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Eu te queria tanto
Mas não sinto mais isso
Porque sinceramente, você acabou sendo a melhor coisa que eu
nunca tive
Você acabou sendo a melhor coisa que eu nunca tive
E eu sempre serei a melhor coisa que você nunca teve
Aposto que deve ser uma droga ser você agora.[1]
Passei a próxima semana pesquisando e consumindo todo conteúdo
sobre inseminação artificial que havia na internet, até tomar coragem para
procurar minha ginecologista e conversar um pouco mais sobre aquele
assunto. Ela não era especialista em reprodução humana assistida, mas me
ajudou muito, tirando algumas dúvidas e até mesmo me indicando uma
clínica da sua confiança.
Eu me consultava com a Doutora Claudia Cardoso há anos e foi para
ela que corri no dia seguinte após a minha separação, para poder pedir os
exames específicos para saber se eu havia contraído alguma IST[2]. Do seu
jeito acolhedor e sem julgamentos, ela ouviu o motivo da minha preocupação
e concordou que eu estava certa em investigar se o canalha do meu ex —
essas palavras foram minhas — havia me passado algum tipo de doença. Os
resultados do exame saíram dias depois e a cada “não detectado” que eu lia,
mais aliviada ficava. Por fim, descobri que eu continuava plenamente
saudável. Dra. Claudia, que também era obstetra, deixou bem claro que
cuidaria de mim durante a gravidez e pareceu feliz pela minha decisão de
realizar o meu sonho de ser mãe.
Saí do seu consultório naquela manhã de terça-feira com a sensação
de que minha vida mudaria para melhor. Dentro do carro, não perdi tempo,
liguei logo para a clínica e marquei uma consulta com a Dra. Amélia Paiva,
indicação da Dra. Claudia. Consegui agendar a consulta para a próxima
semana e senti que contaria os minutos até o dia chegar. Do consultório, fui
direto para a confeitaria e consegui me dedicar cem por cento aos doces,
enquanto Mariana lidava com os clientes e Luíza, a garçonete que havia
contratado duas semanas antes, os servia.
— É tão bom te ver com esse sorriso no rosto! — Miriam disse de
repente, me chamando a atenção. Ao menos tinha me dado conta de que
estava sorrindo.
— Estou feliz, Miriam.
— Estou percebendo, meu bem. — Sua voz carinhosa aqueceu meu
coração. — Posso saber o motivo?
Eu queria falar, mas, antes, conversaria primeiro com os meus pais.
Jantaria com eles naquela noite e deixaria bem claro que, se tudo desse certo,
eles seriam promovidos a avós dali a alguns meses.
— Ainda não, mas eu juro que contarei em breve!
— Bom, o que realmente importa, é que você está sorrindo de novo,
ainda que não confie em mim para contar o porquê...
Seu drama me fez rir e precisei parar de misturar as gotas de
chocolate à massa do cookie para poder abraçá-la.
— Claro que eu confio em você, sua boba, eu só não posso contar
ainda.
— Promete que serei a primeira a saber quando você puder contar?
Não vale passar Rose e Margarida na minha frente, aquelas velhas nunca
mais me deixarão em paz!
— E você as deixará em paz se souber primeiro?
O sorriso maldoso que se abriu em seus lábios não combinava nem
um pouco com uma senhora. Não diziam que as velhinhas eram avós fofas?
— Claro que não! — Confirmou o que eu sabia, caindo na gargalhada
comigo.
O resto do dia foi tranquilo e eu sequer pensei em Davi ou na tristeza
que me atormentava há quase dois meses desde a separação. Até o clima na
confeitaria parecia diferente e eu pude apreciar a música ambiente que tocava
sem prestar atenção na letra, fofoquei um pouco com Miriam sobre a vida dos
outros — seu esporte favorito — e, por fim, quando terminei de contar o
caixa naquele dia e fechei a confeitaria com a ajuda de Mariana, que saiu
correndo para a faculdade logo depois de se despedir de mim, fui para casa
em paz.
Levei um bom tempo embaixo do chuveiro, aproveitando o corpo
lisinho depois de ter feito uma depilação completa no dia anterior e dediquei
alguns minutos ao meu cabelo, massageando e já prevendo como ficaria
bonito depois que eu o finalizasse com uma fitagem rápida e o difusor. Era
bom voltar a pensar em mim, ainda que eu soubesse que isso duraria pouco
tempo, pois logo estaria pensando no meu filho. O sorriso que se abriu em
meus lábios quase partiu meu rosto ao meio. Eu teria um bebê! Isso dissipava
qualquer tristeza que poderia existir dentro do meu peito.
Escolhi uma calça jeans de lavagem escura e uma blusa rosa de meia
manga que ficava bem coladinha ao meu corpo e valorizava minha cintura
fina. Ter o prazer em escolher algo para vestir era um avanço depois de viver
usando moletom e roupas sem graça para ir ao trabalho. Eu gostava de estar
bem-vestida, ainda que passasse boa parte do meu tempo na cozinha usando
um avental, pois achava importante que os clientes tivessem uma boa
impressão da dona do lugar onde estavam fazendo uma pausa para comer.
Finalizei meu cabelo com o difusor, passei um gloss e uma máscara de cílios
e logo estava pronta para sair com Kiki ao meu lado, pois ela amava a casa
dos meus pais.
Assim como eu, meus pais moravam em Laranjeiras e a distância
entre nossos apartamentos era de pouco mais de quinze minutos de carro.
Entrei com a cópia da chave que eu ainda mantinha em meu chaveiro e pude
ouvir um jazz, ritmo favorito do senhor Brito Garcia, tocando ao fundo,
enquanto a risada da minha mãe ecoava na cozinha. Encontrei os dois
tomando uma taça de vinho e rindo de alguma besteira, provavelmente dita
pelo meu pai.
— Isso tudo é felicidade por eu ter chegado? — perguntei, soltando
Kiki da casinha e ouvindo seus latidos ao correr para as pernas da minha mãe.
Meu pai veio me abraçar bem apertado, em seguida, se abaixou para
pegar Kiki e deixar que ela enchesse o seu rosto de beijos. Foi a vez da minha
mãe me dar um abraço e eu adorei ser acolhida por eles. Me lembrava a
minha infância.
— Estou fazendo seu prato favorito.
— Fricassê de camarão?
— Exatamente! Vem aqui com a vovó, meu amorzinho... — Minha
mãe se derreteu para Kiki e eu senti meu coração pulsar de felicidade. Se
ficavam daquele jeito com a minha cachorrinha, como ficariam com um
bebê? Eu mal podia esperar para ver.
— Como está a confeitaria, filha?
Passei os próximos minutos tomando uma taça de vinho e
conversando com o meu pai, que também me atualizou sobre o seu trabalho.
