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Sumário
APOSTILA- SAÚDE DA MULHER ............................................................... 1
INTRODUÇÃO ............................................................................................... 3
REFERÊNCIAS: ........................................................................................... 42
Assim, a citação de gênero como forma de validação de uma posição política – incluir
a violência contra a mulher – pode nos indicar um determinado discurso acerca do
que se propõe como sujeito-mulher da saúde. Desse modo, ao se pensar o sujeito-
mulher desse discurso, ao qual se acrescenta como coisa faltante na integralidade
hoje, a saúde passa a ser também o controle da violência contra a mulher. O que vem
colado a essa questão da violência contra a mulher? A vulnerabilidade é dela? A
questão não está colocada como vulnerabilidade social. É importante salientar, como
aponta Guareschi, que as análises concernentes à vulnerabilidade social não se
constituem em um mapeamento linear da condição do sujeito ou grupo que se procura
analisar ou entender em termos de inscrição social. Trata-se de uma análise
complexa e multifacetada, polimorfa, de organização de diferentes vetores que
obstruem o acesso aos bens, serviços, incluindo os de saúde, bem como de alteração
de capital simbólico – ilustrado pela ausência de acesso à educação formal. Assim,
cabe problematizar a forma como tomando a violência, algo de um indivíduo – mulher
– ou como algo do social constituído nas relações.
Como por exemplo, o normal a partir do que está posto como anormal, como doença
ou como diferença, naturalizando um lugar que é construído, podendo, então, tomar
a mulher na nova visão: a mulher que deixa de ser aquela que lutou por direitos
reprodutivos na década de 1980, para ser a que sofre violência psicológica, física,
institucional, sexual, assédio, abuso, isto é, uma cidadã que precisa ser tutelada pelo
Estado – um risco. Não tendo como foco o aprofundamento da discussão de gênero
nas políticas públicas de saúde, embora toda escrita e problematização desse campo
de saúde da mulher estejam permeadas por essa categoria de análise, na qual tomam
por referentes os estudos feministas em uma vertente dos estudos culturais e pós-
estruturalistas – como as seguintes autoras: Jennifer Harding; Guacira Louro; e
Dagmar Meyer. Porém, salientando que neste contexto tem como foco a
integralidade. Como diz Foucault, a tecnologia do poder disciplinar tem como objeto
a sujeição do corpo do indivíduo, tornando-o dócil, manipulável, enquanto a tecnologia
do biopoder é exercida sobre um corpo, mas não um corpo individual, e sim coletivo.
Esse novo corpo político, distinto do individual, a um só tempo instituído pelo biopoder
e objeto sobre o qual este se exerce, é a população. Segundo Bernardes, as ações
em saúde direcionam-se, como políticas públicas, para as comunidades. A
comunidade, como objeto de governo, de formas de governo, vem a ser empregada
por caracterizar-se de modo mais específico que a população. Para a autora, os
tropos da população para a comunidade referem-se à heterogeneidade que os grupos
representam dentro de uma população. Quando Foucault propõe o conceito de
biopolíticas para problematizar as formas de investimento e controle da população,
trata esta última como um objeto homogêneo. A noção de comunidade vem demarcar
a heterogeneidade da população. As comunidades são os diferentes grupos que
conformam uma população.
a biologia humana;
o sistema de organização dos serviços;
o ambiente social, psicológico e físico;
e o estilo de vida, que está em amplo processo de construção.
A Conferência de Alma-Ata, realizada em 1978, estabeleceu em sua Declaração
a atenção à assistência materno-infantil como prioridade, com inclusão do
planejamento familiar, relacionado não só a aspectos procriativos, mas abrangendo
o conjunto das necessidades de uma família, tais como: saúde, educação,
moradia e lazer.
