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Português 11ºano - Exame

Padre António Vieira - Sermão de Santo António aos Peixes


O Sermão de Santo António aos Peixes foi proferido na cidade de São Luís do Maranhão em 1654, na
sequência de uma disputa com os colonos portugueses no Brasil.
Objetivos da eloquência:
- Docere (educar / ensinar) – função pedagógica, muitas vezes conseguida através de citações bíblicas e de
autores da Igreja ou de obras clássicas; Objetivo: Prática dos ensinamentos de Cristo.
- Delectare (agradar) – função estética, concretizada através de um discurso rico em jogos de recursos
expressivos; Objetivo: deslumbrar os ouvintes.
- Movere (persuadir / influenciar) – função crítica e moralizadora, baseada numa argumentação bem
construída, recorrendo a argumentos de autoridade; Objetivos: Persuadir os ouvintes.
● Captar a atenção dos ouvintes e a sua disponibilidade para ouvir, fazê-los conscientes do que têm de
bom, para o preservar, e do que têm de mau, para o corrigir ou emendar.

Estrutura externa do sermão:


● Exórdio (introdução) – capítulo I: Momento em que o orador expõe o tema a desenvolver e o assunto ou
ideias a defender no sermão, baseado num conceito predicável extraído normalmente da Sagrada
Escritura. Termina com uma invocação/oração à virgem. Na invocação, pede o auxílio divino para a
exposição de ideias. O orador pretende alcançar a benevolência, a simpatia e a atenção dos ouvintes.
● Exposição e confirmação - capítulo II a V: Contextualização do assunto do sermão. Momento de
comprovação ou demonstração das afirmações do orador. O desenvolvimento do seu pensamento faz-se
por meio de argumentos de autoridade e argumentos baseados em exemplos.
● Peroração - capítulo IV: Última parte do discurso que se destina a recapitular a essência do que se disse e
conquistar definitivamente o auditório. O discurso deve ter um desfecho forte e vibrante, capaz de
impressionar o auditório e levá-lo a pôr em prática os seus ensinamentos. Esta é a parte que a memória
dos ouvintes melhor retém.
- Conceito predicável ~ citação bíblica que serve de mote ao sermão, dá-nos o tema do sermão.

Estrutura interna (visão global):


Capítulo I (exórdio)
Inicia-se com o conceito predicável – “Vós sois o sal da terra” - a partir desta metáfora desenvolve-se o
sermão. O texto estrutura-se em torno da importância da palavra dos pregadores – o “sal” – na preservação da
moralidade e integridade dos homens – a “terra”. Tal como o sal impede a corrupção da matéria, também os
pregadores devem impedir a corrupção das almas, porém, tal não se verifica. Padre António Vieira elogia
aqueles que espalham a doutrina divina –os pregadores que ensinam e, ao mesmo tempo, fazem o que devem
– e acusa aqueles outros que não cumprem a sua função – os pregadores que pregam ao contrário,
merecedores de desprezo. Levanta também a hipótese de a culpa poder estar do lado dos ouvintes, porque
preferem imitar os atos dos pregadores ou porque se deixam levar pelos seus desejos.

Capítulo II (exposição e confirmação)


O orador afirma que nunca teve pior auditório do que os peixes, porque são “gente (...) que se não há de
converter”, embora apresentam boas qualidades. Refere, novamente, as propriedades do “sal”, sublinha que as
pregações de Santo António devem servir de exemplo a todos os pregadores.
Vieira refere ainda as palavras de S. Basílio, que sublinham que os peixes não só são dignos de
repreensão, mas também de louvor e de exemplo a seguir, e o exemplo de Cristo, que comparou a sua igreja a
uma rede de pesca, sustentam a argumentação do orador e ajudam a definir a estrutura do sermão. Ao
apresentar as qualidades dos peixes, o pregador enumera, implícita e explicitamente, os defeitos dos homens:
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❖ o deslumbramento face à adulação; a altivez e a presunção; a violência e a obstinação; a crueldade
irracional; o exibicionismo e a vaidade.
O capítulo termina com um novo apelo aos peixes para que sigam o exemplo de Santo António, que tudo
deixou, a sua cidade e o seu país, alterando a sua própria identidade e o seu saber.

Capítulo III (exposição e confirmação)


Neste capítulo apresentam-se os louvores de alguns peixes em particular. O primeiro é o peixe de
Tobias, cujo fel serviria para curar a cegueira, enquanto o coração seria usado para expulsar os demónios.
Deste modo, critica-se a heresia e a ausência de conversão por parte dos homens. Vieira retorna à figura do
santo, referindo que as suas palavras tinham o mesmo poder que as vísceras do peixe, uma vez que, se os
homens lhe abrissem os seus corações, António tirar-lhes-ia as cegueiras e livrá-los-ia dos demónios. Em
seguida, o da rémora, um peixe que, quando se cola ao leme das naus da Índia, consegue, apesar do seu
diminuto tamanho, mudar-lhes o rumo. Critica-se a fraqueza humana e a ausência de força de vontade.
Também as palavras de Santo António foram uma rémora na terra, porque conseguiram “domar a fúria
das paixões humanas”. Vieira continua o seu discurso alegórico, apresentando exemplos que confirmam
a afirmação anterior. O exemplo seguinte é o do torpedo, peixe que produz descargas elétricas, que fazem
tremer o braço do pescador que o tenta capturar, impedindo a pesca. A descarga elétrica simboliza a palavra de
Deus, que deveria abalar a consciência dos homens. Critica-se, assim, a exploração do próximo, a corrupção e a
ambição desmedida. O último é o do quatro-olhos, peixe que, nadando à superfície das águas, apresenta dois
pares de olhos: um par permite-lhe defender-se das aves, enquanto o outro o protege dos peixes predadores.
Desta forma, critica-se a vaidade humana.
Finalmente, enfatiza o facto de Deus ter abençoado os peixes para que eles crescessem e se
multiplicassem, podendo, assim, ser o alimento dos pobres. O exemplo mais claro deste facto são as sardinhas
que o Criador multiplica “em número tão inumerável”, porque são “sustento dos pobres”, enquanto “Os
Solhos, e os Salmões, são muito contados porque servem à mesa dos Reis, e dos poderosos”.

