica permitida a
Produto Rural (CPR), liquidação financeira da CPR de
representativa de promessa de que trata esta Lei, desde que
entrega de produtos rurais, com observadas as seguintes
ou sem garantias cedularmente condições:
constituídas.
I - que sejam explicitados, em seu
corpo, os referenciais necessários
à clara identificação do preço ou
do índice de preços, da taxa de
juros, fixa ou flutuante, da
atualização monetária ou da
variação cambial a serem
utilizados no resgate do título,
bem como a instituição
responsável por sua apuração ou
divulgação, a praça ou o mercado
de formação do preço e o nome
do índice;

II - que os indicadores de preço de


que trata o inciso anterior sejam
apurados por instituições idôneas
e de credibilidade junto às partes
contratantes, tenham divulgação
periódica, preferencialmente
diária, e ampla divulgação ou
facilidade de acesso, de forma a
estarem facilmente disponíveis
para as partes contratantes;

III - que seja caracterizada por seu


nome, seguido da expressão
"financeira".

Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética:

João, um avicultor, emitiu uma cédula de produto rural financeira (CPR-F), mediante a qual se obrigou a pagar a quantia
de R$ 100 mil (equivalente a 10 toneladas de frango) ao Banco do Brasil, que lhe emprestou o dinheiro.

João tornou-se inadimplente e o Banco ajuizou execução de título extrajudicial.

O devedor apresentou embargos à execução argumentando que:

- o Banco juntou aos autos da execução apenas a cópia do título executivo extrajudicial (e não a reprodução
digitalizada de seu original), de forma que não há título executivo hábil a embasar a ação;

- aplicam-se às cédulas de produto rural, no que forem cabíveis, as normas de direito cambial. Assim, por possuírem a
característica de serem transmissíveis via endosso, exige-se a apresentação do original do título para o ajuizamento
da ação de execução.
O que o STJ entende a respeito do tema?

Vejamos.

Necessidade, em regra, de apresentação do original do título de crédito (cédula de produto rural financeira)

Nos termos do art. 798, I, do CPC/2015, ao propor a execução, incumbe ao exequente instruir a petição inicial com o
título executivo extrajudicial:

Art. 798. Ao propor a execução, incumbe ao exequente:

I - instruir a petição inicial com:

a) o título executivo extrajudicial;

(...)

A juntada da via original do título executivo extrajudicial é, em regra, requisito essencial à formação válida do processo
de execução. Isso por dois motivos:

· para se ter certeza da autenticidade da cártula apresentada; e

· para se afastar a possibilidade de o título ter circulado e, com isso, o devedor ser obrigado a pagar duas vezes (para
quem está cobrando agora e para uma nova pessoa no futuro que apresente o original do título).

Conforme explica a Min. Nancy Andrighi:

“A exigência de apresentação do original do título cambial em processo de execução justifica-se, via de regra,
pela possibilidade de sua circulação. Isso significa dizer que a apresentação do documento em sua forma
original, em verdade, visa a assegurar a impossibilidade de uma nova execução baseada no mesmo título de
crédito.” (REsp 1.915.736-MG)

Situações nas quais não se exige o documento original

Agora que sabemos os motivos pelos quais se exige, como regra, a juntada do título original, podemos concluir que, se
ficar comprovado que:

- o título não circulou ou que, por sua natureza, não é hábil a circular; e

- que não há dúvidas quanto à existência do título e do débito...


... nestes casos, a ação de execução pode, excepcionalmente, ser instruída por cópia reprográfica do título executivo
extrajudicial, sendo dispensada a apresentação do documento original.

Eu já li que os documentos juntados ao processo eletrônico são considerados originais para todos os efeitos legais...
essa regra existe mesmo?

SIM. Confira o que diz o art. 11 da Lei nº 11.419/2006 (Lei do Processo Eletrônico):

Art. 11. Os documentos produzidos eletronicamente e juntados aos processos eletrônicos com garantia da
origem e de seu signatário, na forma estabelecida nesta Lei, serão considerados originais para todos os efeitos
legais.

Ocorre que o STJ afirma que essa regra deve ser mitigada quando se trata de título executivo extrajudicial, tendo em
vista a possibilidade de determinação de depósito do documento original em cartório ou secretaria, conforme
preconiza o art. 425, § 2º, do CPC/2015:

Art. 425. (...)

§ 2º Tratando-se de cópia digital de título executivo extrajudicial ou de documento relevante à instrução do


processo, o juiz poderá determinar seu depósito em cartório ou secretaria.

Para a execução de uma cédula de produto rural, é necessária a apresentação do documento original?

Em regra, sim.

A CPR é um título de crédito líquido e certo (art. 4º da Lei nº 8.929/94) e, como tal, admite o endosso.

A Lei nº 8.929/94, no seu art. 10, I, admite o endosso em preto, a que chama de completo. Isso significa que há
permissão legal expressa para que o credor de uma CPR possa endossá-la a outrem, desde que mencione o nome do
endossatário que, em verdade, passa a ser o novo credor do título:

Art. 10. Aplicam-se à CPR, no que forem cabíveis, as normas de direito cambial, com as seguintes
modificações:

I - os endossos devem ser completos;

(...)
Diante disso, por ser a cédula de produto rural título dotado de natureza cambial, tendo como um dos seus atributos a
circularidade, mediante endosso, conforme previsão do art. 10, I, da Lei nº 8.929/94, a apresentação do documento
original, em regra, é necessária para o aparelhamento da execução.

Vale ressaltar, contudo, que essa exigência da CPR só existe para a execução de cédula de produto rural em “formato
cartular”.

O que é isso? O que significa esse formato cartular?

A Lei nº 13.986/2020 alterou a Lei da cédula de produto rural (Lei nº 8.929/94) e, a partir dessa mudança, passou a ser
possível que a emissão destas cédulas se dê de forma:

a) cartular (“em papel”); ou

b) escritural (eletrônica).

Dessa forma, a obrigatoriedade de juntada do título original aos autos da execução dependerá do suporte no qual ele
estará inserido no momento de propositura da demanda executiva:

i) sendo título de crédito de suporte cartular, faz-se necessária a juntada da cártula;

ii) sendo título de crédito de suporte eletrônico, desnecessária a juntada do original, pois todos os dados relativos ao
título constarão de certidão expedida pela Entidade de registro de Títulos Eletrônicos (ERTE). Em suma, tem-se que, a
partir da vigência da mencionada lei, a apresentação da CPR original faz-se necessária ao aparelhamento da execução
somente se o título exequendo for apresentado no formato cartular.

Em suma:

Na execução de cédula de produto rural em formato cartular é necessária a juntada do original do título de crédito,
salvo se comprovado que o título não circulou.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.915.736-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/06/2021 (Info 702).

Questão 39

É nulo o registro de marca nominativa de símbolo olímpico ou paraolímpico.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Caso concreto: uma empresa fabricante de álcool registrou, no INPI, a marca “Fogo Olímpico” para ser usada em seus produtos.
O STJ decidiu que esse registro não é válido porque não é registrável como marca nome, prêmio ou símbolo de evento esportivo
(art. 124, XIII, da Lei nº 9.279/96).

Além disso, o art. 15 da Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé) conferiu às entidades de administração ou prática desportiva a propriedade
exclusiva das denominações e dos símbolos que as identificam, sendo tal proteção válida em todo o território nacional, por tempo
indeterminado, sem a necessidade de registro ou averbação no órgão competente.

Logo, o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e o Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPOB) possuem a exclusividade de uso de símbolos
olímpicos e paraolímpicos, assim como das denominações “jogos olímpicos”, “olimpíadas”, “jogos paraolímpicos” e
“paraolimpíadas”.

Diante desse quadro, deve ser reconhecida a nulidade do registro marcário, tendo em vista:

a) a proteção especial, em todos os ramos de atividade, conferida pelo ordenamento jurídico brasileiro aos sinais integrantes da
“propriedade industrial Olímpica”, que não podem ser reproduzidos ou imitados por terceiros sem a autorização prévia do COB;

b) o necessário afastamento do aproveitamento parasitário decorrente do denominado “marketing de emboscada” pelo uso
conjugado de expressão e símbolos olímpicos cujo magnetismo comercial é inegável; e

c) o cabimento da aplicação da teoria da diluição a fim de proteger o COB contra a perda progressiva da distintividade dos signos
olímpicos, cujo acentuado valor simbólico pode vir a ser maculado, ofuscado ou adulterado com a sua utilização em produto de uso
cotidiano.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.583.007-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/04/2021 (Info 693).

Questão 40

A supressão de garantias reais e fidejussórias decididas em assembleia-geral de credores de sociedade submetida a regime de recuperação
judicial pode ser estendida aos credores ausentes ou divergentes.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Recuperação judicial

A recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da situação
de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam preservados os
empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.

A recuperação judicial consiste, portanto, em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com
o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência.

Fases da recuperação

De forma resumida, a recuperação judicial possui três fases:

a) postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho de processamento;

b) processamento: vai do despacho de processamento até a decisão concessiva;

c) execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação judicial.

Plano de recuperação
Em até 60 dias após o despacho de processamento da recuperação judicial, o devedor deverá apresentar em juízo um
plano de recuperação da empresa, sob pena de convolação (conversão) do processo de recuperação em falência (art.
53 da Lei nº 11.101/2005).

Este plano deverá conter:

·discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a serem empregados (art. 50);

·demonstração de sua viabilidade econômica; e

·laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional legalmente
habilitado ou empresa especializada.

“O plano de recuperação judicial não é uma mera formalidade, devendo ser encarado pelo devedor como a coisa mais
importante para o eventual sucesso de seu pedido. Portanto, é interessante que o plano seja minuciosamente
elaborado, se possível por profissionais especializados em administração de empresas ou áreas afins, e que proponha
medidas viáveis para a superação da crise que atinge a empresa.”(RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Falência e
Recuperação de Empresas. 3ª ed., Salvador: Juspodivm, 2012, p. 87).

Os credores analisam o plano apresentado, que pode ser aprovado ou não pela assembleia geral de credores. Se
nenhum credor apresentar objeções ao plano, significa que houve aprovação tácita e, neste caso, nem mesmo é
necessário que seja convocada uma assembleia geral.

É possível que, no plano de recuperação judicial, fique combinado que os credores que tinham garantias reais e
fidejussórias perderão essas garantias?

SIM. Isso é possível, considerando que o plano de recuperação representa uma negociação feita entre a empresa
devedora e seus credores.

Por que se faria isso? Por que isso seria interessante?

Porque é possível, por exemplo, que a empresa em recuperação venda o bem que foi dado em garantia e, com o
dinheiro, continue sua atividade produtiva e, assim, possa pagar os credores.

