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Escreva de forma simples 2(repudie ojuridiquês)


~ -28

fácil desatar esse .nó' mas . . • que começar em a1gum 1ugar. Precisamos
. temos • • uma
cnar
epúdio ao Jundiques para torna' -lO t· e
cultura de r
. .
ao ca1ona como fumar com piteira.

2_8.2.3 Motivos alegados para preservar O juridiquês


Os J·uristas empregam o juridiquês por inúmeros motivos , do mais• mgenuo
• • ao
[llais torpe.
Muitos o fazem por hábito 0 ~ iné:cia: assim são escritos os textos que leem.
Outros pensam que essas expressoe~ sao mais precisas ou técnicas que as simples.
Já outros pe~sam .que as palavra_s simples estão aquém da dignidade do discurso
·urídico. Mmtos tem medo de nao serem levados a sério pelos colegas. Outros se
~condem por trás do juridiquês por insegurança ou para ocultar fragilidade in-
telectual: é mais fácil dominar O juridiquês do que estudar e conhecer o direito.
Parte da necessidade de usar palavras longas, pomposas, cheias de vento é
uma visão superv~lorizada de si mesmo. Eles escrevem assim porque podem, por-
que conquistaram esse espaço. O jurista se leva muito a sério tem uma visão ele-
vada de si mesmo. Como ele sabe que o seu poder é fundado na aparência, ele não
quer ser pego em público sem paletó ou sem usar olvidar. ~m resumo, é O insegu-
ro metido a besta.
Outro objetivo para usar um jargão impenetrável é criar uma aura de mistifica-
ção sobre o direito, exaltando o autor e valorizando o serviço prestado. É a glamo-
rização da dificuldade, segundo Zaiden Neto. Muitos o fazem para impressionar o
leitor com sua riqueza vocabular ou para demonstrar que transita com intimidade
no seleto clube dos jurisconsultos. Assim, ele obtém a falsa sensação de superiori-
dade e a aparência de prestígio social e profissional.
Como confessou um advogado_americano, os clientes jamais lhe pagariam para
produzir documentos que eles entendessem e pudessem produzir. Mas se ele encher
otexto de expressões latinas, despiciendos e considerandos, os clientes sentirão que
estão pagando por um serviço relevante. Tudo em direito fica mais impressionan-
te com alguma expressão latina ou arcaica. Os advogados querem manter o latim
porque faz com que o direito pareça uma ciência misteriosa é eles pareçam cien-
tistas eruditos merecedores de altos honorários. 732
As igrejas medievais europeias eram construídas de for~a imponente para im-
pressionar a massa deseducada; elas ainda o são, mas perderam a imponência dian-
te de outras construções ainda mais impressionantes. Por séculos, a missa católica
era proferida em latim, impressionando os fiéis com sua majestade misteriosa. O
mesmo se dá com a linguagem do direito: seu objetivo sempre foi excluir e incul-
car no povo respeito pela autoridade e majestade do direito?33

~! 2· loh~ Ritten, Latin lives in legal language, ABA Journal, v. 63, p. 1512, 1977.
3- David Mellinkoff, The language of the law, 1963.
~edação Jurídica: Estilo Pror. .
250 · . . ,,ss,ono, ,
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0 juridiquês é en:ipregad.o u~a con:ibinação de todos esses fat
0
nenhum deles se justifica, o JUnd1ques precisa ser abandonado. res, Colllo

2.8.2.4 Motivos para evitar o juridiquês


o juridiquês não somente é incompatível com a escrita culta m d
pode soar falso e até ridículo. O verdadeiro intelectual não precisa fala;d.ie~a colllo
é seguro de si não precisa provar nada para ninguém. Ademais, se vo cil: quein
1
!
a dizer, quer comunicá-lo ao leitor: informá-lo, educá-lo, convencê-lo.~ te~ algo
preciso primeiro ser compreendido, coisa que somente acontecerá se
ver de forma natural.
1Sso, é
escr,.
v:
Riqueza vocabular não se demonstra com o abuso de palavras difíce·
caicas nem com sinônimos, mas com o empr~go_ de p~lavras precisas.734 F:;u ~-
cil não impressiona ninguém, ainda que voce seJa mais erudito que O le'to dia.
impressionar menos ainda se o leitor for jurista profundo e portador de r~t lai
za vocabular, pois ele vai perceber sua superficialidade e seus erros. o bo
ta não fala difícil; ele usa uma linguagem efetiva, sem afetação. Portanto, :O
te escrever de forma sofisticada, ainda que você o seja. Seu leitor pode não.
o que é pior, ser mais que você.
Pergunte-se por que você usa juridiquês. Para impressionar o leitor?
gurança? Por inércia e falta de senso crítico? Para demonstrar que pertence
comunidade profissional ou acadêmica? Para demonstrar que domina O tema?
esconder que não o domina? Para conquistar credibilidade? Para comunicar-se
tivamente com colegas? Para cobrar altos honorários? De posse dessas respostas,
decida o que fazer, consistente com seus objetivos e valores.735
Para escrever de forma simples e efetiva, portanto, evite palavras e expres;,ões
difíceis, obscuras, pouco conhecidas, arcaicas, longas, vagas, abstratas, estrangei-
ras. 736 Como disse Barbosa Moreira,
Linguagem forense não precisa ser, não pode ser sinônimo de linguagem ciÍlt·
da. Algum esforço para aumentar a inteligibilidade do que se escreve ese diz
no foro decerto contribuiria para aumentar também a credibilidade dos me-
canismos da Justiça. 737

