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Aminoácidopatias

Introdução

As doenças hereditárias do metabolismo são raras, mas um grupo muito vasto de doenças, dado que mais de 750
erros do metabolismo já foram descritos.

Estas doenças estão presentes in extremis, que podem ser nefastas e irreversíveis, pelo que, sendo tratáveis,
requerem uma intervenção precoce e urgente, para minimizar sequelas.

Muitas vezes são identificados por indicadores/metabolitos analíticos. Muitos delas são, nos dias de hoje,
identificadas através de programas nacionais de diagnostico precoce.

Em 3 anos descobriram-se mais 300 doenças, uma evidência clara dos avanços na área da investigação.

As escolas médicas acabam apor não ter uma formação especializada nesta área, o que acaba por ser um desafio,
dado que desta forma o estudo das doenças metabólicas hereditárias fica por detalhar. A classificação tradicional
baseada em órgãos e sistemas, não serve par o ensino destas doenças, porque nem todas elas caem nestas
categorias, pois podemos ter uma mesma doença com uma atuação sistémica, que atua em diversos órgãos e
sistemas ao mesmo tempo.

O prognóstico das doenças hereditárias do metabolismo depende muito da sua rápida deteção/precoce, e no
contexto das aminoácidopatias, o tratamento passa por aplicação precoce de uma dieta para tratamento
nutricional.

Os programas de diagnostico precoce, as novas tecnologias de diagnostico, as diversas opções de tratamento


farmacológicas e transplantação estão a contribui e muito para o bom prognostico dos doentes com estas
limitações.

Objetivos da intervenção nutricional

- corrigir o desequilíbrio metabólico, mantendo um suporto nutricional para o normal crescimento e


desenvolvimento

- evitar ingestão excessiva de qualquer nutriente

- ajustar a intervenção nutricional tendo em conta as diferentes idades, os diferentes espectros das doenças, a sua
severidade e o outocome possível

- desenhar uma intervenção no sentido de ter um ajuste fino e balanceado entre a correção do desequilíbrio e a
prevenção de um overtreatment em resultado de um excesso de restrições;

- as dietas podem ser utilizadas como única estratégia terapêutica, mas muitas vezes são combinadas com outros
tratamentos como terapêuticas farmacológicas, cofatores vitamínicos, e drogas de azoto (para o ciclo de ureia)

- intervenção individualizada e personalizada ao doente, tendo em conta a idade, as condições, as tolerâncias, a


estabilidade metabólica, o prognostico esperado, etc

- intervenção nutricional, restritiva e complexa para todos os envolvidos, tem de ser feita com uma vigilância
nutricional, com nutricionistas em equipas multidisciplinares.

Princípios da intervenção nutricional

 Diminuir o substrato da via afetada, que bloqueia o seu metabolismo


 Suplementação de substratos formados a jusante
A restrição alimentar é feita em função do seu teor proteico, para prevenir a acumulação do substrato. Por outro
lado, é crucial prevenir o catabolismo e a descompensação metabólicas, principalmente em doenças que afetam
aminoácidos de cadeia ramificada, como a leucinose.

Para tal, utilizam-se ferramentas de troca e tabelas, onde o teor de aminoácidos contido nos alimentos estão
ajustados para o alimento em substituição, ou seja, os alimentos podem ser substituídos, mas temos de ter em
conta que a substituição deve ser feita tendo em conta um conteúdo proteico equivalente.

A garantia das necessidades nutricionais tem de estar salvaguardada: vitaminas, minerais, ácidos gordos essenciais e
ácidos gordos poli-insaturados, de forma a manter as necessidades requerimentos dietéticos supridas.

Temos de também de manter substratos dentro do target, limitando o consumo de proteínas naturais. E depois
administrar misturas e soluções desprovidas do substrato em causa, mas de extrema importância para salvaguardar
os níveis necessários de proteínas e nitrogénio

Para garantir um bom status de crescimento, composição corporal, e um bom estado global nutricional, é
necessária a tal vigilância e acompanhamento. Este é também crucial para manter um normal, mas não excessivo,
aporte de energia.

