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Fichamento

A desvalorização contínua da mulheridade negra.


bell hooks.

§ Página Citação

84-131 Parece que Brownmiller reconhece a importância de debater o estupro


de mulheres negras durante o período da escravidão ao incluir essa
seção no livro; no entanto, ela efetivamente se dispersou disso ao
enfatizar que faz parte da história, é passado, acabou.

Ela não informa os leitores que homens brancos continuaram a


violentar sexualmente mulheres negras por muito tempo depois do
término do período da escravidão e que esses estupros eram
socialmente aceitos. Ela não destaca o fato de que um motivo
importante para o estupro de mulheres negras jamais ter recebido a
pouca atenção que o estupro de mulheres brancas recebe é o fato de
o público branco sempre ter visto mulheres negras como permissivas
em relação ao sexo, como disponíveis e ansiosas por receber
violações sexuais de quaisquer homens, negros ou brancos. A
designação de todas as mulheres negras como depravadas, imorais e
sexualmente desinibidas surgiu no sistema de escravidão.

No período da escravidão, pessoas brancas criaram uma hierarquia


social baseada em raça e sexo que posicionou homens brancos em
primeiro lugar, mulheres brancas em segundo, apesar de às vezes
serem colocadas na mesma posição dos homens negros, que estavam
em terceiro lugar, e as mulheres negras eram as últimas.

E por essa razão, ao longo de toda a história estadunidense, o estupro


de mulheres brancas perpetrado por homens negros atraiu muito mais
atenção e é visto como muito mais significante do que o estupro de
mulheres negras, por homens brancos ou negros.

Anais do período da escravidão revelam que o mesmo público


abolicionista que condenou o estupro de mulheres negras as
considerou cúmplices, em vez de vítimas.

Essas anotações de diário indicam que Chesnut considerava as


mulheres negras escravizadas responsáveis por seu destino. Sua ira e
raiva é direcionada a elas e não aos homens brancos.

Os brancos [...] escolheram ignorar o fato de que a grande maioria das


mulheres e dos homens negros tentou adaptar valores e padrões
comportamentais considerados aceitáveis por brancos. [...] Mas
enquanto mulheres e homens negros alforriados lutavam para mudar o
estereótipo da sexualidade da mulher negra, a sociedade branca
resistiu.
As mulheres negras que mais sofriam eram aquelas cujo
comportamento mais se aproximava do da “senhora”. Uma mulher
negra bem-vestida e limpa, portando-se de maneira digna, era, com
frequência, objeto de insultos vindos de homens brancos que
ridicularizavam e zombavam de seus esforços para progredir. Eles a
lembravam de que, aos olhos das pessoas brancas em geral, ela
jamais seria digna de consideração ou respeito.

A exploração sexual de mulheres negras enfraqueceu a moral das


pessoas negras recentemente alforriadas. Porque para eles parecia
que, se não conseguissem mudar as imagens negativas da
mulheridade negra, jamais conseguiriam erguer a raça como um todo.

Mesmo que uma mulher negra se tornasse advogada, médica ou


professora, era provável que ela fosse rotulada, por brancos, de
meretriz, prostituta.

A desvalorização da mulheridade negra depois do término da


escravidão foi um esforço consciente e deliberado dos brancos para
sabotar a construção da autoconfiança e do autorrespeito da mulher
negra.

A sistemática desvalorização da mulheridade negra não foi uma


simples consequência do ódio racial, foi um método calculado de
controle social. Durante os anos da Reconstrução, pessoas negras
alforriadas demonstraram que, se recebessem as mesmas
oportunidades que eram dadas aos brancos, poderiam ser
bem-sucedidas em todas as áreas. Suas realizações desafiavam
diretamente as noções racistas sobre a inferioridade nata de raças de
cor.

As uniões sexuais legalizadas entre homens brancos e mulheres


negras e as uniões sexuais legalizadas entre homens negros e
mulheres brancas ameaçavam todo o fundamento do apartheid. [...]
Usavam dois importantes mitos na lavagem cerebral de todas as
pessoas brancas, para que fossem contra os negros recentemente
alforriados: o mito da mulher negra “má” e sexualmente desinibida e o
mito do homem negro estuprador. Nenhum dos mitos foi baseado em
fatos.

No caso de mulheres negras e homens brancos, sexo inter-racial era


tanto incentivado quanto tolerado, desde que não resultasse em
casamento.

** Nas cidades grandes, o desejo por mulheres negras objetos sexuais


levou à criação de várias casas de prostituição, que forneciam corpos
negros para atender à crescente demanda de homens brancos.

Enquanto o número de homens negros que se casavam com mulheres


brancas aumentava, muitos homens brancos não se casavam com
mulheres negras. Essa diferença de reação não foi acidental. Ainda
que tenham ocorrido mudanças no comportamento público direcionado
aos homens negros, não houve qualquer mudança na imagem
negativa das mulheres negras.

