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REVISTA DO

SERVIÇO PÜBLICO ORSÃO DE INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO


E D ITA D O PELO D E P A R T A M E N T O A D M IN IS T R A T IV O DO SE R V IÇ O PÚ BLICO
(D ecreto -le i n . 1.870, d e 14 de D e z e m b r o d e 1939}

ANO VIII _ ~ FEVEREIRO DE [945 V0|. | - N. 2

------- ------------- SUMÁRIO ---------- ----------


EDITORIAL Págs.
V O s servidores públicos e o coopcrativismo ..................................................................................................................... 3

COLABORAÇÃO
Frazer e a antropologia sociológica — F R A N C I S C O AYALA ....................................................................... 5
Publicidade administrativa — B E N E D IC T O S IL V A ............................................................................................. 12
Reflexões sôbre a situação atual e futura do bibliotecário no Brasil — O T T O M . C A R P E A U X 20
D a administração local no Brasil _ J. SALD ANH A DA GAMA E S IL V A .................................... 24
A moeda escriturai — R IC H A R D L E W IN S O H N ............................................................................................... 32
A promoção nos serviços públicos — A L A IM DE A L M E ID A C A R N E IR O ........................................ 37
Relações do orçamento com o planejamento — R O B E R T A. W ALKER ............................................. 42
Inteligência e profissão - TOM AS DE VI LANO V A M O N T E IR O LOPES .................................... 52
Questões de exame — CELSO DE M A G A LHAES — ................................................................................. 56
A Faculdade Nacional de Filosofia — A D A L B E R T O M A R IO R IBEIRO ................................................ 61

DIREITO Ei J U R I S P R U D Ê N C I A
^ Hier rquia das leis e competência legislativa da União e dos Estados — A . G. D E O L IV E IR A 85 1
Pareceres — Julgados .............................................................................................................................................................. SS

ADM INISTRAÇÃO DE PESSOAL


N ovas normas para o processamento das admissões de extranumerários mensalistas ........................... 9S
N otas para o funcionário ...................................................................................................................................................... 99

A P E R F E IÇ O A M E N T O :
Regras práticas de supervisão ......................................................................................................... ................................... 102
Última reunião mensal de 1944 — “ O ensino da economia e administração” ........................ .............. 106

SELEÇÃO:
Questões apresentadas no último concurso para a carreira de Escrivão de Coletoria ...................... 113

NOTAS
N otas para a História da Reforma Administrativa no Brasil ............................... ......................................... 118
Fundação Getúlio Vargas ...................................................................................................................................................... 121
Cidade Universitária .............................................................................................* .................................................................... 123
Criada no D . A . S . P . a carreira de Oficial Administrativo ........................................... ................................ 125
Assistentes de Documentação ............................................................................................................................................... 125

BIBLIOGRAFIA
Critica — Indicações 126
REVISTA
SERVIÇO PÚBLICO
DO

ORGAO DE IN T E R E S S E DA A D M IN IS T R A Ç Ã O
E d ita d o p elo D ep arta m en to A d m in istrativo d o S erviço P ú blico
(D e c r e to -le i n . 1870, de 14 de dezem bro dB 1939)

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modo geral, não aceita colaboraçõcs espontâneas.
20 REVISTA DO SERVIÇO PÚBLICO FEV. 1945

Reflexões sôbre a situação atual e futura


do Bibliotecário no Brasil
O tto M aria Ca r p e a u x
. Bibliotecário da Faculdade Nacional
de Filosofia

S REFLEXÕ ES seguintes sôbre a situação tecas brasileiras. Existem bibliotecas modelares,

A atual e futura do bibliotecário no Brasil organizadas conforme cs sistemas mais modernos,