Manter uma dieta agradável ao paladar, e mais fácil de cumprir possível. É importantíssimo providenciar os
aminoácidos indispensáveis e essenciais que poderão ter tendência a atingir valores baixos devido ao bloqueio das
enzimas ou ao tratamento nutricional( exemplo. Tirosina na PKU, fenilalanina da HTI, II e II, e cisteína na HCU)

Leucinose

Nesta doença, existe um bloqueio do catabolismo dos


aminoácidos ramificados. Apos a transaminação da leucina, esta
sofre a atuação de um complexo enzimático com diversas
subunidades, que são codificadas em genes de diferentes
cromossomas – o complexo de descarboxilação oxidativa dos alfa-
ceotácidos de cadeia ramificada.

Esta doença é muito rara, com uma incidência 1:120 000 – 1:150
000. Dada a possibilidade de serem afetadas subunidades
distintas, esta rara doença manifesta-se de forma variável,
podendo ser mais grave ou menos grave, o que implica um ajuste
e personalização do tratamento.

Apesar deste complexo estar envolvido no catabolismo dos 3


aminoácidos de cadeia ramificada, a restrição ocorre
essencialmente ao nível da leucina, dado que a acumulação do
alfa-cetoácido da leucina, o 2-oxoisocaproico, e da própria leucina, são aqueles compostos que apresentam uma
maior toxicidade neurológica.

A restrição proteica, pode incorrer em desequilíbrios dos restantes dois aminoácidos de cadeia ramificada,
isoleucina e valina, pelo que é necessária a sua suplementação, o que nos indica que estes dois últimos compostos
não são tao tóxicos como a leucina, extremamente toxica.

Nesta doença, fazemos uma restrição de leucina, isoleucina e valina, especialmente de leucina, uma vez que como
o complexo dos alfa-cetoácidos está afetado, há uma acumulação destes compostos e seus respetivos alfa-
cetoácidos, impossibilitando a obtenção de energia através desta cascata.

Posto isto, há que fazer uma suplementação de valina e isoleucina, não apenas quando as concentrações estão
abaixo do target; podemos suplementar em limites mais elevados, para promover desta forma o fator anabólico.

Como a tiamina, B1, é um dos cofatores deste complexo enzimático, a sua suplementação também é importante;
Mas em doentes que respondem á vitamina B1, o grau de restrições poderá não ser tão avoltado.
ATENÇÃO: aquando do diagnóstico é de extrema importancia remover rapidamente o excesso de leucina, sendo que
cada doente possui uma determinada quantidade deste aminoácido. É muito variável, mas se nada for feito, os
doentes morrem sem intervenção, dada a toxicidade destes compostos. Esta intervenção é feita, então, pela
diminuição do aporte de leucina, com grande aporte energetico; nesse sentido, revertemos o quadro, mas nem
sempre é possível, mesmo com forte indução no anabolsimo, pelo que pode ser neessairo recorrer a metodos
dialiticos, de modo a obter taxas de eliminação em quantidades apreciáveis, para evitar as sequelas neurologicas.

O valor máximo de leucina num indivíduon saudável deve ser 200 micromol por litro.

No que diz respeito às


recomendações nutricionais, com foco especial no controlo do aporte de leucina, devem ser providenciados um
aporte de proteina superior aos “safe levels”, uma vez que estamos a administrar aminoacidos livres, que acabam
por ter uma taxa de utilização subótima. Os suplementos de valina e isoleucina são essenciais, bem como um aporte
energético de nutrientes, minerais e vitaminas, de acordo com as recomendações.

NOTA: a restrição da leucina não pode ser total, porque é um aminoacido essencial para a sintese proteica, pelo que
podemos condicionar um maior risco de desequilibrio
No que diz respeito à reintrodução da leucina na dieta após situações agudas, é importante ter em conta que esta
introdução é feita em função do controlo metabólico. Este aporte tem de ser, assim, ajustado consoante as
concentrações de leucina presentes no plasma, pois não queremos suplementar com excesso, pois poderíamos
voltar a desequilibrar o sistema. Ou seja, esta reintrodução e ajuste do aporte nutricional é um exemplo de medical
nutrition teraphy, dado que esta terapêutica se relaciona com outcomes clínicos e médicos.

Nos doentes com leucinose tratados precocemente, o outcome e o seu bem estar está altamente condicionado pelo
controlo dos níveis de leucina plasmática, dado que estes têm de estar sempre sob vigilância, de modo a evitar
desequilíbrios e crises agudas da doença. Assim, é necessário um acompanhamento continuo e um tratamento
dietético também continuo. A suplementação com valina e isoleucina é indispensável ao longo de toda a vida, sendo
muitas vezes necessário um regime de emergência sempre que há risco de descompensação metabólica (infeções,
quadros respiratórios, episódios febris, etc.)

