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SAÚDE DA MULHER

Sumário
APOSTILA- SAÚDE DA MULHER ............................................................... 1
INTRODUÇÃO ............................................................................................... 3

RESGATE HISTÓRICO ................................................................................. 6

A MULHER COMO SUJEITO DA SAÚDE ...................................................... 7

POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DA MULHER


VERSUS PROMOÇÃO DA SAÚDE ......................................................... 12

BREVE HISTÓRIA DO PAISM ..................................................................... 14

O SIGNIFICADO SOCIAL DO PAISM .......................................................... 20

Evolução das Políticas de Atenção à Saúde da Mulher ................................ 28

Humanização e Qualidade: Princípios para uma Política de Atenção Integral à


Saúde da Mulher .......................................................................................... 32

Diretrizes da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher ....... 34

Objetivos Específicos e Estratégias da Política Nacional de Atenção Integral à


Saúde da Mulher .......................................................................................... 36

REFERÊNCIAS: ........................................................................................... 42

A PROMOÇÃO DA SAÚDE NO CONTEXTO DA SAÚDE DA MULHER


............................................................................................................................. .... 11
INTRODUÇÃO

Desde as primeiras décadas do século passado, anseios de uma perspectiva


ampliada da atenção à saúde da mulher vêm se esboçando no país. Tributadas à
organização e à mobilização de setores civis e governamentais, em geral, e ao
protagonismo do movimento feminista, em específico, as transformações desses
anseios em diretrizes e ações programáticas ocorreram no campo das políticas. No
conjunto dos vários textos legais que procuraram e procuram dar sustentação a essas
transformações, destaca-se a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da
Mulher, criada em 2004 e vigente até os dias atuais. Em suas diretrizes, essa política
se propõe a atingir mulheres, em todos os ciclos de vida, levando em conta as
especificidades de distintos grupos populacionais, como mulheres negras,
indígenas, urbanas, rurais, presidiárias, homossexuais e as com deficiências,
dentre outras.

Dois eixos servem de ancoragem para essas diretrizes: o primeiro se relaciona à


perspectiva de gênero, de raça e de etnia que deve nortear a política, enquanto o
segundo diz respeito à ampliação do enfoque para que se consiga avançar da saúde
sexual e da saúde reprodutiva para todos os aspectos da saúde da mulher. Ainda que
os objetivos dessa política tenham logrado êxito ao longo da sua existência, não se
pode deixar de focalizar alguns desafios, principalmente no que tange ao
enfrentamento de reduções que costumam ocorrer no âmbito de algumas práticas
que buscam viabilizar tais objetivos. Nesse sentido, observam-se dificuldades de
atender à saúde das mulheres de forma integral, por conta de abordagens biomédicas
reducionistas; não contextualização da mulher no campo das relações de gênero;
domínio quase que exclusivo da heteronormatividade; questões estruturais que
limitam o acesso à saúde; e comprometimentos na quantidade e na qualidade da
prestação dos serviços de saúde.

Em termos de políticas públicas, a atenção à saúde da mulher no Brasil, até o


surgimento do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM),
traduziu-se na preocupação com o grupo materno-infantil que, inclusive, sempre
permaneceu como o mais enfatizado por essas políticas. O enfoque central dos vários
programas de saúde materno-infantil estava em intervir sobre os corpos das
mulheres-mães, de maneira a assegurar que os corpos dos filhos fossem adequados
às necessidades da reprodução social (Canesqui, 1987; Osis, 1994). Nesse contexto,
aparentemente de forma surpreendente, surgiu, em 1983, o PAISM, sendo anunciado
como uma nova e diferenciada abordagem da saúde da mulher, baseado no conceito
de “atenção integral à saúde das mulheres” (AISM). Esse conceito implica o
rompimento com a visão tradicional acerca desse tema, sobretudo no âmbito da
medicina, que centralizava o atendimento às mulheres nas questões relativas à
reprodução (Costa, 1979; Canesqui, 1984; Osis, 1994).

Portanto, esse programa constituiu-se também na primeira vez em que o Estado


brasileiro propôs, oficial e explicitamente, e efetivamente implantou, embora de modo
parcial, um programa que inclui o planejamento familiar dentre suas ações, ou seja,
um programa que contemplava o controle da reprodução (Osis, 1994). Além disso, as
próprias circunstâncias e as características do processo pelo qual se constituiu o
PAISM fazem dele, ainda hoje – passados 13 anos desde o seu lançamento e
constatada a sua não implantação efetiva em todo o país – constante objeto de estudo
e discussão (Alvarez, 1990; Pinotti et al., 1990; Costa, 1992;
Correa, 1993; Osis, 1994). Na maior parte do século XX, as políticas nacionais de
saúde da mulher estiveram voltadas
ao ciclo gravídico-puerperal.

A partir de 1984, uma proposta de


atendimento integral ganhou corpo
no então Programa de

Assistência Integral à Saúde da


Mulher (PAISM) e, em 2004, emergiu uma proposta que prioriza a promoção da
saúde, por meio da Política Nacional de Assistência Integral à Saúde da Mulher
(PNAISM). Em análise, epistemologicamente, os pressupostos da promoção da
saúde da PNAISM. O estudo reflexivo, baseado nos princípios e diretrizes da
PNAISM e nos pressupostos da promoção da saúde apresentados nas cartas
resultantes das conferências sobre promoção da saúde. A PNAISM apresentase
de forma inovadora ao contemplar aspectos relacionados à promoção e humanização
da saúde a fim de minimizar Iniquidades existentes na saúde da mulher, atendendo
grupos até então alijados da sociedade e áreas antes pouco assistidas. Assim
no contexto segui a reflexão do significado do PAISM para a abordagem da saúde
reprodutiva no Brasil.
RESGATE HISTÓRICO

No início do século XX e até meados da década de 70, a mulher era assistida


de forma restrita, reducionista e fragmentada, com ações voltadas ao ciclo
gravídico-puerperal. As ações eram verticalizadas e centralizadoras, o que
distanciava as medidas adotadas das reais necessidades dessa população-
alvo. Nesse sentido, o movimento feminista iniciou uma série de objetivo de
incorporar às políticas de saúde da mulher outras questões como gênero,
trabalho, desigualdade, sexualidade, anticoncepção e prevenção de doenças
sexualmente transmissíveis. Na década de 70, foi então lançado o Programa
de Saúde Materno Infantil, no qual o planejamento familiar figurava sob o
enfoque da paternidade responsável, objetivando reduzir as elevadas taxas
de morbidade e de mortalidade infantil e maternidade.

Em 1983, o governo brasileiro lançou o Programa de Assistência Integral à


Saúde da Mulher (PAISM) que adotava, com dificuldade, políticas e medidas
para permitir o acesso da população aos meios de contracepção e buscava
integralizar essa assistência, incorporando medidas educativas, preventivas, de
promoção, diagnóstico, tratamento e recuperação nos âmbitos da ginecologia;

 pré-natal, parto e puerpério;


 climatério;
 planejamento familiar; doenças sexualmente transmissíveis e
câncer de mama e colo de útero.
O Movimento da Reforma Sanitária, iniciado na década de 80, influenciou a
implementação do PAISM que se caracterizou pelas propostas de
descentralização, hierarquização e regionalização dos serviços. Uma análise das
ações de atenção à saúde da Mulher realizada de 1998 a 2002 afirmou que apesar
do discurso integralizador, ainda assim, as políticas públicas voltadas a essa
área do cuidado, mantiveram a ênfase na resolução de problemas de ordem
reprodutiva. Por outro lado, pôde ser observada a incorporação de um novo
tema, a redução da violência sexual, demonstrando a Preocupação
dessas políticas em atender a mulher em seus aspectos mais gerais.

Em 2004, o Ministério da Saúde elaborou o documento da Política Nacional de


Atenção Integral à Saúde da Mulher – Princípios e Diretrizes (PNAISM). Este
reflete o compromisso com a implementação de ações em saúde da mulher,
garantindo seus direitos e reduzindo agravos por causas preveníveis e
evitáveis, enfocando, principalmente, a atenção obstétrica, o planejamento
familiar, a atenção ao abortamento inseguro e o combate à violência
doméstica e sexual.

