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O fim do sistema internacional da Guerra Fria e a persistência da dicotomia

Norte-Sul

1. O fim do modelo soviético


No curto espaço de tempo que vai de 1958 a 1991, a História Mundial sofreu
modificações profundas: a Guerra Fria terminou de forma inesperada, as democracias
populares europeias aboliram o comunismo, as duas Alemanhas reunificaram-se num só
Estado e a URSS desintegrou-se, deixando os Estados Unidos sem concorrente ao lugar
de superpotência mundial.

Uma nova política


Em março de 1985, Mikhail Gorbatchev é eleito secretário-geral do Partido Comunista
da União Soviética. Bem mais novo e decidido do que os seus antecessores, o novo líder
encara de frente a deterioração que o sistema vinha sofrendo desde os tempos de Brejnev.
Enquanto o nível de vida da população baixava, o atraso económico e tecnológico,
relativamente aos Estados Unidos, crescia a olhos vistos, e só com muitas dificuldades o
país conseguia suportar os pesados encargos decorrentes da sua vasta influência no
Mundo.
Neste contexto, Gorbatchev enceta uma política de diálogo e aproximação ao Ocidente,
propondo aos Americanos o reinício das conversações sobre o desarmamento. Incapaz de
igualar o arrojado programa de defesa nuclear da administração Reagan ( a “Guerra das
Estrelas”), o líder soviético procura assim criar um clima internacional estável que refreie
a corrida ao armamento e permita à URSS utilizar os seus recursos para a reestruturação
interna.
Decidido a ganhar o apoio popular para o seu plano de renovação económica, ao qual
chamou perestroika (reestruturação), Gorbatchev inicia, em simultâneo, uma ampla
abertura política, conhecida como glasnost (transparência).
A perestroika propõe-se a descentralizar a economia, estabelecendo a gestão autónoma
das empresas, que, de aí em diante, se veem privadas, tanto das apertadas diretivas dos
planos quinquenais, como dos chorudos subsídios que suportavam a sua falta de
rentabilidade. Paralelamente, incentiva-se a formação de um setor privado parcial, como
forma de estimular a concorrência e compensar a escassez crónica dos bens de consumo,
que tanto dificultavam o quotidiano soviético.
Enquanto isso, a glasnost apela à denúncia da corrupção, à crítica (a censura é abolida) e
à participação efetiva dos cidadãos na vida política. Em março de 1989, esta abertura
democrática reforça-se com as primeiras eleições verdadeiramente pluralistas e livres na
União Soviética, que elegem o Congresso dos Deputados do Povo.
O colapso do bloco soviético
A inflexão da política soviética e as duras críticas tecidas aos tempos de Brejnev
debilitaram a autoridade dos líderes comunistas dos países de Leste. Há muito reprimida,
a contestação ao regime imposto por Moscovo alastrou e endureceu, começando a abalar
as estruturas do poder. E, ao contrário do que outrora acontecera, a linha dura dos
partidos comunistas europeus não contou agora com a intervenção militar russa, para
“normalizar”a situação. Confiante no clima de concórdia que estabelecera com o
Ocidente, Gorbatchev passou a olhar as democracias populares como uma “obrigação”
pesada, da qual a URSS só ganhava em libertar-se.
A doutrina da “soberania limitada” foi posta de lado, e os antigos países-satélites da
URSS puderam, finalmente, escolher o seu regime político. No ano de 1989, uma vaga
democratizadora varre o Leste: os partidos comunistas perdem, um após o outro, o seu
lugar de “partido único” e, pouco depois, realizam-se as primeiras eleições livres do
pós-guerra, que promovem a elaboração de novos textos constitucionais.
Neste processo, a cortina de ferro, que, há quatro décadas, separava a Europa, levanta-se
finalmente: as fronteiras com o Ocidente são abertas e, em 9 de novembro, perante o
mundo estarrecido, cai o Muro de Berlim.
Face à queda do Muro e ao colapso dos regimes comunistas, a divisão da Alemanha
deixara de fazer sentido. Depois de uma ronda de negociações entre os dois Estados
alemães e os quatro países que ainda detinham direitos de ocupação, a Alemanha
reunifica-se. Em 3 de outubro de 1990, menos de um ano depois da queda do Muro de
Berlim, são retirados os marcos entre os dois países e a nação germânica reencontra a
unidade perdida.
No mês seguinte é anunciado o fim do Pacto de Varsóvia e, pouco depois, a dissolução
do COMECON.

O fim da URSS
Nesta altura, a dinâmica política desencadeada pela perestroika tornara-se já
incontrolável, conduzindo, também, ao fim da própria URSS. Mosaico de povos, culturas
e religiões que só uma mão de ferro tinha conseguido manter unidos, o extenso território
das Repúblicas Soviéticas desmembra-se, sacudido por uma explosão de reivindicações
nacionalistas e confrontos étnicos.
O processo começa nas Repúblicas Bálticas, anexadas por Estaline durante a Segunda
Guerra Mundial. Em 1988, a Estónia assume-se como Estado soberano no interior da
URSS, com direito de emitir passaportes próprios e a vetar as leis aprovadas no
Parlamento soviético. Em 1990, a Lituânia vai mais longe e afirma o seu direito de deixar
a União. O mesmo acontece com a Letónia.
Confrontado com estas dissidências, Gorbatchev, que nunca tivera em mente a destruição
da URSS ou do socialismo, tenta parar o processo pela força, intervindo militarmente nos
Estados Bálticos (início de 1991). Esta atuação retira o líder soviético da vanguarda
reformista e o apoio dos mais ousados passa para um ex-colaborador de Gorbatchev,
Boris Ieltsin. Eleito, como independente, presidente da República da Rússia em junho de
1991, Ieltsin reforça o seu prestígio em agosto ao encabeçar a resistência a um golpe de
Estado dos saudosistas do Partido, que pretendiam retomar o poder e parar as reformas
em curso (19 a 21 de agosto). Pouco depois, no rescaldo do golpe, o novo presidente
toma a medida extrema de proibir as atividades do partido comunista.
No outono de 1991, a maioria das repúblicas da União declara a sua independência. Em
21 de dezembro, nasce oficialmente a CEI (Comunidade dos Estados Independentes), à
qual aderem 12 das 15 repúblicas que integravam a União Soviética. Quatro dias depois,
ultrapassado pelos acontecimentos e vencido no propósito de manter unido o país,
Mikhail Gorbatchev abandona a presidência de uma URSS, que, efetivamente, já
desaparecera.