Desequilíbrios no catabolismo dos aminoácidos sulfurados – homocistinúria

Sabemos que a metionina sofre um conjunto de transformações, inclusivamente a perda de um grupo metil, de
modo a originar homocisteína. Este composto é substrato da enzima CBS, cujo cofator é o fosfato piridoxal B6, vai
permitir a síntese de cistationina e consequentemente cisteína.

Em doentes como homocistinúria, a enzima CBS é não funcionante (total ou parcial), o que leva a acumulação de
homocisteína. Este é um fator relacionado com as doenças cardiovasculares, sendo que para evitar este quadro, é
fundamental garantir um status de ácido fólico e vitamina B12, e por vezes betaína, de modo a promover a via
inversa, de remetilação da homocisteína
em metionina, por estimulação da
sintetase da metionina. Desta forma
podemos diminuir a acumulação deste
composto e minimizar os seus efeitos
adversos.

Nos doentes que respondem à vitamina


B6, a acumulação de homocisteína não
é tão complexa, porque eles apresentam
uma maior facilidade em reverter a
homocisteína em metionina.
No que diz respeito às recomendações nutricionais, para além de termos em conta as suplementações já referidas, é
de extrema importancia a restrição dos grandes forncedores proteicos desta composto. Ou seja, há que fazer um
controlo da dieta com uma restrição de metionina (para evitar a toxicidade da homocisteína). Para além disto,
devemos suplementar com vitaminas B6 e B12, folatos e ácido fólico, betaina e cistina, para poder ocorrer a
produção da cisteina

As concentrações de metionina, podem ate ser normais, mesmo com as concentrações de homocisteina alteradas
(um pouco mais elevado entre os 40 e 50). A cisteina, mesmo sendo um produto da reação cujo substrato é a
homocisteina, consegue estar num intervalo normal.

Por outro lado, quando tratamos um doente com


betaina, estamos a forçar a conversão de
homocisteina em metionina, pelo que este ultimo
aminoacido se poderá, naturalmente, apresentar
aumentado. Normalmente, recorremos a este
tratamento quando os doentes não são responsivos
á vitamina B6, pelo que se apresentam mais
vulneráveis e dificies de controlar, pois não
conseguem adquirir valores de homocisteina tão
baixos.

Estes doentes possuem , essenciamente, alterações neurologicas,


alterções ao nivel do esqueleto (osteoporose) ,atrasos mentais e um
elevado risco de doenças cardiovasculares, bem como complicações
oftalmológicas e vasculares. Muitos destes doentes acabam por ter um
fenotipo marfanoide (Alta estatura com braços longos e dedos das mãos
longos e finos) com estatura anormal, muito acima daquilo que é
expectavel para a idade.

Independentemente de estarmos perante doentes responsivos, ou não, à


vitamina B6, sabemos que por volta dos 50 anos de idade, a percentagem
de doentes cuja probabilidade de nunca ter possuido um evento
tromoembólico é extremamente baixa, uma vez que o avançar da idade
aumenta a propensão para estes eventos, dadas as condições da
patologia.

O tratamento nutricional deve ser considerado para todos os doentes


com esta doença, a não ser que o target dos níveis de homocisteína consiga ser alcançado e controlado apenas
com suplementação da vitamina B6 (que sendo cofator do complexo, mesmo que este esteja disfuncional, esta
suplementação pode aumentar a sua atividade ligeiramente e desta forma combater a acumulação da homocisteína,
que continua elevada mas não tanto- primeira linha da tabela acima). Ainda assim, esta suplementação tende a não
ser suficiente, e em doentes que não são responsivos à B6, é necessária a implementação de uma dieta pobre em
proteína natural com suplementos de aminoácidos isentos de metionina. (tratamento necessário para toda a vida).

Sabemos que o diagnostico precoce aumenta a tendência para se conseguir ter doentes sem sintomas, prevenindo
as consequências da doença já referidas (ossos, SNC, olhos, etc.) já nos doentes que não foram diagnosticados
precocemente, o atraso mental é mais frequente , e possuem uma maior tendência para problemas vasculares e
oculares.