têm origem paramente empírica: são o resultado como a Biblioteca Municipal em S. Paulo ou a
de trabalho de mais de dois anos na biblioteca da Biblioteca do Departamento Administrativo do
Faculdade Nacional de Filosofia, que o autor Serviço Público, nesta capital. Há outras, nas
destas linhas tem a honra de dirigir, e das obser­ quais continua a rotina do século passado; exis­
vações, feitas já antes e durante essa época em tem, até aqui no R io de Janeiro, depósitos de livros,
outras bibliotecas brasileiras. rigorosamente guardados, conservando com fideli­
E ’ evidente que nas observações empíricas, por dade comovente a poeira medieval; não produzi­
mais empíricas que sejam, existe sempre um fundo ria surprêsa, se um viajante corajoso encontrasse,
de preconceitos, constituído de experiências an­ em lugar determinado não muito longe do centro
teriores e conhecimentos teóricos; no caso, as ex­ da capital, uma coleção de inscrições em pedra, e
periências anteriores do autor nas grandes biblio­ o guarda tatuado à entrada da caverna se apre­
tecas européias, que conheceu de perto, e os seus sentasse como funcionário público. Apenas, êsse
conhecimentos de biblioteconomia. Contudo, re­ estado de coisas já não é tão imóvel como na época
flexões teóricas teriam valor bastante reduzido, das experiências do Sr. Lourenço Filho no interior
e, doutro lado, o método comparativo não está do Ceará. As bibliotecas brasileiras encontram-se
isento do perigo de enganos graves. Sem dúvida, em franca evolução. Tive oportunidade de dirigir
podemos aprender muita coisa no estrangeiro; mas um dêsses processos de evolução, na biblioteca da
a aplicação de experiências assim adquiridas tem Faculdade Nacional de F ilosofia: encontrei-a
os seu limites. No caso das bibliotecas — como como mero depósito de livros; agora, trata-se de
em todos os casos da vida brasileira — é im­ uma biblioteca científica; no futuro, será um centro
possível a aplicação integral de modelos estran­ de documentação para estudos independentes.
geiros. Será sempre melhor aprender nos próprios Não será precipitado generalizar essas expe­
erros os meios de superá-los. Daí a resolução de riências. Até há pouco, não existia no Brasil a
limitar-se a observações empíricas; dão resultado noção moderna da biblioteca. Graças aos esforços
enquanto é possível convencer os leitores. Daí a do Departamento Administrativo do Serviço Pú­
tentativa de dar-lhes a forma de silogismos lógi­ blico, do Instituto Nacional do Livro, e dosi cursos
cos, cujas conclusões constituem, por sua vez, su­ de biblioteconomia enfim radicalmente reformados,
gestões práticas. na Biblioteca Nacional, introduziram-se os méto­
Num livro do Sr. Lourenço Filho encontra-se dos modernos da biblioteconomia, seguindo parti­
um “aperçu” espirituoso sôbre os resultados duma cularmente os modelos norte-americanos: maior
viagem ao interior do Brasil: o viajante parte liberdade do leitor nas salas de leitura, acesso livre
da capital, metrópole típica no estilo século X X , às estantes para exame dos livros e escolha da lei­
passa pelas pequenas cidades do “hinterland”, que tura conveniente, serviços de empréstimo para
se encontram ainda no século passado, chega a casa, catalogação suficiente, elaboração de fichá-
regiões de regime colonial ou medieval; e, enfim, rios de assuntos conforme o sistema decimal.
a viagem acaba entre gente neolítica. Grande parte das bibliotecas brasileiras já se
Essa simultaneidade de épocas diferentes da pode orgulhar dos resultados obtidos com essas ino­
evolução, é possível observá-la também nas biblio- vações, que, no comêço, pareciam heresias perigo­
RELAÇÕES DO ORÇAMENTO COM O PLANEJAMENTO 21

