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Queer é a destruição de tudo

o que é natural e normal


A questão de fundo não tem que ver com escolhas voluntárias de cada um,
mas sim com a intenção clara de transformar, até por meios violentos, o
sistema moral, económico e político livre e democrático.

17 set. 2022, 01:05 Maria Helena Costa

No dia 1 de Setembro deste ano da graça, comentei o artigo do


Observador Festival Queer Lisboa anuncia programa completocom
estas palavras: «Destruição da sociedade. Queer é a destruição de
tudo o que é natural e normal.». Passados poucos minutos,
o Facebook notificou-me: «Não podes publicar ou comentar
durante 24 horas Este comentário desrespeita as nossas normas
sobre discurso de incentivo ao ódio e inferioridade, pelo que só tu
o podes ver. Conta restrita As tuas publicações vão ser movidas
para uma posição mais abaixo no Feed durante 22 dias».

Reclamei, mas não adiantou de nada. Ou seja, entre outras


coisas, queer é uma teoria que não pode ser criticada nem
denunciada. É mais uma letra do abecedário colorido, parte
daquela bandeira que se impõe a tudo e a todos e ameaça silenciar
qualquer voz que se atreva a divergir. É caso para dizer que nem
no tempo do Salazar a polícia do pensamento esteve tão activa e
castigadora. Só não nos prendem, a-in-da.

Mas, pergunta o leitor: afinal, o que é isso de Queer?

Certamente, já ouviu falar sobre a ideologia de género. Judith


Butler, a filósofa queer, autora da bíblia do género, advoga que o
ser humano nasce neutro e que é a família, a escola e a sociedade
que lhe atrelam um papel binário, homem e mulher, imposto pelo
patriarcado machista opressor. Para ela, o comportamento de cada
sexo, e o próprio sexo, não passam de produções e criações
deliberadas dos homens para que pareçam naturais e inevitáveis,
mas que, ainda de acordo com a feminista radical, não são naturais
nem inevitáveis. Butler evoca Monique Wittig, outra feminista
radical, e a sua proposta de desintegração dos corpos
culturalmente construídos, sugerindo que a própria morfologia é
consequência do tal sistema patriarcal hegemónico e que é preciso
desintegrar as identidades que estão aprisionadas nos
comportamentos de machos e fêmeas, pois são pouco naturais:

Como estratégia para descaracterizar e dar novo significado às


categorias corporais, descrevo e proponho uma série de práticas
parodísticas baseadas numa teoria performativa de actos de género
que rompem as categorias de corpo, sexo, género e sexualidade,
ocasionando sua ressignificação subversiva e sua proliferação além
da estrutura binária (Judith Butler, Problemas de Gênero.
Civilização Brasileira, 2015, pp. 12-13).

A proposta de Butler é a de que a identidade sexual (sexo) seja


negada e se passem a adoptar comportamentos (género) que não
se definam como femininos nem masculinos e que todos se tornem
uma réplica da própria Judith, alguém para quem olhamos sem
conseguir ver de imediato uma mulher nem um homem. É uma
lógica totalmente invertida, que exige militância e um esforço
consciente para afirmar como “natural” algo que é a subversão da
natureza e como “opressão social” aquilo que é, de facto, natural e
gera vida.

Esse mesmo pensamento é central para a teoria queer, que, em


inglês, significa bizarro, estranho, torto. Na gíria, esse adjectivo é
utilizado como um insulto, que, em português, por exemplo, seria
paneleiro, larilas, traveca. E, para não me acusarem de inventar
algo que não corresponde à verdade, nada melhor do que
citar Beatriz Preciado, filósofa queer, que concorda comigo e
acrescenta mais alguns significados à palavra queer: «invertidos,
bicha e lésbica, travesti, fetichista, sadomasoquista e zoófilos».

Mas, para provar que vivemos numa ditadura do pensamento e


que o meu comentário não devia ter sido censurado, pois é apenas
o resumo da constactação de factos por parte de quem estuda a
agenda lgbtetc e derivados há cerca de 8 anos, vou mencionar e
citar a filósofa queer Leonor Silvestri, que integra os “colectivos”
“Ludditas Sexxxuales” e “Manada de Lobxs”, autores do
livro Foucault para Encapuchadas (2014), que começa com uma
pergunta-chave reveladora das intenções da ideologia que
representam: «Agora que entendemos que não há sujeitos da
revolução, quem combate o hétero-capitalismo?»