Ex: a empresa “ABC Ltda” tem uma dívida com o banco e deu um imóvel em garantia. Ocorre que essa empresa está
em processo de recuperação judicial e precisa de capital de giro para comprar matéria-prima e continuar produzindo. É
possível que se ajuste, no plano de recuperação, que essa garantia da dívida será suprimida (deixará de existir) e, com
isso, a empresa poderá alienar o bem para conseguir esse dinheiro necessário à aquisição dos insumos.
Isso será possível mesmo que o credor que tenha essa garantia não participe das negociações do plano ou mesmo
que ele discorde dessa providência?

NÃO. É indispensável a sua concordância. Foi o que decidiu o STJ:

A supressão de garantias reais e fidejussórias decididas em assembleia-geral de credores de sociedade submetida


a regime de recuperação judicial não pode ser estendida aos credores ausentes ou divergentes.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.828.248-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. Acd. Min. Raul Araújo, julgado em 05/08/2021
(Info 703).

Arts. 49, §§ 1º e 3º, e 50, § 1º exigem concordância expressa

A Lei nº 11.101/2005, nos arts. 49, §§ 1º e 3º, e 50, § 1º, é expressa ao dispor que a alienação de bem objeto de
garantia real, a supressão de garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do
credor titular da respectiva garantia:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não
vencidos.

§ 1º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os


coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.

(...)

§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de


arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham
cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em
contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e
prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação
respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei,
a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade
empresarial.

Art. 50 (...)

§ 1º Na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão
admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.

Art. 49, § 2º deve ser interpretado em conjunto com o art. 50, § 1º


O art. 49, § 2º da Lei nº 11.101/2005 afirma que “as obrigações anteriores à recuperação judicial observarão as
condições originalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo se de modo
diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial”.

Todavia, essa parte final da norma tem que ser interpretada em harmonia com a regra do já citado art. 50, § 1º, a qual,
seguindo o critério da especialidade, trata de modo específico e inequívoco acerca da subordinação da deliberação
assemblear de supressão ou substituição da garantia à concordância expressa do credor titular da respectiva garantia.

Desconsiderar a vontade dos credores geraria insegurança jurídica

Sob a ótica do mercado, é evidente que a supressão de garantias reais e fidejussórias contra a vontade dos credores
dissidentes traria evidente insegurança jurídica e profundo abalo ao mercado de crédito, essencial para o
financiamento do setor produtivo da economia, fornecedor de imprescindível apoio à continuidade e expansão das
atividades das sociedades empresárias saudáveis, assim como para o saneamento financeiro e revitalização das
próprias sociedades em recuperação judicial.

Enquanto se perceberem dotados de garantias sólidas quanto ao retorno de seus aportes e investimentos, os
financiadores da atividade produtiva, integrantes do mercado financeiro, fornecedores de insumos ou de bens de
capital, sentirão segurança em disponibilizar às empresas tomadoras capital mais barato, com condições mais
favoráveis e prazos mais longos, o que, até mesmo, contribui para a atração de investimentos e de capitais
estrangeiros, cuja falta é sentida na economia nacional.

O desprestígio das garantias será danoso para toda a atividade econômica do país, trazendo insegurança jurídica e
econômica, com a elevação dos juros e do spread bancário, especialmente para aqueles submetidos justamente ao
regime de recuperação judicial.

Em outras palavras, existe uma grande dificuldade de as sociedades empresárias que estão em recuperação judicial
obter financiamento. Essa dificuldade seria ainda maior se as garantias não fossem respeitadas.

Lei nº 14.112/2020

O financiamento da sociedade em recuperação judicial é tão vital para o sucesso do fortalecimento da atividade
produtiva no País que a Lei nº 14.112/2020, ao modificar a Lei nº 11.101/2005, concebeu modalidade específica de
financiamento aos recuperandos, introduzindo no Direito Pátrio os institutos do “Dip (debtor-in-possession) Finance” e
do “Credor Parceiro”.

A nova redação do parágrafo único do art. 67 da Lei nº 11.101/2005 prestigia o chamado “Credor Parceiro” ou “Credor
Estratégico”, que é aquele que recebe vantagens e privilégios caso continue a fornecer insumos, mercadorias, créditos
ou que adquira papéis e debêntures da recuperanda.

Explicando melhor este ponto. O que são os “credores parceiros”?

Quando uma sociedade empresária entra em recuperação judicial, é comum que os antigos parceiros comerciais não
queiram mais manter contratos e fornecer bens e serviços para a empresa em dificuldades. Isso ocorre porque muitas
vezes tais fornecedores ainda possuem créditos a receber e também pelo fato de que temem que a empresa vá à
falência e que, por consequência, as dívidas não sejam satisfeitas.
Ocorre que, se a empresa não tiver mais fornecedores, ela realmente irá quebrar, de forma que a recuperação judicial
não terá êxito.

Com o objetivo de evitar que isso aconteça, alguns planos de recuperação judicial preveem preferências para o
pagamento de credores que, mesmo após a deflagração do processo de recuperação, continuam fornecendo para a
empresa. São vantagens concedidas aos “credores parceiros”, expressão que acabou sendo consagrada na prática
recuperacional.

Não havia previsão para isso na Lei nº 11.101/2005. Apesar disso, a jurisprudência reconhecia a sua validade.

Exemplo real de uma cláusula presente em um plano de recuperação judicial:

“1.3.18. “Credores Parceiros”: são os Credores Concursais ou Credores Extraconcursais Aderentes que colaborarem
com a recuperação judicial do Grupo XXXXX mediante a (i) concessão de financiamentos em valor igual ou superior ao
valor de seus Créditos; (ii) manutenção e/ou a renovação dos contratos celebrados com o Grupo XXXXX em condições
iguais aos atualmente em vigor ou mais vantajosas para o Grupo XXXXX, pelo prazo mínimo de 5 (cinco) anos; ou (iii)
liberação de garantias reais ou fiduciárias sobre imóveis, em valor igual ou superior ao valor dos Créditos do respectivo
Credor, de cuja venda possa decorrer ativos financeiros ao Grupo XXXXX.”

O que fez a Lei nº 14.112/2020?

Previu a possibilidade de concessão dessa prioridade aos “credores parceiros”, a despeito de não ter utilizado essa
nomenclatura. Confira a nova redação do parágrafo único do art. 67:

LEI DE FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL (LEI 11.101/2005)

Antes da Lei 14.112/2020 Depois da Lei 14.112/2020


Art. 67. Os créditos decorrentes de obrigações contraídas pelo
devedor durante a recuperação judicial, inclusive aqueles relativos a
despesas com fornecedores de bens ou serviços e contratos de
mútuo, serão considerados extraconcursais, em caso de decretação
de falência, respeitada, no que couber, a ordem estabelecida no art.
83 desta Lei.

Parágrafo único. Os créditos Parágrafo único. O plano de


quirografários sujeitos à recuperação judicial poderá
recuperação judicial prever tratamento diferenciado
pertencentes a fornecedores de aos créditos sujeitos à
bens ou serviços que recuperação judicial
continuarem a provê-los pertencentes a fornecedores de
normalmente após o pedido de bens ou serviços que
recuperação judicial terão continuarem a prove?-los
privilégio geral de recebimento normalmente após o pedido de
em caso de decretação de recuperação judicial, desde que
falência, no limite do valor dos tais bens ou serviços sejam
bens ou serviços fornecidos necessários para a manutenção
durante o período da das atividades e que o
recuperação. tratamento diferenciado seja
adequado e razoável no que
concerne à relação comercial
futura.

Dip (debtor-in-possession) Finance

A preservação da atividade produtiva, um dos principais objetivos da recuperação judicial, necessita, assim como o
enfermo de oxigênio, da continuidade da cadeia de fornecimento de insumos, mercadorias e crédito. Em troca, se deve
assegurar condições diferenciadas de pagamento e fortalecimento de garantias a tais credores e fornecedores,
essenciais à continuidade da atividade produtiva, atribuindo-se-lhes a natureza de parceiros essenciais.

As assinaladas vantagens e privilégios podem compreender melhores condições para recebimento dos créditos,
menores deságios do que aqueles impostos aos demais credores, ou mesmo, tudo “ad exemplum”, a redução das
parcelas de resgate do crédito. A permissão legal para essas negociações acarreta significativa melhora nos
relacionamentos no ambiente empresarial.

Na mesma esteira, outra essencial inovação foi inserida na Lei n. 11.101/2005 pela Lei n. 14.112/2020, com os arts.
69-A e seguintes:

Art. 69-A. Durante a recuperação judicial, nos termos dos arts. 66 e 67 desta Lei, o juiz poderá, depois de ouvido
o Comitê de Credores, autorizar a celebração de contratos de financiamento com o devedor, garantidos pela
oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não
circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação do valor de
ativos.
Art. 69-B. A modificação em grau de recurso da decisão autorizativa da contratação do financiamento não pode
alterar sua natureza extraconcursal, nos termos do art. 84 desta Lei, nem as garantias outorgadas pelo devedor
em favor do financiador de boa-fé, caso o desembolso dos recursos já tenha sido efetivado.

Art. 69-C. O juiz poderá autorizar a constituição de garantia subordinada sobre um ou mais ativos do devedor
em favor do financiador de devedor em recuperação judicial, dispensando a anuência do detentor da garantia
original.

§ 1º A garantia subordinada, em qualquer hipótese, ficará limitada ao eventual excesso resultante da alienação
do ativo objeto da garantia original.

§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica a qualquer modalidade de alienação fiduciária ou de cessão
fiduciária.

Art. 69-D. Caso a recuperação judicial seja convolada em falência antes da liberação integral dos valores de que
trata esta Seção, o contrato de financiamento será considerado automaticamente rescindido.

Parágrafo único. As garantias constituídas e as preferências serão conservadas até o limite dos valores
efetivamente entregues ao devedor antes da data da sentença que convolar a recuperação judicial em falência.

Art. 69-E. O financiamento de que trata esta Seção poderá ser realizado por qualquer pessoa, inclusive credores,
sujeitos ou não à recuperação judicial, familiares, sócios e integrantes do grupo do devedor.

Art. 69-F. Qualquer pessoa ou entidade pode garantir o financiamento de que trata esta Seção mediante a
oneração ou a alienação fiduciária de bens e direitos, inclusive o próprio devedor e os demais integrantes do
seu grupo, estejam ou não em recuperação judicial.

Trata-se do instituto, de comum aplicação no direito estadunidense, do “Dip (debtor-in-possession) Finance”, o que
revela a hercúlea preocupação do legislador com a continuidade do fluxo de caixa e de novos financiamentos (Fresh
Money) para a recuperação judicial.