A MULHER COMO SUJEITO DA SAÚDE

A nova visão da mulher, o entendimento de sua integralidade (deixou de ser apenas


mama, colo e gestação), assim como de sua vulnerabilidade a partir das questões de
gênero tem que ser consideradas. E é por aí, por exemplo, que estamos começando
a trabalhar a questão da violência contra a mulher. O exercício de pensar que o que
está dito é o que não é – ou seja, não são mais apenas mamas, colo e gestação – faz
com que isso continue a ser a principal referência das práticas em saúde para
mulheres. O corpo como um construto social é atravessado por múltiplos discursos,
por meio de operações de classificação, agrupamento e diferenciação, práticas de
significação que funcionam em determinados regimes de verdade e que marcam
determinadas formas de ser mulher e de ter cuidados com a saúde e com o corpo
feminino. O corpo, como marca da diferença das mulheres, está marcado como um
corpo que reproduz. Como aponta Foucault, os discursos formam os objetos de que
falam, isto é, discursos são práticas, na medida em que constituem sujeitos e corpos,
assim como formas de existência. Portanto, o discurso sobre a saúde das mulheres,
ao nomear partes do corpo como principais ou não, prescreve, a partir disso, quais
procedimentos devem ser adotados, que condutas devem ser evitadas, quem deve
ficar fora. Ele nos fala e nos faz falar e dar visibilidade sobre o que propõe como forma
integral de cuidar da saúde de uma mulher, constituindo determinados modos de
compreender, pensar e viver o que é essa saúde e essa mulher, entendida, por
exemplo, ainda biologicamente, pelas partes de seu corpo. Afinal, o que vem a ser o
mais, o “além disso”? Mamas, colo e gestação? A violência? As questões de gênero?
Cabe salientar que gênero é uma categoria de análise que poderá ter múltiplas e
diferentes possibilidades de abordagem dentro dos estudos feministas como, por
exemplo, patriarcado, marxistas, pós-estruturalistas.

Assim, a citação de gênero como forma de validação de uma posição política – incluir
a violência contra a mulher – pode nos indicar um determinado discurso acerca do
que se propõe como sujeito-mulher da saúde. Desse modo, ao se pensar o sujeito-
mulher desse discurso, ao qual se acrescenta como coisa faltante na integralidade
hoje, a saúde passa a ser também o controle da violência contra a mulher. O que vem
colado a essa questão da violência contra a mulher? A vulnerabilidade é dela? A
questão não está colocada como vulnerabilidade social. É importante salientar, como
aponta Guareschi, que as análises concernentes à vulnerabilidade social não se
constituem em um mapeamento linear da condição do sujeito ou grupo que se procura
analisar ou entender em termos de inscrição social. Trata-se de uma análise
complexa e multifacetada, polimorfa, de organização de diferentes vetores que
obstruem o acesso aos bens, serviços, incluindo os de saúde, bem como de alteração
de capital simbólico – ilustrado pela ausência de acesso à educação formal. Assim,
cabe problematizar a forma como tomando a violência, algo de um indivíduo – mulher
– ou como algo do social constituído nas relações.

Como por exemplo, o normal a partir do que está posto como anormal, como doença
ou como diferença, naturalizando um lugar que é construído, podendo, então, tomar
a mulher na nova visão: a mulher que deixa de ser aquela que lutou por direitos
reprodutivos na década de 1980, para ser a que sofre violência psicológica, física,
institucional, sexual, assédio, abuso, isto é, uma cidadã que precisa ser tutelada pelo
Estado – um risco. Não tendo como foco o aprofundamento da discussão de gênero
nas políticas públicas de saúde, embora toda escrita e problematização desse campo
de saúde da mulher estejam permeadas por essa categoria de análise, na qual tomam
por referentes os estudos feministas em uma vertente dos estudos culturais e pós-
estruturalistas – como as seguintes autoras: Jennifer Harding; Guacira Louro; e
Dagmar Meyer. Porém, salientando que neste contexto tem como foco a
integralidade. Como diz Foucault, a tecnologia do poder disciplinar tem como objeto
a sujeição do corpo do indivíduo, tornando-o dócil, manipulável, enquanto a tecnologia
do biopoder é exercida sobre um corpo, mas não um corpo individual, e sim coletivo.

Esse novo corpo político, distinto do individual, a um só tempo instituído pelo biopoder
e objeto sobre o qual este se exerce, é a população. Segundo Bernardes, as ações
em saúde direcionam-se, como políticas públicas, para as comunidades. A
comunidade, como objeto de governo, de formas de governo, vem a ser empregada
por caracterizar-se de modo mais específico que a população. Para a autora, os
tropos da população para a comunidade referem-se à heterogeneidade que os grupos
representam dentro de uma população. Quando Foucault propõe o conceito de
biopolíticas para problematizar as formas de investimento e controle da população,
trata esta última como um objeto homogêneo. A noção de comunidade vem demarcar
a heterogeneidade da população. As comunidades são os diferentes grupos que
conformam uma população.

“São vários os mecanismos de controle contemporâneo em


torno das comunidades de risco, comunidades de rap, comunidades
gays, comunidades de jogadores. Essas e outras comunidades
identificam grupos de sujeitos sob os mais diversos objetivos para a
conduta [...] contudo, essas conceituações e administrações, como
também as comunidades a elas ligadas, não existem a priori; existem,
sim, como invenções momentâneas que constantemente mudam de
configuração e sentidos” Cláudio MENDES, 2004, p. 95.
Nesse caso, as biopolíticas volta-se para o grupo que se conforma na saúde da
mulher, desenhando uma comunidade de risco. Essa produção de corpos e sujeitos
acontece mediante a noção de que a atenção tem que ser integral, incluindo-se esse
algo mais, neste caso, a violência, integrando-se novas e determinadas diferenças e
criando se, ao mesmo tempo, diferentes tecnologias de governo. O governo da
conduta pauta-se por inventar critérios do que deve ser o sujeito, ligando-o,
marcando-o e identificando-o a uma identidade, a um modelo de ser sujeito.
Entendendo assim que sujeito é o modo como um indivíduo ou um grupo posiciona-
se nessa rede discursiva do Sistema Único de Saúde – como uma comunidade de
risco –, é voltar-se para a formação de objetos, conceitos e sujeitos que se tornam
possíveis por esse discurso de saúde. Conforme Foucault, podemos entender
discurso como conjunto de enunciados de um determinado campo de saber, neste
caso, a saúde da mulher, constituído historicamente e em meio a disputas de poder.
Então, como se conforma esse campo da saúde da mulher?

Dando seguimento com a promoção da saúde da Mulher.

A PROMOÇÃO DA SAÚDE NO CONTEXTO DA SAÚDE DA


MULHER
O modelo de Promoção da Saúde surgiu na década de 70 no Canadá,
baseando-se em quatro polos:

 a biologia humana;
 o sistema de organização dos serviços;
 o ambiente social, psicológico e físico;
 e o estilo de vida, que está em amplo processo de construção.
A Conferência de Alma-Ata, realizada em 1978, estabeleceu em sua Declaração
a atenção à assistência materno-infantil como prioridade, com inclusão do
planejamento familiar, relacionado não só a aspectos procriativos, mas abrangendo
o conjunto das necessidades de uma família, tais como: saúde, educação,
moradia e lazer.

A II Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em


Adelaide em 1988, teve como tema central políticas públicas voltadas para
a saúde. Foram apresentadas quatro áreas prioritárias para promoção ações, e
o apoio à saúde da mulher foi considerado como uma destas áreas, com
destaque para a valorização da mulher trabalhadora e a igualdade de
direitos na divisão do trabalho.

No entanto, somente em 1986 foi estabelecido o conceito de Promoção da


Saúde, durante a Conferência de Ottawa, como sendo o processo de
capacitação da comunidade para atuar na melhoria da qualidade de vida e
saúde, incluindo uma maior participação no controle desse processo.

A Conferência de Sundsvall (1991) que teve como tema central a criação de


Ambientes Saudáveis à Saúde, reconheceu a mulher como peça importante para a
sua construção ao considerar o crescimento populacional uma ameaça ao
desenvolvimento sustentável, tendo em vista a superpovoação de ambientes
insalubres e o aumento da pobreza, o que incrementou a discussão sobre políticas
de saúde da mulher e sobre o planejamento familiar.

Com o objetivo de adaptar os princípios, estratégias e compromissos


relacionados ao sucesso da saúde da população à realidade dos países latinos,
aconteceu a Declaração de Bogotá (1992). Partindo dos pressupostos já
estabelecidos pelas conferências anteriores, este evento estabeleceu como
compromisso para a promoção da saúde, a eliminação dos efeitos
diferenciais da iniquidade sobre a mulher, considerando-a como um elo
indispensável na promoção da saúde na América Latina.

Nota-se que as políticas de incentivo e apoio à Saúde da mulher


representou temáticas importantes em várias das Conferências de Saúde,
apesar da valorização da fase reprodutiva observada nas primeiras discussões.
Essa retrospectiva traz à tona o olhar reducionista do conceito de saúde
baseado no modelo biomédico, como ausência de enfermidades, e o conceito de
doença como uma fatalidade.