Capítulo IV (exposição e confirmação)


Este capítulo estabelece a ligação entre dois momentos diferentes do sermão: o anterior, em que se
louvaram as virtudes dos peixes, e o posterior, em que se apontaram os seus defeitos. O tema deste capítulo é
o da exploração dos pobres e indefesos pelos poderosos e prepotentes, a antropofagia social1. Continua a
criticar os peixes, afirmando que não percebe como, sendo todos irmãos e vivendo no mesmo elemento, se
comem uns aos outros. Para lhes mostrar quão feio é o seu pecado, vai recorrer ao exemplo dos homens. Os
peixes são, então, convidados a olhar para a terra, não para os matos, mas para a cidade. Desse modo,
poderão constatar nos homens os seus próprios defeitos, nomeadamente o modo como se comem, ou seja o
modo como se exploram uns aos outros. Tenta, então, convencer os peixes a não se comerem uns aos outros.
Os peixes são, ainda, acusados de outros defeitos: a ignorância e a cegueira, que os faz serem pescados e
perderem a vida, sendo "enganados por um retalho de pano” tal como os homens.

Capítulo V (exposição e confirmação)


Depois de apresentar a crítica generalizada, diz-nos os principais defeitos e vícios de alguns peixes, em
particular. A primeira a ser criticada é o grupo dos roncadores. Estes peixes, apesar de pequenos e
aparentemente vulneráveis, emitem um som forte, ao contrário do que acontece com outros peixes de maior
envergadura. Os roncadores simbolizam aqueles que se auto promovem, exibindo a sua vaidade e poder,
sendo, por isso, arrogantes. Outra das espécies são os pegadores. Estes peixes pequenos agarram-se ao dorso
dos peixes maiores, que não conseguem livrar-se deles, vivendo como parasitas às custas dos seus hospedeiros.
Simbolizam o parasitismo, a vivência à custa dos outros.

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“comer uns ao outros”
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Os voadores, foram criados por Deus para serem peixes, mas como têm barbatanas maiores do que os
outros peixes, queriam imitar as aves. Esta ambição de os voadores se quererem transformar naquilo que
verdadeiramente não são, só lhes traz sofrimento porque estão sujeitos aos perigos do mar e aos perigos do ar
– no mar morrem enganados pelo isco e no ar morrem porque as velas, as cordas e os laços dos barcos se
transformam em redes, apanhando-os. Por isso, simbolizam a presunção, a vaidade e a ambição. A última
criatura a ser criticada é o polvo. Este peixe, na verdade, parece um monge e uma estrela, simula brandura e
mansidão, contudo, debaixo desta aparência é “o maior traidor do mar”. Simboliza a traição. Com a sua
capacidade de dissimulação, o polvo engana os outros peixes com malícia e mentira, caçando-os mais
facilmente. A tradição é de tal forma repugnante que Vieira afirma que o polvo é pior que Judas, porque o
apóstolo planeja a entrega de Cristo às escuras mas executou a traição às claras, enquanto o polvo,
escurecendo a água com a sua tinta, rouba a luz à sua presa para a apanhar.

Capítulo VI (peroração)
O Padre António Vieira reaviva a memória dos ouvintes sobre as virtudes e as repreensões com vista à
última tentativa de convencer o seu público e de o influenciar na adoção de um novo estilo de vida, de uma vida
mais voltada para o Céu e menos presa à terra. Vieira refere o facto de os peixes nunca serem animais
escolhidos para os sacrifícios rituais, porque, como não vivem fora da água, chegaram mortos ao altar. O
orador afirma que, tal como os peixes, há muitos homens que chegam ao altar “mortos”, ou seja, em pecado
mortal. Refere a sorte que os peixes têm, pois embora irracionais, não ofendem a Deus nem com as
palavras, nem com a memória, nem com o entendimento, nem com a vontade; apenas desempenham a missão
para que Deus os criou, enquanto ele foi criado para servir Deus, missão que não realiza na sua plenitude, pois
não consegue converter os homens. O último parágrafo constitui uma exortação aos peixes para que louvem a
Deus, porque Ele os fez numerosos, belos e diversos, porque lhes deu a água para nela viverem e se
multiplicarem e porque escolheu os pescadores (os apóstolos) para com Ele privaram. O sermão termina de
modo provocatório, pois como a pregação foi destinada aos peixes e estes, pela sua condição, não são capazes
“de Glória nem de Graça”, o sermão também “não acaba (...) em Graça e Glória”, ou seja, não atinge o seu
objetivo. O pregador remete então para Deus a bênção final.

