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DAVIS, Angela. Mulheres, Raça e Classe. São Paulo: Boitempo, 2016.

Início de leitura: 03.09.19

Capítulo 1 – “O Legado da Escravidão: parâmetros para uma nova condição da


mulher”
Reflete sobre o real papel da mulher no contexto da escravidão nos Estados Unidos.
Argumenta contra a tese da “família matriarcal”.

Revela uma “igualdade sexual” no exercício do trabalho doméstico (aqui fala-se de


famílias negras).

 “O trabalho doméstico era o único trabalho significativo para a comunidade


escrava como um todo” – pág. 29.
A “ideologia da feminilidade” era negada às mulheres escravas, tratadas como
homens nas lavouras (e como mulheres se convinha). O estupro era utilizado como
arma de dominação.

 “(...) por meio da submissão das mulheres à exploração mais cruel possível,
exploração esta que não fazia distinção de sexo, criavam-se as bases sobre as
quais as mulheres negras não apenas afirmavam sua condição de igualdade
em suas relações sociais, como também expressavam essa igualdade em atos
de resistência” – pág. 36.

 “O estupro era uma arma de dominação, uma arma de repressão, cujo objetivo
oculto era aniquilar o desejo das escravas de resistir e, nesse processo,
desmoralizar seus companheiros” – pág. 36.

Capítulo 2 – “O movimento antiescravagista e a origem dos direitos das


mulheres”
Trata da relação do movimento abolicionista norte-americano com o início do
movimento pelos direitos das mulheres. O protagonismo parece ter sido de mulheres
da classe média, que viram no movimento abolicionista uma forma de insurgência
contra a própria opressão por sua condição de mulher (ressignificada com o
desenvolvimento do capitalismo nos EUA) – pág. 44.

 Evocavam a metáfora da escravidão como forma de simbolizar a opressão que


viviam dentro de seus casamentos.

 “(...) a campanha abolicionista era um espaço em que elas poderiam ser


valorizadas por seu trabalho concreto” – pág. 51.

Essas mulheres enfrentavam tanto a reprovação da sociedade da época quanto de


homens dentro do movimento abolicionista.
Nomes importantes: Prudence Crandall; Lucretia Mott; Irmãs Grimké.
Capítulo 3 – “Classe e raça no início da campanha pelos direitos das mulheres”
A luta por direitos das mulheres foi influenciada pela campanha abolicionista? É
verdade, pelo menos, que abolicionistas participaram do movimento nascente.
A inquietação que fez surgir a campanha foi o incômodo das mulheres da classe
média e da burguesia industrial com sua situação doméstica.
Em um momento pré-Guerra Civil, o sufrágio feminino era visto como radical demais
para as próprias participantes da campanha. No entanto, foi posteriormente exigido
como recompensa pela dedicação exclusiva das mulheres ao movimento abolicionista,
apagando suas próprias pautas durante a Guerra.
A Convenção de Seneca Falls (1848) refletia o interesse das mulheres brancas da
classe média, alheias à condição de mulheres negras, de trabalhadoras brancas e de
imigrantes. As operárias, inclusive, foram líderes do movimento operário e fizeram
petições na defesa de seus direitos. Todavia, sua militância não foi suficiente para que
fossem consideradas pioneiras na luta pelos direitos das mulheres.

 “O foco enfático da Declaração de Seneca Falls era a instituição do matrimônio


e seus vários efeitos prejudiciais às mulheres: o casamento roubava delas seu
direito à propriedade, tornando-as econômica e moralmente dependentes de
seus maridos” – pág. 63.
A abolição e a campanha abolicionista não foram eficientes para uma conscientização
antirracista, uma vez que a própria motivação do Norte e do Partido Republicano era
muito mais econômica do que humana.
O forte discurso de Sojourner Truth “Não sou eu uma mulher?” – pág. 71. Ao contrário
das mulheres brancas, a ideologia da feminilidade não atingia as mulheres negras.
Nomes importantes: Elizabeth Cady Stanton; Lucretia Mott; Susan B. Anthony.