Ao contrário da minha mãe, que havia se aposentado, ele continuava atuando
na área da advocacia e era alguém respeitado no meio, mesmo com os seus
sessenta anos. Quem olhasse para o meu pai, tão bem-disposto e alegre, não
imaginaria como teve que ralar muito mais do que os outros para poder ser
alguém na vida. Negro, pobre, com um pai viciado em álcool e agressivo e
uma mãe que passava mais tempo criando os filhos da patroa do que dando
atenção para o menino que tinha em casa, meu pai poderia muito bem ter sido
corrompido pela criminalidade da favela onde morava, mas provou que com
esforço, estudo e dedicação, um menino pobre e preto, poderia vencer.
Não foi fácil, o preconceito era algo que marcava e machucava, mas
meu pai nunca esmoreceu. O orgulho que eu sentia dele e da minha mãe era
tão grande, que mal cabia em mim. Se hoje eu era uma mulher independente,
que teve bons estudos e oportunidade de crescer na vida, era por causa
daqueles dois. Esperava que eles se orgulhassem da filha que haviam criado e
entregado para o mundo.
Com o fricassê pronto, colocamos a mesa e nos sentamos perto um do
outro, como quando eu ainda morava com eles. Deixei que me atualizassem
sobre a nossa família — meu pai tinha um irmão mais velho por parte de pai
que morava em São Paulo. Eles se conheceram quase adultos, quando meu
avô faleceu e meu tio Roberto veio ao Rio de Janeiro para poder ir ao enterro.
Não que meu avô fosse alguém querido para ambos, mas ainda era o pai dos
dois. Foi bom ele ter vindo, pois assim conheceu o irmão mais novo e desde
então, nunca mais perderam contato. Às vezes ele e a família vinham ao Rio
nos visitar, assim como já tínhamos ido a São Paulo passar as férias e festas
de final de ano com eles.
Já a família da minha mãe era toda do Rio de Janeiro, mas cada um
morava em um lugar. Eu não tinha avós, apenas tias e primos, e minha mãe
levou um tempo me contando como cada um estava. Deixei que falassem por
metade do jantar, até que meu pai fez a pergunta fatídica:
— Davi voltou a te procurar?
— Não. Acho que ele entendeu que não tem mais volta depois que
ameacei chamar a polícia.
— Bom. Se ele não tivesse parado, eu mesmo tomaria uma
providência.
— Ele ainda tentou falar comigo semanas atrás, acredita nisso, filha?
Mas não atendi e depois bloqueei o número dele. Não quero olhar na cara
daquele idiota nunca mais!
— Eu também não e não quero mais perder tempo falando sobre ele,
Davi agora faz parte do meu passado. Quero contar algo a vocês.
— Sabia! Esse brilho nos seus olhos não me engana — minha mãe
disse, me fazendo sorrir. — O que aconteceu?
— Não aconteceu ainda, mas vai acontecer.
— Como assim? — meu pai perguntou.
— Vocês sabem que eu sempre sonhei em ser mãe, certo? — Os dois
assentiram. — Por um momento, depois da separação com Davi, achei que
nunca mais iria realizar esse sonho, mas Malu me abriu os olhos e me
lembrou sobre a inseminação artificial. Eu passei a última semana
pesquisando sobre o assunto, então, conversei hoje com a minha
ginecologista e decidi que vou ter o meu filho de forma independente, através
da inseminação.
Meus pais se olharam e esperei pela reação deles com expectativa. Eu
sabia que aquele era um assunto delicado, que poucas filhas chegavam para
os pais e diziam que seriam mães solo por opção, mas aquela era minha
decisão. Esperava que eles me apoiassem.
— Você tem certeza de que é isso que você quer? — Meu pai
perguntou. — Ter um filho requer muita responsabilidade, Briana.
— Eu sei disso, pai, mas eu estou pronta. Completo trinta anos no ano
que vem, acabei de me separar e não quero ter um relacionamento tão cedo,
mas quero ter um filho, sempre foi o meu sonho ser mãe. Se eu tenho
condições de fazer isso, por que esperar?
— Quer saber? Você está certa! — Minha mãe disse, dando um
tapinha na mesa. — Uma mulher livre e independente não precisa esperar por
ninguém para tomar as suas próprias decisões. Se quer ter um filho, tenha um
filho, só saiba que você nunca estará sozinha. Eu e seu pai estaremos sempre
ao seu lado e eu vou amar tanto, mas tanto o meu netinho ou netinha, que ele
ou ela vai preferir morar comigo do que com você.
Eu comecei a rir e meu pai logo me acompanhou, balançando a
cabeça.
— Analídia, meu amor, o filho é da Briana, não nosso.
— Avó é mãe duas vezes, ora! — disse ela, me puxando para um
abraço. — Estou tão feliz por você, meu amor. Dá para ver que a vontade de
ter esse filho está trazendo de volta a Briana iluminada e confiante que eu
conheço.
— Realmente, está. Esse bebê está dando um novo sentido a minha
vida e ele ainda nem existe.
— Mas vai existir em breve — meu pai disse, tocando a minha mão
por cima da mesa. — Pode contar conosco, filha. Você pode ser mãe solo,
mas jamais estará sozinha.
Eu sabia daquilo e ter o apoio dos dois me encheu de felicidade.
Minha consulta com a especialista em reprodução humana assistida
foi esclarecedora. Dra. Amélia me acolheu e tirou todas as minhas dúvidas
sobre cada procedimento, me passou uma lista de exames e me explicou
melhor sobre como funcionava a escolha do sêmen. No Brasil, havia certa
carência em doação de sêmen e o banco brasileiro se tornava infinitamente
menor comparado ao banco de sêmen americano, onde os doadores recebiam
para poder doar.
Além disso, enquanto no Brasil só tínhamos acesso a cor da pele, do
cabelo, dos olhos, tipo sanguíneo, peso e altura, nos Estados Unidos,
tínhamos acesso a tudo isso, mais ao perfil psicológico do doador, histórico
de saúde, fotos da infância, nível de graduação e até mesmo seus hobbies e
animais de estimação favoritos, o que era muito mais interessante, pois eu
poderia escolher um doador que tivesse os mesmos interesses que eu, que
fosse forte e inteligente.
Ao final da consulta, eu estava certa de que importaria o sêmen dos
Estados Unidos e já estava ansiosa para poder escolher o doador. Faria aquilo
enquanto os resultados dos exames pedidos pela Dra. Amélia ficassem
prontos, assim, no nosso próximo encontro, eu já teria o meu escolhido e
poderíamos prosseguir com o protocolo de importação.
Malu me ajudou muito durante a escolha. Analisamos tantos perfis no
banco de sêmen, que me vi louca com todas aquelas opções. Durante a
consulta, Dra. Amélia me contou um fato que me abalou um pouco. Entre os
perfis escolhidos, 95% eram brancos, 52% tinham olhos azuis e 27% eram
loiros. Eu sabia que, infelizmente, por conta do abismo social que havia no
Brasil, pessoas brancas geralmente tinham mais poder aquisitivo do que
pessoas negras e isso poderia influenciar na busca de casais — heterossexuais
ou homossexuais — e mulheres solos pela inseminação artificial, que não era
um procedimento barato. Com isso, era lógico que a pessoa que escolhia
passar por esse procedimento, optaria por um doador fisicamente parecido
consigo mesmo, mas saber que a preferência por sêmen de pessoas brancas
era de 95% me causou um nó no estômago, por isso, mantive a certeza sobre
a minha escolha e busquei apenas por doadores negros.
