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DESAFIOS DA ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO(A) NA POLÍTICA DE


ASSISTÊNCIA SOCIAL COM ÊNFASE NO ATENDIMENTO ÀS PESSOAS EM
SITUAÇÃO DE RUA

CHALLENGES OF THE PSYCHOLOGIST'S PERFORMANCE IN THE


SOCIAL ASSISTANCE POLICY WITH AN EMPHASIS ON CARE FOR PEOPLE IN
SITUATIONS ON THE STREET

Angélica de Fátima Aguiar Gomes 1


Lorena Gabrieli Vasconcelos Americano 2
Raiara Vieira da Silva3

RESUMO

O seguinte trabalho é produzido a partir do questionamento sobre a saúde mental dos


usuários atendidos no Centro de Referência Especializado para pessoas em situação de rua
(CENTRO POP) da cidade de Betim, Minas Gerais. Com o objetivo de investigar alguns dos
desafios encontrados na prática da atuação do profissional de psicologia, no âmbito da
política de Assistência Social. Por isso foram utilizados a revisão da literatura, pesquisas
bibliográficas realizadas em plataformas digitais como Google acadêmico e Scientific
Electronic Library Online (sciELO). O referencial teórico do presente artigo foi subdividido
em dois tópicos, a saber: Pessoa em situação de rua e o papel do Psicólogo na assistência
social à população de rua.

Palavras chaves: Psicologia Social. População em situação de rua. Direitos Humanos.


Políticas públicas

ABSTRACT

The following work is produced from the questioning about the mental health of users
attended at the Specialized Reference Center for homeless people (CENTRO POP) in the city
of Betim, Minas Gerais. With the objective of investigating some of the challenges
encountered in the practice of the psychology professional, within the scope of the Social
Assistance policy. Therefore, a literature review and bibliographical research carried out on
digital platforms such as Google Scholar and Scientific Electronic Library Online (sciELO)
were used. The theoretical framework of this article was subdivided into two topics, namely:
Homeless person and the role of the Psychologist in social assistance to the homeless
population.

Keywords: Social Psychology. Homeless Population. Human Rights. Public Policy.

1
Acadêmica do curso de psicologia do Centro Universitário Una. E-mail: angelicagomesz@outlook.com
2
Acadêmica do curso de psicologia do Centro Universitário Una. E-mail: lorenagvasconcelos13@gmail.com
3
Acadêmica do curso de psicologia do Centro Universitário Una. E-mail: raiarasilva.1809@aluno.una.br;
Artigo apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso de Graduação em psicologia no Centro
Universitário Una. 2022. Orientador: Prof. Me. Alexandre Rocha Araújo;
2

1. INTRODUÇÃO

A inquietação para produzir este trabalho surge a partir do questionamento sobre a


saúde mental dos usuários atendidos no Centro de Referência Especializado para pessoas em
situação de rua (CENTRO POP) da cidade de Betim, Minas Gerais.
Para adentrar ao assunto acerca dos Direitos humanos, vamos utilizar a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que diz: "Todos os seres humanos nascem livres e
iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para
com os outros em espírito de fraternidade”. (Declaração Universal dos Direitos Humanos,
1948, artigo 1º).
Geralmente pessoas que vivem em situação de rua não possuem seus direitos
preservados. Indivíduos que utilizam as ruas como moradia estão em situação de desigualdade
em comparação com outras pessoas, quanto a alguns direitos, muitas vezes sem a consciência
de que podem tê-los assegurados pelo Estado.