Assim, o advento da Promoção da Saúde propõe o surgimento de um novo


paradigma que objetiva romper com a visão fatalista da doença, arraigada
culturalmente, e aprofundar o conceito de saúde sob uma nova Ótica. Esse
novo paradigma rompe a visão curativa e centralizadora do modelo biomédico
até então vigente, o que por atuar com enfoque individualista, curativo e
baseado na doença é de alto custo e baixo impacto. O novo paradigma proposto
baseia-se na promoção da saúde e não na cura de doenças, tem caráter
coletivo, de autonomia e co-responsabilidade dos sujeitos, e atua por meio de
parcerias com educação, ação social e trabalho.

POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DA


MULHER VERSUS PROMOÇÃO DA SAÚDE
Tendo em vista a necessidade de mudanças no cenário nacional Saúde da
mulher, que englobe os pressupostos da promoção da saúde, foi formulada a
PNAISM para nortear as ações de atenção à saúde da mulher de 2004 a 2007.

Os princípios e diretrizes dessa nova proposta foram discutidos em parceria com


diversos segmentos da sociedade, em especial com o movimento de mulheres,
o movimento negro e o de trabalhadores rurais, sociedades científicas,
pesquisadores e estudiosos da área, organizações não-governamentais, gestores do SUS
e agências de cooperação internacional.

Esta foi uma iniciativa importante do Governo e que se baseia nos princípios da promoção,
respeitando a autonomia dos sujeitos em questão e tornando-os coautores de um
processo decisório relevante para a categoria. Também demonstra a preocupação
em adotar políticas consoantes às necessidades das mulheres brasileiras e, assim,
reduzir os índices de morbidade e de mortalidade por causas preveníveis e evitáveis,
o que não aconteceu na gênese das políticas anteriores. Portanto, este documento
consolida avanços no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, com ênfase na
melhoria da atenção obstétrica, no planejamento familiar, na atenção ao abortamento
inseguro e no combate à violência doméstica e sexual. Propõem-se também a
contemplar áreas como: prevenção e tratamento de mulheres vivendo com HIV/aids
e as portadoras de doenças crônicas não transmissíveis e de câncer ginecológico. Esta
nova política foi formulada tendo por base a avaliação das políticas anteriores e, a partir de
então, buscou preencher as lacunas deixadas, como:

climatério/menopausa; queixas ginecológicas; infertilidade e reprodução


assistida; saúde da mulher na adolescência; doenças crônico-degenerativas;
saúde ocupacional; saúde mental; doenças infecto-contagiosas, bem como,
a atenção às mulheres rurais,

com deficiência, negras, indígenas, presidiárias e lésbicas.

Embora tenham sido observados avanços em relação à implementação dessas


políticas, percebe-se ainda a exclusão de certos segmentos da sociedade, tendo
em vista, que grupos como o das prostitutas, que representa uma população
extremamente vulnerável a vários agravos, como: doenças sexualmente
transmissíveis, violência sexual e a própria marginalização da sociedade, continuam
alijados das propostas de atenção à saúde. A PNAISM reforça a humanização da atenção
em saúde, concebendo que humanização e qualidade da atenção são aspectos
indissociáveis. Nesse sentido, é imprescindível considerar que humanizar é muito mais
do que tratar bem, com delicadeza ou de forma amigável, devendo ser consideradas
questões de acessibilidade ao serviço nos três níveis da assistência, provisão
de insumos e tecnologias necessárias, formalização de sistemas de referência e contra-
referência, disponibilidade de informações e orientação da clientela e a sua
participação na avaliação dos serviços. A mulher, a partir de então, é vista em sua
integralidade, como sujeito autônomo e participativo no processo de decisão para a
formulação de políticas públicas, tendo em vista que à medida que a mulher é incluída
nesse processo, há garantia do atendimento de suas reais necessidades aumentando
a qualidade da assistência.

BREVE HISTÓRIA DO PAISM


Em 21 de junho de 1983, por ocasião de seu depoimento na Comissão Parlamentar
de Inquérito (CPI) do Senado que investigava o crescimento populacional, o então
Ministro da Saúde Waldyr Arcoverde apresentou a proposta de criação do PAISM
(Osis, 1994). A proposta levada pelo ministro à CPI fora preparada por uma comissão
especialmente convocada pelo Ministério da Saúde (MS) para a redação do
Programa, em abril de 1983, e constituída por três médicos e uma socióloga: Ana
Maria Costa, da equipe do MS e fortemente identificada com o movimento de
mulheres; Maria da Graça Ohana, socióloga da Divisão Nacional de Saúde
MaternoInfantil (DINSAMI); Anibal Faúndes e Osvaldo Grassioto, ginecologistas e
professores do Departamento de Tocoginecologia da Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP), indicados pelo Dr. José Aristodemo Pinotti, chefe daquele
departamento (Sobrinho, 1993).

É interessante assinalar que a composição desse grupo já parecia indicar o percurso


político do programa a ser elaborado. Ao incluir duas mulheres preparavase a
aproximação com o movimento organizado de mulheres.

A formação delas também se relacionava à intenção do governo vencer possíveis


oposições ao programa: uma socióloga, portanto alguém não médico, e uma médica
sanitarista vinculada ao próprio movimento de mulheres, o que lhe conferia uma
posição diferenciada em relação ao chamado poder médico que tradicionalmente era
visto como opressor. Concomitantemente, os médicos Grassiotto e Faúndes
pertenciam ao grupo da UNICAMP, com ampla prática assistencial e discussão
acadêmica em aspectos da área hoje denominada de saúde reprodutiva.

Ressaltando que, desde o início dos anos 70, esse grupo vinha debatendo as
condições necessárias para se dar às mulheres um atendimento integral, testando
diferentes modelos de assistência em que o corpo feminino fosse tratado como um
todo e não mais como uma série de órgãos isolados, da competência de diferentes
especialistas (Pinotti et al., 1987; Osis, 1994).

O trabalho dessa equipe consistiu em definir normas programáticas, especificando


quais seriam as bases doutrinárias do programa que se estava propondo, e normas
técnicas, descrevendo e especificando os diversos procedimentos médicos que
seriam adotados.

A sua missão incluía a necessidade de apresentar um programa que se justificasse


também filosoficamente perante a sociedade em geral, atendendo os anseios que
estavam se evidenciando, e que fosse considerado tecnicamente correto,
dispensando grandes reformulações.
Tudo indicava que o ministério desejava que o programa causasse um impacto
positivo e pudesse ter sua implantação iniciada imediatamente e de forma satisfatória
(Osis, 1994).

O Ministério da Saúde divulgou oficialmente o PAISM em 1984, através do


documento preparado pela referida comissão: “Assistência Integral à Saúde da
Mulher: bases de ação programática”.

Para estabelecer sua proposta, o ministério partia da constatação de que o cuidado


da saúde da mulher pelo sistema de saúde, até então, limitava-se ao ciclo
gravídicopuerperal, e mesmo aí, era deficiente.

Considerava-se esse quadro agravado face à “...crescente presença da mulher na


força de trabalho, além do seu papel fundamental no núcleo familiar” (MS,
1984:5).

O texto em questão salientava que o governo estava procurando agilizar a atenção


à saúde da população em geral, atuando em duas frentes: expandir e consolidar a
rede de serviços básicos de prestação de ações integrais de saúde (AIS); enfatizar
atividades-chaves, identificadas por critérios epidemiológicos, pelo seu impacto e
transcendência.

Entre essas atividades estavam àquelas voltadas para o grupo materno-infantil:


“...O conceito de assistência integral, aqui preconizado, envolve a oferta de ações
globalmente dirigidas ao atendimento de todas as necessidades de saúde do grupo
em questão, onde todo e qualquer contato que a mulher venha a ter com os serviços
de saúde seja utilizado em benefício da promoção, proteção e recuperação de sua
saúde” (MS, 1984:15).

As diretrizes gerais do Programa previam a capacitação do sistema de saúde para


atender as necessidades da população feminina, enfatizando as ações dirigidas ao
controle das patologias mais prevalentes nesse grupo; estabeleciam também a
exigência de uma nova postura de trabalho da equipe de saúde em face do conceito
de integralidade do atendimento; pressupunham uma prática educativa permeando
todas as atividades a serem desenvolvidas, de forma que a clientela pudesse
apropriar-se “...dos conhecimentos necessários a um maior controle sobre sua saúde”
(MS, 1984:16).
Ainda a título de diretrizes gerais, o documento em questão dedicava dois ítens ao
planejamento familiar. Primeiramente, situavam-se as atividades voltadas à regulação
da fecundidade como complementares no elenco de ações de saúde materno-infantil,
esclarecendo que as motivações do Ministério da Saúde para agir nessa área
baseavam-se “... nos princípios de equidade – oportunidade de acesso às
informações e aos meios para a regulação da fertilidade por parte da população

– e de ordem médica, traduzidos no risco gravídico” (MS, 1984: 16).


Enfatizava-se também que as atividades de planejamento familiar estavam
desvinculadas “... de qualquer caráter coercitivo para as famílias que venham a utilizá-
las” (MS, 1984:16).