sa:;. Mas nada seria mais perigoso do que a satisfa­ documentação imensa, da qual, as mais das vêzes,
ção definitiva com aquêles resultados. A heresia de só o próprio bibliotecário pode ter conhecimento
ontem poder-se-ia transformar em ortodoxia, im­ suficiente; o especialista não sabe da existência de
pedindo o progresso. Convém lembrar uma frase trabalhos que o interessariam vivamente, quando
famosa de Th. H . H u x l e y : “It is the customary feitos em setores independentes de sua especiali­
faíe of new truths to begin as heresies and to end zação. E quem se ocupa com trabalhos de do­
as superstitions” . A boa ordem na biblioteca não é cumentação na administração pública, sabe que lá
o supremo fim dos nossos esforços. O fim é o tra­ também muita coisa fica despercebida porque só
balho "cie documentação científica. E para isso é os guardadores da documentação respectiva têm
preciso algo mais. conhecimento da existência dela. De tôdas essas
observações resulta uma conclusão convincente: a
São bastante conhecidas ss grandes dificuldades
necessidade da colaboração do bibliotecário no tra­
ccm as quais se choca o trabalho científico no
balho científico.
Brasil: a insuficiência das bibliotecas públicas, os
Transformaram-se as bibliotecas, de meros de­
sacrifícios dos particulares em arranjar as do­ pósitos de livros em instituições praticáveis para
cumentações indispensáveis, a falta de comunica­ o estudo. Era o primeiro- passo. Agora, é preciso
ções internacionais; em suma: a falta de organiza­ transformar as bibliotecas em centros de estudos,
ção científica, da qual a organização bibliotecária nos quais a colaboração de bibliotecário, às vêzes
constitui só uma parte. A essas dificuldades espe­ em lugar decisivo, é indispensável.
cificamente brasileiras juntam-se outras, de caráter O primeiro passo foi feito por meio dum traba­
geral1, que se referem ao futuro. É a minha firme lho pedagógico. Era preciso educar os leitores,
convicção que o trabalho científico do futuro será que estavam acostumados a tratar os livros com
de índole coletiva; passou a época de descobertas descuido, a enganar os bibliotecários incompeten­
individuais; começará a épooa das investigações em tes e mal humorados, e mais a práticas piores.
grupo. Um dos sintomas mais interessantes dessa Êsse trabalho educativo já foi feito. O segundo
transformação é a existência de relações entre passo está confiado, com o se viu, ainda uma vez
ciências inteiramente separadas que um estudioso aos bibliotecários. Mas não pode ser feito, en­
só não pode dominar ao mesmo tempo. quanto perdurar a condição atual do bibliotecário
no Brasil.
Exemplo conhecido disso é apresentado pela
Até há pouco o leitor brasileiro era um homem
química-física, ciência relativamente nova, situa­
que, por mais estudioso que fôsse, não sabia bem
da entre a química e a física, com a tendência
utilizar uma biblioteca pública. Surgiu o novo
cada vez mais acentuada de constituir-se em
tipo de bibliotecário, introduzindo inovações iné­
centro de pesquisas para ambos os lados, trans­
ditas e visivelmente utilíssimas, o que lhe arran­
formando a química e a física de outrora em
jou uma situação de certa superioridade com res­
ciências auxiliares. Surge o problema da coorde­
peito ao leitor; era possível, portanto, aquêle tra­
nação dos estudos especializados. Outro exem-
balho educativo. Agora, aproxima-se a fase da
pio conhecido: os estudos sociológicos de M a x
utilização científica da biblioteca. E agora, o bi­
W eber sôbre a relação entre as origens do capita­
bliotecário brasileiro encontra-se numa situação
lismo e a evolução do protestantismo tinham como de evidente inferioridade.
base a relação entre estudos de economia política
Quem são os leitores das nossàs bibliotecas pú­
e estudos, de teologia histórica, quer dizer, entre
blicas? Estudiosos especializados, funcionários
duas ciências inteiramente separadas e considera­
formados, professores formados para o ensino se­
das quase incompatíveis; sabemos que essa maior cundário ou superior, alunos das escolas superio­
descoberta da sociologia do século X X se originou res. Em geral: pessoas de formação universitária.
de conversas casuais do sociólogo com colegas da O bibliotecário, no Brasil, é uma pessoa :om for­
outra Faculdade. Mas não nos podemos confiar mação secundária, habilitado depois num curso
ao acaso; surge, outra vez, o problema da coorde­ técnico de biblioteconomia, e classificado, portan­
nação. Enfim, a tendência para a especialização to, entre os funcionários de formação secundária
cada vez mais rigorosa, que tôdas as ciências mo­ e técnica. Encontra-se, com respeito aos leitores,
dernas revelam, deposita em nossas bibliotecas uma numa situação de evidente inferioridade. Não
22 REVISTA DO SERVIÇO PÚBLIC.O — FEV. 1945