Esta foi uma iniciativa importante do Governo e que se baseia nos princípios da promoção,
respeitando a autonomia dos sujeitos em questão e tornando-os coautores de um
processo decisório relevante para a categoria. Também demonstra a preocupação
em adotar políticas consoantes às necessidades das mulheres brasileiras e, assim,
reduzir os índices de morbidade e de mortalidade por causas preveníveis e evitáveis,
o que não aconteceu na gênese das políticas anteriores. Portanto, este documento
consolida avanços no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, com ênfase na
melhoria da atenção obstétrica, no planejamento familiar, na atenção ao abortamento
inseguro e no combate à violência doméstica e sexual. Propõem-se também a
contemplar áreas como: prevenção e tratamento de mulheres vivendo com HIV/aids
e as portadoras de doenças crônicas não transmissíveis e de câncer ginecológico. Esta
nova política foi formulada tendo por base a avaliação das políticas anteriores e, a partir de
então, buscou preencher as lacunas deixadas, como:
Ressaltando que, desde o início dos anos 70, esse grupo vinha debatendo as
condições necessárias para se dar às mulheres um atendimento integral, testando
diferentes modelos de assistência em que o corpo feminino fosse tratado como um
todo e não mais como uma série de órgãos isolados, da competência de diferentes
especialistas (Pinotti et al., 1987; Osis, 1994).
O momento em que o PAISM foi lançado era de grande efervescência no Brasil, com
intensa atuação de movimentos sociais e da sociedade civil, em geral, lutando pelo
restabelecimento da democracia (Alvarez, 1990; Cardoso, 1984; Jacobi, 1989).
De modo geral, essas reações estavam vinculadas a uma possível contradição entre
o conteúdo explícito do Programa (integralidade e universalidade em que
supostamente se embasaria) e as suspeitas de que o PAISM, na verdade, não
passaria de um disfarce do Governo para agir no sentido de controlar a natalidade da
população (Osis, 1994).
Mesmo aqueles que não centravam suas críticas nesse aspecto, consideravam que
o “integral” estava mal aplicado, porque o Programa persistia na visão, amplamente
já difundida na sociedade, de que a mulher se define pela sua capacidade de
reprodução.
Esse argumento também era utilizado pelos setores que associavam o PAISM a
intenções controlistas, porém com uma interpretação mais abrangente.
Argumentavam que, à primeira vista, o PAISM parecia não estar voltado para a
redução da natalidade, porque estaria preocupado em atender às necessidades
integrais de saúde das mulheres.
Para esses críticos, as intenções controlistas ficavam claras nos próprios objetivos
declarados do Programa, voltados apenas para situações relacionadas à atividade
sexual, gravidez, parto, puerpério e contracepção. Para eles, a exclusão do homem
não comprometia apenas a integralidade e univesalidade do Programa, mas indicava
fortemente a intenção controlista oculta. Isto porque o homem só estaria sendo
lembrado quando se falava da vasectomia, e apenas quando a mulher estivesse
impedida de usar outras formas de anticoncepção. Consideravam que, na verdade, o
PAISM partia do pressuposto, já tradicional, de que a mulher era a grande
responsável por regular o processo reprodutivo, de maneira que cabia atuar sobre ela
massiva e intensamente a fim de alcançar um controle demográfico. Em suma,
consideravam que o governo, hesitante em assumir publicamente seu desejo de
controlar a natalidade, estaria usando o Programa proposto para justificarse. Entre as
reações mais favoráveis ao PAISM esteve a dos grupos organizados de mulheres em
geral, que, logo de início, passaram a lutar pela implantação do Programa,
considerando uma resposta satisfatória, naquele momento, às suas crescentes e
expressivas demandas por uma atenção à saúde das mulheres não centralizada no
cuidado materno-infantil, especialmente desvinculada do controle da reprodução
(Barroso, 1984a,b; Costa, 1992; Correa, 1993).
Essa reação pode ser constatada, por exemplo, através de documentos produzidos
em reuniões promovidas pelo movimento de mulheres como a Carta de Itapecirica,
produzida a partir de um encontro de mulheres acontecido em outubro de 1984
(Labra, 1989).
A seu ver, ele não representava perigo de coerção, uma vez que as atividades de
anticoncepção nele previstas estavam condicionadas à sua inserção no conjunto mais
amplo das ações voltadas à atenção integral à saúde da mulher. Os argumentos
colocados por Carmem Barroso refletiam a postura dos movimentos de mulheres em
torno do direito à anticoncepção. Durante a década de 70, a posição de tais
movimentos esteve marcada pelo combate à ideia de planejamento familiar presente
na atuação da BEMFAM, de que a pobreza somente seria superada se os brasileiros
tivessem menos filhos (Sobrinho, 1993; Rocha, 1993).