Finalmente, ainda em relação ao planejamento


familiar, salientava-se a necessidade de não se
vincular a adoção dessas atividades à solução
dos problemas sociais e econômicos do país “...
e nem ter ignorada a sua inegável interface com
o setor saúde” (MS, 1984:15).

Enfim, PAISM, a postura do PAISM nessa


área seria uma ressonância daquela colocada pelo Brasil na Conferência Mundial
de População de Bucareste, em 1974. Ou seja, ao Estado caberia proporcionar
meios e informações para que todos os brasileiros pudessem planejar suas famílias
(Osis, 1994).

Nesse contexto, a atenção à mulher deveria ser integral, clínico-ginecológica e


educativa, voltada ao aperfeiçoamento do controle pré-natal, do parto e puerpério; à
abordagem dos problemas presentes desde a adolescência até a terceira idade; ao
controle das doenças transmitidas sexualmente, do câncer cérvico-uterino e mamário
e à assistência para concepção e contracepção.
O documento do Ministério incluía também uma breve descrição dos diversos
procedimentos a serem aplicados na AISM e esboçava as estratégias para a
implantação do Programa. A ideia geral era viabilizar a rede básica de serviços pela
integração, regionalização e
hierarquização dos serviços de saúde. Além disso, estabelecia-se que todas as
atividades previstas no PAISM deveriam ser adotadas em conjunto.

Entretanto, uma vez que algumas ações – como as relativas ao pré-natal – já se


achavam incorporadas ao atendimento da rede de saúde, o início da implementação
poderia se dar pelo investimento na melhoria dessas ações.

Frisava-se, entretanto, que as atividades de concepção e contracepção nunca


poderiam ser implementadas isoladamente, tampouco seriam aceitas em serviços em
que os outros objetivos programáticos do PAISM não estivessem em
desenvolvimento. A implantação do novo programa deveria ser iniciada por uma
reciclagem completa tanto do pessoal envolvido diretamente na prestação dos
serviços quanto do pessoal encarregado da supervisão e coordenação programática.
Para realizar essa reciclagem de forma continuada, propunha-se a criação de centros
de referência regionais.

Paralelamente, o ministério considerava importante identificar e apoiar os centros que


faziam pesquisas operacionais e estudos epidemiológicos na área de saúde da
mulher para tê-los na condição de fornecedores de subsídios técnico-científicos para
facilitar a implantação do PAISM.

Previa também um trabalho de adequação e implantação das normas técnicas do


ministério e do material instrucional que deveria ser fornecido às secretarias de saúde
estaduais e municipais.

Finalmente, salientava-se que as equipes envolvidas no Programa também deveriam


ser preparadas para fazer o acompanhamento, controle e avaliação do desempenho
do mesmo.
O SIGNIFICADO SOCIAL DO PAISM

O momento em que o PAISM foi lançado era de grande efervescência no Brasil, com
intensa atuação de movimentos sociais e da sociedade civil, em geral, lutando pelo
restabelecimento da democracia (Alvarez, 1990; Cardoso, 1984; Jacobi, 1989).

Em decorrência disso, e considerando o conteúdo e os antecedentes do Programa, é


possível observar que ele reuniu condições para se constituir em um evento
socialmente relevante, um fato capaz de mobilizar muitos setores da sociedade para
discuti-lo, aprovando-o ou não.

As reações contrárias ou suspeitosas com relação ao lançamento do Programa


estiveram pulverizadas em diferentes setores da sociedade, como alguns grupos de
mulheres, algumas facções dentro de partidos políticos, membros do setor acadêmico
em geral e da categoria médica, especialmente profissional ligada à Sociedade Civil
Bem-Estar Familiar no Brasil (BEMFAM).

De modo geral, essas reações estavam vinculadas a uma possível contradição entre
o conteúdo explícito do Programa (integralidade e universalidade em que
supostamente se embasaria) e as suspeitas de que o PAISM, na verdade, não
passaria de um disfarce do Governo para agir no sentido de controlar a natalidade da
população (Osis, 1994).

Os que questionavam a integralidade e universalidade do programa destacavam a


contradição entre a denominação “integral” e os objetivos explicitados no conteúdo,
que estariam concentrados nos problemas de saúde decorrentes da atividade sexual
e reprodutiva da mulher.

Mesmo aqueles que não centravam suas críticas nesse aspecto, consideravam que
o “integral” estava mal aplicado, porque o Programa persistia na visão, amplamente
já difundida na sociedade, de que a mulher se define pela sua capacidade de
reprodução.

A exclusão do homem do Programa


apresentado pelo Ministério da Saúde
implicaria a noção de que só a mulher era
responsável pela reprodução, e que se o PAISM se pretendia integral e universal
deveria ser, na verdade, de atenção à saúde do adulto (Canesqui, 1984).

Esse argumento também era utilizado pelos setores que associavam o PAISM a
intenções controlistas, porém com uma interpretação mais abrangente.
Argumentavam que, à primeira vista, o PAISM parecia não estar voltado para a
redução da natalidade, porque estaria preocupado em atender às necessidades
integrais de saúde das mulheres.

Entretanto, na verdade, o que se pretendia era atender as mulheres que tivessem


atividade sexual e risco de engravidar, justamente para controlar sua fecundidade
(Folha de São Paulo, 1983a,b; Cebes-Bahia, 1984; Borges, 1986; Folha da Tarde,
1986).

Para esses críticos, as intenções controlistas ficavam claras nos próprios objetivos
declarados do Programa, voltados apenas para situações relacionadas à atividade
sexual, gravidez, parto, puerpério e contracepção. Para eles, a exclusão do homem
não comprometia apenas a integralidade e univesalidade do Programa, mas indicava
fortemente a intenção controlista oculta. Isto porque o homem só estaria sendo
lembrado quando se falava da vasectomia, e apenas quando a mulher estivesse
impedida de usar outras formas de anticoncepção. Consideravam que, na verdade, o
PAISM partia do pressuposto, já tradicional, de que a mulher era a grande
responsável por regular o processo reprodutivo, de maneira que cabia atuar sobre ela
massiva e intensamente a fim de alcançar um controle demográfico. Em suma,
consideravam que o governo, hesitante em assumir publicamente seu desejo de
controlar a natalidade, estaria usando o Programa proposto para justificarse. Entre as
reações mais favoráveis ao PAISM esteve a dos grupos organizados de mulheres em
geral, que, logo de início, passaram a lutar pela implantação do Programa,
considerando uma resposta satisfatória, naquele momento, às suas crescentes e
expressivas demandas por uma atenção à saúde das mulheres não centralizada no
cuidado materno-infantil, especialmente desvinculada do controle da reprodução
(Barroso, 1984a,b; Costa, 1992; Correa, 1993).

Essa reação pode ser constatada, por exemplo, através de documentos produzidos
em reuniões promovidas pelo movimento de mulheres como a Carta de Itapecirica,
produzida a partir de um encontro de mulheres acontecido em outubro de 1984
(Labra, 1989).

A partir do diagnóstico de que as condições de saúde da mulher no Brasil eram


precárias, reivindicava-se um programa integral, que atendesse às mulheres desde a
infância até a velhice, incluindo a saúde mental e as doenças causadas pelo trabalho
dentro e fora de casa. Esse programa deveria ter a preocupação de integrar
prevenção e cura.

Nesse sentido, entre os encaminhamentos propostos pelo grupo reunido, enfatizouse


que fosse incentivado o controle popular na implantação do PAISM (Barroso, 1984a).
Outra fonte que permite vislumbrar como o PAISM foi recebido pelos movimentos de
mulheres são artigos de opinião publicados na imprensa (Barroso, 1984a,b; 1985;
1986; Cardoso, 1984).

Nesses artigos enfatizavam-se aspectos políticos em relação à viabilização e


implantação efetiva do Programa. Parecia haver consenso de que se tratava de uma
proposta inovadora, abrangente, voltada a assistir às precárias condições de saúde
das mulheres no Brasil, independente de estarem ou não no ciclo reprodutivo. O
problema sempre levantado era o de como implementar o plano, como ativar a
vontade política do governo, de forma que houvesse recursos humanos e materiais
adequados para a implementação do PAISM (Osis, 1994). Também era comum a
esses artigos situar a discussão sobre o plano apresentado pelo último governo
ditatorial em termos das lutas que se travavam naquele momento, em busca de um
projeto democrático duradouro para toda a sociedade brasileira.

Apesar do consenso sobre a qualidade do PAISM, esses artigos também remetiam


à discussão acerca da necessidade de contextualizá-lo no embate mais amplo, que
se dava no sentido de conquistar e assegurar a democracia (Osis, 1994).