Segundo a doutrina mais especializada e moderna da matéria, nesta modalidade de financiamento, a recuperanda
mantém a posse e controle dos bens ou direitos dados em garantia, para que a empresa possa se manter operante.
Com isso, é possível suprir a falta de fluxo de caixa para cobrir as despesas operacionais, de reestruturação e de
preservação do valor dos ativos.
Assim, o Dip Finance permite que o juiz, eventualmente, depois de ouvir o comitê de credores, caso constituído,
autorize a contratação de novos financiamentos pela recuperanda, que sejam garantidos pela oneração ou pela
alienação fiduciária de bens e direitos, próprios (pertencentes ao ativo não circulante do devedor) ou de terceiros,
desde que o “dinheiro novo” (Fresh Money) seja utilizado para financiar as atividades e as despesas de reestruturação
ou de preservação do valor de ativos da recuperanda.

Manutenção das garantias é pilar da economia de mercado

Desse modo, pode-se concluir que a manutenção das garantias reais e fidejussórias em favor do credor dissidente é
pilar da economia de mercado, assentada na ponderação de oportunidade e risco feita pelo financiador da atividade
produtiva, seja na época de fartura, seja em momento de dificuldade. Outrossim, os institutos do Dip Finance e do
Credor Parceiro são a viga mestra (chão da fábrica) da recuperação judicial, sem quebra das garantias dos
investidores e sem abalo do mercado de crédito.

De outro modo, a extensão da supressão das garantias ao credor discordante impacta negativamente o ambiente
econômico empresarial, especialmente os mercados de crédito e de fornecimento de insumos e mercadorias, que,
junto à força de trabalho, representam os elementos mínimos para a continuidade da atividade produtiva, um dos
princípios fundantes do processo de recuperação judicial.

Questão 41

A aposição de datas de vencimento divergentes em nota promissória não inquina os títulos de crédito de nulidade, devendo-se adotar, a data
posterior se a outra coincide com a data de emissão do título.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Nota promissória

A nota promissória é...

- um título de crédito

- no qual o emitente, por escrito, se compromete a pagar (promessa de pagamento)

- uma certa quantia em dinheiro

- a uma outra pessoa (tomador ou beneficiário).

Título executivo extrajudicial

A nota promissória é um título executivo extrajudicial (art. 784, I, do CPC/2015). Assim, se não for paga, poderá ser
ajuizada ação de execução cobrando o valor.
Imagine agora a seguinte situação:

Foi emitida uma nota promissória.

Na nota promissória constaram duas informações diferentes sobre a data de vencimento do título.

Em determinado local constou que a data de vencimento do título seria “05.02.2008”.

Em outro campo, constou que a data de vencimento seria “cinco de julho de dois mil e oito”.

Vale ressaltar que a nota promissória foi emitida em 05.02.2008 (data de emissão).

Duas datas de vencimento

Assim, a nota promissória contém duas datas de vencimento, sendo que a primeira delas coincide com a data de
emissão da cártula, aposta numericamente (05.02.2008).

Qual delas deverá prevalecer?

A data de cinco de julho de dois mil e oito.

A aposição de datas de vencimento divergentes em nota promissória não inquina os títulos de crédito de nulidade,
devendo-se adotar a data posterior se a outra coincide com a data de emissão do título.

Se, entre duas datas de vencimento, uma coincide com a data de emissão do título - não existindo, assim, como se
entrever, nessa hipótese, uma operação de crédito -, deve prevalecer a data posterior.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.920.311-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/05/2021 (Info 697).

Questão 42

A validade dos atos executivos realizados no bojo das execuções individuais, no interregno em que a decisão de deferimento do
processamento da recuperação judicial encontra-se sobrestada ou mesmo reformada (porém, sujeita a revisão por instância judicial superior),
fica condicionada à confirmação, por provimento judicial final, de que o empresário, de fato, não fazia jus ao deferimento do processamento de
sua recuperação judicial.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

João, produtor rural, pediu recuperação judicial, cujo processamento foi deferido pelo juiz.
Um dos credores recorreu alegando que não ficou comprovado o exercício da atividade agrícola pelo período de 2
anos, um dos requisitos do art. 48 da Lei nº 11.101/2005):

Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas
atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:

(...)

O Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso negando direito à recuperação judicial.

Aí foi a vez de João recorrer. Ele interpôs recurso especial ao STJ e o Ministro Relator concedeu tutela provisória para
restabelecer a decisão do juiz de 1ª instância, assegurando ao empresário o direito à recuperação judicial.

Ocorre que, no período entre o acórdão do TJ e a decisão do Ministro do STJ, as execuções individuais contra o
empresário que estavam suspensas voltaram a tramitar e foram praticados diversos atos executivos.

Esses atos executivos são válidos?

A validade dos atos executivos realizados no bojo das execuções individuais, no interregno em que a decisão de
deferimento do processamento da recuperação judicial encontra-se sobrestada ou mesmo reformada (porém,
sujeita a revisão por instância judicial superior), fica condicionada à confirmação, por provimento judicial final, de
que o empresário, de fato, não fazia jus ao deferimento do processamento de sua recuperação judicial.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.867.694-MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 06/10/2020 (Info 681).

Assim, no exemplo dado, se a decisão concedendo a recuperação judicial for confirmada por provimento judicial final,
os atos executivos que foram praticados serão considerados inválidos.

O credor assume os riscos de prosseguir com a sua execução individual. Ele deve saber, contudo, que, se for
confirmado o acerto da decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial, com o restabelecimento de
todos os seus efeitos desde a sua prolação, os atos executivos realizados no âmbito das execuções individuais
tornam-se absolutamente nulos.

Questão 43

Cabe agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas no processo de recuperação judicial e no processo de falência, desde
que demonstrada a urgência, por força da taxatividade mitigada do caput do art. 1.015, do CPC.

CERTO

ERRADO Resposta correta


Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

Nata Indústria S/A ingressou com pedido de recuperação judicial.

O juiz deferiu o processamento.

Durante a tramitação do feito, o juiz proferiu decisão interlocutória determinando que a recuperanda efetuasse o
imediato depósito de 40% dos honorários do administrador judicial.

Contra esta decisão, a empresa interpôs agravo de instrumento.

O TJ não conheceu do recurso, afirmando que não cabe agravo de instrumento contra a decisão do juiz que determina
o pagamento da remuneração do administrador judicial.

Para o TJ, não cabe agravo de instrumento porque essa situação não se enquadra em nenhuma das hipóteses
previstas no art. 1.015 do CPC/2015.

Segundo argumentou o Tribunal, as hipóteses elencadas nos incisos I a XI, do art. 1015, do CPC/2015 são taxativas e
não admitem interpretação extensiva.

Agiu corretamente o TJ?

NÃO.

CPC/2015 prevê dois regimes de cabimento do agravo de instrumento

O CPC/2015 prevê dois regimes distintos para o cabimento do agravo


de instrumento:

1) Incisos do art. 1.015 2) Parágrafo único do art. 1.015


Os incisos do art. 1.015 do O parágrafo único do art. 1.015 afirma, de
CPC preveem uma lista de forma ampla e geral, que cabe agravo de
situações nas quais instrumento contra decisões
caberá agravo de interlocutórias proferidas:
instrumento.
• na fase de liquidação de sentença;
Trata-se de rol
com taxatividade mitigada • no cumprimento de sentença;
(Tema 988).
• no processo de execução;
Vale ressaltar, no entanto,
que os incisos do art.
• no processo de inventário.
1.015 somente se aplicam
para decisões
interlocutórias proferidas
na fase de conhecimento.
Assim, a tese da taxatividade
mitigada somente se aplica para a fase de
conhecimento, não sendo empregada nas
fases ou processos previstos no
parágrafo único do art. 1.015.

Por que o legislador estabeleceu esse tratamento diferenciado? Por que na fase de conhecimento o cabimento do
agravo de instrumento é mais restritivo do que nas demais fases?

Na fase de conhecimento sempre haverá sentença posteriormente. Assim, ainda que o Tribunal não analise
imediatamente o que o juiz decidiu na interlocutória, ele poderá apreciar mais para frente, nos termos do art. 1.009, §
1º do CPC:

Art. 1.009 (...)

§ 1º As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de
instrumento, não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação,
eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões.

Por outro lado, nas fases de liquidação e cumprimento de sentença, no processo executivo e na ação de inventário
nem sempre será possível que o Tribunal analise posteriormente a decisão interlocutória. Isso porque nem sempre
haverá apelação nessas espécies de fases procedimentais e processos, inviabilizando a incidência da regra do art.
1.009, §1º, do CPC/2015.

Além disso, existe uma altíssima invasividade e uma maior gravidade das decisões interlocutórias proferidas nessas
espécies de fases procedimentais e processos, uma vez que, em regra, serão praticados inúmeros e sucessivos atos
judiciais de índole satisfativa (pagamento, penhora, expropriação e alienação de bens, etc.) que se revelam claramente
incompatíveis com a recorribilidade apenas diferida das decisões interlocutórias.
Isso significa que caberá agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas nos processos
mencionados no parágrafo único do art. 1.015 do CPC?

Exatamente isso. Em caso de decisão interlocutória proferida nos casos do parágrafo único do art. 1.015 do CPC, o
cabimento do agravo de instrumento é geral e atípico (não precisa estar listado taxativamente). Nesse sentido:

“Na fase de liquidação de sentença, na de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de


inventário e partilha, toda e qualquer decisão interlocutória é agravável. Não há limitação. São atípicos os casos
de decisões interlocutórias agraváveis, cabendo examinar, concretamente, se há interesse recursal.” (DIDIER JR.,
Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões
judiciais e processos nos tribunais. 15ª ed. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 267)

“admite-se agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias que venham a ser proferidas em sede
de liquidação de sentença, na fase de cumprimento de sentença, no processo de execução ou no procedimento
especial de inventário e partilha”. (CÂMARA, Alexandre Freitas. Comentários ao Novo Código de Processo Civil.
CABRAL, Antonio do Passo; CRAMER, Ronaldo (org.). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 1.499).

Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery explicam por que todas as decisões interlocutórias referidas no art.
1.015, parágrafo único, do CPC/2015, são agraváveis de imediato:

“38. Liquidação de sentença. O CPC/1973, na reforma de 2005/2006, firmou o entendimento de que da decisão
sobre a liquidação de sentença caberia agravo de instrumento e não apelação. Essa saída é, de fato, a mais
lógica, tendo em vista que da decisão de liquidação depende o seguimento do cumprimento de sentença, e não
seria compensador nem em relação ao tempo, nem em relação à possibilidade de satisfazer o crédito, aguardar
o julgamento de uma apelação, mesmo que sem efeito suspensivo (e se o Tribunal modificar a decisão?).