A resposta, para destruir toda e qualquer identidade como tal,


consiste em «apagar as categorias de ‘masculino’ e ‘feminino’ de
acordo com as categorias de atribuição biopolítica
‘homem/mulher’. Os códigos de masculinidade são susceptíveis de
abrir-se para que operemos sobre eles uma espécie de
gender hacking perfo-prostésico-lexical usando jogos linguísticos
que escapem das marcas de género, ou pelo menos as
decomponham: proliferar até ao absurdo anormalidades
psicossexuais» (Manada de Lobxs. Ob. Cit., p. 24). A fim de «…
invalidar o sistema hétero-normativo da produção humana e as
formas de parentesco – sempre à priori hétero-normais – por meio
de desistir de práticas como o casamento e todos os seus
substitutos.» (Ob. Cit., p. 25)

O objectivo da ideologia queer é subverter o que designa como


“relações sexuais hétero-normativas”, que inclui não só a relação
heterossexual como tal, mas também o papel que têm em si
mesmos os órgãos sexuais natural e biologicamente determinados
para a prática das relações sexuais (pénis e vagina). Assim, as
teorias queer explicam que «a renúncia de manter relações sexuais
naturalizantes hétero-normais permite a ressignificação e
desconstrução da centralidade do pénis e critica as categorias
‘órgãos sexuais’ (qualquer parte do corpo ou objecto se pode tornar
brinquedo sexual)» (Ob. Cit., p. 25). De facto: «A abolição da prática
da sexualidade em casal, mediante a prática de prazer em grupo
com afinidades sexo-afetivas ressignifica o corpo como uma
barricada de insubordinação política, de desobediência sexual, de
desterritorialização da sexualidade hétero-normativa, seus
regimes disciplinares naturalizados e suas formas de
subjectivização para a posterior criação de espaços de afinidade
anti-género e anti-humanos: destruir até às fundações a
heterossexualidade como regime político. Esse é o nosso
destino.» (Ob. Cit., p. 25)

Confuso? Eu traduzo:

O que se quer dizer com tanto palavreado na novilíngua queer é


que renunciar às relações heterossexuais evitaria a
“naturalização” deste tipo de relação, ou seja, evitaria que a
relação sexual entre um homem e uma mulher parecesse algo
natural, próprio da ordem natural das coisas e absolutamente
necessária para a preservação da espécie. Mas a teoria vai mais
longe e propõe que, não apenas as relações heterossexuais sejam
subvertidas, mas que também o próprio uso dos órgãos sexuais no
contexto do sexo seja desnaturalizado como tal.

Não o impressiona o ódio com que o texto é escrito?

E não me refiro apenas ao ódio aos heterossexuais e à família, mas


ao homem e à humanidade em geral. Há excertos que exalam
violência em doses altíssimas. Por favor, leia: «Sem nome, sem
prestígios, sem passaportes, sem famílias, experimentamos o sabor
do molotov, da nafta, a fumaça da borracha queimada cortando a
ponte e abrindo o caminho como quem experimenta um maracujá,
uma manga, ou o fisting [prática sexual de introduzir o punho no
ânus]» (Ob. Cit., p. 27); «O mundo pertence aos héteros que se
gabam de suas liberdades em nossos rostos. Porque eles têm que
vir para nossos aniversários, nossas festas, nossos rituais, nossas
marchas, nossas cerimónias? Nós não queremos tolerá-los, nem
desejamos sua asquerosa dádiva gay-friendly chamada ‘apoio’,
‘integração’, ‘respeito’, ‘diversidade’… Não queremos suas leis anti-
discriminação. Nós não queremos. O mundo pertence aos héteros
e estamos em guerra contra o seu regime. […] Isto é apologia à
violência, vamos lutar, vamos lutar contra o inimigo com nossa
violência […] O mundo pertence aos héteros e não o cederão
voluntariamente. Teremos que tomá-lo à força. Havemos de forçar
o cu para que o abram.» (Ob. Cit., p. 67); «Um exército de punhos
não pode ser derrotado, meta no cu tudo o que couber. E mais,
jogaremos em seus rostos de heterossexuais consternados: merda
e peidos, chuvas douradas e squirt [urina feminina]. Um riso negro
que soa diabólico e alegre brota de nossa entranhas promíscuas.
[…] Não nos identificamos com vocês, heterossexuais, não
gostamos, desprezamos, vocês são o desprezível desperdício do
capitalismo que impulsionam.» (Ob. Cit., p. 68); «Com grande
alegria nós dizemos: não vamos ter filhxs, adoramos a solidão,
celebramos, apoiamos e insistimos na destruição de toda a relação,
da monogamia, dos laços sentimentais, dos hétero-compromissos,
das paixões, do amor romântico ou dos relacionamentos
escondidos sob a merda do amor livre. Todos estabelecem
territórios e hierarquias de opressão.». (Ob. Cit., p. 72)