Eu era uma mulher negra, meus pais eram negros, pelo menos 60%
das pessoas que compunham a minha família eram negras e eu sentia muito
orgulho disso, portanto, não faria o menor sentido procurar por um doador
branco. Eu gostaria de manter as minhas raízes. Quando voltei a encontrar a
Dra. Amélia, eu já tinha o meu escolhido.
Era um doador afro-americano na faixa dos trinta e sete anos, seu
nível de graduação era MBA, tinha 1,80m e pesava 84kg. No seu perfil, dizia
que tinha uma filha e que amava ser pai, era um bom ouvinte, compassivo,
gentil, gostava de ajudar os menos afortunados, era um homem de caráter e
com instinto de liderança e que sua positividade irradiava pelos olhos
castanhos. Tinha interesse em piano e literatura, seu hobby favorito era
praticar esportes e seus assuntos preferidos eram arte, história, linguagens e
matemática.
— Seus exames estão excelentes, Briana. Você é uma mulher jovem e
saudável, com a taxa de hormônios esperada para sua idade, o que significa
que as chances de o procedimento dar certo são bem altas.
Ouvir as suas palavras me fez ficar nas nuvens. Saí do seu consultório
sabendo que o sêmen do meu doador escolhido levaria até quarenta dias para
chegar ao Brasil e que a minha inseminação seria intracervical, que era
quando o esperma era colocado no colo do útero com uma seringa,
basicamente simulando a função do pênis no momento da ejaculação.
Os próximos quarenta dias seriam os mais aguardados por mim!
Foi só descobrir que estava grávida, para o enjoo chegar com tudo e
fazer a sua estreia em minha vida. Os próximos dias foram uma mistura de
alegria com choro — porque sim, descobri que eu era uma grávida sensível
— e náuseas que se estendiam da manhã até o início da tarde. Para completar,
o novo morador do apartamento ao lado do meu resolveu fazer uma pequena
obra e eu sempre acordava com o barulho de martelo e furadeiras.
Mas tudo bem, eu estava feliz e não gostava de reclamar. Recebi os
parabéns de Dra. Amélia ao contar a confirmação da gravidez e marquei a
primeira ultrassonografia transvaginal com a Dra. Claudia para quando
completasse quatro semanas de gestação. Tomar todas aquelas decisões e ser
paparicada por minha família e amigos fez com que a ficha começasse a cair,
mas apenas quando fui à consulta com a minha ginecologista-obstetra para
realizar a ultra, foi que entendi que aquele momento era mesmo real.
O bebê não era nada mais do que uma manchinha na tela, mas foi o
seu batimento cardíaco que me provou que ele estava ali, dentro de mim,
sendo gerado com todo o meu amor. Não pude evitar as lágrimas e minha
mãe também não. Ela segurava a minha mão e encarava aquela manchinha
como se estivesse vendo o seu filho, o que não era mentira, pois eu sabia que
ela seria uma segunda mãe para o meu bebê. Dra. Claudia deixou que
curtíssemos aquele momento durante alguns minutos, até se virar para mim e
dizer o que eu tanto queria ouvir:
— Está tudo perfeitamente bem, Briana. Agora, é só começar a tomar
os complementos que te passei, inclusive o ácido fólico, e nos vemos em
algumas semanas.
— Graças a Deus! — Minha mãe comemorou ao meu lado, beijando a
minha mão. — Já podemos comprar as roupinhas! Eu quero dar o primeiro
conjuntinho!
— Imagino que é só por amor ao bebê e não porque não quer que
Miriam, Rose ou Margarida passem a sua frente.
— Claro, é só por amor ao neném da vovó.
— Mãe, a senhora acha que engana a quem?
— É claro que eu não posso deixar aquelas velhas passarem a minha
frente, ora! Eu sou a avó mais importante.
Até Dra. Claudia riu, mesmo não conhecendo o meu quarteto de
velhas esclerosadas. No fundo, toda aquela disputa era apenas amor.
Deixamos o consultório com uma lista de vitaminas para comprar, inclusive
um remédio que ajudava a conter o enjoo, e fomos direto ao shopping para
almoçar e comprar as primeiras roupinhas do bebê. Eu me perdi naquele
mundo infantil, no tanto de opção que me esperava. Por fim, saímos da loja
com dois macacões para recém-nascido na cor amarela e branca e um par de
sapatinhos, prometendo a vendedora que voltaríamos para comprar mais
coisas. Eu me segurei para não ver os vestidinhos ou roupinhas para meninos
e decidi que só compraria mais roupinhas quando soubesse o sexo do bebê.
Falavam que o instinto de mãe nunca falhava sobre o sexo, mas eu
ainda não conseguia sentir se era menino ou menina. Talvez o meu instinto
ainda precisasse ser apurado. Depois de jantar com Malu naquela sexta-feira
e receber dela o primeiro presentinho que comprou para o futuro afilhado ou
afilhada — um ursinho branco muito fofo que segurava um coração com uma
frase escrita “sou o bebê da dindinha” —, fui para casa sentindo que
precisava muito da minha cama. A história sobre o sono era real, eu sentia
que poderia tirar pequenos cochilos durante todo o dia e ainda conseguiria
dormir mais de oito horas durante a noite.
Kiki, que estava mais agarrada comigo do que nunca, logo me saudou
quando cheguei e passei algum tempo com ela antes de tomar um banho e me
jogar na cama. Dormi tão rápido, que, quando acordei com o barulho de algo
batendo contra a parede, pensei que estava em um sonho muito louco e tentei
pegar no sono de novo, mas logo o barulho recomeçou. Aos pés da minha
cama, Kiki latiu e eu me sentei, preocupada. Será que haviam invadido o
prédio e estavam tentando arrombar o meu apartamento? Era um assalto?
Meu Deus, tinha que chamar a polícia! Levantei-me aos tropeços, sem saber
se corria, se pegava Kiki no colo ou procurava por meu celular no meio da
penumbra, mas um barulho agudo me fez parar no meio do quarto. Foi então
que eu ouvi uma mulher dizer nitidamente:
— Ai, isso, me fode! Isso, mete essa tora em mim! Que gostoso,
aaaaaai...