Capítulo 4 – “Racismo no movimento sufragista feminino”


Após a Guerra Civil (1861-1865), as mulheres brancas acreditavam que “mereciam”
conquistar o direito ao voto. Todavia, o Partido Republicano defendia que os homens
negros pudessem votar e não as mulheres. Isso porque precisavam dos votos
daqueles para garantir a hegemonia do partido no sul.
O Partido Democrata teve apoiadores que defendiam o sufrágio feminino como forma
de barrar essa possível hegemonia do Republicanos no Sul, impedindo a extensão do
voto ao homem negro.
Décima quarta emenda (14º): Condicionava a partilha de representantes no
Congresso ao número de cidadãos do sexo masculino impedidos de votar nas
eleições federais.
Décima quinta emenda (15º): Proibia o uso de raça, cor e situação prévia de
escravidão como bases para negar o direito de voto aos cidadãos.
Em meio a uma disputa por hegemonia, as emendas foram aprovadas deixando de
fora as mulheres, que só conquistaram o direito ao voto com a emenda dezenove
(1920).
Com o apoio da Associação pela Igualdade de Direitos (que conciliava abolicionistas e
ativistas pelos direitos das mulheres), Mott, Stanton e Anthony passaram a mostrar a
influência ideológica do racismo em seus discursos. Acreditavam que os homens
negros que pudessem votar tornar-se-iam superiores a elas.
Frederick Douglas, no entanto, acreditava que a conquista do voto seria definitiva para
a abolição da escravidão de fato. Esse foi um dos motivos para que ele rompesse com
a Associação.

Capítulo 5 – “O significado de emancipação para as mulheres negras”


No período pós-escravidão, a maior parte do trabalho das mulheres negras girava em
torno do exercício de tarefas domésticas ou se concentrava na lavoura, em condições
pouco diferentes da escravidão, o que em vários casos resultavam na servidão por
dívidas.

 “As poucas que encontraram emprego na indústria realizavam os trabalhos


mais sujos e com os menores salários” – pág. 95.
A população negra encarcerada também constituiu uma mão de obra relevante e, de
acordo com Du Bois, a partir de 1876 o número de pessoas negras encarceradas
aumentou. Nesse caso, os menores pretextos eram usados para aprisionar e contratar
a mão de obra que trabalhava forçadamente.
Nas atividades domésticas, as mulheres negras enfrentavam abusos sexuais e eram
vistas como promíscuas. Além disso, o trabalho era visto como degradante para as
mulheres brancas, mas não para as mulheres negras, consideradas ideais para o
trabalho doméstico ― imigrantes europeias que não poderiam escolher outro tipo de
trabalho também se submetiam ao desse tipo.
A ideia de “negros são serviçais, serviçais são negros” encontrou reverberação na
literatura norte-americana como exemplifica nos casos de William Faulkner (O Som e
a Fúria) e Carson McCulles (A Convidada do Casamento).
Além disso, existiam “mercados – versões modernas das praças de leilões de
escravos – em que as mulheres brancas eram convidadas a escolher entre a multidão
de mulheres negras que procuravam emprego” – pág. 103.
O trabalho doméstico era difícil de ser organizado em sindicatos e estes não recebiam
apoio de feministas brancas de classe média, omissão conveniente para a exploração
de suas próprias empregadas.
A realidade só mudou um pouco durante a II Guerra Mundial, em que o número de
mulheres negras na indústria dobrou.

Capítulo 6 – “Educação e libertação: a perspectiva das mulheres negras”


Com o fim da escravidão e depois da Guerra de Secessão (1861-1865), os objetivos
da população negra eram: possuir terras; votar; educar-se.

 Esse período logo após a Guerra de Secessão ficou conhecido como “Período
da Reconstrução” (1865-1877). Dominado por republicanos, é marcado pela
reunificação dos Estados Unidos e a tentativa de integração dos ex-escravos.
O direito à educação era negado à população negra com base em dois motivos: 1.
Essa população seria incapaz de progressos intelectuais; 2. As pessoas negras não
haviam manifestado desejo pelo conhecimento.

 Obviamente falsas, essas motivações escondiam o real temor: o conhecimento


os tornaria inadequados para a exploração.
Muitas iniciativas quanto à educação foram executadas por mulheres negras e
brancas, cuja sororidade foi essencial. No Sul, essas mulheres lideraram juntas um
movimento de erradicação do analfabetismo.
Após a Reconstrução, contudo, houve uma diminuição dessas iniciativas
principalmente em virtude das leis Jim Crown, que impunham a segregação racial nos
Estados Unidos.

Capítulo 7 – “O sufrágio feminino na virada do século: a crescente influência do


racismo”
Na tentativa de captar mais membros (brancas) para sua associação sufragista, Susan
B. Anthony afastou as mulheres negras – principalmente no Sul. Anthony comportava-
se diferente em público e em particular (onde afirmava sua posição antirracista).

 O contexto da época é o do fim do século XX e a consolidação do sistema legal


de segregação.
Homens brancos como o democrata Henry Blackwell defendiam o direito de voto
feminino como uma forma de defesa da supremacia branca, seria uma forma de
combater o poder político da população negra.