Quanto às relações do PAISM com a discussão sobre planejamento familiar/controle


da natalidade, os artigos em questão não revelavam uma preocupação expressiva
com elas. Parece claro para as articulistas, em especial para Carmen Barroso
(1984a), que a inclusão das atividades de anticoncepção atendia a um anseio das
próprias mulheres brasileiras, e não tinha sido recebida por elas com desconfiança.
Não se ignorava, porém, a possibilidade de existirem intenções ocultas na adoção do
PAISM, mas Barroso considerava isso superável diante do conteúdo e da filosofia do
Programa.

A seu ver, ele não representava perigo de coerção, uma vez que as atividades de
anticoncepção nele previstas estavam condicionadas à sua inserção no conjunto mais
amplo das ações voltadas à atenção integral à saúde da mulher. Os argumentos
colocados por Carmem Barroso refletiam a postura dos movimentos de mulheres em
torno do direito à anticoncepção. Durante a década de 70, a posição de tais
movimentos esteve marcada pelo combate à ideia de planejamento familiar presente
na atuação da BEMFAM, de que a pobreza somente seria superada se os brasileiros
tivessem menos filhos (Sobrinho, 1993; Rocha, 1993).

Logo nos primeiros anos da década de 80, os movimentos de mulheres passaram a


colocar a questão em outros termos, deslocando o eixo da discussão para situar a
anticoncepção no contexto da atenção integral à saúde (Osis, 1994).

Os movimentos intensificavam, então, o questionamento acerca de qual tipo de


atendimento à saúde as mulheres precisavam e queriam receber. As reivindicações
eram feitas justamente a partir da queixa de que, em geral, os médicos encaravam
as mulheres principalmente, quando não apenas, como úteros gravídicos (Osis,
1994).

Foi a partir da interlocução entre representantes dos movimentos de mulheres com


pessoal da área da saúde, sobretudo os profissionais ligados ao grupo da UNICAMP,
aqui já referido, além de sanitaristas, sociólogas e psicólogas, que se consolidou a
idéia de atenção integral à saúde da mulher, que passou a vigorar no PAISM
(Sobrinho, 1993; Osis, 1994).

Nessa interlocução, as mulheres argumentaram que o conceito de integral deveria


enfatizar não só a integração do colo, do útero e das mamas, mas também de outros
aspectos não físicos da vida das mulheres. O que elas defendiam era que o integral
se referisse também ao contexto social, psicológico e emocional das mulheres a
serem atendidas. Em termos pragmáticos, que o médico, ao prestar assistência,
concebesse a mulher como um ser completo, não apenas portadora de um corpo,
mas vivendo um momento emocional específico e inserido em um determinado
contexto socioeconômico (Osis, 1994). Além disso, os movimentos de mulheres
insistiram em que o PAISM incluísse ações definidas de educação sexual e em saúde,
para afastar qualquer possibilidade de ele ser usado para o controle populacional
coercitivo (Alvarez, 1990).

Diante do exposto, é possível depreender que o lançamento do PAISM teve um amplo


significado social, constituindo-se em elemento catalizador de debates, bastante
importantes naquele momento histórico de democratização da sociedade brasileira.
Parece evidente que o ponto crucial do conteúdo do PAISM foi mesmo a inclusão da
anticoncepção como uma das atividades da assistência integral à saúde da mulher.
Isto porque essa inclusão se contrapôs à abordagem do planejamento familiar que
era largamente praticada no país até então, norteada pelas concepções
disseminadas pela BEMFAM.

Historicamente, pelo tradicional enfoque dado à regulação da reprodução via o


controle do corpo feminino (Canesqui, 1984; Costa, 1979; Turner, 1984), é
compreensível que se tenham levantado suspeitas sobre a vinculação do PAISM à
questão do controle populacional, sobretudo em vista do momento em que o
programa foi lançado, exatamente quando o governo brasileiro sofria pressões
externas para adotar uma política demográfica explícita (Veja, 1983; Sobrinho, 1993),
e justamente durante uma CPI para investigar o crescimento populacional. Essas
suspeitas foram rebatidas com veemência pelo Ministério da Saúde, mas não apenas
por ele. A propósito disto, é importante dar voz àqueles que foram responsáveis
diretos pelo conteúdo do programa.

A Dra. Ana Maria Costa, uma das elaboradoras do programa, escreveu: “O Programa
de Assistência Integral à Saúde da Mulher surge em 1983, representando uma
esperança de resposta ao dramático quadro epidemiológico da população feminina.
Neste sentido grandes esforços foram empreendidos pelos movimentos sociais,
particularmente o de mulheres, visando à implantação daquela prática assistencial,
convencidos de que aquele modelo assistencial proposto pelo PAISM, é capaz de
atender às necessidades globais da saúde da mulher” (Costa, 1992:1). Nesse mesmo
sentido pronunciou-se em uma entrevista pessoal outro dos elaboradores do PAISM,
o Dr. Anibal Faúndes (Osis, 1994).
“ Para ele, tais suspeitas sobre as possíveis intenções encobertas do programa revelavam, da
parte dos que as levantavam, “uma escandalosa ignorância” acerca da situação da saúde das
mulheres brasileiras no momento em que o PAISM foi lançado.” o Dr. Faúndes (Osis, 1994).:
,

Especificamente em relação à anticoncepção, naquela época já estava constatada a


inadequação do uso de pílulas, utilizadas por um grande número de mulheres,
compradas livremente nas farmácias ou distribuídas indiscriminadamente por
entidades como a BEMFAM; também já se alertava sobre a “progressão perversa”
da prevalência da ligadura tubária.

Entretanto, justamente quando se propôs a ampliação das opções anticoncepcionais


para evitar essas distorções, e a colocação das atividades de contracepção no
contexto de uma atenção integral à saúde das mulheres, e sob supervisão do
Ministério da Saúde, é que se levantaram suspeitas de que se pretendia controlar a
natalidade no país.

Parece, portanto, que está mais próximo da realidade entender a inclusão das
atividades de contracepção no PAISM como a estratégia política que o governo
brasileiro encontrou para administrar e manter sob controle pressões externas e
internas presentes no momento em que o programa foi lançado.

Vale lembrar que o governo, através do Ministério da Saúde, foi impelido a responder
às demandas sociais no sentido de assumir uma posição clara quanto ao seu
envolvimento nas questões relativas ao crescimento populacional e à regulação da
fecundidade. Nesse sentido, pode-se dizer que foi obrigado a sair de sua posição
ambígua mantida nessa área, sustentada desde os anos 50 (Sobrinho, 1993; Rocha,
1993; Osis, 1994).

É possível supor que, caso o governo, atendendo às pressões externas, propusesse


uma política de controle da natalidade naquele momento de efervescência social e
política, a oposição interna a tal medida criaria ainda mais problemas para o regime
militar, que já desgastado preparava-se para abandonar o cenário nacional. Ao
contrário, ao lançar o PAISM, o governo pode responder às pressões externas para
que adotasse uma política relacionada à regulação da fecundidade, com um
programa que preservava a sua posição oficial no cenário internacional, defendida
em Bucareste, 1974 (Canesqui, 1987; Rocha, 1993).

Ao mesmo tempo, atendeu intensas reivindicações dos movimentos de mulheres,


cuja atuação era expressiva naquele momento histórico. De fato, a adoção do PAISM
conseguiu surpreender até a oposição, que, em grande medida, reconheceu os
méritos da proposta.

Por outro lado, o PAISM se insere no contexto das mudanças ocorridas nas políticas
de saúde nos anos 80, decorrentes da intensa discussão que vinha se realizando
desde os anos 70 sobre universalidade e integralidade, no âmbito do Movimento
Sanitário. Tais mudanças aconteceram à medida que, paulatinamente, foram se
incorporando os conceitos de universalidade e integralidade às políticas públicas na
área da saúde. O Plano Prev-Saúde, lançado em 1980, mas que nunca chegou a ser
implementado, incluía as principais teses de descentralização, hierarquização e
regionalização da atenção à saúde, oriundas do Movimento Sanitário (Teixeira, 1989).
Na sequência dessas mudanças, ao final de 1981 a Presidência da República criou o
Conselho Nacional de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP), que
em 1982 propôs o Plano de Reorientação da Assistência Médica da Previdência,
que insistia na descentralização e utilização prioritária dos serviços públicos na
cobertura assistencial à clientela.

A partir desse plano foram lançadas, ainda 1982, as ações integradas de saúde (AIS),
que permitiam avançar na adoção dos princípios de universalização, de equidade e
de integração dos serviços de saúde (Teixeira, 1989). Quando o PAISM foi lançado,
expressou pragmaticamente a aplicação dos princípios de universalidade e
integralidade, enfatizando a utilização das AIS.