Intenção persuasiva e exemplaridade:


O Sermão de Santo António é um longo discurso argumentativo, criado com a finalidade de ser pregado. A
partir das propriedades do sal (conservar o são e preservar a corrupção) e das características da pregação de
Santo António (louvar o bem e repreender o mal), o Sermão de Vieira assume um dupla finalidade: louvar as
virtudes e repreender os vícios humanos. Começando por referir as qualidades dos peixes, o pregador retira
duas conclusões: os peixes são melhores do que os homens e, para evitar a maldade, aqueles devem manter-se
afastados dos homens. De forma semelhante, Santo António, para se aproximar de Deus, afastou-se dos
homens. Pelo contrário, os vícios, em geral, dos peixes, que se comem uns aos outros e em que os grandes
comem os pequenos, servem de pretexto para uma crítica à exploração dos poderosos sobre os mais humildes.
Além disso, os defeitos, em particular, de certos peixes estão ao serviço da denúncia dos vícios humanos.

Crítica social e alegoria:


O Sermão é uma sátira social em que o Padre António Vieira tece duras críticas à exploração e à ganância
humana, particularmente aquela que é exercida pelos colonos sobre os índios. Por outro lado, o Sermão é uma
longa alegoria, funcionando os peixes como uma metáfora dos homens. Deste modo, as virtudes dos peixes são
pretexto para denunciar os vícios humanos, da mesma forma que os defeitos dos seres marinhos são motivo
para criticar os defeitos morais e sociais dos homens. Contudo, pode-se afirmar que o Sermão aborda um
assunto intemporal na medida em que os homens procuram constantemente a ascensão social, ainda que de
forma imprópria, revelando atitudes moralmente condenáveis.
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Almeida Garrett – Frei Luís de Sousa
Tragédia no que diz respeito ao conteúdo e drama no que diz respeito à forma. Constituído por 3 atos, é
considerado um drama romântico pois a forma é em prosa e não em poesia. Não respeita a lei das unidades
(ação, espaço e tempo), pois a ação acontece em três espaços diferentes: o palácio de Manuel de Sousa
Coutinho, o palácio de D.João de Portugal e a parte baixa do mesmo, em, pelo menos, oito dias.
Além disso, na obra, celebra-se o individualismo e o sentimento. Há uma valorização dos sentimentos
em detrimento da razão Também as personagens apresentam um perfil romântico. Todavia, pode classificar-se
também como tragédia clássica, uma vez que respeita em parte a lei das três unidades e apresenta um número
de personagens restrito e de condição social elevada, pois pertencem à aristocracia. De igual modo, regista-se a
presença de peripécia (incêndio do palácio e o regresso de D.João de Portugal); a hybris (o desafio lançado às
leis da sociedade, quando D.Madalena contrai segundas núpcias sem a certeza da morte do primeiro marido); a
presença do destino, que determina a vida das personagens; o clímax, atinge-se na destruição do retrato e no
incêndio do palácio; a anagnórise (com a identificação do Romeiro com D.João de Portugal); a catástrofe, com
a morte física de Maria, e D.Madalena e Manuel de Sousa para o mundo.

Estrutura
Estrutura Externa Estrutura Interna

Apresentação dos antecedentes da ação que explicam as


circunstâncias, informações sobre as personagens e das relações
Cenas I- IV Exposição entre elas (D. Madalena, Manuel de Sousa Coutinho, Maria, Telmo).
Sebastianismo e dúvidas sobre a situação da família. Sonhos e
pressentimentos da filha e preocupação da mãe.
Ato I ⇒ Palácio
de
D. Manuel Informação sobre as intenções dos governadores, que decidem sair
Cenas V - VI
de Lisboa e instalar-se em casa de Manuel.

Manuel Luís de Sousa resiste-lhes e decide dar-lhes uma lição de


Cenas VII - X
insubmissão e incendeia o palácio.

Cenas XI - XII Manuel Luís de Sousa Coutinho incendeia o seu palácio.

Informações sobre o incêndio, reação de D. Madalena, presságios de


Cenas I - III
Maria sobre o destino dos pais, identificação de D. João de Portugal.
Ato II ⇒
Conflito
Palácio de Ida de Manuel, Maria e Telmo a Lisboa. Temores e pessários de D.
D. João de Cenas IV - VIII Madalena por já ser sexta-feira e fica apenas acompanhada apenas
Portugal por Frei Jorge.

Cenas IX - XV Chegada do Romeiro

Manuel Luís de Sousa e D. Madalena decide tomar o hábito,


Cenas I -III
recolhendo-se ao convento. O estado de Maria agrava-se.
Ato III ⇒ Parte
baixa do Dilemas de Telmo depois da vinda de D. João, que tenta remediar o
Cenas IV - IX
Palácio de D. mal feito.
João
Tomada de hábito de D. Madalena e de Manuel Luís de Sousa
Cenas X - XII Desenlace
Coutinho. Morte de Maria
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Elementos da tragédia clássica presentes em Frei Luís de Sousa

Elementos da tragédia clássica Exemplos em Frei Luís de Sousa

Hybris (desafio) - O desafio lançado pelo D. Madalena ama D. Manuel ainda durante o casamento com D. João.
protagonista após um momento de crise Este “adultério” íntimo constitui um desafio à lei divina, que consagra a
santidade do casamento

Agón (conflito) - Combate ou luta que surge D. Madalena trava uma batalha interior por temer ter sido adúltera
do desafio perante os olhos de Deus e por recear que D. João não esteja morto

Anankê (destino) - O destino, a força cega à O regresso de D. João (sob a forma de “Romeiro”) é a mão implacável
qual nem os deuses é permitido desobedecer. do destino que se abate, sem aviso, sobre D. Madalena, Manuel Luís de
É cruel, imprevisto, implacável, inexorável. Sousa Coutinho e Maria.