Os Direitos Humanos não rege as relações entre iguais; opera precisamente em


defesa dos ostensivamente mais fracos. Nas relações entre desiguais, posiciona-se
em favor dos mais necessitados de proteção. Não busca um equilíbrio abstrato entre
as partes, mas remediar os efeitos do desequilíbrio e das disparidades. (TRINDADE,
1997)

Para a Constituição Federal, o homem se sobrepõe ao Estado, as garantias e os direitos


fundamentais do cidadão aparecem logo nos primeiros artigos. No primeiro, por exemplo, é
estabelecido o princípio da cidadania, da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do
trabalho. Direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais dos cidadãos estão no texto
constitucional. Resguardados pela Carta Magna, os direitos fundamentais colocam o Brasil
como um dos países com o mais completo ordenamento jurídico em relação aos direitos
humanos.
Estudar sobre pessoas que vivem em condição de rua é uma porta de entrada para
conhecer a situação por trás desses indivíduos, que se expõem a ausência de moradia digna,
acesso aos direitos básicos, possuem vínculos familiares fragilizados, bem como a ausência de
uma renda que possibilite o sujeito a reconstruir uma vida minimamente entendida como
digna (ALCÂNTARA S. C ABREU D. P E FARIAS A, 2015).
Pontua-se ainda que os indivíduos marcados pela vulnerabilidade social possuem
diversas limitações ao tentarem acessar direitos sociais constituídos na Constituição Federal
de 1988, sendo esses:
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Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia,


o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL,
1988).

A partir de 2012, de acordo com os dados do IPEA, diante de crises econômicas,


notou-se um cenário em que interferiu no crescimento numérico de pessoas que passaram a
viver, conviver e sobreviver nas ruas. Ocorreu um crescimento de 140% com a chegada da
pandemia ocasionada pelo vírus da Covid-19, atrelado ao aprofundamento da crise econômica
e estrutural (IPEA, 2020), causando sérias consequências como desemprego, ausência de
moradia e insegurança alimentar (IPEA).
Esses índices sobem de forma abrupta como também mostra pesquisa publicada no
Portal Fiocruz:

A pandemia da Covid-19 elevou ainda mais a vulnerabilidade das pessoas que


vivem em situação de rua, ampliando o contingente populacional e mudando o perfil
dessa parcela da população. Conforme dados de pesquisa realizada pela Prefeitura
do Rio de Janeiro, 31% das pessoas estão na rua há menos de um ano. Dessas, 64%
estão nessa condição por perda de trabalho, moradia ou renda. Entre os
entrevistados, 42,8% afirmaram que sairiam das ruas se tivessem um emprego
(FIOCRUZ, 2021).

A psicologia como ciência e profissão busca a garantia dos direitos humanos de


diversas maneiras, dentre elas, fazer com que o sujeito use sua autonomia e que ele perceba
que assim como deveres, possui direitos que podem estar sendo negligenciados. Neste
contexto, destacamos o tema dos Direitos Humanos como um campo de trabalho que passa a
ser explorado por diversos profissionais da Psicologia (SCHWEDE, BARBOSA E
SCHRUBER, 2008).
Torna-se necessário então, a atuação profissional de psicólogos que atuam na grande
área compreendida como Assistência Social, que possui diversas potencialidades e limitações,
quando inseridas em políticas públicas, sendo essa última encontrada em um estado de
precarização, considerando um contexto político e social. O Psicólogo Social é convocado a
trabalhar de forma multiprofissional, seja com Assistentes Sociais, Educadores Sociais,
Pedagogos, Advogados e outros.
O(a) profissional de Psicologia deve estar atento a responsabilidade de exercer sua
profissão dentro dos parâmetros éticos e dentro da legislação vigente, regulamentado pela
resolução CFP nº 010/2005 que “Aprova o Código de Ética Profissional do Psicólogo”,
respeitando o sigilo profissional para que o sujeito tenha uma escuta e acolhimento
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qualificado e especializado por meio de um atendimento técnico e resolutivo, com base nas
respostas que as políticas públicas possibilita o profissional a gerar. E então, o trabalho do
psicólogo na política de Assistência Social em específico, possui alguns cuidados especiais,
para que o profissional não exerça práticas assistencialistas, recorrentemente elaboradas pelo
senso comum ao se referir à política descrita acima. Sendo assim, uma das atribuições do
psicólogo no âmbito da Assistência Social é a de construir meios e contribuir para a
autonomia dos indivíduos como citado anteriormente e também explicitado na seguinte
afirmação:

Como trabalhadores da Assistência Social, os psicólogos devem contribuir para criar


condições sociais para o exercício da cidadania (promoção dos direitos
socioassistenciais) bem como favorecer as condições subjetivas para o seu exercício
circular informação, fortalecer participação, desenvolver potencialidades, facilitar
processos decisórios, dentre outros (AFONSO ET AL. 2012, p. 197).