A pancada contra a parede recomeçou e foi então que eu entendi, não
haviam invadido o prédio e nem era uma tentativa de assalto, era a minha
nova vizinha transando como se não houvesse amanhã e gemendo tão alto,
que sua voz aguda estava ultrapassando a parede. Eu nem sabia que a parede
do meu quarto fazia divisão com o quarto do apartamento vizinho e não
acreditava que não sabia disso porque meus outros vizinhos não transavam —
afinal, Marieta havia saído do prédio grávida — e, sim, porque eles não
gritavam como se estivessem prestes a serem degolados — ou empalados,
porque a mulher chamou o pênis do seu namorado de “tora”. Tora! Pelo amor
de Deus!
— Ai, ai, ai, eu vou gozar, porraaaaaaa!
Percebi que ela gostava de prolongar as palavras no final do gemido e
uma dor de cabeça insuportável pressionou a minha nuca. No meu colo, Kiki
latiu de novo quando a cabeceira da cama voltou a bater contra a parede e
entendi que não daria para dormir no meu quarto naquela noite. Com raiva,
deixei Kiki na sala e fui até a cozinha fazer um chá para tentar voltar a
dormir. Por sorte, da sala eu não conseguia ouvir nada, mas aquela situação
me preocupou. Será que noites como aquela se tornariam uma rotina?
Eu não tinha nada a ver com a vida da minha nova vizinha — ou
vizinho, não conhecia quem havia se mudado para o prédio no início daquela
semana —, mas se ela era adepta a ser tão escandalosa durante o sexo, eu
teria que arriscar a criar uma inimizade com ela e bater em sua porta para
pedir que fosse mais comedida. Eu teria um bebê em breve, como ele
conseguiria dormir com aquela barulheira toda? Era como se estivessem
transando dentro do meu apartamento!
Precisei voltar ao meu quarto para pegar meu travesseiro e o lençol, e
a vizinha ainda gritava, provando que tinha uma garganta abençoada pelo
Senhor. Olhei para a parede com cara feia, como se eles pudessem ver que
haviam me acordado no meio da madrugada com toda aquela bateção de
parede e gemidos ensurdecedores, mas como sabia que não teria efeito algum
sobre o ato dos dois, saí do meu quarto e bati a porta com força, torcendo
para que tivessem ouvido — o que achava muito pouco provável. Acomodei-
me no sofá e Kiki se deitou perto da minha barriga, entendendo que
passaríamos o resto da noite ali. Acariciei sua cabeça e encarei o teto,
torcendo para que a próxima noite fosse mais calma no apartamento ao lado.
Malu chegou em minha casa vinte minutos depois de eu ligar para ela
chorando. Com dois potes de sorvete de pistache — o meu favorito — ela
entrou em meu apartamento e me amparou, me deixando chorar em seu
ombro e ouvindo cada insulto que eu proferia a mim mesma. Quando
consegui me acalmar, ela segurou o meu rosto, limpou as minhas lágrimas,
colocou o pote de sorvete na minha mão junto com uma colher e disse:
— Agora você vai comer um pouco e me ouvir, ok? — Eu apenas
assenti, fungando e colocando um pouco de sorvete na minha boca. Não
deveria ter um gosto tão bom e eu com certeza não merecia estar sentindo
prazer ao comer, porque, naquele momento, eu não merecia nada. — Você
está errada.
— Eu sei — murmurei.
— E foi cruel com Levi.
— Eu sei. — Talvez eu tenha voltado a chorar.
— Eu deveria te dar umas palmadas, Briana!
— Eu sei! — gritei em meio ao choro.
— Mas não vou fazer isso, sabe por quê? — Balancei a cabeça em
meio às lágrimas, vendo Malu me dar um sorriso triste. — Porque eu sei que
quem falou aquelas coisas para Levi não foi essa Briana que está na minha
frente, foi a Briana que tem medo de se machucar de novo. Só que, amiga,
aquele homem... Ele não vai te machucar. Ele não vai te magoar, Briana.
— Eu sei disso — sussurrei, mal conseguindo enxergar suas feições.
— E estou me sentindo horrível por ter sido aquela quem machuca. É tão
ruim estar do outro lado da situação. Como pode existir pessoas que
machucam outras por que querem? Eu não consigo lidar com isso, a culpa
está me corroendo... Eu só queria pedir perdão a ele, mas Levi nem quer me
escutar.
— Talvez ele só precise de um tempo.
— Eu não quero perdê-lo — confidenciei, mesmo tendo certeza de
que Malu já sabia daquilo. — Eu nunca pensei que conseguiria me apaixonar
de novo depois de tudo o que sofri com a traição de Davi, mas, a verdade, é
que eu não só me apaixonei, como voltei a amar. Eu amo Levi, Malu. Eu amo
cada parte dele.
— Acha que não sei disso? Seus sentimentos estão estampados na sua
testa há meses e arrisco a dizer que o que você sente por Levi é algo que
nunca sentiu por homem algum.
— Não mesmo. Eu amei Davi, sabe? Não vou dizer que não, mas o
que sinto por Levi é diferente, é mais forte, intenso. É um amor que eu sei
que nunca vou conseguir esquecer.
— Então é isso que você precisa dizer a ele, Bri. Assim que ele quiser
te escutar, diga tudo o que sente, explica que em momento algum você
enxergou nele o homem que o abandonou quando era criança.
— Será que eu não posso dizer isso agora?
— Eu acho que ele não quer te ouvir agora — disse ela, puxando-me
para os seus braços. — Mas ele não é cabeça dura, sei que vai te ouvir em
breve, talvez amanhã mesmo. Só precisa se acalmar, assim como você. Não
esqueça que você está prestes a parir, Briana, pelo amor de Deus!
— Não tem como esquecer. A bebê está pesando uma tonelada na
minha barriga. E ela ama sorvete, sente só. — Coloquei a mão de Malu em
minha barriga e ela riu ao sentir a bebê chutar. — Eu também estou sentindo
uma dorzinha chata no final das costas.
— Ai, meu Deus, isso não é o parto, né?
— Não. Acho que não. — Acabei rindo do seu desespero. — Só estou
cansada e triste. Ela deve sentir isso.
— Claro que sente, ela já ama você e o Levi, afinal, o homem ficou
grudado em vocês duas nos últimos meses. — Malu acariciou minha barriga
e meus cabelos. — Ele vai ser um pai incrível, Bri. Não deixe esse homem
escapar, porque eu já sinto carinho por ele, ok?
— E pelo amigo dele — sorri.
— Não sei do que está falando.
— Vocês se beijaram. Preciso te lembrar desse fato?
— Não.
— E você nem tem xingado o Diego com tanta frequência, já
percebeu isso também?
— Claro, agora eu o xingo pessoalmente no trabalho! — Riu e seus
olhos brilhando. Era bom que uma de nós duas estivesse feliz no momento.
— Não vou deixar Levi escapar, Malu — sussurrei. — Eu juro.
— É assim que se fala, garota!
Toquei minha mão na dela em um acordo tácito e me afastei para
comer um pouco mais do sorvete, aproveitando que as lágrimas haviam dado
uma trégua. Sem querer, acabei me lembrando das palavras do meu pai
quando saímos da delegacia, meses atrás. Ele me aconselhou a não olhar para
todos os homens com os olhos da mágoa e consegui fazer isso com Levi.