Peripeteia (peripécia) - Súbita mudança de O incêndio do palácio de Manuel Coutinho conduz a que a sua família
acontecimentos que altera completamente o se abrigue no palácio de D. João de Portugal , aproximando D.
rumo da ação. Madalena do passado que a atormenta

Anagnórisis (anagnórise - climax) - O reconhecimento do Romeiro como D. João de Portugal cumpre o


Aparecimento de um algo novo, o destino trágico de D. Madalena, Manuel de Sousa Coutinho e Maria.
reconhecimento de uma personagem.

Katastrophé (catástrofe) - Desenlace fatal que D. Madalena e Manuel recolhem ao convento para encobrir a vergonha
se consuma com a destruição das personagens da honra indelevelmente manchada (morte simbólica). Maria, imagem
dessa mancha, morre “de vergonha”.

O Romantismo vs. Tragédia Clássica


Existem dois estilos, o romantismo, do que são característicos os “dramas”, que se opõe ao realismo; e a
tragédia clássica, cuja principal característica se prende no facto de que alguém que não tem culpa (não fez
nada) cair uma tragédia (desgraça) de forma a que o público sinta o efeito de catarse (ver mais à frente).

Características Românticas na obra:


- Escrito em prosa;
- Dividido em três actos (I, II e III);
- Presença (e exaltação) de sentimentos fortes nas personagens;
- Exaltação do patriotismo, presente principalmente em D. Manuel e D. João;
- Personagens “anjo”, especialmente em Maria (inteligente, perfeição);
- A morte de Maria em palco;
- A religião como consolo.

Características da Tragédia Clássica na obra:


- A família condenada apesar de não ter culpa
- O erro de D. Manuel e D. Madalena em casar (sem saber se D. João estava morto), que se chama Hybris;
- A catarse no fim, ou seja, a sensação da audiência que a sua vida pessoal não é tão má assim;
- Os ambientes que mudam o estado de espírito que uma forma um tanto subtil;
- Poucos espaços e personagens;
- Os conflitos interiores de Madalena e Telmo, que se chama agón;
- O reconhecimento de D. João de Portugal no Romeiro, que se chama anagnorisis;
- O aparecimento de D. João e as suas consequências (casamento e filha ilegítimos), a que se chama
peripécia;
- O clímax, quando se reconhece o Romeiro (que também corresponde à anagnorisis);
- O sofrimento das personagens ou o pathos, muito evidente em D. Madalena;
- A catástrofe, que é a dissolução da família e a morte de Maria.
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A Linguagem na obra
A linguagem em Frei Luís de Sousa é no geral cuidada, encontramos léxico erudito, repleto de recursos
estilísticos, interjeições e actos ilocutórios expressivos. A presença de muitas reticências representa algo mau,
algo de que a personagem tem medo, com que esta está inquieta. As frases curtas conferem um tom incisivo
nas partes em que são usadas. As repetições são muito frequentes e representam ansiedade, inquietação ou
afecto, dependendo de quem as profere.

Personagens
D. Madalena de Vilhena ⇒ Presumível viúva de D. João de Portugal; casada, em segundas núpcias, com
Manuel Luís de Sousa Coutinho; Mãe de Maria, fruto do segundo casamento. Fisicamente é traçada por ser
bela. Socialmente é aristocracia nobre, ou seja concorda que o governo seria supostamente justo se fossem os
melhores e mais aptos a governar. Psicologicamente é uma personagem dominada pelo sentimento de amor.
Religiosa, mas não compreendia que o amor de Deus pudesse exigir o sacrifício do amor humano. Amava a
filha, mas o amor por Manuel Luís de Sousa era superior a isso. É emotiva e sensível, e por isso vive com um
medo, insegurança e angústia por não saber se D. João vai voltar. Receios: a volta de D. João; ter de se separar
de Manuel Luís de Sousa Coutinho; a ilegitimidade da filha e o agravamento da doença da mesma. Com o fim
trágico: forçada a separar-se de Manuel Coutinho, ingressa na vida religiosa e morre socialmente.

Manuel Luís de Sousa Coutinho ⇒ Segundo marido de D. Madalena; pai de Maria; irmão de Frei Jorge.
Fisicamente é traçado por ser belo. Socialmente é aristocracia, cavaleiro de Malta. Psicologicamente, antes do
aparecimento do Romeiro, é dominado pela racionalidade e sensatez. Sempre guiado por uma ordem de
valores aceitos universalmente: a liberdade, a moral, a honra e o nacionalismo. Depois do aparecimento do
Romeiro, torna-se mais emotivo e romântico. É corajoso. Receios: o agravamento da doença de Maria; a volta
de D. João (receio não revelado ao longo da história, suposição). Com o fim trágico: forçado a separar-se de
Madalena, ingressa na vida religiosa e morre socialmente.