Nesse sentido, pode se dizer que tal Programa representou um importante passo no
caminho percorrido pelas ideias que levaram à Reforma Sanitária, passando pela
VIII Conferência Nacional de Saúde, em março de 1986, e culminando com os
debates na Assembleia Nacional Constituinte, sendo que na Constituição de 1988
boa parte das reivindicações do Movimento Sanitário foi contempladas, inclusive a
garantia de que o Sistema Único de Saúde – SUS seria constituído (NEPP, 1988;
Jacobi, 1989; Teixeira, 1989).

E hoje? Qual discurso está sendo capturado? Como está sendo proposta essa
cidadania? Quais ações o gestor estadual se propõe intensificar, de que forma e sobre
quem? Quem participa? Pense não em forma de respostas a essas problematizações,
mas em termos de efeitos no modo de operacionalizar como tomam a mulher. O que
se está visibilizando como importante para a saúde da mulher é a atuação sobre seus
ciclos vitais como uma individualidade, no caso, ciclos de vida de “um corpo” de uma
mulher. O que não fica à vista é a diferença das diferentes mulheres, que pode ser
apontada como questão da intracategoria gênero – por exemplo, a idade, a
raça/etnia, a sexualidade, questões apontadas no PNAISM. Talvez, o que pode
ser visto aqui seja um discurso de gênero colado a um discurso biologicista, uma
ressignificação de gênero no texto... Uma política de desmobilização desse sujeito-
mulher-cidadã, uma cidadã-mulher-tutelada, uma comunidade de risco. Isso vai ao
encontro da ideia foucaultiana de que o poder deve ser analisado como algo que
circula e se exerce em rede, com os indivíduos sempre em posição tanto de exercer
quanto de sofrer sua ação. O poder não é algo que pertence a um grupo específico e
é exercido sobre outro, pois os indivíduos não são alvos inertes do poder, mas são
sempre centros de transmissão.

Evolução das Políticas de Atenção à Saúde da Mulher

No Brasil, a saúde da mulher foi incorporada às políticas nacionais de saúde nas


primeiras décadas do século XX, sendo limitada, nesse período, às demandas
relativas à gravidez e ao parto. Os programas materno-infantis, elaborados nas
décadas de 30, 50 e 70, traduziam uma visão restrita sobre a mulher, baseada em
sua especificidade biológica e no seu papel social de mãe e doméstica, responsável
pela criação, pela educação e pelo cuidado com a saúde dos filhos e demais
familiares. Há análises que demonstram que esses programas preconizavam as
ações materno-infantis como estratégia de proteção aos grupos de risco e em
situação de maior vulnerabilidade, como era o caso das crianças e gestantes. Outra
característica desses programas era a verticalidade e a falta de integração com outros
programas e ações propostos pelo governo federal.

As metas eram definidas pelo nível central, sem qualquer avaliação das necessidades
de saúde das populações locais. Um dos resultados dessa prática é a fragmentação
da assistência (COSTA, 1999) e o baixo impacto nos indicadores de saúde da mulher.
No âmbito do movimento feminista brasileiro, esses programas são vigorosamente
criticados pela perspectiva reducionista com que tratavam a mulher, que tinha acesso
a alguns cuidados de saúde no ciclo gravídico-puerperal, ficando sem assistência na
maior parte de sua vida. Com forte atuação no campo da saúde, o movimento de
mulheres contribuiu para introduzir na agenda política nacional, questões, até então,
relegadas ao segundo plano, por serem consideradas restritas ao espaço e às
relações privadas. Naquele momento tratava-se de revelar as desigualdades nas
condições de vida e nas relações entre os homens e as mulheres, os problemas
associados à sexualidade e à reprodução, as dificuldades relacionadas à
anticoncepção e à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e a sobrecarga
de trabalho das mulheres, responsáveis pelo trabalho doméstico e de criação dos
filhos (ÁVILA; BANDLER, 1991). As mulheres organizadas argumentavam que as
desigualdades nas relações sociais entre homens e mulheres se traduziam também
em problemas de saúde que afetavam particularmente a população feminina.

Por isso, fazia-se necessário criticá-los, buscando identificar e propor processos


políticos que promovessem mudanças na sociedade e consequentemente na
qualidade de vida da população. Posteriormente, a literatura vem demonstrar que
determinados comportamentos, tanto dos homens quanto das mulheres, baseados
nos padrões hegemônicos de masculinidade e feminilidade, são produtores de
sofrimento, adoecimento e morte (OPAS, 2000). Com base naqueles argumentos, foi
proposto que a perspectiva de mudança das relações sociais entre homens e
mulheres prestasse suporte à elaboração, execução e avaliação das políticas de
saúde da mulher. As mulheres organizadas reivindicaram, portanto, sua condição de
sujeitos de direito, com necessidades que extrapolam o momento da gestação e
parto, demandando ações que lhes proporcionassem a melhoria das condições de
saúde em todas os ciclos de vida.

Ações que contemplassem as particularidades dos diferentes grupos populacionais,


e as condições sociais, econômicas, culturais e afetivas, em que estivessem
inseridos. Em 1984, o Ministério da Saúde elaborou o Programa de Assistência
Integral à Saúde da Mulher (PAISM), marcando, sobretudo, uma ruptura conceitual
com os princípios norteadores da política de saúde das mulheres e os critérios para
eleição de prioridades neste campo (BRASIL, 1984). O PAISM incorporou como
princípios e diretrizes as propostas de descentralização, hierarquização e
regionalização dos serviços, bem como a integralidade e a equidade da atenção, num
período em que, paralelamente, no âmbito do Movimento Sanitário, se concebia o
arcabouço conceitual que embasaria a formulação do Sistema Único de Saúde (SUS).
O novo programa para a saúde da mulher incluía ações educativas,
preventivas, de diagnóstico, tratamento e recuperação, englobando a assistência à
mulher em clínica ginecológica, no pré-natal, parto e puerpério, no climatério, em
planejamento familiar, DST, câncer de colo de útero e de mama, além de outras
necessidades identificadas a partir do perfil populacional das mulheres (BRASIL,
1984). O processo de construção do SUS tem grande influência sobre a
implementação do PAISM.

O SUS vem sendo implementado com base nos princípios e diretrizes contidos na
legislação básica: Constituição de 1988, Lei n.º 8.080 e Lei n.º 8.142, Normas
Operacionais Básicas (NOB) e Normas Operacionais de Assistência à Saúde
(NOAS), editadas pelo Ministério da Saúde. Particularmente com a implementação
da NOB 96, consolida-se o processo de municipalização das ações e serviços em
todo o País. A municipalização da gestão do SUS vem se constituindo num espaço
privilegiado de reorganização das ações e dos serviços básicos, entre os quais se
colocam as ações e os serviços de atenção à saúde da mulher integrada ao sistema
e seguindo suas diretrizes. O processo de implantação e implementação do PAISM
apresenta especificidades no período de 84 a 89 e na década de 90, sendo
influenciado, a partir da proposição do SUS, pelas características da nova política de
saúde, pelo processo de municipalização e principalmente pela reorganização da
atenção básica, por meio da estratégia do Programa Saúde da Família.

Estudos realizados para avaliar os estágios de implementação da política de saúde


da mulher demonstram a existência de dificuldades na implantação dessas ações e,
embora não se tenha um panorama abrangente da situação em todos os municípios,
pode-se afirmar que a maioria enfrenta ainda dificuldades políticas, técnicas e
administrativas. Visando ao enfrentamento desses problemas, o Ministério da Saúde
editou a Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS 2001), que “amplia as
responsabilidades dos municípios na Atenção Básica, define o processo de
regionalização da assistência, cria mecanismos para fortalecimento da gestão do
SUS e atualiza os critérios de habilitação para os estados e municípios” (BRASIL,
2001). Na área da saúde da mulher, a NOAS estabelece para os municípios a garantia
das ações básicas mínimas de pré-natal e puerpério, planejamento familiar e
prevenção do câncer de colo uterino e, para garantir o acesso às ações de maior
complexidade, prevê a conformação de sistemas funcionais e resolutivos de
assistência à saúde, por meio da organização dos territórios estaduais (COELHO,
2003).

A delimitação das ações básicas mínimas para o âmbito municipal é resultante do


reconhecimento das dificuldades para consolidação do SUS, e das lacunas que ainda
existem na atenção à saúde da população. Porém, essa proposta não abrange todo
o conjunto de ações previstas nos documentos que norteiam a Política de Atenção
Integral à Saúde da Mulher, que passa a contemplar, a partir de 2003, a atenção a
segmentos da população feminina ainda invisibilisados e a problemas emergentes
que afetam a saúde da mulher (BRASIL, 2003d). O nível federal de administração
também apresentou, na última década, dificuldades e descontinuidade no processo
de assessoria e apoio para implementação do PAISM, observando-se mudanças a
partir de 1998, quando a saúde da mulher passa a ser considerada uma prioridade
de governo.