Os problemas da transição para a economia de mercado


A perestroika tinha prometido aos soviéticos uma melhoria acentuada e rápida do nível
de vida: melhores salários, mais bens de consumo, melhor assistência social. Mas, ao
contrário do previsto, a reconversão económica foi um fracasso e a economia
deteriorou-se rapidamente.
O fim da economia planificada significou o fim dos subsídios estatais às empresas, que
se viram na necessidade de se tornarem lucrativas ou enfrentarem a falência. Assim,
muitas unidades desapareceram e outras extinguiram numerosos postos de trabalho,
considerados excedentários.
Simultaneamente, o descontrolo económico e a liberalização dos preços (os bens de
primeira necessidade deixaram também de ser subsidiados pelo Estado) desencadearam
uma inflação galopante que a subida de salários não acompanhou.
O desemprego, o atraso nos pagamentos das pensões e dos salários dos funcionários
públicos, bem como a rápida perda de valor do rublo significara o fim das poupanças de
muitas famílias soviéticas, que rapidamente se viram sem meios de subsistência.
Em contrapartida, a liberalização económica enriqueceu um pequeno grupo que, em
pouco tempo, acumulou fortunas fabulosas. Muitos dos antigos gestores estatais
apoderaram-se do controlo das empresas, que foram privatizadas, de forma pouco
transparente, por preços irrisórios. Outros, aproveitando a desorientação reinante,
canalizaram fundos públicos para investimentos privados no estrangeiro. Outros
dedicaram-se ainda à extorsão ou ao mercado negro.
De forma geral, a riqueza passou para as mãos de antigos altos funcionários que
souberam aproveitar a posição-chave em que se encontravam. Em meados dos anos 90,
45% do rendimento nacional encontrava-se nas mãos de menos de 5% da população.
Os países de Leste viveram também, de forma dolorosa, a transição para a economia de
mercado.
Privados dos chorudos subsídios que recebiam da União Soviética, a braços com uma
significativa redução das trocas do antigo COMECON e com uma produção alicerçada
em indústrias e equipamentos obsoletos, os antigos satélites da URSS sofreram uma
brusca regressão económica. Com exceção da RDA, que recebeu avultados subsídios da
Alemanha Ocidental, a transição fez-se precipitadamente e com poucas ajudas externas.
Tal como na Rússia, o caos económico instalou-se e as desigualdades agravaram-se. De
acordo com o Banco Mundial (2002), nos países em transição para a economia de
mercado, a “pobreza espalhou-se e cresceu a um ritmo mais acelerado do que em
qualquer outro lugar do Mundo”. Segundo a mesma fonte, a percentagem de pobres
elevou-se, em apenas uma década (1988-1998) de 2 para 21% da população total.
Este quadro genérico esconde, porém, grandes disparidades regionais e nacionais. Os
países que encetaram reformas mais drásticas e beneficiaram de uma relativa estabilidade
política, como a República Checa, a Hungria ou a Polónia, captaram importantes
investimentos estrangeiros e grandes fluxos turísticos, apresentando, a partir de meados
da década de 90, uma evolução económica positiva. Aí, o nível de vida ultrapassou
rapidamente o antigo padrão comunista e as previsões de crescimento económico
mantêm-se animadoras, devido, em parte, ao forte estímulo que constitui a recente adesão
à União Europeia.

2. Os polos do desenvolvimento económico


Na viragem para o século XXI, o mundo concentrava a maior parte da sua riqueza e da
sua capacidade tecnológica em três polos de intenso desenvolvimento: os Estados
Unidos, a União Europeia e a zona da Ásia-Pacífico.
A este poder económico concentrado, mais ainda assim multipolar, sobrepôs-se a
hegemonia político-militar de um único país: os Estados Unidos. Sem rival de vulto
desde a implosão da URSS, o gigante americano transformou-se numa hiperpotência
disposta a colocar o Mundo sob sua proteção.

A hegemonia dos Estados Unidos


● A prosperidade económica
Com um território de 9,4 milhões de km quadrados e mais de 300 milhões de habitantes,
os Estados Unidos da América são o quarto maior país do Mundo e o terceiro mais
populoso. Terra das oportunidades desde o seu nascimento, a América glorifica o espírito
de iniciativa individual e a imagem do multimilionário bem-sucedido. A “livre-empresa”
continua no centro da filosofia económica do país e o Estado incentiva-a,
assegurando-lhe as condições de uma elevada competitividade: a carga fiscal é ligeira, os
encargos com a segurança social diminutos e as restrições ao despedimento ou à
deslocação da mão de obra quase não existem.
Pátria de gigantescas multinacionais, os Estados Unidos vivem também de uma densa
rede de pequenas empresas, algumas de grande dinamismo e espírito de inovação. Na
viragem do século, estas empresas, que se contam aos milhões, proporcionaram a maior
parte dos postos de trabalho do país.
Com interesses económicos em todo o Mundo, recetores de importantes investimentos
estrangeiros e um mercado consumidor incontornável, os Estados Unidos são um eixo
maior da economia mundial. Os seus ciclos económicos, de recessão ou prosperidade,
repercutem-se, de imediato, na economia global.