(...).

39. Cumprimento de sentença e execução. Nestes casos, não é viável aguardar a apelação contra a sentença que
finaliza esses procedimentos, pois o curso do levantamento e alienação de bens, por exemplo, pode ficar
prejudicado, criando o risco de o devedor dilapidar os bens que poderiam servir à satisfação do crédito. Existe,
pois, o interesse em que tais procedimentos sejam céleres, além do que já seria esperado em razão da garantia
constitucional da duração razoável do processo.

(...).

40. Inventário. A partilha, objetivo máximo do inventário, não pode ficar à espera de decisões menores do
processo. E isso acontece não apenas porque os bens correm o risco de deterioração e desvalorização, mas
também porque os interesses de várias pessoas, e também do Estado, estão voltados à solução da partilha. Vale
ressaltar que a decisão final da partilha também é sentença, muito embora não esteja assim qualificada no CPC
203 §1º.” (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 16ª ed, São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 2.241).

Esse foi o entendimento adotado pelo STJ:

Cabe agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas na liquidação e no cumprimento de
sentença, no processo executivo e na ação de inventário.
STJ. Corte Especial. REsp 1.803.925-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 01/08/2019 (Info 653).

A falência e a recuperação judicial podem ser enquadradas no parágrafo único do art. 1.015 do CPC?

SIM. A recuperação judicial é um processo que tem natureza jurídica de liquidação e de execução negocial das dívidas
da pessoa jurídica devedora. Logo, é uma espécie de processo de execução.

De igual forma, a falência é um processo judicial que tem natureza jurídica de liquidação e de execução coletiva das
dívidas da pessoa jurídica falida. Desse modo, também é uma espécie de processo de execução.

A melhor intepretação é a de que o parágrafo único do art. 1.015 não abrange apenas a liquidação e a execução
previstas no CPC/2015, mas, ao contrário, igualmente se aplica aos processos que, embora disciplinados por
legislação extravagante, também possuam natureza jurídica de liquidação e execução, como é o caso, por exemplo,
dos processos recuperacionais e dos processos falimentares previstos na Lei nº 11.101/2005.

Essa já havia sido a conclusão adotada na I Jornada de Direito Processual Civil do CJF:

Enunciado nº 69: A hipótese do art. 1.015, parágrafo único, do CPC abrange os processos concursais, de falência e
recuperação.

Trata-se da opinião manifestada pela imensa maioria da doutrina especializada:

(...) o entendimento correto é no sentido de continuar sendo possível o agravo de instrumento, em todos os casos
de decisão interlocutória na LREF, aplicando-se analogicamente ao processo falimentar e recuperacional, a
exceção prevista no parágrafo único do art. 1.015 do CPC.” (BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação
de empresas e falência. São Paulo: RT, 2018, p. 448)

Em suma:

Cabe agravo de instrumento de todas as decisões interlocutórias proferidas no processo de recuperação judicial e
no processo de falência, por força do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.717.213-MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/12/2020 (Recurso Repetitivo – Tema
1022) (Info 684).

Modulação dos efeitos

Para propiciar segurança jurídica e proteger as partes que, confiando na irrecorribilidade das decisões interlocutórias
fora das hipóteses de cabimento previstas na Lei nº 11.101/2005, não interpuseram agravo de instrumento com base
no art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015, faz-se necessário estabelecer que: 1) as decisões interlocutórias que não
foram objeto de recurso de agravo de instrumento poderão ser objeto de impugnação pela parte em eventual e
hipotética apelação ou em contrarrazões, como autoriza o art. 1.009, §1º, do CPC/2015, se entender a parte que ainda
será útil o enfrentamento da questão incidente objeto da decisão interlocutória naquele momento processual;

2) a presente tese jurídica vinculante (Tema 1022) deverá ser aplicada a todas as decisões interlocutórias proferidas
após a publicação do acórdão que fixou a tese (10/12/2020) e a todos os agravos de instrumento interpostos antes da
fixação da tese e que ainda se encontrem pendentes de julgamento ao tempo da publicação deste acórdão, excluindo-
se aqueles que não foram conhecidos por decisão judicial transitada em julgado.

Reforma da Lei de Falências (IMPORTANTE):

As decisões interlocutórias proferidas nos processos de recuperação judicial e falência podem ser impugnadas por
agravo de instrumento. Foi o que previu o art. 189, § 1º, II, da Lei nº 11.101/2005, com redação dada pela Lei nº
14.112/2020:

Art. 189. Aplica-se, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei, o disposto na Lei nº 13.105, de 16 de
março de 2015 (Código de Processo Civil), desde que não seja incompatível com os princípios desta Lei.

§ 1º Para os fins do disposto nesta Lei:

(...)

II - as decisões proferidas nos processos a que se refere esta Lei serão passíveis de agravo de instrumento,
exceto nas hipóteses em que esta Lei previr de forma diversa.

Desse modo, existe agora previsão expressa na Lei nº 11.101/2005 no sentido de que cabe agravo de instrumento
contra as decisões proferidas na falência e recuperação judicial.

Questão 44

O afastamento dos créditos de titulares de posição de proprietário fiduciário dos efeitos da recuperação judicial da devedora independe da
identificação pessoal do fiduciante ou do fiduciário com o bem imóvel ofertado em garantia ou com a própria recuperanda.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Quais créditos estão sujeitos à recuperação judicial

Na recuperação judicial, a empresa devedora, que está “sufocada” por dívidas, irá pagar os seus credores de uma
forma mais “suave”, a fim de que consiga quitar todos os débitos e se manter funcionando.

Assim, os credores da empresa em recuperação judicial são inscritos no “quadro geral de credores”, e cada um
receberá seu crédito de acordo com o que for definido no plano de recuperação.
Um dos temas importantes sobre esse assunto é saber quais créditos estão sujeitos à recuperação judicial, ou seja,
quais credores terão que receber seus créditos conforme o plano de recuperação.

Regra

Em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial,
ainda que não vencidos (art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005).

Ex.: a empresa tem que pagar uma dívida com um fornecedor daqui a 9 meses; se o pedido de recuperação foi feito
hoje, esse crédito já será incluído nas regras da recuperação judicial, mesmo que ainda não tenha chegado a data do
vencimento.

Consequência dessa regra:

Como vimos acima, tendo sido decretada a recuperação judicial, os credores irão receber conforme o plano. Como
consequência disso, em regra, as ações e execuções que tramitam contra a empresa em recuperação são suspensas
para poder não atrapalhar a execução do plano. Veja:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:

I - suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime desta Lei;

II - suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio
solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência;

III - proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição
judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos
créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência.

(...)

§ 4º Na recuperação judicial, as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste
artigo perdurarão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado do deferimento do processamento da
recuperação, prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não
haja concorrido com a superação do lapso temporal.

Exceções à regra:

A regra acima exposta (caput do art. 49) possui exceções, que estão elencadas nos §§ 3º e 4º.

Dessa feita, nesses parágrafos estão previstos determinados créditos que não se sujeitam aos efeitos da recuperação
judicial.
Veja o § 3º, que interessa para explicar o julgado:

Art. 49 (...)

§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de


arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham
cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em
contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e
prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação
respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta
Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade
empresarial.

Créditos decorrentes de alienação fiduciária enquadram-se no § 3º

Se a empresa em recuperação tinha um contrato de alienação fiduciária com o credor “X” e este credor tinha, como
garantia da dívida, a propriedade fiduciária de um bem que está na posse da empresa, esse “crédito” enquadra-se no §
3º.

Ex.: a empresa tinha feito uma alienação fiduciária para adquirir um caminhão “XYZ”; como não tinha dinheiro para
pagar à vista, fez um financiamento e o veículo ficou na propriedade fiduciária do banco “ABC”, sendo usado pela
empresa (que tinha a posse direta do bem). Se a empresa entra com pedido de recuperação judicial, esse crédito do
banco não está submetido aos efeitos do plano de credores. Em outras palavras, a empresa terá que continuar
pagando as prestações da mesma forma que já estava ajustada no contrato e, se atrasar, o banco poderá propor a
ação de busca e apreensão.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:

A sociedade empresária Medical Line Comércio Ltda. celebrou contrato de empréstimo com o Banco e, como garantia
de que a dívida seria paga, João, um dos sócios da empresa, transferiu seu imóvel para a instituição financeira.

Na prática, foi feito um contrato de alienação fiduciária, no entanto, a garantia relativa à alienação fiduciária de imóvel
foi prestada por terceiro, não afetando nenhum bem do patrimônio da empresa devedora.

Passado algum tempo, foi decretada a recuperação judicial da empresa.

A Medical Line Comércio Ltda ainda não pagou a dívida com o banco, devendo ainda R$ 500 mil.

Daí surgiu a seguinte divergência: esse crédito de R$ 500 mil está fora dos efeitos da recuperação judicial?Aplica-se,
ao caso, o § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005?

1ª posição: NÃO.

O administrador judicial defendeu que não. Para o administrador judicial, o banco deverá pleitear o crédito segundo o
plano de credores. Isso porque a garantia relativa à alienação fiduciária de imóvel foi prestada por terceiro, de forma
que a situação não se amoldaria ao § 3º do art. 49 da Lei nº 11. A 101/2005.
2ª posição: SIM.

O Banco sustentou que seu crédito estaria fora dos efeitos da recuperação judicial (o que, para ele é bom, já que é
mais fácil de receber).

Para a instituição financeira, o crédito em questão possui natureza extraconcursal, na medida em que o art. 49, § 3º,
da Lei “não faz qualquer distinção quanto ao fato do bem dado em alienação fiduciária ser de propriedade de terceiros,
ou seja, não exige que o fiduciante seja empresa em recuperação judicial”.

Qual das duas posições foi acolhida pelo STJ?

A segunda.

O fato de o bem imóvel alienado fiduciariamente não integrar o acervo patrimonial da empresa devedora não tem o
condão de afastar a regra prevista no § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005.

Esse dispositivo legal estabelece que o crédito que o proprietário fiduciário possui não se submete aos efeitos da
recuperação. O legislador não delimitou o alcance da regra em questão exclusivamente aos bens alienados
fiduciariamente originários do acervo patrimonial da própria sociedade empresária recuperanda, tendo apenas
estipulado a não sujeição aos efeitos da recuperação do crédito titularizado pelo “credor titular da posição de
proprietário fiduciário”.

Portanto, o dispositivo legal em análise afasta por completo dos efeitos da recuperação judicial não apenas o bem
alienado fiduciariamente, mas o próprio contrato por ele garantido.