Existem já, para algumas doenças com esta incluída, algoritmos de decisão para o ajuste da intervenção nutricional
num recém-nascido com homocistinúria, em função de ser ou não responsivo ao piridoxal fosfato, em função de
estar com aleitamento com forma adaptada ou com leite materno, sendo feito um elevado controlo metabólico,
com o objetivo de otimizar o prognostico dos doentes.

Alterações no metabolismo da tirosina

Na cascata de degradação da tirosina, podem ocorrer varias alterações, que levam a diversas doenças
(representadas pelas barras a negro).

a. Deficiências na tirosina aminotransferase (1)

Esta doença é extremamente rara e denomina-se por tirosinemia tipo II. Apesar de fazerem uma restrição em
proteína natural, de modo a controlar os níveis de tirosina, acabam muitas vezes por comprometer, em
demasia, os níveis de fenilalanina, necessitando de suplementos deste ultimo aminoácido. Ou seja, como não
conseguimos controlar a percentagem de fenilalanina que é hidroxilada a tirosina no fígado, há que fazer uma
dieta pobre nestes dois aminoácidos, sendo depois essencial ajustar a fenilalanina, dada a sua importância para
a síntese proteica de diversas proteínas e enzimas.

b. Deficiências na fumarilacetoacetase (4)

Esta é a doença mais grave deste conjunto e denomina-se tirosinemia tipo I. Esta enzima iria degradar o
fumarilacetoacetato, originando fumarato e acetoacetato. Nesta doença, a sua atividade está comprometida,
pelo que não ocorre esta degradação.

Esta doença, curiosamente, não se manifesta muito em


concentrações altas de tirosina, mas sim do composto
fumarilacetoacetato, que depois é usado para a síntese de
succinil acetona, que também se encontra em elevados níveis,
sendo este composto extremamente toxico para o fígado, que
é o responsável pela fisiopatologia major desta doença.

Assim, em doentes com tirosinemia tipo I, a terapêutica


nutricional ocorre em segundo plano, aparecendo em
primeiro plano para tirosinemia tipo II, dado que a
acumulação é diretamente da tirosina.

NOTA: ainda existem outras patologias ligadas a esta via de


catabolismo. A tirosinemia tipo III decorre de uma deficiência na
dioxigenase do hidroxifenilpiruvato , com acumulação deste
composto (2). Para além desta, temos ainda a conhecida
alcaptonúria, por deficiência na enzima oxidase do homogentisato
(3), por exemplo.

Tirosinemia tipo I

As manifestações clinicas são muito variáveis, desde agudas a cronicas, sempre com envolvimento hepático, devido
a succinil acetona.

Mais uma vez, estamos no âmbito de uma doença rara, com múltiplas mutações a condicionarem esta patologia,
sendo transmitida à descendência como sendo autossómica recessiva. Graças a esta variabilidade genética, há um
vasto leque de severidade da patologia, pelo que diferentes apresentações clinicas poderão apresentar diferentes
severidades.

Os níveis normais de tirosina plasmática estão entre os valores de 30 e 120, sendo que neste tipo de tirosinemia, as
concentrações de tirosina não estão muito aumentadas, não tendo grande valor de diagnostico. Por outro lado, as
elevadas concentrações da succinil-acetona são uma marcador de excelência para o diagnostico desta doença. Dai a
importância da sua monitorização constante.

(a alfa-fetoproteina também não e um indicador muito bom, porque tem falta de especificidade para substratos,
pelo que o seu aumento pode estar na origem de diferentes patologias)

Em termos de tratamento, a dieta pobre em fenilalanina e tirosina tem interesse mas tem um impacto ligeiro na
disfunção tubular e no crescimento, havendo uma pequena melhoria da função hepática. No entanto, a restrição
alimentar não é suficiente, uma vez que não conseguimos através dela, controlar diretamente a formação do
produto toxico, a succinil-acetona. Doentes que eram tratados apenas com restrições alimentares, evoluíam
frequentemente para quadros de hepatocarcinoma, não prevenido por esta intervenção  transplante

Assim, existem outros tratamentos com fármacos. A administração de NTBC orfadina inibe uma enzima denominada
desoxigenase do 4-hidroxifenilpiruvato. Ou seja, ao inibir a via metabólica a montante, temos a capacidade de
transformar, em termos de fenótipo, esta tirosinemia tipo I numa tirosinemia tipo III ou tipo II, uma vez que passa a
ocorrer acumulação de hidroxifenilpiruvato e tirosina.