● Os setores de atividade
Marcadamente pós-industrial, a economia americana apresenta um claro predomínio do
setor terciário, que ocupa 75% da população ativa e é responsável por cerca de 80% do
PIB. Em conformidade, a América é, hoje, o maior exportador de serviços do mundo,
sobretudo na área dos seguros, transportes, restauração, cinema e música.
Este predomínio do terciário não significa, porém, a atrofia dos setores agrícola e
industrial, que ocupam um lugar cimeiro no conjunto das economias desenvolvidas.
Altamente mecanizadas, sabendo rentabilizar os avanços científicos, as unidades
agrícolas e pecuárias americanas têm uma elevadíssima produtividade. De tal forma que
as grandes empresas não desdenham o investimento na agropecuária, como é o caso da
Boeing, que também se dedica à criação de gado, e da Coca-Cola, proprietária de
vinhedos e pomares de citrinos. Assim, os Estados Unidos são os maiores exportadores
de produtos agrícolas do mundo, só superados pela União Europeia no seu conjunto.
Pelo seu dinamismo, a agricultura americana alimenta ainda um conjunto vasto de
indústrias, desde a produção de sementes e maquinaria agrícola até à embalagem,
comercialização e transformação dos seus produtos. Este verdadeiro complexo
agroindustrial que envolvia, no início do século XXI, mais de 20 milhões de
trabalhadores, tornou-se o centro de gigantes multinacionais.
Desde há muito na vanguarda da inovação, a indústria americana sofreu, no último
quartel do século passado, uma reconversão profunda. Os setores tradicionais, como a
siderurgia e o têxtil, entraram em declínio e, com eles, caiu também a importância da
zona nordeste, o Manufacturing Belt, até aí o coração da indústria americana.
Esta zona, que se mantém o centro financeiro da América (Nova Iorque, Chicago),
alberga ainda as sedes sociais das grandes empresas e algumas das mais prestigiadas
universidades americanas. No entanto, o declínio da velha indústria e a deslocalização de
alguns ramos para as regiões do Sul relegou-a para o segundo lugar da hierarquia
industrial, em favor do Sun Belt, uma extensa faixa sudoeste assim chamada em virtude
do seu clima agradável.
Em crescimento acelerado desde os anos 60, a região do Sun Belt beneficia de uma
situação geográfica privilegiada para os contactos com o Pacífico e a América Latina, e
do dinamismo das indústrias de alta tecnologia que aí se instalaram.

● Novos laços comerciais


A vantagem que os Estados Unidos retiram da sua implantação na América e na área do
Pacífico reforçou-se durante a presidência de Bill Clinton. Numa tentativa de contrariar o
predomínio comercial da União Europeia, Clinton procurou estimular as relações
económicas com a região do Sudeste Asiático, revitalizando a APEC (Cooperação
Económica Ásia-Pacífico), criada em 1989. No mesmo sentido, o presidente impulsionou
a criação da NAFTA (Acordo de Comércio Livre da América do Norte), que estipula a
livre circulação de capitais e mercadorias (não de pessoas) entre os EUA, o Canadá e o
México.
Em consequência da sua participação na NAFTA, o Canadá e o México beneficiaram da
pujança económica americana, mas, em contrapartida, viram aumentar a dependência
face ao seu gigantesco vizinho: mais de três quartos do comércio externo do Canadá
passou a fazer-se com os Estados Unidos e a proporção mexicana cresceu de 75%, em
1993, para 81%, em 2000.

● O dinamismo científico-tecnológico
Numa época em que as grandes indústrias de base recuam perante as novas tecnologias, a
capacidade de inovar é determinante para o desenvolvimento e o prestígio de um país.
Liderando a corrida tecnológica, os Estados Unidos asseguram, na viragem do século
XXI, a sua supremacia económica e militar.
Tal como nos tempos da Guerra Fria, os Estados Unidos são, hoje, a nação que mais
gasta em investigação científica. Para além dos centros que dele diretamente dependem,
o Estado Federal tem um papel decisivo no fomento da pesquisa privada, quer através do
seu financiamento (em 50%), quer das gigantescas encomendas de sofisticado material
militar e paramilitar.
O avanço americano fica, também, a dever-se à criação precoce de parques tecnológicos -
os tecnopolos -, que associam universidades prestigiadas, centros de pesquisa e empresas,
que trabalham de forma articulada. Um dos mais famosos situa-se em Silicon Valley, na
Califórnia, e foi o berço da Internet.
A liderança americana na área científica atrai às suas universidades investigadores de
todo o mundo e espelha-se no elevado número de prémios Nobel que o país já recebeu
(270 nos campos da Medicina, Física e Química)..

● A hegemonia político-militar
No início dos anos 90, o fim da Guerra Fria trouxe ao mundo a esperança de uma época
nova, de paz e cooperação entre as nações. Dessa esperança se fez eco o presidente dos
Estados Unidos, George Bush (pai), ao defender a criação de uma nova ordem mundial
orientada pelos valores que, em 1845, tinham feito nascer a ONU.
É invocando esta nova ordem que as Nações Unidas aprovam uma operação militar
multinacional com o fim de repor a soberania do Kuwait, pequeno país petrolífero do
Golfo Pérsico, invadido, em agosto de 1990, pelo vizinho Iraque.
A libertação do Kuwait (conhecida por Guerra do Golfo) iniciou-se em janeiro de 1991 e
exibiu, perante o mundo que a seguiu “em direto” pela televisão, a superioridade militar
dos Estados Unidos. Este primeiro conflito pós-Guerra Fria inaugurou “oficialmente” a
época da hegemonia militar americana. O fim da URSS deixou os Estados Unidos sem
rival de vulto na cena político-militar e o poderio americano afirmou-se
inequivocamente.
Verdadeira hiperpotência, os Estados Unidos têm sido considerados os “polícias do
Mundo”, em virtude do papel preponderante e ativo que têm desempenhado na
geopolítica do mundo. Assim:
● multiplicaram a imposição de sanções económicas como recurso para punir os
“infratores”, quer se trate de violação dos direitos humanos, repressão política,
suporte de organizações terroristas quer de agressões militares. Em 1998, 75 países
do mundo sofriam ou estavam ameaçados por este tipo de sanções;
● reforçaram o papel da OTAN, que, com o fim do comunismo na Rússia e a
dissolução do Pacto de Varsóvia, teria, à partida, perdido a sua razão de existir.
Contrariando a sua vocação defensiva, a OTAN atribuiu a si própria, desde 1991, a
função de velar pela segurança da Europa, recorrendo, sempre que necessário, à
intervenção militar armada. No fim do século, a organização alargou-se, com a
entrada de antigos países do Pacto de Varsóvia;
● assumiram um papel militar ativo, encabeçando numerosas intervenções armadas
pelos motivos mais díspares, desde as causas puramente humanitárias, como foi o
caso da operação “Devolver a Esperança”, levada a cabo na Somália, entre 1992 e
1994, até ao combate ao terrorismo, que motivou a intervenção no Afeganistão, em
2001, ou à destituição de regimes repressivos que, alegadamente, constituem uma
ameaça à paz mundial.
Este último motivo serviu de suporte à polémica invasão do Iraque, que, em 2003,
derrubou o regime de Saddam Hussein. Com uma ofensiva militar rápida e bem
sucedida, esta intervenção abriu, no entanto, um foco de grande instabilidade e violência.
Confrontada com a inconsistência das razões invocadas para o desencadear da guerra,
com o crescente radicalismo das fações locais e com a manifesta incapacidade em
cumprir o objetivo de consolidar, no Iraque, um governo democrático, a administração
Bush foi perdendo prestígio no país e no Mundo.
Em dezembro de 2008, a eleição do presidente Barack Obama parece ter aberto uma
nova etapa da História do país. Embora honrando os compromissos anteriormente
assumidos, Obama envidou esforços para reduzir a presença militar americana no
estrangeiro, preparando a retirada do Iraque e do Afeganistão, que se concluiu em 2011 e
2013, respetivamente. A Casa Branca iniciou também uma política de redução das Forças
Armadas que, segundo alguns analistas, poderá conduzir ao declínio da hegemonia
militar americana.