Tal compreensão se coaduna com a sistemática legal arquitetada para albergar o instituto da propriedade fiduciária,
de modo que, estando distanciado referido instituto jurídico dos interesses dos sujeitos envolvidos - haja vista estar o
bem alienado vinculado especificamente ao crédito garantido - afigura-se irrelevante a identificação pessoal do
fiduciante ou do fiduciário com o objeto da garantia ou com a própria sociedade recuperanda.

Nesse sentido:

(...) 1. Debate-se nos autos a necessidade de o bem imóvel objeto de propriedade fiduciária ser originariamente
vinculado ao patrimônio da recuperanda para fins de afastamento do crédito por ele garantido dos efeitos da
recuperação judicial da empresa.

2. Na propriedade fiduciária, cria-se um patrimônio destacado e exclusivamente destinado à realização da finalidade


de sua constituição, deslocando-se o cerne do instituto dos interesses dos sujeitos envolvidos para o escopo do
contrato.

3. O afastamento dos créditos de titulares de propriedade fiduciária dos efeitos da recuperação, orientado por esse
movimento que tutela a finalidade de sua constituição, independe da identificação pessoal do fiduciante ou do
fiduciário com o bem imóvel ou com o próprio recuperando, simplifica o sistema de garantia e estabelece prevalência
concreta da propriedade fiduciária e das condições contratuais originárias, nos termos expressos pelo art. 49, § 3º,
da Lei n. 11.101/05. (...)

STJ. 3ª Turma. REsp 1549529/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 18/10/2016.
Em suma:

O afastamento dos créditos de titulares de posição de proprietário fiduciário dos efeitos da recuperação judicial da
devedora independe da identificação pessoal do fiduciante ou do fiduciário com o bem imóvel ofertado em garantia
ou com a própria recuperanda.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.938.706-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 14/09/2021 (Info 710).

Questão 45

Não é cabível o repasse da despesa relativa à tarifa de emissão de boletos bancários feito pela distribuidora de medicamentos às drogarias e
farmácias.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

A empresa “DistriDroga” é uma grande distribuidora de remédios. Ela é responsável por comprar os remédios das
indústrias farmacêuticas e distribuí-los (revendê-los) para todas as drogarias do Estado.

Quando a drogaria encomenda os remédios que quer comprar, a distribuidora emite um boleto bancário para que a
farmácia efetue o pagamento.

A distribuidora é a cedente do título e a drogaria que comprou o medicamento é o sacado.

Ocorre que a distribuidora cobra R$ 2,50 das drogarias por cada boleto bancário que emite, afirmando que faz isso
para cobrir os custos, já que os bancos exigem dela este valor.

As drogarias (varejistas) são pequenas e não têm condições de, individualmente, discutir cláusulas contratuais com a
distribuidora (atacadista), que é maior em termos de poderio econômico.

Diante disso, o sindicato das drogarias e farmácias ingressou com ação de obrigação de fazer contra a distribuidora
requerendo que esta seja condenada a se abster de cobrar ou repassar as despesas para as varejistas quanto aos
custos de emissão dos boletos bancários.

Após ser julgado pelo juiz e pelo TJ, a questão chegou até o STJ.

As distribuidoras podem cobrar das drogarias e farmácias esse valor do boleto bancário?

SIM.
É cabível o repasse da despesa relativa à tarifa de emissão de boletos bancários feito pela distribuidora de
medicamentos às drogarias e farmácias.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.515.640/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 19/09/2017.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.580.446-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 23/02/2021 (Info 686).

Presume-se a cargo do comprador as despesas com o pagamento e a quitação

As distribuidoras (comerciantes atacadistas) adquirem os produtos da indústria farmacêutica (laboratórios e


importadoras) e, posteriormente, atuam em uma complexa logística até que esses medicamentos cheguem às
farmácias e drogarias. Para conseguir isso, essas distribuidoras precisam armazenar, controlar o estoque e organizar
o fluxo de distribuição, transporte e venda dos medicamentos.

Uma vez firmado o contrato de compra e venda mercantil - integrante da relação de distribuição de produtos
farmacêuticos -, a obrigação essencial das atacadistas (vendedoras) consistirá na “entrega dos medicamentos”
(transferência efetiva do domínio) em determinado prazo, ao passo que incumbirá às varejistas (compradoras) o
pagamento do preço avençado.

Nos termos do art. 325 do Código Civil, a obrigação das compradoras não se resume ao pagamento do preço,
presumindo-se a sua responsabilidade pelas “despesas com o pagamento e a quitação”, salvo em se tratando de
despesa excepcional decorrente de fato imputável ao credor:

Art. 325. Presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e a quitação; se ocorrer aumento
por fato do credor, suportará este a despesa acrescida.

À luz do Código Civil, a chamada “tarifa de emissão de boleto bancário” pode ser considerada como uma despesa
decorrente da oferta deste meio de pagamento às varejistas (compradoras), revelando-se razoável que lhes seja
imputada. Além disso, como vimos no art. 325, essa despesa fica, em regra, a cargo do comprador.

Resolução nº 3.919/2010 do CMN não se aplica ao caso

Um dos argumentos do sindicato das drogarias e farmácias era o de que o Conselho Monetário Nacional (CMN) proíbe
essa cobrança na Resolução nº 3.919/2010, que diz:

Art. 1º (...)

§ 2º É vedada a realização de cobranças na forma de tarifas ou de ressarcimento de despesas:

(...)

II - do sacado, em decorrência da emissão de boletos ou faturas de cobrança, carnês e assemelhados.


O STJ não aceitou essa alegação. Isso porque essa a vedação de cobrança de tarifa de emissão de boleto
consubstancia comando dirigido unicamente às instituições financeiras, que não podem exigir de seus clientes
(pessoas, físicas ou jurídicas, com as quais mantenha vínculo negocial não esporádico) a remuneração de serviço sem
respaldo em prévia contratação nem obter valores, a esse título, diretamente do sacado.

Essa Resolução não proíbe nem limita a liberdade negocial de sociedades empresárias que, no livre exercício de sua
autonomia privada, podem combinar que esse custo da vendedora (distribuidora) será transferido para as adquirentes
dos produtos farmacêuticos (varejistas).

O Conselho Monetário Nacional nem poderia avançar sobre a liberdade contratual dos empresários na celebração dos
seus negócios, proibindo-lhes de fazer o repasse dos seus custos àqueles que com eles venham a contratar,
engessando, assim, a dinâmica distribuição da responsabilidade pelos custos contratuais.

Questão 46

Cabe agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas no processo de recuperação judicial e no processo de falência, desde
que demonstrada a urgência, por força da taxatividade mitigada do caput do art. 1.015, do CPC.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

Nata Indústria S/A ingressou com pedido de recuperação judicial.

O juiz deferiu o processamento.

Durante a tramitação do feito, o juiz proferiu decisão interlocutória determinando que a recuperanda efetuasse o
imediato depósito de 40% dos honorários do administrador judicial.

Contra esta decisão, a empresa interpôs agravo de instrumento.

O TJ não conheceu do recurso, afirmando que não cabe agravo de instrumento contra a decisão do juiz que determina
o pagamento da remuneração do administrador judicial.

Para o TJ, não cabe agravo de instrumento porque essa situação não se enquadra em nenhuma das hipóteses
previstas no art. 1.015 do CPC/2015.

Segundo argumentou o Tribunal, as hipóteses elencadas nos incisos I a XI, do art. 1015, do CPC/2015 são taxativas e
não admitem interpretação extensiva.

Agiu corretamente o TJ?

NÃO.
CPC/2015 prevê dois regimes de cabimento do agravo de instrumento

O CPC/2015 prevê dois regimes distintos para o cabimento do agravo


de instrumento:

1) Incisos do art. 1.015 2) Parágrafo único do art. 1.015

Os incisos do art. 1.015 do O parágrafo único do art. 1.015 afirma, de


CPC preveem uma lista de forma ampla e geral, que cabe agravo de
situações nas quais instrumento contra decisões
caberá agravo de interlocutórias proferidas:
instrumento.
• na fase de liquidação de sentença;
Trata-se de rol
com taxatividade mitigada • no cumprimento de sentença;
(Tema 988).
• no processo de execução;
Vale ressaltar, no entanto,
que os incisos do art.
• no processo de inventário.
1.015 somente se aplicam
para decisões
interlocutórias proferidas
na fase de conhecimento.
Assim, a tese da taxatividade
mitigada somente se aplica para a fase de
conhecimento, não sendo empregada nas
fases ou processos previstos no
parágrafo único do art. 1.015.

Por que o legislador estabeleceu esse tratamento diferenciado? Por que na fase de conhecimento o cabimento do
agravo de instrumento é mais restritivo do que nas demais fases?

Na fase de conhecimento sempre haverá sentença posteriormente. Assim, ainda que o Tribunal não analise
imediatamente o que o juiz decidiu na interlocutória, ele poderá apreciar mais para frente, nos termos do art. 1.009, §
1º do CPC:
Art. 1.009 (...)

§ 1º As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de
instrumento, não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação,
eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões.

Por outro lado, nas fases de liquidação e cumprimento de sentença, no processo executivo e na ação de inventário
nem sempre será possível que o Tribunal analise posteriormente a decisão interlocutória. Isso porque nem sempre
haverá apelação nessas espécies de fases procedimentais e processos, inviabilizando a incidência da regra do art.
1.009, §1º, do CPC/2015.

Além disso, existe uma altíssima invasividade e uma maior gravidade das decisões interlocutórias proferidas nessas
espécies de fases procedimentais e processos, uma vez que, em regra, serão praticados inúmeros e sucessivos atos
judiciais de índole satisfativa (pagamento, penhora, expropriação e alienação de bens, etc.) que se revelam claramente
incompatíveis com a recorribilidade apenas diferida das decisões interlocutórias.

Isso significa que caberá agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas nos processos
mencionados no parágrafo único do art. 1.015 do CPC?

Exatamente isso. Em caso de decisão interlocutória proferida nos casos do parágrafo único do art. 1.015 do CPC, o
cabimento do agravo de instrumento é geral e atípico (não precisa estar listado taxativamente). Nesse sentido:

“Na fase de liquidação de sentença, na de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de


inventário e partilha, toda e qualquer decisão interlocutória é agravável. Não há limitação. São atípicos os casos
de decisões interlocutórias agraváveis, cabendo examinar, concretamente, se há interesse recursal.” (DIDIER JR.,
Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões
judiciais e processos nos tribunais. 15ª ed. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 267)

“admite-se agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias que venham a ser proferidas em sede
de liquidação de sentença, na fase de cumprimento de sentença, no processo de execução ou no procedimento
especial de inventário e partilha”. (CÂMARA, Alexandre Freitas. Comentários ao Novo Código de Processo Civil.
CABRAL, Antonio do Passo; CRAMER, Ronaldo (org.). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 1.499).

Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery explicam por que todas as decisões interlocutórias referidas no art.
1.015, parágrafo único, do CPC/2015, são agraváveis de imediato:

“38. Liquidação de sentença. O CPC/1973, na reforma de 2005/2006, firmou o entendimento de que da decisão
sobre a liquidação de sentença caberia agravo de instrumento e não apelação. Essa saída é, de fato, a mais
lógica, tendo em vista que da decisão de liquidação depende o seguimento do cumprimento de sentença, e não
seria compensador nem em relação ao tempo, nem em relação à possibilidade de satisfazer o crédito, aguardar
o julgamento de uma apelação, mesmo que sem efeito suspensivo (e se o Tribunal modificar a decisão?).

(...).
39. Cumprimento de sentença e execução. Nestes casos, não é viável aguardar a apelação contra a sentença que
finaliza esses procedimentos, pois o curso do levantamento e alienação de bens, por exemplo, pode ficar
prejudicado, criando o risco de o devedor dilapidar os bens que poderiam servir à satisfação do crédito. Existe,
pois, o interesse em que tais procedimentos sejam céleres, além do que já seria esperado em razão da garantia
constitucional da duração razoável do processo.

(...).

40. Inventário. A partilha, objetivo máximo do inventário, não pode ficar à espera de decisões menores do
processo. E isso acontece não apenas porque os bens correm o risco de deterioração e desvalorização, mas
também porque os interesses de várias pessoas, e também do Estado, estão voltados à solução da partilha. Vale
ressaltar que a decisão final da partilha também é sentença, muito embora não esteja assim qualificada no CPC
203 §1º.” (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 16ª ed, São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 2.241).

Esse foi o entendimento adotado pelo STJ:

Cabe agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas na liquidação e no cumprimento de
sentença, no processo executivo e na ação de inventário.

STJ. Corte Especial. REsp 1.803.925-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 01/08/2019 (Info 653).

A falência e a recuperação judicial podem ser enquadradas no parágrafo único do art. 1.015 do CPC?

SIM. A recuperação judicial é um processo que tem natureza jurídica de liquidação e de execução negocial das dívidas
da pessoa jurídica devedora. Logo, é uma espécie de processo de execução.

De igual forma, a falência é um processo judicial que tem natureza jurídica de liquidação e de execução coletiva das
dívidas da pessoa jurídica falida. Desse modo, também é uma espécie de processo de execução.

A melhor intepretação é a de que o parágrafo único do art. 1.015 não abrange apenas a liquidação e a execução
previstas no CPC/2015, mas, ao contrário, igualmente se aplica aos processos que, embora disciplinados por
legislação extravagante, também possuam natureza jurídica de liquidação e execução, como é o caso, por exemplo,
dos processos recuperacionais e dos processos falimentares previstos na Lei nº 11.101/2005.

Essa já havia sido a conclusão adotada na I Jornada de Direito Processual Civil do CJF:

Enunciado nº 69: A hipótese do art. 1.015, parágrafo único, do CPC abrange os processos concursais, de falência e
recuperação.

Trata-se da opinião manifestada pela imensa maioria da doutrina especializada:


(...) o entendimento correto é no sentido de continuar sendo possível o agravo de instrumento, em todos os casos
de decisão interlocutória na LREF, aplicando-se analogicamente ao processo falimentar e recuperacional, a
exceção prevista no parágrafo único do art. 1.015 do CPC.” (BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação
de empresas e falência. São Paulo: RT, 2018, p. 448)

Em suma:

Cabe agravo de instrumento de todas as decisões interlocutórias proferidas no processo de recuperação judicial e
no processo de falência, por força do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.717.213-MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/12/2020 (Recurso Repetitivo – Tema
1022) (Info 684).

Modulação dos efeitos

Para propiciar segurança jurídica e proteger as partes que, confiando na irrecorribilidade das decisões interlocutórias
fora das hipóteses de cabimento previstas na Lei nº 11.101/2005, não interpuseram agravo de instrumento com base
no art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015, faz-se necessário estabelecer que: 1) as decisões interlocutórias que não
foram objeto de recurso de agravo de instrumento poderão ser objeto de impugnação pela parte em eventual e
hipotética apelação ou em contrarrazões, como autoriza o art. 1.009, §1º, do CPC/2015, se entender a parte que ainda
será útil o enfrentamento da questão incidente objeto da decisão interlocutória naquele momento processual;

2) a presente tese jurídica vinculante (Tema 1022) deverá ser aplicada a todas as decisões interlocutórias proferidas
após a publicação do acórdão que fixou a tese (10/12/2020) e a todos os agravos de instrumento interpostos antes da
fixação da tese e que ainda se encontrem pendentes de julgamento ao tempo da publicação deste acórdão, excluindo-
se aqueles que não foram conhecidos por decisão judicial transitada em julgado.

Reforma da Lei de Falências (IMPORTANTE):

As decisões interlocutórias proferidas nos processos de recuperação judicial e falência podem ser impugnadas por
agravo de instrumento. Foi o que previu o art. 189, § 1º, II, da Lei nº 11.101/2005, com redação dada pela Lei nº
14.112/2020:

Art. 189. Aplica-se, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei, o disposto na Lei nº 13.105, de 16 de
março de 2015 (Código de Processo Civil), desde que não seja incompatível com os princípios desta Lei.

§ 1º Para os fins do disposto nesta Lei:

(...)

II - as decisões proferidas nos processos a que se refere esta Lei serão passíveis de agravo de instrumento,
exceto nas hipóteses em que esta Lei previr de forma diversa.
Desse modo, existe agora previsão expressa na Lei nº 11.101/2005 no sentido de que cabe agravo de instrumento
contra as decisões proferidas na falência e recuperação judicial.

Questão 47

O termo inicial da contagem do prazo para pagamento dos credores trabalhistas é a data da concessão da recuperação judicial, e não o
término do período de suspensão.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
O termo inicial da contagem do prazo para pagamento dos credores trabalhistas é a data da concessão da
recuperação judicial, e não o término do período de suspensão.

Durante a elaboração e a aprovação do plano de recuperação judicial, há uma liberdade para negociar os prazos de
pagamento dos credores. Sendo o plano homologado, tais prazos deverão ser respeitados na fase de execução do
plano. Vale ressaltar, contudo, que essa liberdade para negociar os prazos não é absoluta, sendo mitigada pela lei em
certas situações, como forma de serem evitados abusos. Um dos limites à liberdade de negociar os prazos para
pagamento é justamente no caso dos créditos trabalhistas. O art. 54 da Lei nº 11.101/2005 prevê prazos máximos
para o pagamento dos créditos trabalhistas.

Apesar do estabelecimento do prazo máximo para o pagamento dos créditos trabalhistas, a Lei nº 11.101/2005 não
fixou o marco inicial para a contagem desses prazos.

Vale ressaltar que o STJ não admite que o termo inicial desse prazo para pagamento seja o término do período de
suspensão (stay period).

O termo inicial para a contagem do prazo máximo para o pagamento dos credores trabalhistas deve ser a data da
concessão da recuperação judicial. A concessão da recuperação judicial é verdadeira condição para o início do
cumprimento das obrigações previstas no plano de soerguimento. O plano de recuperação judicial gera uma novação
do crédito que apenas terá eficácia com a decisão que homologa o plano e concede a recuperação judicial. Não há
lógica de obrigar o devedor em recuperação a realizar o cumprimento da obrigação novada antes de concluída a
novação, com a aprovação do plano.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.924.164-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/06/2021 (Info 701).

Questão 48

O prazo do § 1º do art. 24-A da Lei nº 9.656/98 pode ser ampliado pelo juízo da insolvência civil de operadora de plano de saúde para atingir
os bens de ex-conselheiro fiscal que deixou o cargo antes dos doze meses que antecederam o ato de decretação da liquidação extrajudicial.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Liquidação extrajudicial dos planos de saúde

Os planos de saúde gerenciam o dinheiro de muitas pessoas que buscam, após anos de contribuição, terem o
atendimento médico e hospitalar quando necessitarem.

Trata-se, portanto, de uma atividade de enorme responsabilidade e de grande interesse público.

Diante disso, o Poder Público exerce uma intensa fiscalização sobre tais entidades a fim de que os recursos sejam
gerenciados com responsabilidade e que os serviços sejam prestados de forma devida.
Caso os planos de saúde estejam passando por dificuldades financeiras, em vez de irem à falência imediatamente
prejudicando milhares de pessoas, a Lei nº 9.656/98 prevê medidas para evitar a quebra, sendo uma delas a liquidação
extrajudicial. Nesse sentido, confira o que diz o art. 24 da Lei:

Art. 24. Sempre que detectadas nas operadoras sujeitas à disciplina desta Lei insuficiência das garantias do
equilíbrio financeiro, anormalidades econômico-financeiras ou administrativas graves que coloquem em risco a
continuidade ou a qualidade do atendimento à saúde, a ANS poderá determinar a alienação da carteira, o
regime de direção fiscal ou técnica, por prazo não superior a trezentos e sessenta e cinco dias, ou a liquidação
extrajudicial, conforme a gravidade do caso.

Indisponibilidade dos bens das pessoas que exerceram a administração do plano de saúde

A fim de ter condições de quitar todas as dívidas, a Lei prevê a indisponibilidade dos bens das pessoas que exerceram
a administração do plano de saúde até que termine a apuração para verificar se elas possuem responsabilidade pela
situação:

Art. 24-A. Os administradores das operadoras de planos privados de assistência à saúde em regime de direção
fiscal ou liquidação extrajudicial, independentemente da natureza jurídica da operadora, ficarão com todos os
seus bens indisponíveis, não podendo, por qualquer forma, direta ou indireta, aliená-los ou onerá-los, até
apuração e liquidação final de suas responsabilidades.

Nas palavras da Min. Nancy Andrighi, “a decretação da indisponibilidade de bens visa a evitar que a eventual
insolvência civil ou falência da operadora, causada pela má-administração, provoque um risco sistêmico ao mercado
de planos de saúde, assegurando a responsabilidade patrimonial de todos aqueles que concorreram para a
instauração do regime de liquidação extrajudicial. Visa, em última análise, à proteção de toda a coletividade envolvida
na prestação do serviço privado de assistência à saúde, de inegável relevância econômica e social.”

Vale ressaltar que essa indisponibilidade não significa uma perda imediata e automática da propriedade dos bens. A
indisponibilidade impõe restrição apenas ao exercício do direito de dispor do bem (alienar). Não impede, contudo, que
o titular continue usando da coisa até que se decida se haverá, ou não, o efetivo perdimento.