2. MÉTODO

O presente trabalho sustenta-se a partir da revisão da literatura, que visa, através de


uma reconstrução histórica, relacionar materiais produzidos acerca do tema investigado
(PAIVA, 2008). A estrutura argumentativa pressupõe uma comparação entre as noções de
direitos humanos, população de rua e papel da psicologia. As fontes são artigos acadêmicos
pesquisados em plataformas como SciELO, Google Acadêmico e site do Conselho Federal de
Psicologia (CFP), com os descritores de População em Situação de Rua (PSR) e a Psicologia.
Os caminhos utilizados se dão através de pesquisas básicas, pois a intenção é gerar
novos conhecimentos, sendo uma pesquisa conceitual e qualitativa, pois serão utilizados e
interpretados dados estudados e coletados por autores da área, sendo observados pontos
relevantes para agregar o trabalho em questão.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Pessoa em Situação de Rua

É comum a um grande contingente populacional interpretar a rua enquanto um lugar


de transição, de movimentos e não de permanência, porém, no decorrer desse trajeto,
captamos um público heterogêneo que em comum, possui a situação de extrema pobreza,
sendo esses sujeitos as Pessoas em Situação de Rua (PSR).
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Considera-se população em situação de rua o grupo populacional heterogêneo que


possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou
fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os
logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento,
de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para
pernoite temporário ou como moradia provisória (BRASIL.Decreto n.7.053, de 23
de dezembro de 2009, p. 6, Art. 1º, parágrafo único).

Outros termos podem sustentar ideias de fracasso moral e individual, desconsideram


as especificidades dessa população e ignoram a possibilidade de mudança e saída dessa
situação, impingindo às pessoas uma visão determinista e inalterável. Dessa forma, tanto os
movimentos sociais quanto as políticas públicas utilizam o termo população em situação de
rua, conhecida também pela sigla PopRua (NEXO JORNAL, 2020).

[...] se refletirmos sobre a qualidade destas interações, observaremos que


comumente nós as olhamos amedrontados, de soslaio, com uma expressão de
constrangimento. Alguns as vêem como perigosas, apressam o passo. Outros logo as
consideram vagabundas e que ali estão por não quererem trabalhar, olhando-as com
hostilidade. (MATTOS; FERREIRA, 2004, p. 2)

No decorrer do tempo, pessoas em situação de rua foram tratadas de distintas formas,


ora os sujeitos eram beneficiados pela benevolência e assistencialismo, ora eram marcados
pela repressão dos equipamentos de segurança pública, sendo que no decorrer dos anos a
partir da instauração dos principais direitos sociais, como aqueles configurados pela
constituição federal de 1988, tais sujeitos passam pelo leque de ser reconhecidos como
portadores de direitos e deveres.
Lopes (2006), argumenta que não há um fator em específico para que os sujeitos
busquem a rua enquanto moradia, o que há são diversidades decorrentes das estruturas
societárias, tais como: – ausência de moradia, ausência de acesso a emprego e renda,
educação, saúde e outros direitos, culminando na situação de extrema pobreza, atrelado ou
não a fatores subjetivos do sujeito, como a fragilização de vínculos familiares, adoecimento
mental e uso abusivo de álcool ou drogas, bem como a fatores naturais como desastres
ambientais.
A questão de moradia é um problema comum a toda a PSR, porém a tentativa de
“reinserir” esses sujeitos a um espaço doméstico comum, torna-se um embate caloroso, visto
que:

Uma vez fortalecidas as vinculações ao espaço da rua, pode-se instalar um processo


em que a rua passa a ser o espaço primordial de relações pessoais e estratégias de
sobrevivência, conduzindo a uma gradativa adesão aos códigos das ruas como local
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de moradia e trabalho. A dificuldade de acesso a serviços públicos de qualidade e,


por vezes, a falta de respostas às necessidades e demandas, com a devida agilidade e
respeito à dignidade, contribuem para que a rua se configure como um espaço de
resistência e sobrevivência. (BRASIL, 2011c, p. 24- 25)

E é nesse contexto de análise que vê-se importantes configurações nos grandes centros
urbanos a partir do fenômeno do êxodo rural, configurando- se moradias irregulares, que se
criando nas calçadas e outros espaços tão precários quanto, atrelado a sujeitos que diante de
suas situações de fragilidades, utilizam dos espaços públicos como estratégia de sobrevivência
e resistência.
Porém o que se perpetua no decorrer dos anos é o processo de higienização das ruas,
havendo uma continuidade de violência contra um grupo em específico, cercado de
fragilidades e situação de vulnerabilidade socioeconômica que contribui inclusive para
dificuldades de acompanhamento, identificação, quantificação e caracterização desse público
na contemporaneidade, sabendo que não há fontes específicas para gerar dados estatísticos
relacionados a esse grupo em específico (ANTONIO, M. 2016, p.7).
O que há presente é uma grande variedade de fontes, como os dados estatísticos de
1.924 municípios via Censo do Sistema Único de Assistência Social (Censo Suas), pesquisas
acadêmicas realizadas pelo Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), Comitê
Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, dados do Consultório de rua atrelado a
dados do sistema único de saúde (SUS), complementando ainda que:

O único dado oficial mais recente, mas que ainda se trata de uma projeção, foi
divulgado em março de 2020 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea):
221.869 brasileiros viviam nas ruas naquele ano, o equivalente a cerca de 0,1% da
população total do país. (DW, 2022, n.p).

Ao citar os avanços legislativos, destaca-se a Frente Parlamentar em Defesa dos


Direitos da População em Situação de Rua que foi instituída em 2009, com a proposta de dar
visibilidade a este segmento social e lutar por ações governamentais efetivas para a superação
da situação de rua. Intercedendo ao IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) a
inclusão dos dados sobre a população em situação de rua, no censo de 2022, (DW,2022).
Quanto a avanços jurídicos, de reconhecimento da existência da PSR, captura-se que a
PSR possui, ainda que de forma tardia, dois grandes marcos legislativos nas últimas duas
décadas, de modo a reconhecer as necessidades e compreender esse grupo como sujeitos de
direitos, são eles: A instituição da Política Nacional para a População em Situação de Rua e
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do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, por meio do Decreto n°


7.053, de 23 de dezembro de 2009.
O Estado também atua com providências acerca de violências contra este grupo,
realizando canais de comunicação com a sociedade para que tais expressões e experiências
violentas não se agrave, como: O Disque 100 – Disque Direitos Humanos onde os cidadãos
denunciam atos violentos (Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República –
SDH), dentre outros como o Disque 136 – Disque Saúde e o Disque 180 – Central de
Atendimento à Mulher.

Infelizmente, assistimos diariamente a casos de violência contra a população de rua.


De acordo com dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da
República, 195 moradores de rua foram assassinados em todo o Brasil só no
primeiro semestre de 2013 (BRASIL, 2011d).

E nesse contexto de prevenção a violência destes indivíduos, cita-se ainda a


importância do Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua
(Centro POP) enquanto um equipamento público que é regulamentado e vinculado ao
Ministério da Cidadania e faz parte da Proteção Social Especial de Média Complexidade,
como produto de execução da Política Nacional para a população em situação de rua,
instituído em 2009. Com base em sua operação neste contexto, faremos considerações no
presente trabalho acerca da atuação profissional do psicólogo em um contexto na grande área
da psicologia social.

