INSTITUTO DE SAÚDE E PRODUÇÃO ANIMAL BIOCLIMATOLOGIA ANIMAL DOCENTE: JAMILE DANTAS
INFLUÊNCIA DO AMBIENTE SOBRE A NUTRIÇÃO ANIMAL
O ambiente a que são submetidos os animais é o fator determinante para o
desempenho produtivo das criações. Deste fator dependem todos os aspectos endógenos e exógenos que influenciam a produção animal. Qualquer que seja a alteração nos efeitos da interação ambiental determina, como conseqüência, uma queda na eficiência produtiva do animal. A nutrição, como todos os outros elementos, sofre ação direta e indireta do meio ambiente. Quando o clima interfere de maneira imprópria na produção e no metabolismo dos alimentos, acontece a quebra na interação entre os elementos que influenciam na saúde do animal que, sentindo-se agredido, reage fisiologicamente. Esta reação acontece até que a capacidade do animal de reagir a tal agressão se esgote. A partir daí o animal ingressa no estado denominado “stress”. Para que possa entender a influencia do meio ambiente sobre a performance do animal é necessário que se entenda o que é realmente o stress. A evolução do stress depende basicamente do agente agressor que, segundo algumas pesquisas, atua em três estágios: no primeiro, denominado de “reação de alarme”, o organismo, de maneira global, começa a tomar consciência que o estímulo é uma “agressão” e que precisa começar a mobilizar esforços para combatê-lo ou tolerar a ofensa; o segundo, denominado de “estágio de resistência”, acontece quando o organismo supera o impacto inicial e planeja uma certa tolerância ao stress, usando sua resistência para superá-lo. O terceiro, o “estágio de esgotamento ou abandono”, se faz presente quando o animal permanece sob ação contínua e prolongada do agente agressor. A resposta básica do animal ao agente agressor é a liberação, pela hipófise, do hormônio ACTH, que em resposta induz a secreção, pela córtex adrenal, de grande quantidade de adrenocorticóides (cortisona, cortisol, aldosterona e desoxicorticosterona) que exercem efeitos diversos. Esta resposta é comum a todos os agressores, mas o que permanece ainda em aberto é o tipo de resposta geral, que resulta num sintoma específico.
NÍVEL ENERGÉTICO COMO FATOR DE STRESS
Excesso de energia
Nas vacas lactantes, a observação mais comum do consumo excessivo de
energia ocorre durante o período seco, quando o animal comumente ingere dietas com elevados teores de energia, resultando no desenvolvimento de uma condição muito citada, porém nunca definida, a Síndrome da vaca gorda”. Um condicionamento excessivo resulta numa resposta que induz ao stress, o qual permite alguma deficiência adicional fisiológica ou patológica, que reduz a sintomatologia exagerada. Pelo fato de que uma vaca normal pode sobreviver com algum tipo de problema, podemos deduzir que o condicionamento que possuem alguns animais é sintetizado por um estressor que adiciona mudanças metabólicas e fisiológicas que ocorrem perto do período do parto. A duração da tolerância ao stress depende da condição normal do animal de suportar determinada agressão. As vacas gordas freqüentemente mostram infiltrações de gordura no fígado, que pode caracterizar o stress quando é a causa imediata e específica da superalimentação, ou quando é um efeito suplementar de algum agente agressor. O papel do fígado, como determinante do metabolismo orgânico, sugere que a deficiência causada pela infiltração deve contribuir para a inabilidade do organismo para enfrentar outro eventual agressor.
Deficiência de energia
A deficiência de energia é mais freqüente do que o excesso. Neste caso é
apropriada a discussão da situação: se a vaca está sob deficiência relativa de energia ou se está passando fome. A deficiência relativa acontece quando o gasto de energia é maior do que o consumo, o que se dá quando as vacas, altamente produtoras, não conseguem consumir energia suficiente para produzir a quantidade de leite de acordo com seu potencial. Quando isto ocorre, o animal mobiliza tecido corporal (principalmente gordura) para satisfazer suas necessidades. A proporção de tecidos mobilizados depende da composição da dieta. O resultado de uma prolongada mobilização leva a um esgotamento de vários sistemas orgânicos; conseqüência semelhante à evolução da Síndrome Geral de Adaptação, onde o primeiro estágio representa o stress causado pela deficiência de apenas um elemento, o segundo, a mobilização das reservas que diminuem ou apaziguam o stress e o terceiro estágio, a exaustão, devido à inabilidade de mobilizar mais quantidades de tecido. A deficiência de um nutriente, especificamente, é um reflexo condicionado que sensibiliza o sistema alvo. Em vacas altamente produtoras a manifestação mais comum da deficiência de energia é a cetose, que normalmente é conseqüência da mobilização de lipídios de reservas para a formação da gordura do leite, em condições de fome ou deficiência energética relativa. O problema do excesso ou deficiência de energia acentua-se nos grandes rebanhos leiteiros. Os animais controlam seu consumo de energia segundo duas necessidades. A composição da dieta do rebanho é fixada de acordo com as necessidades da média das vacas do grupo. Conseqüentemente, sempre haverá animais superalimentados e animais subalimentados. Este problema aumenta de acordo com o aumento do número de animais do rebanho.