Outro ponto a ser destacado é que a indisponibilidade do caput do art. 24-A acima transcrito decorre da mera
instauração do regime de liquidação extrajudicial, não sendo necessária decisão judicial. A indisponibilidade de bens
constitui um efeito direto e imediato do regime de liquidação extrajudicial determinado pela ANS (Agência Nacional de
Saúde Suplementar).

Quem é atingido pela indisponibilidade?

O § 1º do art. 24-A afirma que essa indisponibilidade atinge apenas as pessoas que exerceram a administração do
plano de saúde nos 12 meses antes do ato que decretar a direção fiscal ou a liquidação extrajudicial:

Art. 24-A (...)


§ 1º A indisponibilidade prevista neste artigo decorre do ato que decretar a direção fiscal ou a liquidação
extrajudicial e atinge a todos aqueles que tenham estado no exercício das funções nos doze meses anteriores
ao mesmo ato.

Esse prazo legal pode ser ampliado pelo juiz (Poder Judiciário) para atingir algum ex-administrador que tenha saído
há mais de doze meses?

SIM.

O prazo do § 1º do art. 24-A da Lei nº 9.656/98 pode ser ampliado pelo juízo da insolvência civil de operadora de
plano de saúde para atingir os bens de ex-conselheiro fiscal que deixou o cargo antes dos doze meses que
antecederam o ato de decretação da liquidação extrajudicial.

Desde que observados os requisitos legais, pode o Juízo, com base no poder geral de cautela, ampliar o alcance da
norma quando verificar a existência de fundados indícios de responsabilidade de determinado agente, a fim de
assegurar, concretamente, a eficácia e a utilidade do provimento jurisdicional de caráter satisfativo.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.845.214-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/10/2020 (Info 682).

Por força do art. 24-D da Lei nº 9.656/98, as normas do Código de Processo Civil aplicam-se, subsidiariamente, à
liquidação extrajudicial, falência e insolvência civil das operadoras de planos de saúde, no que for compatível com a
legislação especial, como ocorre com os dispositivos que versam sobre o poder geral de cautela, sobretudo por se
tratar de poder com acento em princípios processuais gerais como o da efetividade da jurisdição e o da segurança
jurídica.

A decretação da indisponibilidade de bens visa a evitar que a eventual insolvência civil ou falência da operadora,
causada pela má-administração, provoque um risco sistêmico ao mercado de planos de saúde, assegurando a
responsabilidade patrimonial de todos aqueles que concorreram para a instauração do regime de liquidação
extrajudicial; visa, em última análise, à proteção de toda a coletividade envolvida na prestação do serviço privado de
assistência à saúde, de inegável relevância econômica e social.

Desde que observados os requisitos legais, pode o Juízo, com base no poder geral de cautela, ampliar o alcance da
norma que prevê a decretação da indisponibilidade de bens quando verificar a existência de fundados indícios de
responsabilidade de determinado agente, a fim de assegurar, concretamente, a eficácia e a utilidade do provimento
jurisdicional de caráter satisfativo.

Questão 49

A diluição da marca no exterior não é suficiente para afastar a distintividade do registro no Brasil.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte:
Red Bull é uma marca de energéticos, conhecidíssima tanto no Brasil como no restante do mundo.

A marca Red Bull foi registrada no INPI em 1993.

Em 2010, a empresa Funcional Drinks Ltda registrou, no INPI, a marca Power Bull, para também ser utilizada em
bebidas energéticas.

Ao tomar conhecimento disso, a Red Bull ajuizou ação contra a empresa Funcional Drinks Ltda e contra o INPI pedindo
a nulidade desse registro.

A ré afirmou que não há risco de os consumidores confundirem os produtos porque eles possuam diferenças de
embalagem e de layout.

A questão chegou até o STJ. Para o Tribunal, o registro da marca Power Bull deve ser anulado?

SIM.

Associação indevida

As empresas em conflito atuam no mesmo segmento mercadológico, fornecendo produto similar, que podem estar
presente nos mesmos locais de venda e que visam o mesmo público.

Existe uma proximidade grande nas marcas considerando que ambas utilizam o termo “bull”, diferenciando-se apenas
pelo acréscimo dos vocábulos “red” e “power”.

Diante desse quadro, o STJ reconheceu que havia o risco de a empresa Red Bull, notoriamente mais antiga e
conhecida, ser indevidamente associada ao produto concorrente.

Alguns consumidores poderiam achar que o produto Power Bull fosse um energético que faria parte da linha de
produtos da marca Red Bull.

Assim, embora não esteja caracterizada a possibilidade de confusão entre as marcas tendo em vista que possuem
embalagens e nomes diferentes, havia o risco de indevida associação entre os produtos.

Mesmo que não exista a possibilidade de confusão entre as marcas, considerando que o conjunto marcário (cor,
embalagem, layout, nome) é diferente, a Lei nº 9.279/96 também proíbe a reprodução parcial ou total de marca que
possa causar associação indevida com marca alheia. Confira o que diz o art. 124, XIX, da Lei de Propriedade Industrial:

Art. 124. Não são registráveis como marca:

(...)

XIX - reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para
distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou
associação com marca alheia;
A associação indevida a marca alheia, prevista no art. 124, XIX, da Lei nº 9.279/96, pode ser caracterizada pelo
risco de vinculação equivocada quanto à origem dos produtos contrafeitos, ainda que inexista confusão entre os
conjuntos marcários.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.922.135/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/04/2021 (Info 692).

Teoria da diluição

A Red Bull alegou que ao se permitir que a ré utilize, em sua marca, a palavra-chave “Bull”, isso faz com que este
elemento, de suma importância para a autora, seja diluído no mercado, o que abre precedente para que outros
comerciantes se sintam no direito de identificar seus produtos e serviços com esse mesmo elemento, fazendo com
que a marca Red Bull perca força.

Trata-se da chamada teoria da diluição.

Segundo explica Fábio Ulhoa Coelho, a diluição consiste na prática adotada por outros empresários que se beneficiam
indevidamente do prestígio associado a marcas conhecidas, fazendo com que haja uma perda de valor da marca
notória. (Curso de Direito Comercial. Volume 1: Direito de Empresa. 4ª edição em e-book baseada na 23ª edição
impressa. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019).

A ré argumentou, então, que o termo bull já se encontraria diluído em decorrência da sua ampla utilização para
identificar diversos produtos em âmbito internacional.

O STJ, contudo, deu razão à autora. Isso porque a diluição internacional ou, no caso, a ofensa à unicidade, não é
suficiente para afastar a distintividade da marca registrada no Brasil. Assim, permanece hígido o direito da empresa de
zelar pela sua unicidade, integridade ou reputação em território nacional.

Vale ressaltar que não existem, no Brasil, outras bebidas registradas com o elemento “bull”, de forma que não prospera
a argumentação de que já haveria um desgaste da referida expressão na classe de bebidas.

Em suma:

A diluição da marca no exterior não é suficiente para afastar a distintividade do registro no Brasil.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.922.135/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/04/2021 (Info 692).

Questão 50

Em ação de nulidade de registro de marca, a natureza da participação processual do INPI, quando não figurar como autor ou corréu, é de
intervenção sui generis (ou atípica) obrigatória, na condição de assistente especial.

CERTO Resposta correta

ERRADO
Comentários
Marca

Marca é um sinal distinguível visualmente, por meio do qual os produtos ou serviços são identificados e assim podem
ser discernidos dos demais.

“A marca, cuja propriedade é consagrada pelo art.5º, XXIX da CF, se constitui um sinal distintivo de percepção visual
que individualiza produtos e/ou serviços. O seu registro confere ao titular o direito de usar, com certa exclusividade,
uma expressão ou símbolo.” (Min. Nancy Andrighi).

Vale destacar, mais uma vez, que “marca”, segundo a legislação brasileira, é obrigatoriamente um sinal identificável
pela visão, ou seja, não existe “marca sonora” ou “marca olfativa”. Justamente por isso, o famoso som “plim plim” que
a rede Globo de televisão utiliza não pode ser registrado como marca no Brasil. É comum a seguinte afirmação:
“marca no Brasil é somente aquilo que a pessoa pode ver”.

Importância

A marca é extremamente importante para a atividade empresarial, considerando que, muitas vezes, ela é decisiva no
momento em que o consumidor irá optar por escolher entre um ou outro produto ou serviço. Justamente por isso são
desenvolvidas inúmeras ações de marketing para divulgar e tornar conhecida e respeitada a marca.

“A sua proteção, para além de garantir direitos individuais, salvaguarda interesses sociais, na medida em que auxilia na
melhor aferição da origem do produto e/ou serviço, minimizando erros, dúvidas e confusões entre usuários.” (Min.
Nancy Andrighi).

Proteção da marca

Por ser importante à atividade empresarial, a marca é protegida pela legislação.

A Lei nº 9.279/96 afirma que a marca pode ser registrada para que não seja utilizada indevidamente em outros
produtos ou serviços:

Art. 122. São suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não
compreendidos nas proibições legais.

Art. 129. A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições
desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às
marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148.

Onde é realizado esse registro?


No Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI). Trata-se de uma autarquia federal que possui a atribuição de
conceder privilégios e garantias aos inventores e criadores em âmbito nacional.

Os direitos de propriedade industrial são concedidos, no Brasil, pelo INPI.

O que acontece caso o INPI tenha registrado indevidamente uma marca?

Neste caso, dizemos que o registro é nulo:

Art. 165. É nulo o registro que for concedido em desacordo com as disposições desta Lei.

Parágrafo único. A nulidade do registro poderá ser total ou parcial, sendo condição para a nulidade parcial o
fato de a parte subsistente poder ser considerada registrável.

Exemplo: determinada empresa registrou, no INPI, a marca JOCA COLA para um refrigerante. Ocorre que esse registro
foi indevido porque pode gerar confusão com outra marca mundialmente conhecida, qual seja, a COCA-COLA.

Como fazer para obter declaração de nulidade do registro da marca?

A declaração de nulidade do registro pode ocorrer de duas formas:

1) mediante processo administrativo de nulidade:

Art. 168. A nulidade do registro será declarada administrativamente quando tiver sido concedida com
infringência do disposto nesta Lei.

Art. 169. O processo de nulidade poderá ser instaurado de ofício ou mediante requerimento de qualquer pessoa
com legítimo interesse, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contados da data da expedição do certificado de
registro.

2) por meio de processo judicial, que irei explicar abaixo.

Ação de nulidade de registro de marca

Legitimidade

A ação de nulidade poderá ser proposta:


· pelo próprio INPI; ou

· por qualquer pessoa com legítimo interesse (em nosso exemplo: a Coca-Cola).

Competência

A competência para julgar essa demanda será da Justiça Federal.