3.2 O papel do Psicólogo na Assistência Social com ênfase à População em


Situação de Rua

Sabe-se que são múltiplas as contribuições da psicologia à assistência social na


atuação dos Serviços Especializados em Abordagem Social (SEAS) para com a Pessoa em
Situação de Rua (PSR). Um cenário no qual o psicólogo se vê de frente a uma atuação não
convencional, onde é preciso trabalhar de forma conjunta com as multidisciplinaridades do
serviço social, da pedagogia, do direito e etc.
Diferente da atuação no campo tradicional, como um atendimento na clínica, a atuação
do psicólogo na assistência social, especificamente com pessoas em situação de rua, lida com
diversos desafios. O público alvo e o setting mutável são diferentes, pois o profissional de
psicologia vai ao encontro da PSR através de uma busca ativa, o consultório é onde o
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indivíduo está, seja na praça ou debaixo de um viaduto e podem ocorrer impasses nas
intervenções que podem impedir um bom trabalho, mas é preciso, de acordo com a vivência
atual do indivíduo, se adaptar e trazer para ele um lugar de fala e escuta (MAYNART,
ALBUQUERQUE, BRÊDA & JORGE).
Nesse cenário, ao se aproximar dessa população em situação de rua, o profissional
precisa usar uma abordagem diferente, indo ao encontro do indivíduo com um modo no qual
ele permita que ocorra uma boa intervenção. E é através da prática, vivenciada no dia a dia,
que o profissional percebe a importância de um atendimento que fuja do modelo
convencional.
Fazendo um paralelo entre o cuidado ofertado às PSRs e a prática psicológica, é
importante destacar que o trabalho do psicólogo no contexto de rua surge mais
notadamente articulada com as necessidades de cuidado em saúde mental dos
sujeitos em sofrimento, convocando esse profissional a atuar fora das modalidades
tradicionais tão difundidas na formação acadêmica (SPINK, 2006, 3a ed., pp.
29-39).

Um fundamento importante para a Psicologia Social neste contexto, é a teoria das


Representações Sociais idealizada, na década de 60 por Serge Moscovici. Através dessa
teoria, Moscovici buscava a transformação da perspectiva individualista dos fenômenos
psicológicos, sociais e cognitivos, que até então se encontrava instalada na Psicologia Social
tradicional.
Enquanto as formas 'clássicas' de psicologia cognitiva... tratam a representação como
um elemento estático da organização cognitiva, na teoria da representação social o
próprio conceito de representação possui um sentido mais dinâmico, referindo-se
tanto ao processo pelo qual as representações são elaboradas, como às estruturas de
conhecimento que são estabelecidas (MOSCOVICI, 2003, p. 20).

Em seus estudos, Moscovici defendia a ideia de que a Psicologia Social precisa alinhar
seu campo de estudo com a antropologia e sociologia, para garantir melhor compreensão dos
fenômenos psíquicos e cognitivos. Assim, mais uma vez, reafirmando a importância da
multidisciplinaridade e o entendimento do sujeito com seus aspectos psicossociais, ou seja, a
subjetividade do indivíduo.
Cabe salientar que, assim como a vulnerabilidade da saúde física das pessoas em
condição de vivência em rua, a saúde mental destas também está sujeita a fragilidades e
adoecimento, e por consequência, há necessidade de intervenções e tratamentos
psicoterapêuticos. Sabendo disso, o(a) profissional da psicologia deve estar atento a
responsabilidade de exercer sua profissão dentro dos parâmetros éticos e dentro da legislação
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vigente para que, o assistido seja resguardado no atendimento humanizado, empático e com
acolhimento técnico, que se diferencia do atendimento psicoterapêutico.
Sendo assim, uma das atribuições do psicólogo no âmbito do SUAS é a de “(...)
construir estratégias que efetivem o acesso do cidadão aos direitos socioassistenciais, levando
em conta (...) a dimensão subjetiva que está envolvida na situação de vulnerabilidade e/ou
violação de direitos”. (CRP-MG, 2015, p 42).
É fundamental que, os profissionais que atuam na assistência social, estejam sempre
alinhados com as necessidades dos assistidos, para que possam promover a execução e
alinhamento da promoção dos direitos humanos dos mesmos. Tais como iniciativas de gerir e
operar ações onde os usuários possam ser contemplados com as políticas públicas de forma
eficaz (ARAÚJO, 2020, p.23).
Uma grande questão na prática da Psicologia Social no contexto com a pessoa em
situação de rua é a de lidar com a realidade. Nem sempre é possível exercer efetivamente o
que se deseja, mesmo que mudando a abordagem e não atuando de maneira habitual, o
psicólogo se vê diante de desafios para exercer a sua função. Dentre eles podemos citar: a
falta de apoio de outros profissionais da interdisciplinaridade, o local de atendimento que
pode ser variável, o pouco amparo teórico, a falta de amparo com relação à políticas públicas
enfraquecidas pela falta de recursos financeiros e orçamentários insuficientes, a dúvida de
como agir diante das adversidades encontradas nesse novo setting, entre outros.