A Dra. Ana Maria Costa, uma das elaboradoras do programa, escreveu: “O Programa
de Assistência Integral à Saúde da Mulher surge em 1983, representando uma
esperança de resposta ao dramático quadro epidemiológico da população feminina.
Neste sentido grandes esforços foram empreendidos pelos movimentos sociais,
particularmente o de mulheres, visando à implantação daquela prática assistencial,
convencidos de que aquele modelo assistencial proposto pelo PAISM, é capaz de
atender às necessidades globais da saúde da mulher” (Costa, 1992:1). Nesse mesmo
sentido pronunciou-se em uma entrevista pessoal outro dos elaboradores do PAISM,
o Dr. Anibal Faúndes (Osis, 1994).
“ Para ele, tais suspeitas sobre as possíveis intenções encobertas do programa revelavam, da
parte dos que as levantavam, “uma escandalosa ignorância” acerca da situação da saúde das
mulheres brasileiras no momento em que o PAISM foi lançado.” o Dr. Faúndes (Osis, 1994).:
,
Parece, portanto, que está mais próximo da realidade entender a inclusão das
atividades de contracepção no PAISM como a estratégia política que o governo
brasileiro encontrou para administrar e manter sob controle pressões externas e
internas presentes no momento em que o programa foi lançado.
Vale lembrar que o governo, através do Ministério da Saúde, foi impelido a responder
às demandas sociais no sentido de assumir uma posição clara quanto ao seu
envolvimento nas questões relativas ao crescimento populacional e à regulação da
fecundidade. Nesse sentido, pode-se dizer que foi obrigado a sair de sua posição
ambígua mantida nessa área, sustentada desde os anos 50 (Sobrinho, 1993; Rocha,
1993; Osis, 1994).
Por outro lado, o PAISM se insere no contexto das mudanças ocorridas nas políticas
de saúde nos anos 80, decorrentes da intensa discussão que vinha se realizando
desde os anos 70 sobre universalidade e integralidade, no âmbito do Movimento
Sanitário. Tais mudanças aconteceram à medida que, paulatinamente, foram se
incorporando os conceitos de universalidade e integralidade às políticas públicas na
área da saúde. O Plano Prev-Saúde, lançado em 1980, mas que nunca chegou a ser
implementado, incluía as principais teses de descentralização, hierarquização e
regionalização da atenção à saúde, oriundas do Movimento Sanitário (Teixeira, 1989).
Na sequência dessas mudanças, ao final de 1981 a Presidência da República criou o
Conselho Nacional de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP), que
em 1982 propôs o Plano de Reorientação da Assistência Médica da Previdência,
que insistia na descentralização e utilização prioritária dos serviços públicos na
cobertura assistencial à clientela.
A partir desse plano foram lançadas, ainda 1982, as ações integradas de saúde (AIS),
que permitiam avançar na adoção dos princípios de universalização, de equidade e
de integração dos serviços de saúde (Teixeira, 1989). Quando o PAISM foi lançado,
expressou pragmaticamente a aplicação dos princípios de universalidade e
integralidade, enfatizando a utilização das AIS.
Nesse sentido, pode se dizer que tal Programa representou um importante passo no
caminho percorrido pelas ideias que levaram à Reforma Sanitária, passando pela
VIII Conferência Nacional de Saúde, em março de 1986, e culminando com os
debates na Assembleia Nacional Constituinte, sendo que na Constituição de 1988
boa parte das reivindicações do Movimento Sanitário foi contempladas, inclusive a
garantia de que o Sistema Único de Saúde – SUS seria constituído (NEPP, 1988;
Jacobi, 1989; Teixeira, 1989).