Obviamente que esta acumulação tem consequências, principalmente a nível neurológico; no entanto, as
consequências são menos graves do que as consequências hepáticas devido à succinil acetona, dado que não
colocam em causa a sobrevivência, ao contrario do que se verifica na de tipo I por deterioração da função hepática.

Assim, o tratamento da tirosinemia tipo I passa, primeiramente, por esta intervenção farmacológica. E depois, em
segundo plano, recorre-se então a uma dieta nutricionalmente controlada, em busca de controlar os níveis de
tirosina e hidroxifneilpiruvato

Uma dose única deste fármaco NTBC vai aumentar 10x a concentração de tirosina, pelo que por força destas
concentrações plasmáticas estarem associadas a manifestações neurológicas e óculo-cutâneas, típicas da
tirosinemia tipo II, o que temos de fazer é implementar um intervenção nutricional para controlar estes níveis.

Depois, em função do controlo metabólico, é uma questão de ir ajustando a dieta com mais ou menos proteína.

Não só é importante restringir a quantidade de proteína natural, como também é fundamental suplementação
com misturas de aminoácidos isentas de fenilalanina e tirosina. Poderá ser necessário depois fazer uma
suplementação da fenilalanina, pois o seu défice pode estar associado a atrasos no crescimento.

Na era pós-NTBC implementada precocemente, os possuem uma percentagem baixa de desenvolver


hepatocarcinoma , relativamente aos doentes na era pré-NTBC, dado que mais de um terço dos doentes evoluía
para esta condição.
Fenilcetonúria, PKU

Esta doença resulta de um défice do metabolismo


hepático da fenilalanina, sendo que cerca de 99% dos
pacientes possuem uma deficiente atividade da
hidroxilase da fenilalanina, responsável pela sua
transformação em tirosina.

Existem também défices na cascata de síntese e


regeneração do cofator tetrabiopterina, BH4, daí que
este diagnostico diferencial tenha de ser feito no
período neonatal.

Esta doença foi a primeira aminoácidopatia


diagnosticada em Portugal, através do teste do
pezinho.

Quando se acumula fenilalanina, formam-se fenil-


derivados com um odor característico, sendo que
estes são inibidores competitivos de outras hidroxilases, nomeadamente da tirosina e do triptofano, que deixam de
estar aptos a atravessar a barreira hematoencefálica, comprometendo a síntese de importantes
neurotransmissores: a dopamina e a serotonina, respetivamente.

Estando perante uma doença de etiologia hepática, é importante as medições plasmáticas. No entanto, a
esmagadora maioria da fisiopatologia desta doença, não ocorre ao nível do fígado, mas sim a nível cerebral. Assim,
não só é necessária uma abordagem nutricional, bem como uma abordagem farmacológica. Existem cada vez mais
guias de tratamento que permitem personalizar e optimizar estas intervenções.

Por um lado, o reflexo nas concentrações plasmáticas de fenilalanina é linear com o défice hepático. Por outro lado,
as implicações ao nível cerebral poderão não ser tão lineares, uma vez que está dependente da cinética de
transporte do LAT1, expresso na barreira hematoencefálica.

O que acontece, é que este transportador, para além de transportar fenilalanina, transporta também aminoácidos
neutros como a tirosina e o triptofano. Desta forma, e sabendo que o transportador tem maior afinidade para a
fenilalanina do que para os aminoácidos neutros, verificamos um maior aporte de fenilalanina, em detrimento dos
restantes aminoácidos, uma vez que as suas elevadas concentrações vão competir pelo transporte e vão
comprometer o aporte cerebral dos restantes aminoácidos transportados pelo LAT1.

Desta forma, há um forte comprometimento cerebral… por um lado, em resultado da grande concentração de
fenilalanina no cérebro, existe:
 Inibição enzimática;
 Danos ao nível da bainha de mielina dos neurónios
 Inibição da síntese de neurotransmissores por influencia na atividade das hidroxilases.