Maria de Noronha ⇒ Filha de Manuel Luís de Sousa Coutinho e D. Madalena de Vilhena. Fisicamente é
traçada por ser alta, delgada e formosa. Tem 13 anos. Socialmente é aristocracia nobre. Psicologicamente é
frágil, pura, doente, mas muito inteligente. Influenciada pela intranquilidade da mãe e pelo sebastianismo de
Telmo. Cheia de fantasias incontroláveis e com uma curiosidade invencível. Maria não aparece como uma
personagem real, já que o grau de idealização e que foi concebida, já que é angelical como uma criança e
perspicaz como uma adulta. Receios: a possível separação dos seus pais e vive no pressentimento de que
qualquer coisa terrível estava iminente sobre a sua família. Com o fim trágico: sobre a vergonha da
ilegitimidade e morre fisicamente, na presença dos pais.

Telmo Pais ⇒ Escudeiro fiel de D. João, no passado; leal servidor de Madalena e sua família no presente.
Fisicamente é traçado como idoso. Socialmente é do povo, um escudeiro de famílias poderosas.
Psicologicamente é sebastianista, pelo menos até compreender o que significa para Maria. Dedicado e fiel a
ambas as famílias estabelecendo assim o elo entre elas. É o confidente de Maria e D. Madalena. Receios: o
agravamento da saúde de Maria e a desonra da mesma. Com o fim trágico: vive o dilema de escolher entre a
lealdade a D. João e o amor de Maria e assiste à destruição da família.

Frei Jorge ⇒ Irmão de Manuel Luís de Sousa Coutinho e frade. Socialmente é do clero. Psicologicamente é
caracterizado pela sua racionalidade e sensatez, é também confidente. Contribui para que os acontecimentos
trágicos sejam suavizados por uma perspectiva cristã. Receio: o despontar de uma situação funesta na família.
Com o fim trágico: assiste à destruição da família e aconselha casal a professar como meio de consolo e
redenção.
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D. João de Portugal / Romeiro ⇒ primeiro marido de Madalena, desaparecido na batalha de Alcácer Quibir.
Fisicamente é caracterizado por ter grandes barbas e ter uma aparência idosa. Socialmente é da nobreza,
pertencia ao círculo mais próximo do rei. Psicologicamente é inteligente, de grande humanidade e austeridade.
É corajoso, por ter ido com o rei. Nos dois primeiros atos é uma personagem abstrata, só existe na fantasia de
Madalena, Telmo e Maria. Aparece no 3º ato como romeiro (povo) numa forma de caracterizar os receios que
torturavam Madalena. Receios: a destruição da família de Madalena e o sofrimento da mulher que ama. Com o
fim trágico: ao regressar após 21 anos de cativeiro, encontra Madalena casada com Manuel e vê a destruição da
família de Madalena, que em vão, tenta evitar.

Ato I
No cenário elegante do palácio de D. Manuel Luís de Sousa Coutinho, em Almada. Ambiente leve e
exótico que revela o estado de espírito da família (feliz no geral). Inicia-se com D. Madalena a ler um excerto d’
Os Lusíadas, mas precisamente o excerto de Inês de Castro, em que afirma que o amor cega e condena a alma
ao sofrimento. “Naquele engano d’alma lego e cego, Que a fortuna não deixa durar muito". Estes versos
avolumam as dúvidas e temores, cheia de pressentimentos e inseguranças que há muito torturam D. Madalena,
pelo seu casamento com Manuel Coutinho e o possível aparecimento de D. João. Telmo, o escudeiro, entra em
cena e ambos discutem sobre Maria. Os medos de D. Madalena em relação ao regresso do ex-marido, que
nunca regressou da batalha, refletem-se na proteção da sua filha em relação ao Sebastianismo (se D. Sebastião
voltasse, D. João também podia), um tema na altura muito discutido. Maria é frágil, e Telmo, que já fora
escudeiro de D. João, incentiva-a a acreditar no Sebastianismo, ao que ela fortemente abraça apesar do
desaproveitamento de sua mãe. Por fim chega D. Manuel, um cavaleiro da nobreza, que informa as
personagens da necessidade de movimentação daquela casa, porque os "governantes" (na altura Portugal
estavam sob o domínio espanhol (viriam e desejavam instalar-se em sua casa. O acto acaba com D. Manuel a
incendiar a sua própria casa, como um símbolo de patriotismo, incendiando também o seu retrato (simboliza o
início da destruição da família), movendo-se a família para o palácio de D. João de Portugal (apesar dos
agouros de D. Madalena).

Ato II
No cenário de D. João de Portugal, em Almada, no salão antigo. O ambiente fechado, sem janelas, com
os quadros grandes das figuras de D. João, D. Sebastião e Camões revelam uma presença indesejada e uma
família mais abatida (algo está por vir). D. Madalena apresenta-se muito abatida (fraca), com a chegada de D.
Manuel (que teve de fugir devido à afronta dos governantes). A indicação de que estes o tinham perdoado
deixou D. Madalena fica mais descansada, mas ao saber por Frei Jorge, um frei do convento de Domínios, que
D. Manuel terá de partir para Lisboa para se apresentar, ficando de novo desassossegada.
D. Manuel parte para Lisboa na companhia de Maria e Telmo, deixando em casa D. Madalena e Frei
Jorge. Aparece um Romeiro que a princípio não se quer identificar, mas dá indícios de ser D. João de Portugal,
que voltaria exatamente 21 anos depois da batalha de Alcácer-Quibir.