será capaz nem considerado capaz de dirigir um fatório. O ensino das mesmas ciências como
centro de estudos científicos. Como dar, então, “acessório”, como “complemento” , produzirá só
aquêle segundo passo? diletantes. Dêste modo, uma parte dos futuros
Nesta altura, permito-me, pela primeira vez, bibliotecários adquirirá nas Faculades conheci­
uma comparação com a situação do bibliotecário mentos teóricos para cuja aplicação nunca terá
europeu; mas isso só porque uma sugestão recente­ oportunidade; serão logo esquecidos. Os bibliote­
mente surgida se baseia, sem dúvida, naquela cários, porém, que aspiram à direção dos futuros
comparação. O bibliotecário europeu tem, em centros científicos, não adquirirão nem nas. Facul­
geral, formação universitária. Estudou filosofia, dades os conhecimentos dos quais precisariam
para aquêle fim . Continuariam na situação de
ou letras, ou história ou ciências sociais ou natu­
rais, adquirindo assim os conhecimentos que o inferioridade administrativa: ontem eram consi­
derados como almojíarifes; amanhã seriam consi­
habilitam para dirigir a parte respectiva duma
biblioteca gerai' ou uma biblioteca especializada derados como almoxarifes formados.
na sua disciplina; depois, adquiriu os conhecimen­ O êrro contido naquela sugestão consiste na con­
tos técnicos de bibloteconom ia. Dêste modo, o fusão entre conhecimentos científicos e conheci­
bibliotecário europeu é um “funcionário cientí­ mentos técnicos (no caso, de biblioteconomia).
fico” , na categoria dos assistente das universida­ O bibliotecário precisa de ambos. Mas ambos
des; mais tarde, lhe caberá o título de professor, não se adquirem juntos.
que, na maior parte dos países europeus, é reser­ A solução do problema já está delineada nas
vado aos docentes das escolas superiores. . Está observações precedentes. Precisamos de vários
claro que o bibliotecário assim formado e classifi­ tipos de bibliotecários, com formação diferente
cado é capaz de cumprir aquelas exigências. conforme os fins para os quais têm de servir.
Baseava-se, provavelmente, nessa comparação Precisamos de tantos tipos de bibliotecários quanto
a sugestão de incorporar o curso de biblioteconomia precisamos de tipos de bibliotecas.
às Faculdades de Filosofia: criar, dêsse modo, Antes de entrar nessa classificação, será con­
uma cadeira universitária de biblioteconomia e
veniente fazer, já pela última vez, uma compa­
uma carreira universitária de bibliotecário. E aque­
ração com a situação no estrangeiro. A compara­
le fim seria conseguido.
ção com a situação nas bibliotecas européias será
A proposta é realmente muito boa. A conse­ tanto mais conveniente que não há diferença
qüência imediata seria o melhoramento do nível essencial, neste ponto, entre a Europa e os Esta­
científico dos nossos bibliotecários e, portanto, uma dos Unidos.
maior consideração social da profissão. Mas com
Existem, na Europa e em tôda parte, quatro
isso, aquêle fim não seria conseguido.
tipos de biblioteca:
A biblioteconomia é uma técnica; aprende-se em
cursos teóricos — os atuais são perfeitamente sufi­ 1) as bibliotecas chamadas “nacionais” , biblio­
cientes — e em estágio prático numa biblioteca tecas representativas do país e da nação;
bem organizada. O curso universitário de biblio­
2 ) as bibliotecas universitárias, destinadas ao
teconomia não poderia dar mais, se não fôsse mais
uso das escolas superiores. Bibliotecas de tipo
teoria biblioteconômica; teoria de cujo valor prático
idêntico encontram-se, às vêzes, em cidades im­
muitos entendidos duvidam. Contudo, seria possí­
portantes nas quais não existe Universidade;
vel, numa Faculdade, melhorar as outras disciplinas
que se ensinam no curso de biblioteconomia: litera­ 3 ) as bibliotecas científicas especializadas, jun­
tura geral, conhecimentos de outras ciências, etc.; tas, em geral, a institutos de pesquisas científicas
mas essa esperança é ilusória. Literatura, filo­ como de historiografia nacional, ou de ciências ad­
sofia, ciências sociais e naturais, tôdas elas exi­ ministrativas, ou de medicina experimental, e tc.;
gem um estudo sério e especializado; não é se­ e t c .;
gredo, absolutamente, que até o ensino especiali­ 4 ) as bibliotecas populares, destinadas à divul­
zado daquelas ciências nas nossas escolas supe­ gação de boas leituras e conhecimentos científi­
riores não é ainda, até hoje, perfeitamente satis­ cos entre a parte menos culta da população.
RELAÇÕES DO ORÇAMENTO COM O PLANEJAMENTO 23