Por outro lado, em consequência da falta de aminoácidos neutros no cérebro, temos:

 Comprometimento da síntese proteica


 Comprometimento da síntese de neurotransmissores de dopamina (pela tirosina) e de serotonina (pelo
triptofano), por escassez de substrato

No seu conjunto, todos estes fatores vão culminar em severos défices cognitivos, bem como défices
neurofisiológicos e neuropsicológicos. Desta forma, é ainda difícil prever quais os doentes que apresentam maio ou
menos suscetibilidade e severidade de sintomas.

Surge assim a questão: porque razão alguns doentes, mesmo sem ser tratados de forma continua, conseguem
“escapar” a estas consequências neurológicas. Pensa-se que esteja relacionado com a existência de mecanismos de
transporte através da barreira hematoencefálica, independentes do défice hepático. Anatomicamente, há ainda
transporte para diferentes tipos de células ao nível do sistema nervoso. A forma como este desequilíbrio afeta a
plasticidade sináptica, mielinização, transmissão sináptica, fenómenos de stress oxidativo e síntese de proteínas
envolvidas no metabolismos energético, ainda está por explicar.

À partida, um mau controlo metabólico estará na origem de uma afetação intelectual, e de um desfecho cognitivo
desfavorável. No entanto, isto não ocorre necessariamente, ou seja, não é legitimo que ocorra em todos os
docentes. Desta forma, a individualização e personalização da terapêutica é inevitável.

Em Portugal há uma prevalência da fenilcetonuria mediana, sendo que há países em que a prevalência é
relativamente baixa, e outros em que a prevalência é elevada.
Como referido, nem todos os doentes apresentam a mesma severidade, pelo que podemos, por vezes, fazer uma
distinção nas denominações: hiperfenilalaninemias, fenilcetonúria mediana, e fenilcetonuria clássica (grau de
gravidade aumenta da esquerda para a direita). Os valores normais estão certamente abaixo de 120 micromolares.

Nestes pacientes, a intervenção nutricional é feita com base na ideia de que, sendo o figado incapaz de metabolizar
o excesso fenilalanina, surge a necessidade de diminuir o aporte deste aminoácido atraves de uma dieta restrita
em proteina natural, com o intuito de diminuir os niveis plasmáticos de fenilalanina. No entanto, se não for feita
uma devida suplementação, vamos incorrer em graves défices nutricionais.

Assim, para acompanhar a restrição alimentar de proteinas naturais, é necessária uma suplementação de
substitutos proteicos. Para tal, recorremos a misturas de aminoacidos isentas de fenilalanina, dando um aporte de
energia atraves de alimentos hipoproteicos. Desta forma, estabelecemos uma ingestão nutricional que é mais
favorável e que é ajustada em função das necessidades individuais.

Desde cedo que se faz esta abordagem terapêutica, tendo sido estabelecidos objetivos:

O controlo da dieta é feito à custa de ferramentas que controlam o aporte de


fenilalanina através da identificação das quantidades deste aminoácidos nos mais
variados alimentos. No entanto, cada caso é um caso, e por isso é necessário ajustar a utilização destas ferramentas
à idade e à severidade da doença, bem como à forma como o organismos responde ao tratamento.

Os suplementos proteicos administrados nestes casos, não são consumidos em todas as refeições, mas sim em
apenas algumas, sendo que a base da dieta será então a alimentação pobre em alimentos proteicos, passando
essencialmente pela ingestão de frutas e vegetais, ou seja, alimentos de baixa qualidade proteica. Há ainda muitas
dúvidas em termos de equilíbrio a ter em conta, dai que esta doença seja uma área fértil para potenciar a realização
de trabalhos de investigação.

A complexidade nutricional destes pacientes é elevada, dado que ainda não se sabe se a doença afeta muito ou
pouco as necessidades nutricionais, havendo ainda um desequilíbrio nos suplementos e nos alimentos
hipoproteicos, no sentido em que não são muito equiparáveis aos alimentos normalmente ingeridos. Posto isto, é
sempre bastante necessário recorrer à complementaridade nutricional, de modo a criar um ambiente nutricional
favorável. O impacto farmacológico é também muito importante.

Independentemente dos métodos utilizados, existe sempre um comprometimento do controlo metabólica, dado
que a dieta é muito difícil de manter e de aderir. Os doentes que possuem formas mais moderadas da doença, não
precisam de tantas restrições, conseguindo manter níveis aceitáveis de fenilalanina. Por outro lado, em doentes,
com fenilcetonúria clássica, é mais complicado atingir valores ótimos.