A União Europeia
Nos anos que se seguiram ao fim da Segunda Guerra Mundial, no âmbito do Plano
Marshall, nasceu a primeira aliança económica europeia - a OECE. Seguiram-se outras
formas de união económica entre as quais a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço -
CECA, constituída pela França, Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda e Luxemburgo, com
o objetivo de organizarem em comum a gestão dos recursos de carvão e ferro, mas
também de contribuir para a elevação do nível de vida dos habitantes dos
Estados-Membros.
A 25 de maio de 1957, o sucesso económico da CECA ao lado da fragilidade revelada
pela Europa Ocidental em questões de política internacional motivaram a celebração do
Tratado de Roma, com o objetivo de alargar e aprofundar o mercado comum, pela união
aduaneira dos Estados-membros.
Nos termos deste tratado, era também criada mais uma comunidade de interesses, a
EURATOM - Comunidade da Energia Atómica Europeia, e ficava instituída a
Comunidade Económica Europeia.
Dando prioridade à integração aos países com elevada taxa de emprego nos setores de
serviços e indústrias e mais reduzida na agricultura, a Europa dos Seis acabou por se
abrir à integração de novos países. Em 1973, aderem o Reino Unido, a Irlanda e a
Dinamarca e a Europa económica passa a ser conhecida como Europa dos Nove.
O Tratado de Roma previa que qualquer Estado Europeu poderia requerer a sua adesão à
Comunidade Económica Europeia, bastando-lhe, para isso, cumprir determinados
critérios de adesão, que incluíam um sólido equilíbrio financeiro, um considerável
desenvolvimento económico e social e, condição prioritária, o reconhecimento dos
direitos humanos e a consolidação da democracia pluralista.
Por conseguinte, é só após o triunfo da democracia, meados da década de 70, que os
países da Europa do Sul (Portugal, Espanha e Grécia) passam a reunir a condição
fundamental para requererem a respetiva adesão. A Grécia vê a sua adesão reconhecida
em 1981, e, em 1986, são a Espanha e Portugal que passam a integrar a agora Europa dos
Doze.

➔ Os acordos de Schengen
Schengen é o nome de uma cidade luxemburguesa onde os governos da França, da
Alemanha, da Bélgica, do Luxemburgo e da Holanda decidiram, em junho de 1985, criar,
entre si, um espaço sem restrições à circulação de pessoas. Para o efeito, era proposta a
criação de uma fronteira externa única e a abolição de todos os controlos fronteiriços
internos (terrestres, marítimos, aéreos) e o estabelecimento de medidas para a
salvaguarda da segurança dos cidadãos.
Esta cooperação intergovernamental evoluiu e confirmou-se à medida que outros países
da Comunidade Europeia iam aderindo aos princípios acordados. Deste modo, em 1997,
aquando a assinatura do Tratado de Amesterdão, o espaço Schengen já abrangia todos os
países da União Europeia, com exceção da Irlanda e do Reino Unido, mais a Islândia e a
Noruega, que não integravam a União.
Por isso, segundo este tratado, as decisões adotadas desde 1985 pelos membros do
espaço Schengen, bem como pelas estruturas de trabalho criadas, passariam a constituir
mais um fundamento institucional da União Europeia, com efeitos a 1 de maio de 1999.
Concretamente, ficavam abrangidos pelos acordos:
● as condições de entrada dos estrangeiros no espaço Schengen e de circulação pelas
fronteiras internas dos Estados-membros;
● a harmonização de políticas relativas à concessão de vistos de entrada e de asilo;
● o reforço da cooperação entre os sistemas judiciários e policiais dos países
membros, visando o combate ao terrorismo e ao crime organizado.

➔ O Ato Único Europeu


Com o objetivo de prosseguir as políticas de união europeia já delineadas em tratados
anteriores e de encontrar novos mecanismos que conferissem uma maior coesão e
solidariedade à Europa na defesa de interesses comuns, foi assinado, em fevereiro de
1986, o Ato Único Europeu. Tratou-se, efetivamente, de um tratado que veio dissipar
todas as dúvidas sobre a concretização do projeto de constituição da Comunidade
Europeia.
Através deste documento, procede-se à primeira grande revisão dos tratados fundadores
das primeiras comunidades europeias (o Tratado de Paris, de 1951, que criou a CECA, e
os Tratados de Roma, de 1957, que instituíram a CEE e a EURATOM), reunindo no seu
texto aspetos de caráter político e económico dispersos em documentos anteriores.
Na prática, o Ato Único Europeu veio reforçar o caráter supranacional dos órgãos de
governo comunitário já instituído em muitos dos tratados anteriores e contribuir para a
aceleração da união económica da Europa.