Ato III
Decorre na parte baixa do palácio de D. João de Portugal. Um ambiente muito fechado, representando
a falta de saída da família que, caso o Romeiro fosse D. João, estaria perante um casamento e uma filha
ilegítimos (a morte era a única forma de divórcio). Romeiro encontra-se a sós com Telmo (que entretanto volta
com D. Manuel e Maria), este imediatamente reconhece o antigo amo e fica num dilema para decidir a quem
prestar a sua lealdade (entre Maria e D. João). Romeiro pede a Telmo que minta por ele, que diga que este é
um impostor, que salve a família (momento em que acredita que possa ainda haver salvação). Telmo vai pedir
conselhos a Frei Jorge, que lhe diz que, se tem a certeza ser D. João, a verdade não deve ser escondida. Por fim,
não tendo outra salvação, Maria morre de desgosto (de ser filha ilegítima; de tuberculose) e os pais D.
Madalena e Manuel Coutinho vão para um convento (religião como consolação), tornando-se D. Manuel,
Frei Luís de Sousa.
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Temas de Frei Luís de Sousa
Liberdade individual — é visível na revolta de D. Manuel de Sousa Coutinho contra um governo ao
serviço de Espanha, revolta que é apoiada por Maria e por Telmo, bem como no discurso final desta última
personagem, no qual a jovem se insurge contra as normas de uma sociedade que lhe impõe a separação dos
país; além disso, a própria D. Madalena afirma a sua liberdade, ao casar-se com o homem que amava
sem ter provas irrefutáveis de que o seu anterior marido tinha morrido;
Patriotismo — é evidente não apenas na crença no comportamento de D. Manuel anteriormente
referido, mas também na esperança de Telmo e de Maria no regresso de D. Sebastião, que implicaria a
libertação de Portugal do jugo estrangeiro;
Cosmovisão cristã — a religião tem um papel fundamental em Frei Luís de Sousa: é graças a ela que D.
Manuel e D. Madalena conseguem libertar-se da desonra que se abateu sobre eles com o regresso de D. João de
Portugal (o ingresso na vida monástica permitir-lhes-á expiarem o seu pecado e renascerem para uma nova
existência); A religião apresenta-se como uma salvação; existem outros exemplos que incitam a audiência a
acreditar no final trágico da história.
Importância do oculto — a valorização do inconsciente e da intuição característica do Romantismo é
visível pela referência às premonições de Telmo, de D. Madalena e de Maria (que, no caso desta última, se
associam à crença de que possui a capacidade de prever o futuro, através de elementos como os sonhos ou as
estrelas); de notar que, à medida que a tensão dramática se adensa, a visão racional do mundo defendida por
D. Manuel e por Frei Jorge é cada vez mais posta em causa — até que, no desenlace, todos os presságios de
catástrofe se cumprem;
Primazia dos sentimentos sobre a razão — além de comprovável pelo destaque conferido ao lado mais
irracional do Homem (referido no tópico anterior), a valorização das emoções é também visível na importância
conferida ao amor: é ele que leva D. Madalena a casar com o homem que amava sem ter a certeza plena de que
o seu primeiro marido estaria morto;
Amor – caracterizado como algo que cega; impossível de se sair feliz do amor; perceptível desde a
primeira cena; e ainda o amor entre Telmo e Maria e D. João, na fidelidade do escudeiro feliz.

Sebastianismo – o culto, quase religião, do mito sebastianismo, neste drama anunciado pelas bocas de
Telmo e Maria, contra a vontade de D. Madalena. O sebastianismo consiste, inicialmente, na crença de que
jovem rei, que morreu em Alcácer-Quibir, regressará não só para recuperar a independência de Portugal como
também para dar um novo impulso ao Reino a fim de conseguir que este saia do estado de ruína e marasmo
em que se encontra. Nesta vertente, trata-se de uma crença messiânica pois parte do princípio de que a
salvação da pátria e de um povo está nas mãos de uma figura (histórica ou lendária) e que ela fará renascer a
Nação a partir das cinzas e a conduzirá num caminho glorioso. Com o passar dos tempos, o sebastianismo já
não se referiu ao regresso físico de D. Sebastião mas sim à chegada de uma personagem que assumisse esta
função salvadora ou a uma ideia que desempenhasse esse papel, como sucede com o mito do Quinto Império,
de que Vieira e Fernando Pessoa trataram. Em Frei Luís de Sousa, D. João de Portugal não regressa de
Alcácer-Quibir, é feito prisioneiro e só voltará vinte e um anos depois à Pátria, com D. Madalena casada em
segundas núpcias, desencadeando assim as consequências trágicas que se conhecem. D. João alude
simbolicamente a D. Sebastião, e o seu regresso serve para especular sobre as consequências do regresso do
antigo rei. Nesta peça de Garrett, o sebastianismo é perspetivado de forma crítica e negativa. Por um lado,
porque a saudade deste velho Portugal, que Telmo protagoniza, não traz a solução para o problema da Pátria.
Por outro, porque o regresso de D. João (e da ideia de uma nação decadente) impossibilita que se opere a
mudança e o surgimento de um novo Portugal (de Madalena, Manuel e Maria) que consiga triunfar.
Português 11ºano - Exame
Camilo Castelo Branco – Amor de perdição
Simão Botelho, filho de Domingos Botelho, juiz, e de Rita Botelho. Simão causa desgostos à sua família
por se relacionar apenas com pessoas sem escrúpulos e levar uma vida boémia. Simão apaixona-se por Teresa
de Albuquerque, filha de Tadeu de Albuquerque, e muda de comportamento passando a levar uma vida mais
regrada. Os Botelho e os Albuquerque são inimigos, o que dificulta a relação de amor entre Simão e Teresa, que
passam a odiar as suas famílias, namorando às escondidas, embora as famílias desconfiem. Tadeu de
Albuquerque decide prometer em casamento a filha, Teresa, ao seu sobrinho Baltasar Coutinho. Teresa recusa
o casamento, enfrentando o pai; Tadeu, revoltado, promete deserdá-la e enviá-la para um convento. Domingos
Botelho, também desagradado com a paixão dos dois, envia Simão para Coimbra. Simão, desesperado de
saudades de Teresa, vai a Viseu visitá-la e fica em casa de João da Cruz, pai de Mariana. Teresa vai para um
convento em Viseu, aguardando a sua entrada num convento do Porto. Simão, furioso por Teresa já se
encontrar no convento, tenta raptá-la, mas, num duelo inesperado com Baltasar Coutinho, dá-lhe um tiro fatal.