E hoje? Qual discurso está sendo capturado? Como está sendo proposta essa
cidadania? Quais ações o gestor estadual se propõe intensificar, de que forma e sobre
quem? Quem participa? Pense não em forma de respostas a essas problematizações,
mas em termos de efeitos no modo de operacionalizar como tomam a mulher. O que
se está visibilizando como importante para a saúde da mulher é a atuação sobre seus
ciclos vitais como uma individualidade, no caso, ciclos de vida de “um corpo” de uma
mulher. O que não fica à vista é a diferença das diferentes mulheres, que pode ser
apontada como questão da intracategoria gênero – por exemplo, a idade, a
raça/etnia, a sexualidade, questões apontadas no PNAISM. Talvez, o que pode
ser visto aqui seja um discurso de gênero colado a um discurso biologicista, uma
ressignificação de gênero no texto... Uma política de desmobilização desse sujeito-
mulher-cidadã, uma cidadã-mulher-tutelada, uma comunidade de risco. Isso vai ao
encontro da ideia foucaultiana de que o poder deve ser analisado como algo que
circula e se exerce em rede, com os indivíduos sempre em posição tanto de exercer
quanto de sofrer sua ação. O poder não é algo que pertence a um grupo específico e
é exercido sobre outro, pois os indivíduos não são alvos inertes do poder, mas são
sempre centros de transmissão.
As metas eram definidas pelo nível central, sem qualquer avaliação das necessidades
de saúde das populações locais. Um dos resultados dessa prática é a fragmentação
da assistência (COSTA, 1999) e o baixo impacto nos indicadores de saúde da mulher.
No âmbito do movimento feminista brasileiro, esses programas são vigorosamente
criticados pela perspectiva reducionista com que tratavam a mulher, que tinha acesso
a alguns cuidados de saúde no ciclo gravídico-puerperal, ficando sem assistência na
maior parte de sua vida. Com forte atuação no campo da saúde, o movimento de
mulheres contribuiu para introduzir na agenda política nacional, questões, até então,
relegadas ao segundo plano, por serem consideradas restritas ao espaço e às
relações privadas. Naquele momento tratava-se de revelar as desigualdades nas
condições de vida e nas relações entre os homens e as mulheres, os problemas
associados à sexualidade e à reprodução, as dificuldades relacionadas à
anticoncepção e à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e a sobrecarga
de trabalho das mulheres, responsáveis pelo trabalho doméstico e de criação dos
filhos (ÁVILA; BANDLER, 1991). As mulheres organizadas argumentavam que as
desigualdades nas relações sociais entre homens e mulheres se traduziam também
em problemas de saúde que afetavam particularmente a população feminina.
O SUS vem sendo implementado com base nos princípios e diretrizes contidos na
legislação básica: Constituição de 1988, Lei n.º 8.080 e Lei n.º 8.142, Normas
Operacionais Básicas (NOB) e Normas Operacionais de Assistência à Saúde
(NOAS), editadas pelo Ministério da Saúde. Particularmente com a implementação
da NOB 96, consolida-se o processo de municipalização das ações e serviços em
todo o País. A municipalização da gestão do SUS vem se constituindo num espaço
privilegiado de reorganização das ações e dos serviços básicos, entre os quais se
colocam as ações e os serviços de atenção à saúde da mulher integrada ao sistema
e seguindo suas diretrizes. O processo de implantação e implementação do PAISM
apresenta especificidades no período de 84 a 89 e na década de 90, sendo
influenciado, a partir da proposição do SUS, pelas características da nova política de
saúde, pelo processo de municipalização e principalmente pela reorganização da
atenção básica, por meio da estratégia do Programa Saúde da Família.
COSTA, J. F., 1979. Ordem Médica e Norma Familiar. Rio de Janeiro: Graal.
Saúd
OSIS, M. J. D., 1994. Atenção Integral à Saúde da Mulher, o Conceito e o
Programa: História de uma Intervenção. Dissertação de Mestrado, Campinas:
Departamento de Antropologia Social, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Estadual de Campinas.
OSIS, M. J. D.; HARDY, E. E.; SIMÕES, I. R. S.; VERA, S. & FAÚNDES, A.,
1990. Laqueadura tubária nos serviços de saúde do Estado de São Paulo. Revista de
Ginecologia e Obstetrícia, 1:195-204.
OSIS, M. J. D.; HARDY, E.; FAÚNDES A. & ALVES, G., 1993. Fatores
associados à assistência pré-natal entre mulheres de baixa renda no Estado de São
Paulo, Brasil. Revista de Saúde Pública, 27:49-53.
PINOTTI, J. A.; FAÚNDES, A.; HARDY, E. E.; SIMÕES, I. R.; OSIS, M. J. D.;
SOUZA, T. R. & MORAES, T. M., 1990. Avaliação da assistência ginecológica no
Estado de São Paulo. Revista de Ginecologia e Obstetrícia, 1:7-21.