 Blackwell ajudou a Nawsa (Associação Nacional Estadunidense pelo Sufrágio


Feminino) a se estabelecer campanha no Kansas (1867) ao lado de Stanton e
Anthony.
Acatando o argumento racista e classista de que o direito ao voto deveria ser
concedido às mulheres como forma de combater um “governo baseado em
analfabetismo”, a Nawsa apontou uma resolução em 1983. A questão era, portanto,
mulheres instruídas versos negros ignorantes.

 A concessão do voto às mulheres instruídas (brancas de classe média e


burguesas) era uma forma de subjugar: negros, brancos analfabetos e
imigrantes – a classe trabalhadora norte-americana.
Em 1896, com o caso Plessy versos Ferguson, foi considerado constitucional (apesar
da 14º emenda) a segregação racial nos estados da União em espaços públicos e
privados sob a doutrina do “separate but equal”.

 Essa doutrina só começou a cair com o caso Brown versos Board of Education
(1954), mas diversas leis segregacionistas continuaram até a década de 70.
Portanto, em um momento crítico para a população negra estadunidense, a postura da
então presidente da Nawsa, Susan B. Anthony, foi de “neutralidade” frente aos
enforcamentos, torturas generalizadas e prisões injustificadas.

 “Na melhor das hipóteses, essa postura evasiva em relação à luta pela
igualdade negra constituía uma aquiescência ao racismo e, na pior das
hipóteses, era um incentivo deliberado da parte de uma influente organização
de massa à violência e à destruição causadas pelas forças baseadas na
ideologia da supremacia branca daquela época.” – pág. 125.
 A Nawsa também serviu aos interesses imperialistas estadunidenses em Cuba,
Havaí, Filipinas e Porto Rico. Embora exigissem o direito ao voto das mulheres
desses países, não contestavam o imperialismo.
O início do século XX celebrou a união entre a supremacia branca e a supremacia
masculina. As mulheres, inferiorizadas, eram vistas como “mães da raça” (anglo-saxã).
Dentro das convenções da Nawsa em 1901 e 1903 foram proferidas declarações
racistas e sexistas.
Outro argumento surgido na época foi que a educação profissionalizante para a
população negra, realizada no norte, era um incremento na luta entre as raças,
principalmente entre brancos e negros pobres.

 “O homem branco pobre, amargurado por sua pobreza e humilhado por sua
inferioridade, não encontrará espaço para si mesmo e para suas crianças e,
então acontecerá a luta entre as raças.” – pág. 129, apud Judith Papachristou.
 O argumento de Davis é que esse conflito foi pensado pela burguesia
ascendente como forma de desmobilizar a classe trabalhadora.
Belle Kearney acreditava que uma forma de manter o conflito racial dentro dos limites
era a concessão de voto às mulheres mais o estabelecimento de requisitos como
instrução e posses.

 “Não eram os direitos das mulheres ou a igualdade política das mulheres que
tinham de ser preservados a qualquer custo, e sim a superioridade racial
reinante da população branca.” – pág. 131.

Capítulo 8 – “As mulheres negras e o movimento associativo”


A década de 1890 foi especialmente difícil para a população negra devido à onda de
linchamentos e abusos sexuais sofridos. Portanto, as mulheres negras passaram a
estabelecer organizações para discutir tais questões.
A primeira federação de mulheres (brancas) a surgir foi a Federação Geral de
Associações de Mulheres em 1890. Segundo a pesquisadora William L. O’Neill,

 “A maioria delas tinha uma educação insuficiente, não desejava ou não


conseguia manter um emprego remunerado e encontrava no cotidiano das
associações a solução para seu dilema pessoal” – pág. 135.
Muito mais mulheres negras trabalhavam do que mulheres brancas. No entanto, as
líderes do movimento associativo não eram da classe de trabalhadoras (o que permitia
que suas líderes da classe média tivessem atitudes elitistas), diferenciando-as das
mulheres brancas por serem capazes de pensar e se pronunciar contra o racismo.

 “(...) sua própria familiaridade com o racismo cotidiano da sociedade


estadunidense as vinculava muito mais intimamente às suas irmãs da classe
trabalhadora do que a experiência do sexismo as vinculava às mulheres
brancas de classe média” – pág. 135.
Antes do movimento associativo, o primeiro encontro realizado por mulheres negras
teve origem na perseguição racista à jornalista Ida B. Wells, que vinculou notícias
sobre o linchamento de negros em seu jornal. Esse encontro aconteceu em Nova York
em 1892 e inspirou a criação da União da Lealdade Feminina. Outras associações
foram criadas em Boston, Chicago, New Haven e etc.
A Primeira Conferência Nacional das Mulheres de Cor (Boston, 1985) tinha como
objetivo “definir uma estratégia de resistência às investidas feitas por meio da
propaganda contra as mulheres negras e à vigência da lei de linchamento” – pág. 139.
A Associação Nacional das Agremiações de Mulheres de Cor nasceu na fusão entre a
Federação Nacional das Mulheres Afro-Americanas e da Liga Nacional das Mulheres
de Cor. Dentro do movimento, contudo, foi criado um conflito entre Ida B. Wells e Mary
Church Terrell. A primeira foi incansável em sua luta contra os linchamentos, rodando
o país para se opor à lei. A segunda foi “a força motriz que transformou o movimento
associativo de mulheres negras em um grupo político forte” – pág. 141.