➔ O Tratado da União Europeia - Tratado de Maastricht


Trata-se de um tratado cujas negociações foram concluídas, ao mais alto nível político,
em dezembro de 1992, numa cimeira realizada na cidade holandesa de Maastricht e que,
por isso, também é conhecido por Tratado de Maastricht. Tendo entrado em vigor em
novembro de 1993, introduz alterações nos textos dos tratados anteriores, em particular
do Ato único Europeu, e institui, oficialmente, o nome de União Europeia em
substituição de Comunidade Europeia.
Segundo o Tratado de Maastricht, a União Europeia passa a estruturar-se em três pilares:
● o primeiro sobre matérias de caráter económico e social, onde releva a adoção de
uma moeda única e a ampliação da noção de cidadania europeia - conjunto de
direitos comuns a todos os cidadãos europeus;
● o segundo sobre questões de política externa e de segurança comum (PESC), em
que releva a preocupação da Comunidade Europeia em falar a uma só voz e agir
em conjunto na cena política internacional;
● o terceiro sobre cooperação nos domínios da justiça e de assuntos internos face aos
desafios da criminalidade e do terrorismo internacionais, às pressões migratórias
que se exercem sobre a Comunidade e à abolição dos controlos nsa fronteiras
internas.
➔ O Tratado de Amesterdão
Como o seu nome indica, foi assinado em Amesterdão, na Holanda, em outubro de 1997,
para entrar em vigor a 1 de maio de 1999. Dando continuidade à concretização dos
princípios que nortearam a celebração dos acordos anteriores, o Tratado de Amesterdão,
entre outras matérias, reservou particular atenção para o problema da disciplina
orçamental, reconhecida como condição fundamental do bom funcionamento da União
Económica e Monetária (UEM).
Em conformidade, foi adotado um Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), através
do qual todos os Estados-Membros se comprometem a promover medidas necessárias
para harmonizar os valores do défice público, da dívida pública e da taxa de inflação em
função dos referentes estabelecidos na União Europeia.
Para coordenar a política económica e monetária da União Europeia e promover o
desenvolvimento comum, começa a ganhar forma a instituição do Banco Central
Europeu (BCE) e são esclarecidos os critérios necessários à criação do euro, que fica
prevista para 1 de janeiro de 1999, ainda sem a concretização física, que é, todavia,
estabelecida para três anos mais tarde. Em conformidade, às zero horas do dia 1 de
janeiro de 2002, os países membros, com exceção do Reino Unido, da Dinamarca e da
Suécia, despediam-se das suas velhas moedas nacionais e abriam as suas carteiras a uma
moeda comum - o euro.

➔ O Tratado de Nice
Assinado em dezembro de 2000, para entrar em vigor a fevereiro de 2003, foi a 4ªrevisão
operada no ordenamento jurídico comunitário desde o Ato Único Europeu de 1986.
Entre as muitas novidades relativas à organização e funcionamento das instituições
comunitárias, releva do Conselho Europeu reunido em Nice o Anexo I do tratado final
que acolhe o Protocolo sobre a Ampliação da União Europeia. Esta ampliação
concretizar-se-à com o alargamento da União Europeia aos países do Leste da Europa, já
tentado na cimeira de Amesterdão.
Por conseguinte, após a adesão da Finlândia, Áustria e Suécia, em 1995, formou-se a
Europa dos 25, com a integração dos países da antiga “cortina de ferro”: República
Checa, Eslováquia, Eslovénia, Polónia, Hungria, Estónia, Letónia, Lituânia e dois
pequenos países “ocidentais”, Malta e Chipre, a 1 de maio de 2004, uma das datas mais
gloriosas da União Europeia.
A 1 de janeiro de 2007, o processo de consolidação de uma comunidade europeia tem
novos desenvolvimentos, com a adesão de mais dois países do Leste - a Roménia e a
Bulgária. É a Europa dos 27. E a 1 de julho de 2013, a Croácia tornou-se o 28ª país da
União Europeia.
➔ A União Europeia e as dificuldades da construção de uma Europa política
Apesar da morosidade do processo e de muitos impasses que tiveram de ser superados, a
consolidação do “1º pilar” da União Europeia passou a ser uma realidade incontestável,
sobretudo a partir de 1 de janeiro de 2002, com a entrada em circulação da nova moeda.
Todavia, a consolidação dos outros dois pilares, correspondentes à união política e
diplomática, tem passado por dificuldades de muito difícil resolução, prevendo-se, ainda,
como muito longo e difícil o caminho a percorrer.

Dificuldades de caráter político


A nível político, são notórias as resistências das populações à perda da sua soberania,
sobretudo por parte de alguns dos países mais desenvolvidos e orgulhosos do seu
passado. Entre eles destaca-se o Reino Unido, que nunca se identificou de forma convicta
com o projeto europeu, ao ponto de não aderir à moeda única, tal como a Suécia e a
Dinamarca.
Todavia, os “eurocéticos” multiplicam-se por toda a Europa, sobretudo após a aprovação
do Tratado da União Europeia, considerando o avanço que este acordo deu à união
política e diplomática dos Estados-membros.
A integração de novos povos com culturas e passados políticos claramente diferenciados
da tradição cultural e política ocidental também não tem favorecido os sentimentos de
abertura à constituição de uma Europa unida e muito menos federal.
O sentimento antieuropeu acentuou-se com os complexos desafios colocados à União
Europeia resultantes da intensificação do afluxo de refugiados à Europa, em
consequência do agravamento das condições de guerra e de catástrofe dos respetivos
países de origem. Mias grave tem sido o recrudescimento de ações levadas a cabo por
grupos terroristas de inspiração islâmica radical, ao ponto de provocarem o crescimento
do apoio eleitoral a movimentos políticos de inspiração nacionalista, xenófoba e até
racista que reivindicam, entre outras medidas, o controlo de fronteiras e, em
consequência, o fim da União Europeia.

Dificuldades de caráter económico-social


As dificuldades económicas sentidas pelos europeus nos inícios do novo milénio, de que
resulta a incapacidade da União Europeia em resolver com eficácia o problema do
desemprego, também não têm contribuído para a sólida implantação de um sentimento
europeísta. Demonstram-no os elevados índices de abstenção registados nas eleições para
o Parlamento Europeu, a resistência à adoção de uma política externa comum, de que as
divisões sobre a intervenção militar no Iraque, em 2003, dão provas, e a controvérsia
suscitada pelo projeto de Constituição Europeia e respetivas medidas tendentes à
consolidação da união política.
Efetivamente, quando a ratificação depende da consulta popular através do referendo, as
incertezas sobre o seu êxito são muitas. Em 2005, o primeiro projeto foi reprovado na
França e na Holanda.
➔ O Tratado de Lisboa e a confirmação das dificuldades
Em dezembro de 2007, os Estados-membros, reunidos em Lisboa, aprovaram um tratado
reformador da Constituição europeia - o Tratado de Lisboa - , com entrada em vigor
prevista para 1 de janeiro de 2009.
Porém, a sua ratificação foi recusada, por referendo, pela Irlanda, em junho de 2008, e só
viria a ser ratificado nos outros Estados-membros porque não foi necessária a sua
submissão a processo referendário, por não ser obrigatório, nos termos das respectivas
constituições.
Mas, mesmo depois de ratificado pelos parlamentos nacionais dos outros
Estados-membros, muitas e profundas têm sido as dúvidas sobre a sua implementação.
Na Alemanha, país decisivo na aprovação do novo texto, por exemplo, a legalidade do
Tratado de Lisboa foi contestada entre os setores de oposição ao Governo de Angela
Merkel. Esta contestação levou mesmo a que o tratado fosse submetido a apreciação pelo
Tribunal Constitucional, sob o pretexto de roubar competências ao Parlamento nacional.
Na República Checa, depois de vários meses de polémica e de adiamentos, só em abril de
2009 é que o Senado concluiu, sem grande entusiasmo, o processo de ratificação, depois
da aprovação pela câmara baixa, em fevereiro. Este arrastamento resultou, entre outros
motivos particulares de alguns deputados, do facto de considerarem que o Tratado de
Lisboa vem reforçar o peso dos grandes países em detrimento dos pequenos.