Verifica-se que a direção e administração dês­ biblioteconomia, o atual ou o universitário, e além


ses quatro tipos de biblioteca é confiada a pessoas disso, fazer um curso no instituto para o qual se
de formação e índole muito diferentes. A “Biblio­ destinam; neste último curso adquirirão conheci­
teca Nacional” confia-se a uma personalidade mento da bibiliografia da respectiva ciência.
representativa, cujo “Estado-Maior” se compõe Assemelha-se ao tipo da biblioteca universitá­
de bibliotecários de todos os tipos de formação. ria a biblioteca da Faculdade Nacional de Filo­
As bibliotecas universitárias são dirigidas por um sofia; nesta se ensina Filosofia, História, Geogra­
professor de Universidade; quer dizer, um mem­ fia, Ciências Sociais, Letras Clássicas, neolatinas
bro da congregação tem, em vez da tarefa de daí e anglo-germânicas, e tôdas as Ciências Naturais,
aulas, a tarefa de dirigir a biblioteca, e o seu “Esta­ inclusive a matemática; quer dizer, a composição
do-Maior” compõe-se de bibliotecários-assistentes, típica das universidades européias. O mesmo tipo
na categoria dos outros assistentes universitários. de biblioteca encontra-se nas Bibliotecas Públicas
As bibliotecas especializadas dos institutos de estaduais, nas capitais dos Estados. Essas biblio­
pesquisas científicas são dirigidas, da mesma ma­ tecas constituem o núcleo dos futuros centros de
neira, por especialistas. Enfim, as bibliotecas po­ documentação científica. Só com muita hesitação
pulares confiam-se a bibliotecários profissionais, se pode dizer que essas bibliotecas deveriam ser
que possuem a mesma formação biblioteconômica dirigidas por “intelectuais” ; porque a palavra “in­
como todos os funcionários mencionados, mais telectual” é ambígua e a proposta poderia abrir
conhecimentos científicos gerais e da técnica de a porta à nomeação de homens de cultura geral,
divulgação ( “University extension” ). mas superficial e autodidática. Doutro lado, só
No Brasil, a Biblioteca Nacional é uma institui­ um intelectual, isto é, um homem de cultura geral
ção “sui generis” ; não é possível generalizar o e conhecimentos variados, será capaz de transfor­
caso. Contudo, a reorganização atual da Biblio­ mar aquelas bibliotecas en centros de estudos
teca Nacional dá uma lição preciosa: foi confiada científicos. A definição seria: “um intelectual que
a um intelectual de formação universitária e a possui formação universitária e adquiriu os co­
um especialista em biblioteconomia científica É nhecimentos necessários de biblioteconomia” .
um caso de precedência. Os bibliotecários das bibliotecas populares,
enfim, precisarão também, como os das bibliotecas
Apesar da organização da Universidade do
especializadas, de formação biblioteconomista,
Brasil, as Faculdades levam no Brasil vida mais ou
eventualmente universitária. Nas bibliotecas po­
menos independente. Tôdas elas possuem biblio­
pulares, é de importância muito grande o serviço
tecas especiais (biblioteca da Faculdade de D i­
de consulta: o leitor pede informações sôbre o
reito, biblioteca da Faculdade de Medicina etc.;
que deve ler, em geral ou para determinado fim.
e t c .), que se assemelham menos às bibliotecas
O bibliotecário que está fazendo êsse serviço, de­
universitárias na Europa do que às bibliotecas
especializadas dos institutos de pesquisas científi­ verá ser capaz de atender às consultas mais va­
riadas .
cas; são bibliotecas especializadas em Direito, em
Medicina etc. Encontram-se na mesma categoria O resultado final seria a decomposição da atual
as bibliotecas dos Ministérios, a biblioteca do carreira de bibliotecário em três ou pelo menos
D . A . S . P . , e tc . Em todos êsses casos, não se re­ duas carreiras distintas, além da consideração
comenda a imitação do modêlo europeu. A dire­ dos casos especiais mencionados. Dêste modo,
ção dessas bibliotecas por especialistas na matéria o bibliotecário brasileiro poderá conseguir a mes­
seria dispendiosa; e, considerando-se o fato de ma posição social elevada que possuem os seus
que se trata de bibliotecas relativamente pequenas confrades europeus; mais importante, porém, será
aquêle especialista não seria plenamente ocupado. o outro fim, obtido ao mesmo tempo: a fundação
Para êsse caso especial, recomenda-se uma va­ de novos centros de documentação e estudos cien­
riante daquela sugestão relativa aos cursos uni­ tíficos no Brasil. Será mais uma heresia, entre
versitários de biblioteconomia. Os bibliotecários outras, mas melhor, em todo caso, do que a su­
dessas instituições teriam que fazer o curso de perstição, que, neste caso, se chama rotina.

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