 Cada uma lutou à sua maneira, sendo essenciais para o emergente movimento
associativo e de combate ao racismo.
O movimento associativo negro, todavia, não encontrou apoio nas mulheres brancas,
que faziam da Federação Geral de Agremiações de Mulheres (GFWC) um movimento
exclusivo. Isso ficou mais evidente a partir do “caso Ruffin”, em que a delegada negra
da Associação de Mulheres Era foi excluída.

Capítulo 9 – “Mulheres trabalhadoras, mulheres negras e a história do


movimento sufragista”

Durante a Guerra Civil e no período posterior, as mulheres constituíam uma relevante


massa de trabalhadoras. Em 1970, eram responsáveis por ¼ da força de trabalho no
país. No entanto, poucos sindicados as aceitavam (apenas produtores de cigarros e
de gráficos).
A NLU (Federação Sindical Nacional, 1866) aprovou resoluções pela igualdade entre
homens e mulheres, mas a NCLU (Federação Sindical Nacional do Operariado de Cor,
1869) elegeu Mary S. Carey para o comitê executivo de elaboração das políticas da
organização.
Para Stanton e Anthony (delegadas em uma convenção da NLU), a concessão do
direito ao voto, sua principal batalha, traria também a igualdade salarial almejada pelas
trabalhadoras. O Revolution, jornal de Anthony, foi um grande propagador dessa ideia,
além de defender as jornadas de oito horas de trabalho. Além disso, no jornal foi
criado um sindicato de mulheres tipógrafas.
Isso, contudo, não as isenta de críticas porque “Assim como relutaram em admitir que
a libertação negra poderia reivindicar uma prioridade momentânea em relação a seus
próprios interesses como mulheres brancas, elas não abraçaram integralmente os
princípios fundamentais da unidade e da solidariedade de classe, sem os quais o
movimento operário permaneceria impotente” – pág. 145.
Anthony e Stanton consideravam a pauta do direito ao voto a principal, portanto, não
tiveram sensibilidade com o operariado. As mulheres, especificamente, tinham
questões mais imediatas a se importar como salários desiguais, jornadas insuportáveis
e condições insalubres de trabalho. Sabiam, pelo exemplo de companheiros, pais,
amigos e irmãos pobres, que “A igualdade política não abrira a porta da igualdade
econômica” – pág. 146. O voto era visto como abstrato demais diante de necessidades
mais pertinentes e cotidianas (ver página 147).
O voto tornou-se uma questão importante para as trabalhadoras a partir do século XX,
pois perceberam uma real relevância. O marco foi o “Levante das 20 mil” (1909-1910).

 “Como as líderes operárias começaram a argumentar, as trabalhadoras


poderiam usar o voto para exigir salários mais altos e melhores condições de
trabalho. O sufrágio feminino poderia servir como uma arma poderosa na luta
de classes” – pág. 148.
O voto, de acordo com Leonora O’Reilly, seria usado para pressionar os políticos que
não se comprometessem com a classe trabalhadora. O movimento sufragista, todavia,
nunca abriu realmente as portas para as mulheres negras trabalhadoras. Contudo, “o
movimento das agremiações de mulheres negras estava imbuído do espírito do
sufrágio feminino – e, apesar da recusa por parte da Nawsa, continuou a defender o
direito das mulheres ao voto” – pág. 149.
Homens negros também foram companheiros na luta pelo direito ao voto. Frederick
Douglass e W.E.B Du Bois foram os mais relevantes, mas outros como Charles W.
Chesnutt, Francis J. Grimké, Benjamin Brawley e Robert H. Terrel. Ao lado deles,
mulheres como Mary Church Terrel, Anna Jones e Josephine St. Pierre Ruffin
participaram de um simpósio em defesa do voto feminino.
Embora sempre rejeitadas pelas sufragistas brancas que desejavam conquistar o
apoio do Sul, as mulheres negras foram incansáveis. Quando a Décima Nona Emenda
(1920) foi aceita os estados do Sul ainda mantinham firme posição contrária. As
mulheres negras da região foram perseguidas por organizações racistas ou
simplesmente impedidas de votar, mas o protesto das mulheres brancas foi silencioso.

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