➔ A importância da cidadania europeia na afirmação da União no sistema mundial


A cidadania da União conferida aos nacionais de todos os Estados-membros pelo Tratado
da União Europeia é complementar da cidadania nacional e não a substitui. Destina-se a
tornar o processo de integração europeia mais relevante para os cidadãos, incrementando
a sua participação, reforçando a proteção dos seus direitos e promovendo a ideia de uma
identidade europeia.
Neste âmbito, é conferido a cada cidadão europeu um conjunto de direitos comuns:
● Direito de circulação e permanência noutro Estado-membro;
● Direito de votar e ser eleito em eleições autárquicas e europeias noutro
Estado-membro;
● Direito de petição perante o Parlamento Europeu;
● Direito a proteção diplomática e consular;
● Direito à não discriminação por razões de nacionalidade;
● Direito de igualdade de acesso à função pública comunitária.
Este conjunto de direitos permite que se construa e cimente a noção de pertença a um
bloco político democrático e economicamente interdependente que se proteja a nível
internacional. Apesar de a Europa não ser um Estado soberano, na prática, geralmente
atua como uma força única na política mundial, projetando poder nas áreas que mais
contam para a influência global, baseado num sistema de solidariedade voluntária entre
os diferentes Estados, nomeadamente em políticas externas e de defesa europeias.
A União Europeia é, de facto, a segunda maior economia do mundo, não hesitando em
explorar a sua posição proeminente. O alargamento da União - impulsionado, em grande
parte, por perceções de vantagem económica - tem sido, nas últimas décadas, a
ferramenta de influência política mais rentável nas mãos de qualquer país ocidental. Ao
longo de 60 anos, a União expandiu-se de 6 para 28 membros (menos o Reino Unido,
que saiu da UE no dia 31 de janeiro de 2020), incentivando os países a adotarem
reformas democráticas, legais e de mercado.
Outros instrumentos económicos europeus de projeção mundial são menos visíveis, mas
não menos importantes. Um exemplo é a ajuda externa. A Europa fornece 69% da
assistência oficial ao desenvolvimento global, em comparação com os 21% fornecidos
pelos Estados Unidos. A ajuda externa europeia desempenhou um papel decisivo na
promoção dos objetivos estratégicos ocidentais. Outro exemplo de instrumento
excecionalmente eficaz do poder económico europeu é a imposição de sanções
económicas.
A importância da União no sistema mundial traduz-se, também, no facto de ser um dos
principais contribuintes para as instituições globais e regionais: embora os Estados
Unidos geralmente recebam crédito por serem o maior contribuinte das Nações Unida,
em 2015, a União Europeia foi responsável por 37% do orçamento dessa organização,
contrapondo com os 22% dos EUA.
A projeção mundial da União Europeia é também evidente no campo da educação: 27
das 100 melhores universidades do mundo estão na Europa, em comparação com 55 dos
Estados Unidos.

Afirmação do espaço económico Ásia-Pacífico


Nos anos 50, a zona da Ásia hoje conhecida como “arco do Pacífico” vivia ainda das suas
atividades tradicionais. Nos anos 90 tinha-se tornado um polo de intenso
desenvolvimento económico.
A região desenvolveu-se em três fases consecutivas: em primeiro lugar emergiu o Japão;
depois, em conjunto, os quatro dragões (ou tigres) asiáticos: Hong Kong, Singapura,
Taiwan e Coreia do Sul; finalmente, os países do Sudeste, como a Malásia, a Tailândia e
a Indonésia, seguidos, a pouca distância, pela imensa República Popular da China.

➔ Os quatro dragões: Hong Kong, Singapura, Coreia do Sul e Taiwan


O sucesso do Japão serviu de incentivo e de modelo à primeira geração de países
industriais do Leste asiático. Tal como o seu vizinho nipónico, estes países tinham, à
partida, poucos trunfos em que se apoiar: careciam de terra arável, de recursos mineiros e
energéticos, bem como de capitais. Enfrentavam, ainda, os problemas da superpopulação.
Em contrapartida, não faltava vontade política, determinação e capacidade de trabalho.
Tomando como objetivo o crescimento económico, os governos procuraram captar
investimentos estrangeiros, adotaram políticas protecionistas, concederam grandes
incentivos à exportação e investiram fortemente no ensino.
Compensando a escassez de capitais, a industrialização asiática explorou uma mão de
obra abundante e disciplinada, capaz de trabalhar longas horas de trabalho por muito
pouco dinheiro. Esta mão de obra esforçada e barata permitiu produzir, a preços
imbatíveis, têxteis e produtos de consumo corrente, que inundaram os mercados
ocidentais. Com o capital assim arrecadado, desenvolveram-se outros setores, como o
automóvel, a construção naval e as novas tecnologias.
Os “quatro dragões” constituíram um tremendo sucesso económico. Em 1976, o Japão e
os seus novos parceiros asiáticos produziam, em conjunto, 60% das exportações
mundiais de bens manufaturados.