NÍVEL PROTÉICO COMO FATOR DE STRESS
Excesso de proteína na dieta
Existem poucas informações sobre a influencia de níveis excessivos de
proteína na dieta em relação ao stress. Se a ruptura da molécula de nitrogênio da proteína ocorre com velocidade excessiva no rúmen, pode ocorrer uma intoxicação amoniacal, o que certamente acontece em situação de dieta com altos níveis de nitrogênio não protéico. A quantidade exata na qual a proteína começa a ser tóxica depende da variação dos demais constituintes da dieta. Alguns autores têm demonstrado que, dietas com teor de proteína muito alto, resulta na depressão da eficiência da utilização da energia, que se dá pela quantidade de energia mobilizada para excretar a quantidade excessiva de nitrogênio pela urina. Estes dados, apesar de sugestivos, não são considerados até o momento, indicadores específicos de stress.
Deficiência de proteína na dieta
A deficiência de proteína adequada na dieta de vacas leiteiras é um fator
estressante, pois a função proteína/energia é alterada nesta condição imposta, o que leva à diminuição da produção e à redução da digestão da dieta, trazendo como conseqüência a tendência à Síndrome da vaca gorda. A mobilização da proteína do corpo, ocasionada pela deficiência de proteína da dieta, caracteriza o segundo estágio da Síndrome Geral de Adaptação. No terceiro estágio acontecerá a diminuição da produção de leite, aborto ou morte, dependendo do grau de exaustão. Cada uma destas etapas dependerá da mobilização progressiva da proteína. O stress primário, por aporte inadequado de proteína, pode se conseqüência do aproveitamento, insuficiente da alimentação, baixa produção de leite, tendência para mudanças na utilização da gordura do corpo ou dano do fígado causado por infiltração gordurosa.
A DIETA COMO FATOR DE STRESS
A qualidade da dieta e sua interação com o ambiente são fatores que
exercem notável efeito sobre a saúde do animal e por isso são determinantes do stress. A deficiência de um ou mais nutrientes na ração ou alguma anormalidade nas concentrações destes na dieta, induzem o agente estressor a determinar o primeiro estágio da Síndrome Geral de Adaptação e gerar condições específicas para sensibilizar o órgão ou tecido “alvo”. Se o fator dieta une-se com outros agentes estressores (meio ambiente, agentes patogênicos, etc.), as conseqüências são aceleradas até a quebra do sistema. O grau de tolerância ou duração do stress depende da intensidade do agente estressor e da companhia, ou não, de outros agentes estressores.
SUGESTÕES PARA A PREVENÇÃO DO STRESS NUTRICIONAL EM GRANDES GRUPOS DE
VACAS LEITEIRAS
O uso de dietas a base de alimentos cortados e fermentados, como as
silagens, especificamente de milho, têm sido recomendadas e apresentam sucesso satisfatório no manejo alimentar de rebanhos leiteiros. As vantagens do uso da silagem são: grande produção de matéria seca por unidade de área de cultivo, possibilidade de arraçoamento em estábulo, plantio e colheita totalmente mecanizados e outras, que fizeram da silagem de milho o principal ingrediente das rações utilizadas em rebanhos leiteiros. A dieta de milho não é uma dieta balanceada. É basicamente fonte de energia; portanto, deve-se considerar que deva ser cuidadosamente balanceada com a utilização de fontes de nutrientes essenciais, que nela não existam suficientemente, a fim de suprir as necessidades nutricionais do animal. A organização de grupos de vacas que possuam as mesmas características é um bom procedimento para a utilização e formulação correta da ração, para que cada animal consuma a alimentação de acordo com suas necessidades. A limitação física das maiores produtoras de cada grupo deve ser considerada para as decisões da quantidade de cada alimento a ser oferecido para o grupo. Geralmente pode-se oferecer duas dietas diferentes nos rebanhos: 1) para as lactantes, mediante o uso de alimentadores magnéticos (transponders); e 2) para as vacas secas e novilhas, dieta com baixo teor de energia.
Outro procedimento adequado é o de formular dietas contendo todos os
níveis de nutrientes necessários e nas proporções adequadas, de acordo com o nível de produção de cada animal. A análise dos ingredientes da alimentação a ser oferecida, a pesagem dos alimentos e a mistura cuidadosa dos componentes da dieta, além da disposição de número suficiente de comedouros, a fim de que as vacas comam à vontade e minimizar as causas não nutricionais do stress são igualmente procedimentos importantes para prevenir o stress nutricional.