Essa inversão de papéis coloca o psicólogo em um lugar distinto daquele que


tradicionalmente esse profissional ocupou por muitos anos. Quando o psicólogo é
demandado para algum tipo de intervenção no contexto da rua, por vezes, surgem
impasses no âmbito do julgamento moral e ético do profissional, haja vista o
autoquestionamento sobre que possibilidades e referenciais poderiam ou não auxiliar
as demandas dos sujeitos em situação de rua (ROCHA; OLIVEIRA; 2020, p.20).

Uma vez que o trabalho do psicólogo na Política de Assistência Social é norteado pela
multidisciplinaridade, sendo seu exercício inserido em uma política de garantia de direitos
para os assistidos, a essência de sua diferenciação está baseada pela formação acadêmica e o
uso da psicologia como instrumento capaz de olhar o sujeito respeitando sua subjetividade,
com o olhar humanizado para o assistido.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O psicólogo inserido na política da Assistência Social, como agente promotor de


cidadania e direitos humanos, encontra-se em constantes contextos de desafios e embaraços
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no âmbito da atuação junto a pessoas em situação de rua. Por isso, é necessário que o
profissional esteja sempre atualizado quanto aos avanços dos cenários em questão, para
garantir a melhor atuação profissional, levando em consideração os parâmetros éticos,
técnicos, metodológicos e espaciais (setting) da profissão.
Cabe ressaltar ainda, que no Brasil há limites de estudo quanto à essa população, pela
dificuldade de se encontrar dados estatísticos atualizados e que possam servir como referência
precisa para pesquisa da mesma. Ainda assim, sabe-se que segundo estimativa (IPEA, 2020),
a população em questão vem crescendo e com isso, ampliando o campo de estudo, passando
este a ser um tema explorado cada vez mais pelos profissionais, entre eles, os da Psicologia.
Tendo em conta que a Política Nacional para a População em Situação de Rua (Decreto
7053, 2009) é recente, ainda há muito o que se considerar para avanços nesse contexto. Tendo
o psicólogo o exercício de uma importante função neste cenário, que seria de compreender o
sujeito como ser subjetivo, dotado de aspectos biopsicossociais, para então, promover junto
aos demais profissionais da área multidisciplinar a garantia dos direitos básicos desta
população.
É pertinente apontar também que a Psicologia como ciência e profissão, tem o seu
papel excepcional na garantia da promoção da saúde mental do indivíduo, como também seu
papel social pela busca da preservação dos direitos sociais dos mesmos. Sendo estes, direitos
básicos, assegurados pelas legislações vigentes, como aos configurados na Declaração
Universal dos Direitos Humanos e no marco constitucional do país na data de 1988.
Cabe considerar que o presente trabalho destaca alguns dos desafios recorrentemente
encontrados na atuação do psicólogo na política de Assistência Social. Um paralelo de teorias
epistemológicas e práticas de uma atuação real, onde os profissionais estão a depender dos
poderes do Estado em âmbito municipal, estadual e/ou federal, para exercer seu trabalho com
exatidão e eficiência.
No entanto, o que ocorre no cenário das Políticas Públicas na Assistência Social,
voltado ao exercício da psicologia, é o constante enfrentamento da profissão com as
indiferenças do poder público para com essa atividade e também, a luta pelo reconhecimento
com sua atuação não convencional.

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