Agora, eu teria que lembrar a mim mesma a nunca mais olhar para ele com os
olhos do medo, pois o sentimento se tornava irracional quando era dirigido a
ele. Eu não precisava ter medo de Levi, pois sabia que ele nunca me
machucaria, sabia que ele seria um pai incrível para a minha filha e um
homem ainda melhor para mim. Não abriria mão dele, nunca! Faria de tudo
para ele me perdoar.
— Tá ouvindo isso? — Malu questionou minutos depois, quando
ouvimos vozes altas no corredor. Apurando minha audição, pude entender o
que um homem disse:
— Não, você não vai fazer isso!
— Sim... Sim, e-eu vou...
— Fique quieto, cara!
— É o Diego? — Malu perguntou, se levantando. Eu fiz o mesmo,
mas com dificuldade por conta da barriga. Duas batidas soaram em minha
porta.
— Brianaaaaaaaa!
— Caralho, Levi, você está bêbado, porra! Deixa a Briana em paz!
— Na-não... Brianaaaaa!
Malu me encarou e fui até a porta, abrindo-a no momento em que
Diego passou o braço de Levi por seu pescoço e tentou afastá-lo.
Boquiaberta, encarei um Levi completamente bêbado, com os olhos inchados
e mal se aguentando de pé.
— Oi, Bri... — Ele tentou ficar de pé sozinho e colocar uma
expressão séria no rosto. — Na-não, é Briana, por-porque estamos brigados.
— Pelo amor de Deus! — Diego revirou os olhos e puxou Levi, me
dando um sorriso amarelo. — Desculpa, Bri, vou levar essa bunda bêbada
para casa.
— Não! Deixe-o aqui. Quer dizer — virei-me para Levi e pedi,
olhando em seus olhos: —, fique aqui, Levi. Por favor.
Ele me olhou de cima a baixo lentamente, daquele jeito torto e bêbado
e bufou.
— Não. — Meu coração doeu com a sua negativa e acompanhei seus
olhos indo para Malu. — Sabia que a gente brigou, Malu?
— É, eu estou sabendo. — Malu riu, me encarando rapidinho antes de
voltar para Levi e falar mais baixo, como se estivesse contando um segredo:
— Briana estava aqui chorando no meu ombro, sabia? Ela está muito
arrependida.
— Hum... Não acredito-to — ele soluçou no final.
— É verdade, Levi — falei, dando um passo para frente. — Por favor,
acredite em mim.
— Ela está arrependida de verdade — Malu acrescentou.
Seus olhos bêbados encontraram os meus novamente e ele ergueu o
queixo, me perguntando baixinho:
— Está?
— Estou. Claro que estou, amor — falei, finalmente tocando o seu
rosto. O cheiro de uísque me fez estremecer com uma onda de náusea, mas
me segurei. — Mas não vou falar nada agora, porque sei que não vai se
lembrar amanhã.
— Vou sim.
— Não, não vai. — Eu consegui rir, mas logo voltei a ficar séria. —
Fique aqui, me deixe cuidar de você, Levi.
— Ele precisa de um banho gelado, Bri. Estou com medo de que caia
no box.
— Tá achando que sou criança, po-porra? — Levi perguntou para
Diego em um tom resignado e seu melhor amigo riu.
— Não sei se percebeu, mas você mal se aguenta em pé.
— Aguento si-sim!
— Eu que estou te segurando, Levi. Acho melhor te levar para casa e
te dar um banho, Briana pode nos acompanhar, se quiser.
— Dê um banho nele aqui, tem roupas dele no meu closet — ofereci e
voltei a encarar Levi. — Fique, por favor.
Algo brilhou em seus olhos nublados pela bebida, vi a indecisão ali.
Mesmo bêbado, Levi ainda não parecia confiar totalmente em mim e pude
ver como estava magoado. Eu queria me desculpar, implorar pelo seu perdão,
mas sabia que hoje seria inútil pelo jeito como ele estava. A única coisa que
poderia fazer, era cuidar dele.
— Briana não pode ficar so-sozinha — ele disse para Diego e o aperto
em meu peito ficou mais firme. Mesmo brigado comigo, ele se preocupava.
Eu não merecia aquele homem.
— Vai ficar? — Diego perguntou e Levi apenas assentiu com certa
dificuldade.
— Ótimo! Briana te ajuda enquanto eu faço um café — Malu
concluiu.
Acenando com a cabeça, Diego entrou e os guiei até o banheiro do
meu quarto, pois ficaria mais fácil para depois Diego colocar Levi na cama.
Enquanto eles iam juntos até o banheiro — com Levi reclamando alto sobre
não ser criança —, fui pegar suas roupas e parei por um momento com a
gaveta aberta, sentindo minha mente girar com tudo o que estava
acontecendo naquela noite e com o estado de Levi. Acho que nunca o vi tão
bêbado, nem quando descobriu sobre a gravidez. Senti meu coração se
apertar. Ele devia estar sofrendo muito. Será que iria se arrepender de ficar
em minha casa quando acordasse no dia seguinte? Eu esperava que não.
Encontrei um short de pijama e uma regata branca e peguei uma
toalha limpa antes de ir ao banheiro. Encontrei-o nu, escorado contra a parede
e xingando Diego por conta da água gelada. Seus olhos estavam fechados e a
careta em seu rosto me fez querer rir.
— Estou tendo que te ver pelado, Levi! Quem deveria estar xingando
era eu.
— Briana gosta de me ver pelado — ele murmurou e senti meu rosto
ficar quente.
— Não sei por quê. Ela deve se contentar com pouco.
— Tá falando que tenho pa-pau pequeno? Meu pau é grande pra
caralho!
— Não é isso que estou vendo aqui — Diego zoou com a cara dele e
Levi bufou, abrindo os olhos e dando de cara comigo.
— Fala pra ele que meu pau é grande, Bri.
Meu Deus, ele devia estar muito bêbado mesmo. No meio de toda
aquela crise, era com aquilo que Levi estava preocupado.
— Se eu disser, você vai me perdoar?
— Porra! Essa mulher sabe negociar. Eu te venero, Briana! — Diego
riu e Levi arqueou uma sobrancelha, saindo de perto da parede e
cambaleando.
— Posso pensar no seu caso. Vem aqui comigo.
— Olha o tamanho da barriga dela, cara. Não dá pra transar no
chuveiro — Diego disse. — E me respeite, porra!
Minha nossa, era melhor eu me afastar, antes que perdesse a cabeça e
acabasse entrando naquele box com um Levi completamente nu e bêbado.
Resolvi deixar os dois sozinhos quando Diego fechou o chuveiro e fui para o
quarto, encontrando Malu na porta, prestes a entrar. Ela carregava uma xícara
fumegante de café preto.
— Ele está melhor?