Uma vez que mulheres brancas representam um grupo sem poder,


quando não aliado a homens brancos poderosos, o casamento delas
com homens negros não é uma ameaça forte à regra patriarcal branca
existente. Em nossa sociedade patriarcal, se uma mulher branca rica
se casa com um homem negro, ela legalmente adota o status dele.
Por conseguinte, uma mulher negra que casa com um homem branco
adota o status dele; ela assina o nome dele e as crianças são
herdeiras dele. Consequentemente, se a maioria desse pequeno grupo
de homens brancos, que dominam corpos formadores de opinião na
sociedade estadunidense, fosse se casar com mulheres negras, as
bases do poder branco estariam ameaçadas.

As imagens de mulheres negras que são vistas como positivas, em


geral, são aquelas que as retratam como resignadas, religiosas,
maternais, cuja característica mais cativante é se sacrificar e de se
anular pelas pessoas que ela ama.

Esse é apenas mais um indicativo de como a preocupação geral das


pessoas negras em relação ao racismo lhes permite
convenientemente ignorar a realidade da opressão sexista. Não há
vontade de reconhecer que, enquanto o racismo levou homens
brancos a transformarem mulheres negras em alvos, o sexismo foi e é
o que leva todos os homens a pensarem que podem verbal ou
fisicamente atacar mulheres, com intenções sexuais, sem serem
punidos.

O esforço coletivo de pessoas brancas e negras para reduzir


casamentos e até mesmo amizades entre mulheres negras e homens
brancos serve para ajudar a manter a ordem patriarcal branca e apoiar
a contínua desvalorização da mulheridade negra.

um deles foi a noção de que todas elas eram criaturas sub-humanas,


masculinizadas. Escravizadas negras haviam mostrado que eram
capazes de realizar os chamados trabalhos “de homem”, que elas
eram capazes de aguentar sofrimento, dor e privação, mas que
também conseguiam realizar as chamadas tarefas “de mulher”, que
incluíam cuidar da casa, cozinhar e educar as crianças. A habilidade
de lidar bem com os papéis definidos por conceitos sexistas como “de
homem” ameaçava os mitos patriarcais sobre a natureza da diferença
e inferioridade psicológica nata da mulher.

Qualquer que fosse a razão, mulheres negras representaram uma


ameaça tão grande ao patriarcado existente que homens brancos
espalharam o conceito de que mulheres negras tinham características
masculinas incomuns para a espécie feminina.

Apesar de sociólogos brancos fazerem todos os estadunidenses


acreditarem que a mulher negra é, com frequência, o “homem da
casa”, raramente esse é o caso. Mesmo em lares de mãe solteira,
mães negras chegam ao ponto de delegar a responsabilidade de ser
“homem” para o filho.

Mulheres de classe baixa, consequentemente várias mulheres negras,


não têm um mínimo controle sobre o corpo. Na maioria dos estados,
mulheres com dinheiro suficiente (sobretudo, mulheres brancas de
classe alta e média) sempre puderam se livrar de gestações
indesejadas.

Mulheres negras, assim como a maioria das mulheres em sociedades


patriarcais, preferem o nascimento de um filho, uma vez que nossa
sociedade respeita o menino e ignora ou repreende a menina.

[...] quando observaram famílias negras, escolheram enxergar


independência, força de vontade e iniciativa das mulheres negras
como um ataque à masculinidade de homens negros.

Pesquisas com grupos de mulheres de todas as raças e classes que


tentam receber de ex-maridos pensão alimentícia para a prole
ofereceriam extensa prova da relutância dos homens em assumir o
papel de provedor.

Uma pessoa ignorante, ao ouvir uma análise sobre a teoria do


matriarcado negro, pode facilmente supor que o trabalho que mulheres
negras conseguiram adquirir, possibilitando serem provedoras, elevou
o status delas acima do dos homens negros, mas isso nunca foi o
caso. Na realidade, várias das prestações de serviços nas quais
mulheres negras foram empregadas forçaram o contato delas com
brancos racistas, que delas abusaram e as humilharam. Elas
provavelmente sofreram com muito mais intensidade o sentimento de
desumanização e degradação do que os homens negros
desempregados, que permaneciam o dia inteiro nas esquinas. Ter um
emprego com salário baixo não leva, necessariamente, a um
autoconceito positivo.

O pensamento sexista tornou aceitável que homens negros se


recusassem a prestar um serviço subalterno, mesmo estando
incapacitados de prover a família e as crianças.

Assim como os homens brancos enxergaram a entrada das mulheres


brancas para o mercado de trabalho como ameaça aos cargos de
homens e à masculinidade, homens negros eram socializados para
considerar a presença de mulheres negras na força de trabalho com
semelhante desconfiança.

Uma vez que mulheres negras são iludidas e imaginam que temos um
poder que, na realidade, não temos, a possibilidade de nos
organizarmos coletivamente para lutar contra a opressão sexista e
racista é reduzida.
A “maldade” de uma certa mulher pode simplesmente ser uma fachada
dela para o mundo sexista e racista que ela percebe que somente a
exploraria se parecesse vulnerável. [...] Todos os mitos e estereótipos
utilizados para caracterizar a mulheridade negra têm origem na
mitologia negativa antimulher.

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