➔ Da concorrência à cooperação
Apesar do seu enorme êxito, os Novos Países Industrializados (os NPI) da Ásia
confrontavam-se com dois problemas graves: o primeiro era a excessiva dependência
face às economias estrangeiras, quer em termos financeiros e nergéticos, quer, sobretudo,
na esfera comercial: dois terços das exportações dirigiam-se aos países ocidentais, o que
significava que qualquer contração destes mercados se refletiria no seu crescimento; o
segundo era a intensa rivalidade que os separava, já que concorriam com os mesmos
produtos, nas mesmas zonas.
Quando a economia ocidental abrandou, nos anos 70, os países asiáticos foram induzidos
a procurar mercados e fornecedores mais próximos da sua área geográfica. Voltaram-se,
então, para os membros da ASEAN, organização económica que aglutinava alguns países
do Sudeste Asiático.
Nascida em 1967, a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) agrupava a
Tailândia, a Malásia, as Filipinas e a Indonésia, países cujas economias se encaixavam
perfeitamente na do Japão e nas das quatro novas potências: eram ricos em
matérias.primas, nos recursos energéticos e nos bens alimentares de que os cinco
necessitavam.
Agarrando a oportunidade, as duas partes deram início a uma cooperação regional
estreita: o Japão, a Coreia do Sul e Taiwan iniciaram a exportação de bens manufaturados
e tecnologia para os países do Sudeste e começaram a investir fortemente na exploração
das suas reservas petrolíferas. Obtiveram, em troca, os produtos primários que
pretendiam.
Este intercâmbio permitiu a emergência de uma segunda geração de países
industrializados na Ásia: a Tailândia, a Malásia e a Indonésia, sobretudo, desenvolveram
a sua produção, apoiada numa mão de obra ainda mais barata, em virtude do seu maior
atraso.
Na última década, a ASEAN tem demonstrado um dinamismo notável, mostrando-se
capaz de enfrentar os desafios económicos do século XXI. Os Estados do “arco do
Pacífico” tornaram-se, deste modo, um polo económico articulado, com elevado volume
de trocas inter-regionais. A Austrália, a Nova Zelândia, os Estados Unidos e o Canadá
integraram-se nesta zona económica através da APEC, que aglutinava, em 2014, 21
países.
O crescimento asiático alterou a balança da economia mundial, até aí concentrada na
tríade EUA, Europa, Japão. Teve, no entanto, custos ecológicos e sociais muito altos: a
Ásia tornou-se a região mais poluída do mundo e a sua mão de obra permaneceu,
maioritariamente, pobre e explorada. Numa perspetiva ocidental, faltam, também, as
liberdades cívicas que boa parte dos regimes, de índole autoritária, não foi ainda capaz de
instituir.

➔ A questão de Timor
Quando, em 1949, a Holanda concedeu a independência à Indonésia, a parte leste da ilha
de Timor não se integrou no novo país. Era, desde o século XVI, um território
administrado pelos portugueses e, para os portugueses, ainda não tinha chegado o tempo
da descolonização.
Em 1974, a Revolução dos Cravos agitou também Timor-Leste, que se preparou para
encarar o futuro sem Portugal. Na ilha, onde não tinham ainda surgido movimentos de
libertação, nasceram três partidos políticos: a UDT (União Democrática Timorense), que
defendia a união com Portugal num quadro de autonomia; a APODETI (Associação
Popular Democrática Timorense), favorável à integração do território na Indonésia; e a
FRETILIN (Frente Revolucionária de Timor-Leste Independente), com um programa
independentista, ligado aos ideais de esquerda.
O ano de 1975 foi marcado pelo confronto entre os três partidos, cuja violência Portugal
não conseguiu conter. Demasiado absorvido pela descolonização dos grandes territórios
africanos, o nosso país acabou por se retirar de Timor sem reconhecer, formalmente, a
legitimidade de um novo governo.
Em 7 de dezembro desse mesmo ano, reagindo contra a tomada do poder pela
FRETILIN, o líder indonésio Suharto ordena, em nome da sua cruzada anticomunista, a
invasão do território.
Face ao sucedido, Portugal corta, de imediato, relações diplomáticas com Jacarta e apela
às Nações Unidas, que condenam inequivocamente a ocupação e continuam a considerar
Timor-Leste um território não autónomo, sob administração portuguesa.
Os factos, porém, contrariavam estas decisões. Os Indonésios, que impuseram o seu
poder através do terror, anexaram formalmente Timor-Leste, que, em 1976, se tornou a
sua 27º província.
Apesar de consumada, a anexação de Timor permaneceu ilegítima à luz do direito
internacional e do entendimento da maioria dos seus habitantes. Refugiados nas
montanhas, os guerrilheiros da FRETILIN encabeçaram a resistência contra o invasor,
que se viu obrigado a aumentar sucessivamente o contingente militar estacionado no
território.
Quis o acaso que uma das muitas ações de repessão sobre os timorenses fosse filmada
por operadores de televisão estrangeiros que se encontravam em Díli: a 12 de novembro
de 1991, as tropas ocupantes abrem fogo sobre uma multidão desarmada que
homenageava, no cemitério de Santa Cruz, um independentista assassinado. O massacre
fez 271 mortos e várias centenas de feridos.
As imagens correm o mundo e despertam-no para a questão timorense, até aí remetida
para os debates políticos. No ano seguinte, a prisão do líder da Resistência, Xanana
Gusmão, é amplamente noticiada. Com a ajuda dos media, Timor mobiliza a opinião
pública mundial e, em 1996, a causa ganha ainda mais força com a atribuição do Prémio
Nobel da Paz ao bispo de Díli, D.Ximenes Belo, e ao representante da Resistência
timorense no exterior, Ramos Horta.
No fim da década, pressionada pelo mundo em geral e pelos seus parceiros da ASEAN,
em particular, a Indonésia aceita que o povo timorense decida o seu destino através de
um referendo, que fica marcado para o dia 30 de agosto de 199. Entretanto,
encapotadamente, dá o seu apoio à organização de milícias armadas que iniciam ações de
violência e de intimidação no território.
O referendo, supervisionado por uma missão das Nações Unidas, a UNAMET, deu uma
inequívoca vitória à independência, mas desencadeou uma escalada de terror por parte
das milícias pró-indonésias. A UNAMET foi obrigada a evacuar os seus elementos e o
povo timorense viu-se à mercê da destruição, torturas, assassinatos e deportações
efetuadas pelas milícias, com a cumplicidade das autoridades indonésias.
Uma onda de indignação e de solidariedade percorreu o mundo e conduziu ao envio de
uma força de paz multinacional, patrocinada pelas Nações Unidas. Sob a proteção dessa
força, martirizado e destruído, o território encaminhou-se, finalmente, para a
independência. A 20 de maio de 2002, nasce oficialmente a República Democrática de
Timor-Leste. Pouco depois, Timor torna-se o 191º membro das Nações Unidas.
A independência não trouxe, porém, a paz e a prosperidade desejadas. Em 2006, uma
gravíssima crise político-militar colocou Timor novamente no centro das atenções do
mundo, que tantas esperanças pusera no futuro desse pequeno país. Perante uma onda de
violência aparentemente incontrolável, a ONU destacou uma nova missão de paz no
território cujo mandato inicial, de 6 meses, se prolongou até ao fim de 2012. Só nessa
altura, Timor foi considerado capaz de prosseguir, de uma forma autónoma, a sua
caminhada rumo à estabilidade e ao progresso.