Sugestão biográfica (Simão e narrador) e construção do herói romântico:


Camilo Castelo Branco, afirma ser sobrinho do herói de Amor de Perdição, Simão Botelho, cuja história de
amor infeliz leu enquanto estava preso na Cadeia da Relação, no Porto. Pelas informações da vida e da morte
do seu tio direito, Camilo conta esta história, mostrando Simão como um herói verdadeiramente romântico
que «Amou, perdeu-se e morreu amando». Pelo conhecimento da biografia de Camilo e de Simão, cedo os
leitores se apercebem da semelhança entre estes dois heróis românticos - apaixonados fervorosamente (Simão
- Teresa e Camilo - Ana Plácido), perseguidores da sua felicidade amorosa contra as adversidades, sofredores
das respetivas consequências, mas continuamente ao serviço do verdadeiro Amor-Paixão.

A obra como crónica da mudança social:


Além de uma história de amor de perdição, o romance é também um documento histórico, com marcas de uma
crónica da mudança social. Em primeiro lugar, a província como espaço privilegiado dos valores tradicionais,
onde se encontram três instituições repressivas que contrariam o amor dos jovens protagonistas: a Família, a
Igreja e a Justiça. Deste modo, a relação amorosa de Teresa de Albuquerque e de Simão Botelho é vítima da
repressão familiar, conventual e judicial. Os jovens vivem no ambiente social da província dos inícios do século
XIX, numa sociedade repressiva pautada pelos preconceitos e pelas pequenas intrigas, em que os valores
tradicionais do materialismo, do pragmatismo e do ódio entre famílias entram em confronto com o
individualismo e o idealismo dos jovens amantes. Este mundo provinciano fechado com os seus preconceitos e
em que a tradição familiar e a reputação pessoal são valores primordiais leva este par amoroso a reagir contra
as instituições repressivas. Em suma, na novela, há um conflito permanente entre o sentimento individual e os
obstáculos impostos por esta sociedade provinciana.

Características das personagens: •


- Simão Botelho: é jovem, bonito e viril. É o típico herói romântico: rebelde, intempestivo, solitário,
transformado pelo amor. É digno e honrado, corajoso e determinado, que acredita no amor eterno.
- Teresa Albuquerque: é jovem bonita, de origem aristocrática e rica. É apaixonada por Simão, muito
sensível e acredita no amor eterno. Tem personalidade forte e determinada – recusa casar com Baltasar
–, revelando a sua coragem – mantém a sua vontade, enfrentando a tirania do pai.
- Mariana: de origem popular, é jovem e bonita (mais bonita do que Teresa), desembaraçada e decidida.
Acredita no amor eterno e é apaixonada por Simão, revelando-se abnegada e sofredora – ama Simão e
acompanha-o sempre, mesmo sabendo que o jovem ama Teresa, suicidando-se quando Simão morre.
Revela-se uma personagem forte e determinada.
- João da Cruz: é uma personagem do povo, um castiço rude e violento, mas muito corajoso, grato e
bondoso. É amigo de Simão.
Português 11ºano - Exame
- Baltasar: é orgulhoso, prepotente, insensível e arrogante. Mesmo sabendo que Teresa ama Simão,
decide levar o seu desejo de a desposar avante.
- Tadeu de Albuquerque e Domingos Botelho: são orgulhosos, preconceituosos, prepotentes e inflexíveis,
revelando-se insensíveis ao amor arrebatado de Teresa e Simão, cedendo perante todas as convenções
sociais.

O amor-paixão:
A relação afetiva de Simão e de Teresa é, de facto, um amor-paixão, construído de excessos, que conduz a um
desenlace trágico de amor e morte, pois este sentimento afetivo caracteriza-se por encontrar na morte a
solução para a sua impossibilidade. Ao associar o amor à morte, destaca-se uma outra característica do
amor-paixão, a ideia de eternidade, um amor que perdura para além da morte, porque quando se ama, é para
sempre. Deste modo, o amor adquire um carácter sagrado e religioso como se ultrapassasse a mera dimensão
da vida real. Este par amoroso simboliza a pureza da entrega a um amor idealizado a que a sociedade se opõe,
empurrando os protagonistas para o sofrimento e para uma morte libertadora. Através do amor, como valor
absoluto, Teresa e Simão ascendem a um estatuto superior de heróis.