A competência para examinar qualquer alegação de nulidade do registro de uma marca é da Justiça Federal. Isso
porque, nessa situação, haverá interesse jurídico do INPI na demanda, considerando que foi essa autarquia federal que
concedeu o registro, incidindo, portanto, na hipótese do art. 109, I, da CF/88:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição
de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à
Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

(...)

No mesmo sentido é o art. 175 da Lei nº 9.279/96.

Prazo prescricional

Prescreve em 5 anos a pretensão para declarar a nulidade do registro (art. 174). Esse prazo é contado da data da
concessão do registro.

Liminar

O juiz poderá, nos autos da ação de nulidade, determinar liminarmente a suspensão dos efeitos do registro e do uso da
marca, atendidos os requisitos processuais próprios.

Prazo para resposta

O prazo para resposta do réu titular do registro será de 60 dias (art. 175, § 1º).

Papel do INPI na ação de nulidade


Vimos acima que o INPI pode ser o autor da ação de nulidade. É sua opção ajuizar, ou não, a ação.

No entanto, o ponto importante é que, se o INPI não for o autor, mesmo assim, ele deverá obrigatoriamente participar
do processo, sob pena de nulidade processual. O art. 175 da Lei nº 9.279/96 afirma que, se o INPI não for o autor da
ação de nulidade, ele deverá intervir no feito.

Justamente por isso, o autor da ação deverá pedir a citação do titular da marca que pretende anular o registro e do
INPI.

Em nosso exemplo, a Coca-Cola, na petição inicial da ação de nulidade, deverá pedir a citação:

· da empresa titular do registro Joca Cola; e

· do INPI.

O INPI vai escolher se defende, ou não, o registro impugnado na ação

Vale ressaltar que a participação do INPI na ação de nulidade não é necessariamente para defender o ato que
concedeu o registro. Ao contrário, o interesse jurídico do INPI se distingue do interesse individual de ambas as partes,
considerando que o objetivo da Instituição é de proteger a concorrência e o consumidor, direitos essencialmente
transindividuais, o que atrai certo temperamento das regras processuais tradicionais da defesa de direitos individuais.

O INPI desempenha função própria, mediante intervenção sui generis, nos processos de anulação de registro de
marca.

Em face disso, nem sempre se comportará como litisconsorte passivo, devendo a sua legitimidade e os consectários
da sua atuação processual tomarem em consideração a função efetivamente exercida no caso concreto.

Em palavras mais simples: o INPI, se não for o autor, deverá ser obrigatoriamente citado; ao ser citado, irá analisar,
com base no interesse público, se deve defender o registro que foi realizado ou se é caso realmente de nulidade.

Existe uma natureza dinâmica do litisconsórcio exercido pelo INPI, que não fica adstrito a qualquer um dos polos da
demanda.

Desse modo, fala-se em uma “migração interpolar”* do INPI, a exemplo do que ocorre na ação popular e na ação de
improbidade, nas quais a pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação,
pode abster-se de contestar o pedido, ou atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, nos
termos do art. 6º, § 3º, da Lei nº 4.717/65 e art. 17, § 3º, da Lei nº 8.429/92:

Lei nº 4.717/65 (Lei de ação popular):

Art. 6º (...) § 3º A pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação,
poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao
interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.

Lei nº 8.429/92 (Lei de ação civil pública):


Art. 17 (...) § 3º No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no que couber,
o disposto no § 3º do art. 6º da Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965.

Natureza da intervenção do INPI

Em ação de nulidade de registro de marca, a natureza da participação processual do INPI, quando não figurar como
autor ou corréu, é de intervenção sui generis (ou atípica) obrigatória, na condição de assistente especial (ou até de
amicus curiae).

STJ. 4ª Turma. REsp 1.817.109-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 23/02/2021 (Info 686).

* Migração interpolar é uma expressão cunhada pelo processualista Antonio do Passo Cabral para designar, em
resumidas palavras, a possibilidade de:

“(...) atuação dos sujeitos processuais independentemente do polo da demanda em que originariamente
posicionados, ou seja, verificar se é dado aos atores do processo migrar de um polo para outro ou atuar, em
conjunto ou solitariamente, em posições jurídicas típicas do outro polo.

(...)

O tema é relevante também para a atuação processual do amicus curiae e das agências reguladoras, que
possuem faculdades imparciais no interesse público da fiscalização e regulação; bem como para a atuação
processual de litisconsortes quando, no âmbito daquela pluralidade de sujeitos, haja interesses contrapostos ou
divergências estratégicas.” (Despolarização do processo e “zonas de interesse”: sobre a migração entre polos da
demanda. Custos Legis. Revista Eletrônica do Ministério Público Federal. Ano I. Número 1. 2009).

Questão 51

O sócio não tem direito de retirar-se imotivadamente da sociedade limitada se ela for regida supletivamente pelas normas da sociedade
anônima.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Dissolução de uma sociedade

A dissolução de uma sociedade pode ser:

a) Parcial: quando um ou alguns dos sócios saem da sociedade, mas ela é preservada.

b) Total: quando a sociedade é extinta.


Dissolução parcial de sociedade

Ocorre, portanto, quando um ou alguns dos sócios se desligam da sociedade, mas ela continua existindo. A isso
também se dá o nome de “liquidação parcial da sociedade”.

Uma das hipóteses de dissolução parcial de sociedade é o direito de retirada (direito de recesso, direito de denúncia),
ou seja, é a saída do sócio por iniciativa própria. Ele simplesmente não quer mais fazer parte daquela sociedade.

Nesse caso, o sócio que deixar a sociedade receberá a parte que lhe cabe no patrimônio social, continuando a
sociedade em relação aos demais sócios.

Para que o sócio exerça seu direito de retirada, é necessária a propositura de ação judicial?

Depende:

• Se a sociedade empresária for por prazo determinado: SIM. Isso porque o Código Civil exige que ele prove uma justa
causa (art. 1.029).

• Se a sociedade empresária for por prazo indeterminado: NÃO. O sócio precisará apenas notificar extrajudicialmente
os demais sócios com antecedência mínima de 60 dias (art. 1.029). Trata-se de hipótese de retirada voluntária
imotivada. Caso ele não concorde com os valores que a sociedade quer lhe pagar a título de apuração de haveres,
poderá propor ação para discutir apenas isso (os valores), no entanto, a saída da sociedade não depende de decisão
judicial.

Veja a redação do art. 1.029 do CC:

Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de
prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se
de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.

Parágrafo único. Nos trinta dias subsequentes à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da
sociedade.

Este dispositivo está inserido no capítulo relativo às sociedades simples. Apesar disso, o STJ entende que ele é
perfeitamente aplicável às sociedades limitadas. Assim, o sócio de uma sociedade limitada de prazo indeterminado
tem o direito de se retirar de forma imotivada sem que seja necessária, para tanto, a propositura de ação de dissolução
parcial. Isso com base no art. 1.029 do CC, que se aplica também para as sociedades limitadas.

Regramento das sociedades limitadas

As sociedades limitadas são regidas pelos arts. 1.052 a 1.087 do Código Civil.
Ocorre que, muitas vezes, tais regras não são suficientes para resolver todos os casos. Por isso, o legislador previu
que se aplicam às sociedades limitadas, supletivamente, as regras da sociedade simples (arts. 997 a 1.038).

Os sócios da sociedade simples, no entanto, podem decidir que eles querem que se apliquem, supletivamente, as
regras da sociedade anônima. Nesse caso, eles deverão fazer constar isso no contrato social. Veja o que diz o art.
1.053 do CC:

Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples.

Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da
sociedade anônima.

Vimos acima que o STJ considera que o art. 1.029 do CC, apesar de estar previsto no capítulo sobre sociedades
simples, também se aplica para as sociedades limitadas. A dúvida que surgiu foi a seguinte: e se o contrato dessa
sociedade limitada estipular a aplicação supletiva das regras da sociedade anônima, conforme autoriza o art. 1.053,
parágrafo único? Mesmo assim será possível aplicar a regra do art. 1.029 do CC para essa sociedade limitada? Veja a
resposta abaixo.

Imagine a seguinte situação hipotética:

Determinada sociedade limitada (com prazo indeterminado) é formada por três sócios: Ricardo, Pedro, Paulo e João.

Vale ressaltar que o contrato social desta sociedade prevê que ela se constitui sob a forma de sociedade limitada, mas
que, supletivamente, devem ser aplicadas as regras inerentes às sociedades anônimas. Isso é autorizado, como vimos,
pelo parágrafo único do art. 1.053 do Código Civil.

João quer sair da sociedade. Ele poderá retirar-se imotivadamente, nos termos do art. 1.029 do CC, mesmo sendo
essa sociedade regida de forma supletiva pelas normas relativas à sociedade anônima?

SIM.

É direito do sócio retirar-se imotivadamente de sociedade limitada regida de forma supletiva pelas normas da
sociedade anônima.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.839.078/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 09/03/2021 (Info 688).

O fato de a sociedade limitada ser regida supletivamente pela Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/76) não
afasta a possibilidade de retirada imotivada do sócio.

A aplicação supletiva da Lei nº 6.404/76 não tem o condão de afastar o direito de retirada imotivada nas sociedades
limitadas de prazo indeterminado. Podemos apontar duas razões:
1) a Constituição Federal expressamente garante, em seu art. 5º, XX, o direito fundamental de associação. Há,
portanto, liberdade constitucionalmente garantida não apenas de se associar, mas também de não permanecer
associado.

2) a aplicação supletiva das normas relativas às sociedades anônimas, autorizada pelo parágrafo único do art. 1.053
do CC, apenas deve ocorrer naquilo que for compatível com o regramento das sociedades limitadas. A Lei nº 6.404/76
não traz nenhuma regra disciplinando a retirada imotivada de sócios. Diante disso, é possível aplicar para a sociedade
limitada a regra do art. 1.029 do CC. Isso porque o fato de a sociedade anônima ser regida por lei especial não impede
que se aplique a ela, nos casos de omissão, as normas do Código Civil. Nesse sentido, confira o que diz o art. 1.089 do
CC:

Art. 1.089. A sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se-lhe, nos casos omissos, as disposições
deste Código.

Sendo assim, não havendo previsão específica na Lei nº 6.404/76 acerca da retirada imotivada, e sendo tal omissão
incompatível com a natureza das sociedades limitadas, imperioso reconhecer a possibilidade de aplicação do art.
1.029 do CC.

Desse modo, ainda que o contrato social tenha optado pela regência supletiva da Lei nº 6.404/76, há direito
potestativo de retirada imotivada do sócio na sociedade limitada em questão.

Tendo sido devidamente exercido tal direito, não mais se mostra possível a convocação de reunião com a finalidade de
deliberar sobre exclusão do sócio que já se retirou.

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