O balanço institucional das ações realizadas no período de 1998 a 2002, elaborado


por Correa e Piola, indica que, nesse período, trabalhou-se na perspectiva de
resolução de problemas, priorizando-se a saúde reprodutiva e, em particular, as
ações para redução da mortalidade materna (pré-natal assistência ao parto e
anticoncepção). Segundo os autores, embora se tenha mantido como imagemobjetivo
a atenção integral à saúde da mulher, essa definição de prioridades dificultou a
atuação sobre outras áreas estratégicas do ponto de vista da agenda ampla de saúde
da mulher. Essa perspectiva de atuação também comprometeu a transversalidade de
gênero e raça, apesar de se perceber um avanço no sentido da integralidade e uma
ruptura com as ações verticalizadas do passado, uma vez que os problemas não
foram tratados s de forma isolada e que houve a incorporação de um tema novo como
a violência sexual (CORREA; PIOLA, 2002).

Nesse balanço são apontadas ainda várias lacunas como atenção ao


climatério/menopausa; queixas ginecológicas; infertilidade e reprodução assistida;
saúde da mulher na adolescência; doenças crônico-degenerativas; saúde
ocupacional; saúde mental; doenças infectocontagiosas e a inclusão da perspectiva
de gênero e raça nas ações a serem desenvolvidas. Em 2003, a Área Técnica de
Saúde da Mulher identifica ainda a necessidade de articulação com outras áreas
técnicas e da proposição de novas ações, quais sejam: atenção às mulheres rurais,
com deficiência, negras, indígenas, presidiárias e lésbicas e a participação nas
discussões e atividades sobre saúde da mulher e meio ambiente.

Humanização e Qualidade: Princípios para uma Política de Atenção


Integral à Saúde da Mulher

A humanização e a qualidade da atenção em saúde são condições essenciais para


que as ações de saúde se traduzam na resolução dos problemas identificados, na
satisfação das usuárias, no fortalecimento da capacidade das mulheres frente à
identificação de suas demandas, no reconhecimento e reivindicação de seus direitos
e na promoção do autocuidado. As histórias das mulheres na busca pelos serviços
de saúde expressam discriminação, frustrações e violações dos direitos e aparecem
como fonte de tensão e mal-estar psíquico-físico. Por essa razão, a humanização e a
qualidade da atenção implicam na promoção, reconhecimento, e respeito aos seus
direitos humanos, dentro de um marco ético que garanta a saúde integral e seu bem-
estar.

Segundo Mantamala (1995), “a qualidade da atenção deve estar referida a um


conjunto de aspectos que englobam as questões psicológicas, sociais, biológicas,
sexuais, ambientais e culturais. Isso implica em superar o enfoque biologicista e
medicalizador hegemônico nos serviços de saúde e a adoção do conceito de saúde
integral e de práticas que considerem as experiências das usuárias com sua saúde”.
Humanizar e qualificar a atenção em saúde é aprender a compartilhar saberes e
reconhecer direitos. A atenção humanizada e de boa qualidade implica no
estabelecimento de relações entre sujeitos, seres semelhantes, ainda que possam
apresentar-se muito distintos conforme suas condições sociais, raciais, étnicas,
culturais e de gênero.

A humanização da atenção em saúde é um processo contínuo e demanda reflexão


permanente sobre os atos, condutas e comportamentos de cada pessoa envolvida na
relação. É preciso maior conhecimento de si, para melhor compreender o outro com
suas especificidades e para poder ajudar sem procurar impor valores, opiniões ou
decisões. A humanização e a qualidade da atenção são indissociáveis. A qualidade
da atenção exige mais do que a resolução de problemas ou a disponibilidade de
recursos tecnológicos. E humanização é muito mais do que tratar bem, com
delicadeza ou de forma amigável. Para atingir os princípios de humanização e da
qualidade da atenção deve-se levar em conta, pelo menos, os seguintes elementos:

 acesso da população às ações e aos serviços de saúde nos três níveis de


assistência;

 definição da estrutura e organização da rede assistencial, incluindo a


formalização dos sistemas de referência e contra-referência que possibilitem
a continuidade das ações, a melhoria do grau de resolutividade dos problemas
e o acompanhamento da clientela pelos profissionais de saúde da rede
integrada;

 captação precoce e busca ativa das usuárias;


 disponibilidade de recursos tecnológicos e uso apropriado, de acordo com os
critérios de evidência científica e segurança da usuária;

 capacitação técnica dos profissionais de saúde e funcionários dos serviços


envolvidos nas ações de saúde para uso da tecnologia adequada, acolhimento
humanizado e práticas educativas voltadas à usuária e à comunidade;

 disponibilidade de insumos, equipamentos e materiais educativos;


acolhimento amigável em todos os níveis da assistência, buscando-se a
orientação da clientela sobre os problemas apresentados e possíveis
soluções, assegurando-lhe a participação nos processos de decisão em todos
os momentos do atendimento e tratamentos necessários;

 disponibilidade de informações e orientação da clientela, familiares e da


comunidade sobre a promoção da saúde, assim como os meios de prevenção
e tratamento dos agravos a ela associados;

 estabelecimento de mecanismos de avaliação continuada dos serviços e do


desempenho dos profissionais de saúde, com participação da clientela;
 estabelecimento de mecanismos de acompanhamento, controle e avaliação
continuada das ações e serviços de saúde, com participação da usuária;

 análise de indicadores que permitam aos gestores monitorar o andamento das


ações, o impacto sobre os problemas tratados e a redefinição de estratégias
ou ações que se fizerem necessárias.

Diretrizes da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da


Mulher

 O Sistema Único de Saúde deve estar orientado e capacitado para a atenção


integral à saúde da mulher, numa perspectiva que contemple a promoção da
saúde, as necessidades de saúde da população feminina, o controle de
patologias mais prevalentes nesse grupo e a garantia do direito à saúde.

 A Política de Atenção à Saúde da Mulher deverá atingir as mulheres em todos


os ciclos de vida, resguardadas as especificidades das diferentes faixas etárias
e dos distintos grupos populacionais (mulheres negras, indígenas, residentes
em áreas urbanas e rurais, residentes em locais de difícil acesso, em situação
de risco, presidiárias, de orientação homossexual, com deficiência, dentre
outras).

 A elaboração, a execução e a avaliação das políticas de saúde da mulher


deverão nortear-se pela perspectiva de gênero, de raça e de etnia, e pela
ampliação do enfoque, rompendo-se as fronteiras da saúde sexual e da saúde
reprodutiva, para alcançar todos os aspectos da saúde da mulher.

 A gestão da Política de Atenção à Saúde deverá estabelecer uma dinâmica


inclusiva, para atender às demandas emergentes ou demandas antigas, em
todos os níveis assistenciais.

 As políticas de saúde da mulher deverão ser compreendidas em sua dimensão


mais ampla, objetivando a criação e ampliação das condições necessárias ao
exercício dos direitos da mulher, seja no âmbito do SUS, seja na atuação em
parceria do setor Saúde com outros setores governamentais, com destaque
para a segurança, a justiça, trabalho, previdência social e educação.

 A atenção integral à saúde da mulher refere-se ao conjunto de ações de


promoção, proteção, assistência e recuperação da saúde, executadas nos
diferentes níveis de atenção à saúde (da básica à alta complexidade).

 O SUS deverá garantir o acesso das mulheres a todos os níveis de atenção à


saúde, no contexto da descentralização, hierarquização e integração das
ações e serviços. Sendo responsabilidade dos três níveis gestores, de acordo
com as competências de cada um, garantir as condições para a execução da
Política de Atenção à Saúde da Mulher.

 A atenção integral à saúde da mulher compreende o atendimento à mulher a


partir de uma percepção ampliada de seu contexto de vida, do momento em
que apresenta determinada demanda, assim como de sua singularidade e de
suas condições enquanto sujeito capaz e responsável por suas escolhas.

 A atenção integral à saúde da mulher implica, para os prestadores de serviço,


no estabelecimento de relações com pessoas singulares, seja por razões
econômicas, culturais, religiosas, raciais, de diferentes orientações sexuais,
etc. O atendimento deverá nortear-se pelo respeito a todas as diferenças, sem
discriminação de qualquer espécie e sem imposição de valores e crenças
pessoais. Esse enfoque deverá ser incorporado aos processos de
sensibilização e capacitação para humanização das práticas em saúde.

 As práticas em saúde deverão nortear-se pelo princípio da humanização, aqui


compreendido como atitudes e comportamentos do profissional de saúde que
contribuam para reforçar o caráter da atenção à saúde como direito, que
melhorem o grau de informação das mulheres em relação ao seu corpo e suas
condições de saúde, ampliando sua capacidade de fazer escolhas adequadas
ao seu contexto e momento de vida; que promovam o acolhimento das
demandas conhecidas ou não pelas equipes de saúde; que busquem o uso de
tecnologia apropriada a cada caso e que demonstrem o interesse em resolver
problemas e diminuir o sofrimento associado ao processo de adoecimento e
morte da clientela e seus familiares.
 No processo de elaboração, execução e avaliação das Política de Atenção à
Saúde da Mulher deverá ser estimulada e apoiada a participação da sociedade
civil organizada, em particular do movimento de mulheres, pelo
reconhecimento de sua contribuição técnica e política no campo dos direitos e
da saúde da mulher.