Quem pensa que o português jurídico contém peculiaridades que o distin~~


do português comum jamais escreverá bem. Não existe um "bom estilo jundi~
diferente de um bom estilo. É esse equívoco que autoriza os juristas a serem arll·

734. V. Capítulo 2.3, Escreva de forma precisa 1 (fundamentos).


735. Helen Sword, Stylish academic writing, p. 120-21, 2012. /eJllldl
736. Henry Watson Fowler e Francis George Fowler, The king's English, p. 11, 1930; Bryan A. Gamer, Thee
of legal style, p. 29, 2002.
1999
737. José Carlos Barbosa Moreira, A linguagem forense, Carta mensal, v. 45, n. 530, p. 11-20, maio ·

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Escreva de forma simples 2(repudieojuridiquês) 251
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1 738
e a adotarem inúmeros maus hábitos que conduzem a uma
6c . : ineficiente.
Como disse David Mellinkoff, a linguagem do direito deve _ser
à linguagem com~m, a m~n~s que haj_a algum motivo que justifique a _d1fe-
1gu a E se houver motivos, os JUnstas preCISam estar conscientes deles. 739 C1cero
74
mesmo 2.000 ano: antes. º Por esse motivo, divirja da linguagem culta co-
:Sm apenas quando voce souber por que o está fazendo.

2,s.3
......... ...
, ?.~--~-~-~~-~~--~-~Y.~~-~ . . ........................ .
Um jargão incompreensível é 1
o traço distintivo de uma profissão. 1
Kingman Brewster, Jr. (1919-1988)"1

. Ojargão nos perm!te camuflar


pobreza intelectual com extravagancia verbal. _
l
David Pratt'42
Juridiquês é uma palavra polissêmica: ela tem vários significados. As pessoas a
empregam de forma descuidada, sem definição precisa.
Em princípio, os autores de português jurídico são contra o juridiquês, porque
essa palavra tem uma conotação negativa.743 O problema está em conceituá-la: to-
dos a empregam sem definir, cada um com um significado diferente. Por isso, nun-
ca se sabe bem o que o autor está querendo dizer. Mas condenar o juridiquês é fá-
cil; difícil é defini-lo de forma precisa e oferecer alternativas concretas.
Como dissemos, o juridiquês é a linguagem empregada pelos juristas que des-
toa gratuitamente da linguagem culta comum, sem ser uma necessidade da aplica-
ção do direito. 744
O juridiquês lexical é composto por aquelas palavras e expressões que todo ad-
vogado gosta de salpicar no texto para dar aquele cheirinho mofado de linguagem
jurídica. Há vários níveis de juridiquês, com vários graus de repreensibilidade. Esses
níveis não são compartimentos estanques, mas níveis gradativos. Ademais, a classi~
ficação é subjetiva: cada palavra pode ser classificada de maneira diferente por ou-
tra pessoa. Aqui faço apenas uma primeira tentativa de sistematização.

738. Bryan A. Garner, ln conclusion ..., ABA Journal, p. 24, Maio 2017.
739. David Mellinkoff, The language of the law, p. vii, 1963. ·
740. Cícero [106 BC-43 BC], De Oratore § 1.3.12, 55 B.C. V. ainda John Franklin Genung, The working principies of
rhetoric, p. 110-11, 1900.
7
41. Kingman Brewster, Jr. (1977), in Simpson's contemporary quotations, p. 101, 1988 ("lncomprehensible jargon
is the hallmark of a profession").
74
2. David Pratt, in Lilless McPherson Shilling e Linda K. Fuller, Dictionary of quotations in communications, p. 118,
1997 ("Jargon allows us to camouflage intellectual poverty with verbal extravagance").
74
3. V., e.g., Cláudio Moreno & Túlio Martins, Português para convencer: Comunicação e persuasão em Direito, p.
74, 2011; Osvaci Amaro Venâncio Júnior, Redação jurídica sem mistério, p. 129-30, 2019.
7
44. V. Capítulo 2.8.1, Ojuridiquês estrutural (definindo juridiquês).

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