PROBLEMAS DE NUTRIÇÃO ANIMAL NOS TRÓPICOS
São vários os problemas de nutrição nas regiões tropicais e seria
praticamente impossível abordarmos todos. Assim, iremos tratar de um ponto central, que atinge todas as espécies domésticas e tem um conceito elevado em Bioclimatologia e na adaptação zootécnica dos animais. Este conceito consiste na obtenção da temperatura ideal ótima para a utilização máxima dos alimentos. Na economia fisiológica de um processo como a produção de leite, podemos dizer que depende da eficiência energética, que por sua vez, seria a quantidade de leite produzido pela energia total dos nutrientes (NDT) consumidos, incluindo os usados para sua manutenção. A energia que chega às células ou tecidos pode ser utilizada para o crescimento e para formar produtos úteis, perdendo em formas de calor ou pelo trato urinário. Esta energia desperdiçada pode atingir até 75% do total consumido como alimento. Sabe-se que uma vaca leiteira considerada superior converte uma terça parte da energia que consome como alimento, e uma considerada boa, 25% (1/4). A maior parte desta energia se perde em forma de calor. Este calor pode ser útil em clima frio, porém se torna pesado ônus, que diminui a produção, em clima quente. A vaca eficiente é, provavelmente, a que mais tolera o calor. Teoricamente poderia transformar energia alimentícia em calor, pois geraria menos calor durante os processos metabólicos celulares e digestivos. Com maior energia retida ou transformada em produção haveria uma menor perda urinária e fecal. Quanto à ingestão de alimentos, a temperatura crítica em que começa a diminuir o seu consumo é de 24 a 26º C para a raça Holandesa; de 26 a 29º C para a Jersey; 29º C para a Schwyz e de 32 a 35º C para as raças zebuínas. Em condições de campo, o efeito deprimente do calor sobre a ingestão de alimentos é evidente, à medida que os animais dedicarem menos tempo ao pastejo diurno, passarão maiores períodos na sombra. Conclui-se que a área de conforto é uma realidade, onde dentro daquelas temperaturas limites o animal terá o seu rendimento máximo na utilização dos alimentos. CONTRIBUIÇÃO DA NUTRIÇÃO PARA PROTEÇÃO DOS ANIMAIS NOS TRÓPICOS
Vamos abordar a importância dos líquidos, em especial, a água, na adaptação
dos animais. A maior parte do líquido do corpo está dentro das células. O conteúdo de água das células nos diversos tecidos varia consideravelmente e é particularmente baixo no tecido adiposo. Em monogástricos, o volume total dos líquidos representa uma pequena percentagem do peso total do corpo, porém o enorme tubo gastrintestinal dos ruminantes pode conter uma quantidade de líquido que equivale a 10% do peso do corpo. A água é o melhor regulador do equilíbrio deste líquido dentro do organismo. Isto se deve a certas propriedades favoráveis que ela possui:
a) A mobilidade, representada pela facilidade com que pode entrar e sair do
organismo animal. b) O seu calor específico, que facilita os processos de vaporização. c) A sua alta condutibilidade.
Sendo portanto, a água o maior constituinte do corpo do animal e pelas
propriedades enumeradas, dão-lhe um lugar destacado para a obtenção de conforto dos animais nos trópicos. Na vida pré-natal o feto possui 90% deste líquido e na pós-natal cerca de 75%, excluindo as gorduras. Assim, um homem de 65 kg possui 41 kg de água na sua constituição. Além da composição do corpo, a maioria dos produtos de origem animal possui grande quantidade de água; o leite, por exemplo, tem 87% de água na sua composição. A ingestão de água é regulada por mecanismos micrormonais. O hipotálamo é o responsável pela ingestão de água. Desta forma, se o centro regulador do hipotálamo anterior esquenta, tal como sucede após um exercício ou em um ambiente quente, o animal bebe normalmente. O esfriamento do hipotálamo tem efeito oposto. No intestino existem mecanismos ativos de transporte que são em grande parte responsáveis pela absorção dos íons. Este mecanismo está sob controle hormonal, isto corresponde dizer que a cortisona, um hormônio segregado pela córtex adrenal, favorece a absorção de íons sódio e cloro e inibe a absorção de potássio. Isto não significa que os ruminantes tenham nos espaços extracelulares maior quantidade de potássio. O potássio ingerido é segregado pela urina mediante a filtração glomerular complementada com a secreção direta das células do tubo distal do rim. Devemos escolher animais para zonas quentes que tenham boa capacidade de ingestão de líquidos, ainda mais que a água não entra no custo da produção e serve para amenizar as condições de calor dos trópicos. Nas regiões quentes, os animais devem possuir água potável à disposição, para não sofrer as conseqüências de sua falta. Os ovinos possuem uma capacidade maior de reter água do que os bovinos. A filtração glomerular é controlada principalmente por ação dos nervos linfáticos. Nos carneiros expostos a verões quentes, a filtração glomerular é duas vezes maior durante o verão que no inverno. Os rins de animais de zonas quentes possuem mais asas de Henle que os de zonas frias. Isto nos leva a concluir que o animal precisa sempre ter água à sua disposição e que possa tomá-la repetidamente, pois isto é mais importante que a temperatura em si. A água faz com que baixe a temperatura do rúmen na proporção de 2,3º C para cada 3 litros de água ingerida, voltando ao estado normal ao cabo de 2 horas. Por tudo o que apresentamos, chegamos à conclusão final de que o gado precisa de sombra e água fresca.