Peço perdão pela linguagem, mas se eu tive que ler isto, para
desconstruir uma narrativa política hedionda, o leitor também tem
que ler para não ser enganado.

E não, não é só a filósofa queer, Leonor Silvestri e os autores


de Manada de lobbxs que incitam a violência contra os
heterossexuais e contra todos aqueles que não pensam como eles.
A filósofa queer Beatriz Preciado também partilha deste tipo de
ideia – sobre como destruir a sexualidade – e convoca à prática da
“contra-sexualidade”. Segundo ela: «A contra-sexualidade afirma
que o desejo, a excitação e o orgasmo não são mais que produtos
retrospetivos de uma certa tecnologia sexual que identifica os
órgãos reprodutores como órgãos sexuais, em detrimento de uma
sexualização de todo o corpo. […] O sexo é uma tecnologia de
dominação hétero-social que reduz o corpo às zonas erógenas de
acordo com uma distribuição assimétrica de poder entre os sexos
(feminino/masculino), fazendo coincidir certos afetos com
determinados órgãos, certas sensações com certas reações
anatómicas.» (Preciado, Beatriz. Manifesto contra-sexual. Prácticas
subversivas de identidade sexual. Madrid, Opera Prima, 2002, p. 19)

Então, Preciado oferece-nos um exemplo prático de como resistir


ao sistema hétero-capitalista: «a prática de fisting[prática sexual de
introduzir o punho no ânus], que teve um desenvolvimento
sistemático no seio da comunidade gay e lésbica dos anos 70, deve
ser considerada como um exemplo de alta tecnologia contra-
sexual. Os trabalhadores do ânus são os proletários de uma
possível revolução contra-sexual». (Manifesto contra-sexual, Cit., p.
26)

Tão marxista, não é?

Soa-lhe como uma piada? E se eu lhe disser que a


ativista queerfornece um manual de práticas “dildo-tectónicas”, a
implementar com a ajuda de um “dildo” (vibrador) e que
contribuiriam para sexualizar outras partes do corpo na luta
contra a “hegemonia do pénis e da vagina”, estabelecida pelo
“hétero-capitalismo”? Se está interessado em confirmar, leia as
páginas 46-47 do Manifesto contra-sexual.

Muito mais haveria a dizer sobre a teoria queer, mas o texto já vai
longo e creio que ficou demonstrado que o meu comentário, ao
artigo do Observador, até foi muito simpático, pois apresentava
apenas uma perspectiva crítica daquela realidade que era
apresentada, e não havia nada que justificasse a censura. Penso
que a conclusão inevitável, depois de ler este artigo, é a de que a
teoria queer gera nos seus fiéis um coquetel explosivo de ódio,
violência e frustração individual, pois a luta interminável contra a
natureza, que o movimento queer promove, está perdida desde
antes de se ter iniciado.

Não se deixe enganar. O movimento queer é político e é de


esquerda, mais propriamente da nova esquerda. A dívida da
ideologia queer para com a esquerda fica clara nestas palavras:
«Os movimentos da Nova Esquerda com suas declarações
empurram-nos para o facto de que a luta está em muitas frentes
mais do que na simples luta de classes». (Anónimo. Espacios
peligrosos. Resistencia violenta, utodefensa y lucha
insurreccionalista en contra del género. Distribuidora Coños como
Llamas, 2013, p. 5)
A questão de fundo não tem que ver com as escolhas voluntárias
de cada um, mas sim com a intenção clara de transformar, até
mesmo por meio da violência, o sistema moral, económico e
político que permite que todos tenhamos, por exemplo, direito a
expressar a nossa opinião livremente. Não me importa os delírios
de outras pessoas, desde que não afectem os meus direitos
individuais e não me imponham a lei da mordaça.

https://observador.pt/opiniao/queer-e-a-destruicao-de-tudo-o-que-e-natural-e-
normal/

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