Antero de Quental – Sonetos completos


A angústia existencial:
- Esta poesia exprime as preocupações do ser humano perante a sua condição e a sua fragilidade, que
sente esperanças e sofre desalentos, que duvida perante os mistérios da criação, da morte e de Deus.
- Coexistem em Antero o apolíneo e o noturno: o primeiro exprime a luz, a Razão e o Amor; o segundo
canta a Noite, a Morte e o Pessimismo.
- Esperança e desilusão são duas forças constantes no seu pensamento e na sua vida, entre as quais tudo
oscila.
- O clima prevalecente é o de uma progressiva falência da vontade humana, arrastada por “uma espécie
de tristeza congênita" e motivada por uma lúcida consciência da imperfeição humana.

Configurações do Ideal:
- O Ideal é sempre algo Perfeito, Absoluto, Eterno, é o seu «Palácio da Ventura», o Inatingível (daí a
frustração/angústia existencial);
- As religiões não lhe chegam porque Deus, que conhece, não assume para Antero essa Perfeição, esse
Absoluto, que é o não-sentir, o não-pensar, o Bem imaterial;
- Tipos e formas de Ideal: a Beleza, o Bem, uma entidade metafísica absoluta e superior (ainda não
encontrada), o Nada supremo, a Liberdade, o Nirvana, o Amor total e absoluto (sem dor nem
materialismo), a Consciência, a Sabedoria, a Paz.

Linguagem, estilo e estrutura:


Seguindo os dois temas acima apresentados, não é de estranhar que encontremos nos seus sonetos:
● a escolha do próprio soneto como composição clássica e espaço de apresentação dos seus conceitos e
conclusões, distribuídos entre as duas quadras e os dois tercetos;
● vocabulário erudito e ao serviço da verbalização de ideias, conceitos, pensamentos e essência do sentir;
● recursos expressivos, tais como apóstrofes (para presentificar entidades reais ou ideais), metáforas
(úteis a associações filosóficas e poéticas) e ainda personificações (que ajudam à visão de entidades
abstratas como potencialmente identificáveis com seres humanos).
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Cesário Verde - Cânticos do realismo
A representação da cidade e dos tipos sociais:
Em Cesário Verde existe uma dicotomia cidade / campo. Esta oposição é um elemento estruturante da
obra poética de Cesário. Com efeito, divide-se entre a crítica da cidade e o elogio do campo. Na cidade, o sujeito
sente-se sufocado, encarcerado. O ambiente citadino é o símbolo do desenvolvimento e do progresso. O campo
simboliza a energia, a vida, a saúde, o espaço onde se recuperam as forças perdidas na confusão da cidade e,
ainda, é um espaço de inspiração.
Enquanto deambula pela cidade, o poeta é surpreendido por vários tipos sociais que despertam nele a
temática da humilhação ou a dignidade dos mais humildes. Assim, em Cesário, é possível distinguir três tipos
de humilhação: a sentimental, a estética e a social. A humilhação sentimental aparece associada à mulher,
descrita como fria e distante. A humilhação estética está presente quando está em causa a sua produção
estética. A humilhação social transparece quando descreve todos aqueles que trabalham em ocupações
humildes, revelando simpatia pelas classes oprimidas.

Deambulação e imaginação – o observador acidental:


Deambulando pela cidade, o poeta capta impressões da realidade quotidiana, tornando-se um
observador acidental. O espaço urbano transforma-se num espaço de observação do mundo e da vida. Ele
observa acidentalmente pessoas e espaços, transformando-se num repórter do quotidiano. Ao estilo realista,
transporta para a sua poesia a realidade de todos os dias, concedendo particular atenção aos lugares e às
pessoas com quem se cruza.
Sensível à vida difícil das classes mais humildes, deambula, por vezes, pelas ruas mais sombrias da
cidade, dando o seu testemunho das difíceis condições em que vivem os mais humildes. Esta forma de observar
a realidade banal e quotidiana e fazer dela matéria da sua poética contribui para tornar Cesário um poeta da
modernidade.

Perceção sensorial e transfiguração poética do real:


Na sua deambulação pela cidade, perceciona o real através dos sentidos e recriam através do mundo
interior da criação poética. Através do impressionismo, o poeta regista impressões da vida quotidiana, capta a
luz, as sensações e a brevidade do momento.
Além da perícia na observação do real, o poeta revela também a capacidade de transfigurar o que vê
através de um olhar subjetivo. Deste modo, por vezes, a realidade é observada e transformada por uma visão
surrealista, recorrendo a metáforas.

Linguagem, estilo e estrutura:


● Seleção frequente de rima cruzada e interpolada ao serviço do cruzamento de planos visíveis e
transfigurados pelo poeta-pintor;
● Estrofes: quadras, quintilhas;
● Métrica: versos decassilábicos e alexandrinos;
● Comparações, metáforas, enumerações, hipérboles, sinestesias, usos expressivos do adjetivo e do
advérbio.

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