— Não sei dizer. — Fui sincera, porque Levi bêbado era uma
incógnita. Pouco mais de cinco minutos depois, Diego saiu com ele já
vestido, e o levou até a cama. Tomando a xícara da mão de Malu, me
aproximei. — Beba um pouco, Levi.
Ele tomou a xícara da minha mão e fez uma careta depois de dar o
primeiro gole, mas acabou tomando mais um pouco, bem devagar. Seus olhos
pareciam mais vivos do que antes, mas ainda estavam pesados e inchados.
Era como se ele tivesse chorado e aquilo me fez sentir um aperto no peito.
— Vocês podem ir, se quiserem. Eu sigo daqui — falei, virando-me
para Diego e Malu parados lado a lado. Soltando um suspiro, Diego assentiu.
— Ok, qualquer coisa, é só me ligar. Você está se sentindo bem?
— Sim. Obrigada por ficar com ele, Diego, de verdade.
— Eu amo esse idiota e ele precisava de companhia para encher a
cara e ser trazido para casa em segurança.
Fiquei muito feliz por Levi ter Diego em sua vida. Eles eram irmãos
de alma, assim como Malu e eu. Por falar nela, logo senti seus braços ao meu
redor e sua voz sussurrando em meu ouvido:
— Não se aproveite do corpinho bêbado dele, ok?
— Ah, pode deixar! — Eu ri daquela doida. Como se eu tivesse
condições físicas de me aproveitar de alguém. Levi e eu só transávamos de
conchinha agora, porque minha barriga me impedia até mesmo de ver a
minha vagina.
Fui com eles até a sala e abri a porta, me despedindo dos dois, que,
como vinha acontecendo ultimamente, nem começaram a brigar. Enquanto se
afastavam no corredor, ouvi Diego perguntar a Malu:
— Pode me dar uma carona, gatinha?
Eu ri baixinho, curiosa pela resposta dela. Malu pareceu suspirar,
resignada.
— Você não tem o aplicativo do Uber no seu celular?
— Sim, eu tenho, mas nenhum motorista vai ser você...
Acho que eles entraram no elevador, pois não consegui ouvir mais
nada. No fundo, eu sabia que Malu daria uma carona para ele. Nervosa,
fechei a porta e passei a mão pelo pijama que havia colocado antes de ligar
para Malu, sem saber ao certo como encarar Levi. Ainda que ele estivesse
bêbado e soltando piadinhas, tinha certeza de que ainda estava muito
magoado comigo. Respirando fundo, voltei para o quarto e o encontrei
recostado à cabeceira de olhos fechados, segurando a xícara vazia. Achei que
estivesse cochilando e fui tirar a xícara de suas mãos, mas ele acabou abrindo
os olhos e me encarou um pouco mais sóbrio do que antes de eu sair do
quarto.
— Deite-se um pouco, Levi. Quer água?
— Não.
Sua voz saiu em um sussurro e eu engoli em seco, me dando conta de
que ele parecia um menino vulnerável daquele jeito, com os olhos pesados e
brilhando, a voz baixa e contida. Deixei a xícara em cima da mesinha de
cabeceira e me sentei ao seu lado, tomando sua mão na minha. Meu coração
despencou no peito quando ele a afastou.
— Levi...
— Você quer que eu vá embora? — Sua pergunta me pegou
completamente de surpresa e um nó intenso se formou em minha garganta. —
Quer que eu vá embora da sua vida?
— Não, Levi, nunca! — Respondi tão rápido, que quase perdi o
fôlego. Mesmo com medo de que ele largasse a minha mão, peguei a sua de
novo e entrelacei nossos dedos. — Por favor, não pense isso nem por um
segundo.
— Mas você não confia em mim...
— Claro que eu confio.
Seus olhos encontraram os meus e senti meus lábios tremerem, uma
vontade imensa de chorar tomando conta de mim. Aquela dor chata em
minhas costas se intensificou e chegou no pé da minha barriga, mas eu engoli
em seco a sensação, sem desviar os olhos dos dele.
— Meu pai me ligou — ele revelou de repente, me pegando de
surpresa.
— Ligou? Quando?
— Hoje, quando estava no bar. Ele sabe que vou ser pai, minha mãe
contou. E ele me pediu perdão por tudo que fez, mas não esperou que eu o
perdoasse. Talvez um dia eu o perdoe, Bri.
Eu assenti, entendendo. Era óbvio que sua mágoa pelo pai não iria
desaparecer só porque o homem lhe pediu perdão, mas, e sua mágoa por
mim? Será que ela iria sumir algum dia?
— Espero que um dia você possa me perdoar também —
confidenciei, sentindo as lágrimas caírem pelo meu rosto.
Surpreendendo-me, Levi encostou a testa na minha e respirou fundo,
tocando o nariz com o meu.
— Me pergunte isso amanhã e eu acho que vou ter uma resposta para
te dar.
Meu coração acelerou com esperança e ansiedade e um suspiro
escapou dos meus lábios quando ele me deu um selinho demorado, com gosto
de dor e amor, de mágoa e tristeza, mas também de expectativa. Eu me
agarrei àquele beijo como se fosse a minha tábua de salvação.
No fundo, eu sabia que realmente era.
Puta. Merda.
Um pedreiro muito filho da puta parecia martelar a minha cabeça com
uma marreta e um enjoo quase me fez ofegar, levando a bílis à minha
garganta. Tentei engolir um pouco de saliva, mas a boca seca me impedia de
fazer qualquer coisa e o meu corpo doía como se um caminhão tivesse me
atropelado. Respirando fundo, tomei coragem para abrir os olhos e agradeci
internamente por encontrar o quarto na penumbra, com a luz do céu mal
conseguindo passar pelas frestas da cortina rosa.
Cortina rosa?
Demorei meio segundo para entender que eu estava no quarto de
Briana e não no meu. Porra, como vim parar aqui? Fechei os olhos quando
minha cabeça latejou assim que os flashes de memória me assaltaram.
Lembrei-me de entrar no bar, começar a encher a cara, conversar com Diego.
Então, veio a ligação do meu pai. Infelizmente, também conseguia me
lembrar de cada uma das suas palavras. Depois disso, era tudo um borrão. Eu
bebendo e chorando, Diego pagando a conta, a gente entrando no elevador e,
depois, Briana abrindo a porta. Em seguida, nós dois em sua cama. Falei
alguma coisa séria, pois ela chorou, mas não conseguia me lembrar do que
era.
— Que merda — gemi, virando-me de lado e encontrando seu lugar
vazio.
Ignorando a dor chata no meu corpo, proveniente da ressaca, sentei-
me na beirada do colchão e peguei meu celular na mesinha de cabeceira,
vendo que passava um pouco das nove da manhã. Pelo menos era domingo e
eu não precisaria me preocupar em ir trabalhar. Pensei em chamar por Briana,
mas achei que seria melhor apenas me levantar, vestir minhas roupas e
encontrá-la na sala ou na cozinha, onde provavelmente deveria estar. Não
sabia ao certo o que dizer a ela nem se estava pronto para conversar, mas
deixaria para decidir isso quando tivesse que encará-la.