Existe já um tratamento farmacológico disponível, que passa pela administração de


sapropterina, uma chaperone/análogo sintético do cofator BH4. Nos doentes que
respondem ao fármaco, existe a possibilidade de duplicar o aporte de proteína natural,
ou seja, permite beneficiar o aporte de fenilcetonuria.

O tratamento com BH4 permite aumentar significativamente o aporte de proteína


natural, diminui a necessidade de misturas de aminoácidos, mas ainda assim, é
necessário manter um aporte destas misturas, porque como o aporte de proteínas não
pode ser igual aquele que deveria ser na ausência de doença, poderíamos incorrer em
défices nutricionais que colocariam em causa o crescimento e o estado nutricional.

O tratamento farmacológico com sapropterina, uma chaperone, permite que haja um


controlo da estrutura da enzima, evitando a perda da sua estrutura quarternária e,
desta forma, evitando problemas ao nível da sua formação ou renovação  dai ser
considerado um análogo da BH4, porque permite a atividade enzimática.

Existe um teste de resposta, em que os doentes são sujeitos a resposta a duas tomas
únicas deste fármaco, e em função da resposta percebemos se serão ou não candidatos ao tratamento com esta
fármaco. Há determinadas mutações que estão descritas como respondedoras ao fármaco, pelo que esses doentes
possuem uma maior probabilidade de resposta ao tratamento, dado possuírem este tipo de mutação (atividade
residual da enzima)

Nem todos os genótipos são candidatos a esta terapêutica, devido à atividade da enzima. Quando existe, por
exemplo, 11% de atividade residual, verificamos que possui propriedades cinéticas diferentes, que apenas se
manifestam em concentrações de fenilalanina mais altas. Desta forma, se sujeitos a uma restrição dietética muito
marcada, esta não tem a capacidade de exercer a sua função, pelo que é crucial a correta análise e a personalização.
Existe um novo tratamento farmacológico em desenvolvimento, por substituição enzimática, que consiste na
administração da enzima PAL, de origem bacterina. Esta enzima converte a fenilalanina em ácido trans-cinâmico e
amónia, compostos estes que são depois excretados.

Para “mascarar” a ação do sistema imune sobre esta enzima estranha ao organismo. A enzima sofre um processo de
envolvimento poli-etilenoglicol, no sentido de formar o fármaco Pegvaliase. Este permite então combater a
fenilcetonuria, sem ser rejeitado pelo organismo  terapêutica enzimática de substituição.

A enzima em nada interfere com a via normal de catabolismo, vai sim degradar a fenilalanina em ambiente
plasmático , não originando tirosina. Assim , temos de monitorizar a concentração deste ultimo aminoácido.

Tanto a PAL como Pegvaliase desenvolvem efeitos de hipersensibilidade, ou seja, efeitos adversos. Em regra,
aquando da décima semana, é necessário fazer co-medicação para atenuar estes efeitos. Na eventualidade de
possuírem um choque anafilático, é recomendado o uso de uma caneta de adrenalina  efeitos secundários graves.

Sabe-se com certeza que este fármaco tem um efeito de diminuição das concentrações da fenilalanina, dado que a
sua descontinuação, vai fazer aumentar estes níveis  muito eficaz.

O grande objetivo passa, então, por reduzir as concentrações de fenilalanina, normalizar a dieta e manter as
concentrações de Phe abaixo dos valores anteriormente definidos, sendo candidato a todos os doentes com mais de
16 anos que não consigam manter um controlo metabólico aceitável.

Antes da administração do Palynzig é necessária uma avaliação nutricional do doente, para que a administração
seja adequada ao seu estado inicial. É necessário ter em conta diversos parâmetros nutricionais aquando da
administração e seguimento da evolução do doente, bem como a composição nutricional e composição mineral
óssea.

Inicialmente, aconselha-se a manutenção de uma dieta constante. Só depois temos a capacidade de lidar com o
ajuste da nutrição em função do controlo metabólico resultante da administração do fármaco. Podemos até chegar
ao ponto em que o doente pode possuir um aporte proteico como uma pessoa normal (0,8 g/ kg/ dia), sem a
patologia, prevenindo sempre situações de desequilíbrio, dado que estes doentes podem facilmente cair em
quadros de hipofenilalaninemia.

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