Modernização e abertura da China à economia de mercado


O fracasso económico do maoísmo obrigou a China a repensar o seu modelo de
desenvolvimento. Após a morte de Mao, em 1976, o êxito das novas economias asiáticas
induziu os dirigentes chineses a abolirem a antiga política coletivista, virada para a
autarcia, em prol da “modernização” do país. A China integrou-se, então, nos sistemas
financeiro e comercial internacionais e adotou as regras da economia de mercado.
➔ A “era Deng”
A missão de mudar a face da China foi assumida por Deng Xiaoping, um comunista da
velha guarda que Mao afastara durante a Revolução Cultural.
Seguindo uma política pragmática, simultaneamente arrojada e cautelosa, Deng dividiu a
China em duas áreas geograficamente distintas: o interior, essencialmente rural,
permaneceria resguardado de influência externa; o litoral abrir-se-ia ao capital
estrangeiro, integrando-se plenamente no mercado internacional.
Relegada para o papel subsidiário de alimentar as indústrias nascentes, a China
camponesa não acompanhará o surto de desenvolvimento do país. O sistema agrário foi,
no entanto, profundamente reestruturado. Em cerca de quatro anos (1979-1983), as terras
foram descoletivizadas e entregues (em regime de arrendamento a longo prazo) aos
camponeses, que puderam comercializar os excedentes, num mercado livre. Face a estas
medidas,a produção agrícola chinesa cresceu 50% em apenas cinco anos. Quanto à
indústria, sofreu uma modificação radical. A prioridade à indústria pesada foi
abandonada em favor dos produtos de consumo e a autarcia em favor da exportação.
A estratégia de desenvolvimento do setor assentou no sistema de “Porta Aberta”, através
da qual passaria a tecnologia e o capital estrangeiros. Em 1980, as algumas cidades
chinesas foram consideradas Zonas Económicas Especiais (SEZ, na sigla inglesa),
dotadas de uma legislação ultraliberal, favorável aos negócios. As empresas de todo o
mundo foram convidadas a estabelecer-se nestas áreas, quer através de contratos de
parceria com as empresas locais, quer pela simples abertura de filiais. Só em 1983, foram
oficializados 188 contratos de parceria equitativa com multinacionais estrangeiras da área
da construção, turismo, têxteis e exploração de petróleo.
Este processo foi preparado pela aproximação aos dois gigantes económicos do Pacífico:
em 1978, a China celebrou o tratado de paz com o Japão, pondo fim à inimizade aberta
pela Segunda Guerra Mundial, e, no ano seguinte, reatou as relações diplomáticas com
Washington, interrompidas desde a proclamação da República Popular.
Concomitantemente, o país integrou-se nos circuitos económicos mundiais: em 1980,
aderiu ao FMI e ao Banco Mundial (o que lhe permitiu receber importantes fundos de
auxílio económico) e em 1986 candidatou-se formalmente ao GATT.
Desde 1981 que o crescimento económico da China tem sido impressionante. O PIB
aumentou a uma taxa que ronda os 10% ao ano, tornando-se, em 2010, o segundo maior
PIB do mundo.
Recém-chegada ao grupo dos países industrializados da Ásia, a China detém um
potencial muito superior ao dos seus parceiros, quer em recursos naturais, quer,
sobretudo, em mão de obra. Com mais de um milhar de milhão de habitantes, a
competitividade do país alicerçou-se numa massa inesgotável de trabalhadores mal pagos
e sem regalias sociais, que fluiu ininterruptamente dos campos. Depressa, porém, os
chineses adquiriram capacidade tecnológica e um domínio surpreendente do mundo dos
negócios e da finança internacional.
Neste país socialista, as desigualdades entre o litoral e o interior e entre ricos e pobres
cresceram exponencialmente. A incongruência entre o regime político e a via económica
preconizada trouxe, como seria de esperar, sérios problemas ao Partido Comunistam, que
se mantém nas rédeas do poder, como partido único. Em 1986, grandes mobilizações a
favor da liberalização política foram severamente reprimidas.
A morte do reformador Deng Xiaoping, em 1997, não desviou a China do rumo
económico traçado, mas não trouxe, ainda, as medidas políticas que poderão salvar um
regime de um impasse.

➔ A integração de Hong Kong e Macau


A aproximação da China ao Ocidente favoreceu as negociações para a integração dos
dois enclaves que se encontravam, ainda, em mãos europeias: Hong Kong, sob
administração britânica desde o século XIX, e Macau, colónia fundada pelos portugueses
em 1557.
Depois de vários anos de negociações, os ingleses acordaram, em 1984, a transferência
da soberania de Hong Kong para a China, a partir de 1 de julho de 1997. O acordo
instituía uma “Região Administrativa Especial”, com um elevado grau de autonomia, por
um período de 50 anos após a transferência de poderes. Garantiu-se o funcionamento
democrático das instituições políticas do território, que, inclusive, conservou uma moeda
própria, totalmente convertível.
Poucos anos depois (1987), celebrou-se um acordo idêntico entre Portugal e a China,
com vista à integração de Macau, que ficou marcada para o dia 20 de dezembro de 1999.
A transferência da soberania de Macau acabou por se fazer de uma forma mais serena do
que a de Hong Kong, quer por se tratar de um territória mais pequeno e menos
desenvolvido, quer por, nos dois anos anteriores, se ter comprovado o cumprimento
genérico, por parte da China, do acordo estabelecido com os ingleses.
Com a integração dos dois enclaves encerrou-se, para portugueses e britânicos, um longo
ciclo de domínio político no Ocidente. Manteve-se, no entanto, a ligação efetiva e o
intercâmbio frutuoso entre as duas culturas que, um dia, a História uniu.

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