Sentindo vontade de mijar, fui em direção ao banheiro, mas só quando
me aproximei da porta entreaberta, que consegui ouvir o barulho do chuveiro,
indicando que Briana não estava na sala ou na cozinha. Será que eu deveria
aproveitar a oportunidade e sair de fininho, sem falar com ela? Talvez fosse
melhor. Não queria falar nada naquele momento, estava morrendo de ressaca
e sabia que iria apagar de novo assim que tomasse um banho e duas aspirinas.
No entanto, nunca fui covarde e, se bati em sua porta ontem à noite, o
mínimo que poderia fazer era me despedir antes de ir embora. Respirando
fundo, abri a porta e a encontrei dentro do box, que estava com a porta de
vidro entreaberta. Suas mãos estavam abertas de encontro aos azulejos e a
testa encostada na parede. O banheiro estava coberto pela fumaça, por conta
da água quente que caía direto em suas costas.
— Bom dia — saudei, sem saber ao certo o que falar. Senti Briana se
sobressaltar, mas não se virou para me olhar.
— Bom dia — respondeu baixinho e eu olhei novamente para ela. O
torpor da ressaca finalmente me deixando perceber que aquela sua posição
era muito esquisita. Um alerta soou em minha mente:
— Briana, está tudo bem?
Ela suspirou e esperei que me respondesse, mas tudo o que saiu da
sua boca foi um soluço e, então, ela se curvou.
— Ai, meu Deus... — O som de sofrimento que escapou pelos seus
lábios me fez invadir o box com tudo, mal notando a água molhar as minhas
pernas.
— Briana! O que foi? O que você está sentindo? — perguntei,
tocando em suas costas e em sua barriga. A forma como estava rígida me fez
arregalar os olhos. — Meu Deus. Briana, fala comigo!
— Calma... Respira...
— Respira? O quê? O que está acontecendo? A bebê está nascendo, é
isso? — Esperei, mas ela apenas respirou fundo. — Briana, fala alguma
coisa!
Estava quase puxando seu rosto e virando-a para mim, quando seus
olhos cheios de lágrimas finalmente encontraram os meus. Ela não precisou
dizer nada, ali mesmo eu entendi tudo.
— As contrações estão vindo de meia em meia hora — ela respondeu
com uma tranquilidade que quase me matou. Parecia que sequer estava
sentindo dor há menos de um minuto. — Acho que a gente já pode ir para o
hospital.
Eu hiperventilei.
— O quê? Como assim? Como que... Desde quando você está
sentindo dor?
— Desde ontem à noite.
Ontem à noite. Ontem à noite, enquanto eu estava em um bar
enchendo a cara. Puta que pariu!
— Por que não me disse?
— Porque estava bem fraca, era só uma pressão nas costas que se
estendia para a barriga... Depois que você dormiu, é que ela começou a ficar
mais forte e, de madrugada, entendi que eram contrações. Estou conversando
com a médica por mensagem e...
— Espera, você está sentindo dor durante todo esse tempo e não me
acordou? — perguntei, chocado e, porra, ficando bravo pra caralho. Briana se
encolheu um pouco e fiquei com medo de ser outra contração, mas logo
percebi que não era.
— Eu tentei, mas você não acordou.
Minha boca caiu aberta e depois a fechei, sem palavras, com um
monte de sentimento me corroendo. Briana estava sentindo dores e eu não
acordei. Não acordei porque estava bêbado como a porra de um gambá! Que
tipo de pai — de homem — merda eu era?
— Levi... — Briana tomou a minha mão e, só naquele momento,
percebi que eu havia dado um passo para trás. — Está tudo bem. A dor não
estava muito forte e vinha de uma em uma hora. Não fica assim.
— Não importa. Eu te deixei sozinha.
— Não deixou, você estava do meu lado o tempo todo.
— Não! Eu estava apagado, Briana! E se você precisasse de mim? E
se a bebê nascesse de repente?
Porra, eu a havia mandado embora ontem, depois da nossa discussão,
e nem passou pela minha cabeça que ela já estava com nove meses e que a
bebê poderia nascer a qualquer momento! E se isso tivesse acontecido
enquanto eu estava no bar, bebendo? E se eu tivesse ido para casa, ao invés
de passar a noite aqui? Eu prometi que não a deixaria sozinha!
— Olha para mim — Briana pediu, segurando meu rosto com as duas
mãos. — Eu só fiquei tranquila, porque você estava comigo. Se eu realmente
estivesse sentindo muita dor ou prestes a parir, eu sabia que você iria acordar.
Você não me deixou sozinha, Levi.
— Eu deixei — sussurrei, puxando-a para mim. Toquei minha testa
na dela, ficando encharcado, sentindo sua barriga dura contra o meu abdome.
— Te deixei sozinha ontem, quando te mandei sair.
— Eu mereci aquilo.
— Não. Ainda que eu estivesse chateado, não poderia ter deixado
você sozinha, nunca. Eu prometi que estaria com você e qual foi a primeira
coisa que fiz logo após a nossa primeira briga? Virei as costas, Bri. Não
cumpri com a minha palavra, fui um idiota.
— Você não me virou as costas. Você teria feito isso se não tivesse
voltado, mas você voltou, Levi — ela sussurrou e senti sua voz embargada.
— Mesmo magoado comigo, bêbado, você voltou. E eu deveria saber que
você jamais me deixaria, que jamais deixaria a minha filha, porque você é
diferente de qualquer outro homem que já conheci. Você cumpre cada uma
das suas promessas e esse é só um dos motivos pelo qual eu te amo.
Briana soluçou e eu me afastei um pouco, com medo de que fosse a
dor, mas vi que não era. Ela estava chorando sim, mas era por minha causa.
Por nossa causa. Seus dedos desenharam o meu maxilar e eu senti meus
olhos ficarem rasos d’água.
— Eu te amo muito, Levi. Eu amo seu coração enorme, sua gentileza,
sua lealdade, sua cumplicidade. Amo o seu sorriso, esse seu corpo
maravilhoso — ela riu em meio às lágrimas —, seus braços fortes que sempre
estão prontos para me amparar, seus olhos verdes que me encantaram desde a
primeira vez. E amo, acima de qualquer coisa, o homem incrível que sempre
foi para mim e o melhor pai do mundo que eu sei que você vai ser para a
nossa filha, porque você tem razão, ela é nossa. Ela sempre foi nossa.
Meu coração parecia que ia saltar da caixa torácica e sair quicando
pelo chão, enquanto eu ouvia cada uma das suas palavras e sentia, pouco a
pouco, a mágoa indo embora. Eu sempre acreditei que palavras eram muito
pouco perto de atitudes, mas, naquele momento, as palavras de Briana me
fizeram acreditar em cada um dos seus sentimentos, porque eu os via
refletidos em seus olhos cheios de lágrimas, em sua expressão emocionada.