 Compreende-se que a participação da sociedade civil na implementação das


ações de saúde da mulher, no âmbito federal, estadual e municipal requer –
cabendo, portanto, às instâncias gestoras – melhorar e qualificar os
mecanismos de repasse de informações sobre as políticas de saúde da mulher
e sobre os instrumentos de gestão e regulação do SUS.

 No âmbito do setor Saúde, a execução de ações será pactuada entre todos os


níveis hierárquicos, visando a uma atuação mais abrangente e horizontal, além
de permitir o ajuste às diferentes realidades regionais.

 As ações voltadas à melhoria das condições de vida e saúde das mulheres


deverão ser executadas de forma articulada com setores governamentais e
não-governamentais; condição básica para a configuração de redes integradas
de atenção à saúde e para a obtenção dos resultados esperados.

Objetivos Específicos e Estratégias da Política Nacional de


Atenção Integral à Saúde da Mulher

Ampliar e qualificar a atenção clínico-ginecológica, inclusive para as portadoras


da infecção pelo HIV e outras DST:

 fortalecer a atenção básica no cuidado com a mulher;


 ampliar o acesso e qualificar a atenção clínico- ginecológica na rede SUS.
Estimular a implantação e implementação da assistência em planejamento
familiar, para homens e mulheres, adultos e adolescentes, no âmbito da atenção
integral à saúde:
 ampliar e qualificar a atenção ao planejamento familiar, incluindo a
assistência à infertilidade;

 garantir a oferta de métodos anticoncepcionais para a população em idade


reprodutiva;

 ampliar o acesso das mulheres às informações sobre as opções de métodos


anticoncepcionais;

 estimular a participação e inclusão de homens e adolescentes nas ações de


planejamento familiar.

Promover a atenção obstétrica e neonatal, qualificada e humanizada, incluindo


a assistência ao abortamento em condições inseguras, para mulheres e
adolescentes:

 construir, em parceria com outros atores, um Pacto Nacional pela Redução


da Mortalidade Materna e Neonatal;

 qualificar a assistência obstétrica e neonatal nos estados e municípios;


 organizar rede de serviços de atenção obstétrica e neonatal, garantindo
atendimento à gestante de alto risco e em situações de urgência/emergência,
incluindo mecanismos de referência e contrareferência;

 fortalecer o sistema de formação/capacitação de pessoal na área de


assistência obstétrica e neonatal;

 elaborar e/ou revisar, imprimir e distribuir material técnico e educativo;


 qualificar e humanizar a atenção à mulher em situação de abortamento;
 apoiar a expansão da rede laboratorial;
 garantir a oferta de ácido fólico e sulfato ferroso para todas as gestantes;
 melhorar a informação sobre a magnitude e tendência da mortalidade
materna.
Promover a atenção às mulheres e adolescentes em situação de violência
doméstica e sexual:

 organizar redes integradas de atenção às mulheres em situação de violência


sexual e doméstica;
 articular a atenção à mulher em situação de violência com ações de
prevenção de DST/aids;

 promover ações preventivas em relação à violência doméstica e sexual.

Promover, conjuntamente com o PN-DST/AIDS, a prevenção e o controle das


doenças sexualmente transmissíveis e da infecção pelo HIV/aids na população
feminina:

 prevenir as DST e a infecção pelo HIV/aids entre mulheres;


 ampliar e qualificar a atenção à saúde das mulheres vivendo com HIV e aids.

Reduzir a morbimortalidade por câncer na população feminina:

 organizar em municípios pólos de microrregiões redes de referência e contra-


referência para o diagnóstico e o tratamento de câncer de colo uterino e de
mama;

 garantir o cumprimento da Lei Federal que prevê a cirurgia de reconstrução


mamária nas mulheres que realizaram mastectomia;

 oferecer o teste anti-HIV e de sífilis para as mulheres incluídas no Programa


Viva Mulher, especialmente aquelas com diagnóstico de DST, HPV e/ou
lesões intra-epiteliais de alto grau/ câncer invasor.

Implantar um modelo de atenção à saúde mental das mulheres sob o enfoque


de gênero:

 melhorar a informação sobre as mulheres portadoras de transtornos mentais


no SUS;

 qualificar a atenção à saúde mental das mulheres;


 incluir o enfoque de gênero e de raça na atenção às mulheres portadoras de
transtornos mentais e promover a integração com setores não-

governamentais, fomentando sua participação nas definições da política de


atenção às mulheres portadoras de transtornos mentais.

Implantar e implementar a atenção à saúde da mulher no climatério:


 ampliar o acesso e qualificar a atenção às mulheres no climatério na rede
SUS.

Promover a atenção à saúde da mulher na terceira idade:


 incluir a abordagem às especificidades da atenção a saúde da mulher na
Política de Atenção à Saúde do Idoso no SUS;

 incentivar a incorporação do enfoque de gênero na Atenção à Saúde do Idoso


no SUS.

Promover a atenção à saúde da mulher negra:

 melhorar o registro e produção de dados;


 capacitar profissionais de saúde;
 implantar o Programa de Anemia Falciforme (PAF/MS), dando ênfase às
especificidades das mulheres em idade fértil e no ciclo gravídicopuerperal;

 incluir e consolidar o recorte racial/étnico nas ações de saúde da mulher, no


âmbito do SUS;

 estimular e fortalecer a interlocução das áreas de saúde da mulher das SES


e SMS com os movimentos e entidades relacionados à saúde da população
negra.

Promover a atenção à saúde das trabalhadoras do campo e da cidade:

 implementar ações de vigilância e atenção à saúde da trabalhadora da cidade


e do campo, do setor formal e informal;

 introduzir nas políticas de saúde e nos movimentos sociais a noção de direitos


das mulheres trabalhadoras relacionados à saúde.
Promover a atenção à saúde da mulher indígena:

 ampliar e qualificar a atenção integral à saúde da mulher indígena.

Promover a atenção à saúde das mulheres em situação de prisão, incluindo a


promoção das ações de prevenção e controle de doenças sexualmente
transmissíveis e da infecção pelo HIV/aids nessa população:

 ampliar o acesso e qualificar a atenção à saúde das presidiárias.


Fortalecer a participação e o controle social na definição e implementação
das políticas de atenção integral à saúde das mulheres:

 promover a integração com o movimento de mulheres feministas no


aperfeiçoamento da política de atenção integral à saúde da mulher.

Considerando assim as políticas de atenção à saúde da mulher formuladas


nacionalmente através de amplas e complexas discussões trouxeram
contribuições imprescindíveis para o processo de transformação sobre o
paradigma da saúde da mulher. Apesar dos avanços extraordinários, esse
processo é dinâmico e acompanha a transformação da sociedade e, por isso,
inexaurível. Cada política trouxe consigo um avanço singular no processo geral
pela busca da saúde da mulher, conforme destacado anteriormente.
A atual PNAISM, objeto de reflexão neste estudo, apresenta-se de forma
inovadora ao propor contemplar em seus princípios e diretrizes, aspectos
relacionados à promoção e humanização da saúde a fim de minimizar as
iniquidades existentes na saúde da mulher. Rompendo com o enfoque
biologicista e medicalizador hegemônico nos serviços de saúde, a PNAISM
adota o conceito de saúde integral propondo atender à mulher em todas as suas
etapas de vida, englobando inclusive segmentos que estavam, até então, à
margem dos serviços de saúde.
Todavia, percebe-se, ainda, certa valorização da doença em parte das ações
propostas. Na prática, a integralidade da assistência não é efetivamente
contemplada, tendo em vista que o sistema de saúde apresenta dificuldades em
assistir a mulher nas áreas específicas de climatério, infertilidade, saúde mental e
saúde ocupacional.

A PNAISM procurou em seus princípios e diretrizes estabelecer áreas


prioritárias, enfatizando com isso, mulheres indígenas, lésbicas e presidiárias, mas,
ainda assim, o próprio sistema de saúde Enfrenta dificuldades em atender
à mulher em tais especificidades.

Apesar do inegável avanço, é essencial questionar a real implementação


desses princípios nos municípios e estados brasileiros. Mais ainda, para que isso
aconteça é necessário um controle social efetivo por parte das mulheres, no
que tange a implantação e avaliação dessas políticas. Vale ressaltar que a
efetivação desta política depende igualmente dos gestores das unidades de saúde
e dos profissionais que lidam diretamente com o público feminino, abrindo canais
para o debate e para a crescente escolarização desse públicoalvo.
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