Fungando, ela continuou:
— Eu não quero te perder. Eu não posso... — Ela parou para
recuperar o fôlego e eu a sustentei, esperando que dissesse tudo o que tinha
para dizer. — Eu não posso perder você, Levi. Eu sinto muito por tudo o que
falei ontem, por ter, ao menos por um segundo, duvidado de você e dos seus
sentimentos. Talvez você mereça uma mulher melhor e mais confiante de si
mesma, porque, no fundo, eu sempre acreditei em você e cada uma das
minhas inseguranças tinha muito mais a ver comigo. Nunca foi com você,
Levi. Nunca. — Seus olhos marejados encontraram os meus e eu contive a
respiração, completamente apaixonado por aquela mulher. — Você pode me
perdoar?
Tomei seu rosto em minhas mãos, olhando bem fundo em seus olhos
castanho-escuros, quase pretos, que emolduravam aquele rosto tão lindo. Por
fim, respondi:
— A única mulher que importa para mim, a única que merece o meu
coração e todo o meu amor, é você. Sempre foi você, desde a primeira vez em
que te vi. — Ela ofegou, desbando em lágrimas, mas eu a amparei e reforcei:
— E eu prometo, Briana, do fundo da minha alma, que nunca mais haverá
motivos para você desconfiar disso ou de si mesma. É aqui que eu quero
ficar, ao seu lado, ao lado da nossa filha, para sempre. Eu te amo, Bri. Eu te
amo profundamente e sempre vou amar.
— Eu sempre vou te amar — ela sussurrou de volta, conseguindo
ficar nas pontas dos pés para me abraçar pelo pescoço. — Sempre, Levi. Eu
prometo.
Naquela promessa eu acreditaria, porque sabia que Briana iria
cumprir. Com seu rosto em minhas mãos, eu a beijei delicadamente, sentindo
minha alma renovada, o peso da mágoa finalmente deixando os meus
ombros. Era aqui que eu pertencia e eu não iria embora. Nunca mais iria
embora. Quase senti meu pau ficar duro, doido para selar aquela conversa
fazendo amor com a minha mulher, mas, então, ela se retesou e um gemido
doloroso saiu da sua boca. Ah, porra, a bebê estava nascendo! Quase me
esqueci daquilo.
— Contração. Ai, ai...
Eu a amparei, um pouco desesperado, porque não tinha muito o que
fazer. A parte de ruim de ser pai era que a gente não podia sentir a dor pela
nossa mulher. Briana ficou daquele jeito por longos segundos,
choramingando e fazendo careta, até que a contração foi embora e ela
conseguiu voltar a ficar ereta, respirando devagar.
— Vamos para o hospital — decidi, fechando o chuveiro. — Vai ficar
tudo bem, ok? Vou ficar com vocês o tempo todo.
— Eu sei. Nós amamos você.
— Não mais do que eu amo vocês.
Fomos para o hospital enquanto Briana anunciava para todo mundo
por mensagem que a bebê estava prestes a nascer. Eu não conseguia entender
muito bem como ela poderia estar tão tranquila enquanto eu tremia de
nervoso, mas, segundo ela, enquanto a contração não vinha, tudo se
acalmava. Resolvi acreditar, já que era ela quem estava sentindo tudo e não
eu.
Ok, talvez eu devesse ser sincero comigo mesmo. Eu também sentia
muita coisa. Inclusive, estava começando a achar que a dor que sentia pelo
corpo era culpa da tensão pelo parto e não da ressaca, que agora estava
esquecida. Dei entrada na internação de Briana e sua médica e a doula[5]
chegaram minutos depois de entrarmos no quarto, que era todo equipado para
o parto natural. Havia uma sala pequena assim que entrávamos, em seguida,
vinha o quarto em si, com uma piscina inflável cheia de água quente. A
primeira coisa que a médica fez foi medir a dilatação de Briana e eu fiquei
chocado quando ela disse que Briana estava dilatada em sete centímetros. Era
preciso que chegasse em dez para nascer.
Antes que ela tivesse mais uma contração — essa parte me matava e
precisei dirigir bem devagar, pois ela teve duas a caminho do hospital —, a
acompanhei até a piscina e me agachei do lado de fora, tocando sua barriga
por baixo d’água. Estávamos sozinhos no quarto, mas eu já conseguia ouvir
vozes do lado de fora.
— Tudo bem? — perguntei pela décima quinta vez e ela riu.
— Tudo ótimo. Não poderia ser diferente, já que você está aqui
comigo.
— Eu não estaria em outro lugar.
— Não duvidei disso nem por um segundo, mas estou querendo dizer
sobre você estar comigo, amor — murmurou e eu finalmente entendi.
Contudo, acabei reforçando:
— Eu não estaria em outro lugar. Nunca.
Ela sorriu, emocionada, e senti que a nossa briga havia acontecido a
milhões de anos atrás, pois, neste momento, não havia espaço para qualquer
sentimento ruim. Briana me beijou, mas se afastou quando veio outra
contração e deixei que apertasse a minha mão enquanto se contorcia, a
barriga ficando cada vez mais dura. Beijei sua testa e esperei com ela,
acariciando sua barriga com a mão livre e sussurrando em seu ouvido que
faltava muito pouco. Logo teríamos a nossa princesa nos braços.
Todo mundo chegou e falou com Briana. Percebi que Malu e Diego
logo entenderam que estávamos bem e não tocaram no assunto da briga. Em
algum momento, Briana sentiu fome e conseguiu comer, mas, no início da
tarde, ela começou a mudar, ficando mais calada, concentrada, e a doula
alertou que estava chegando a hora. Após mais um toque, a doutora concluiu
que Briana havia chegado à dilatação máxima e eu senti o meu mundo
começar a mudar.
Foi aos poucos, mas, assim como Briana, eu senti a nossa filha
chegar. As vozes diminuíram e, com Briana em meus braços, nós dois dentro
da piscina, entramos numa bolha que só nós dois entendíamos. Mal percebi
quando apenas sua mãe ficou no quarto, sentada ao nosso lado em uma
cadeira, junto com a doula, que observava o que acontecia no meio das
pernas de Briana, e a médica, que monitorava tudo. Bri chorou de encontro
ao meu peito, se retesou em várias contrações e eu a segurei com cuidado,
sentindo dentro de mim a mudança nítida.
Eu não era mais o Levi de meia hora atrás. Estava me tornando pai e
desejava que cada homem no mundo aproveitasse aquela experiência, que
abraçasse aquele sentimento, que se permitisse amar sem limites a criança
que ajudou a formar. Com dor, Briana ficou de joelhos e, com a ajuda da
doula, me coloquei à sua frente, com as mãos no meio das suas pernas. Foi
então que eu senti a cabecinha bem ali, saindo aos poucos, enquanto Briana
grunhia e chorava, dando tudo de si para dar à luz a nossa filha.
E assim, tendo uma mãe que era uma leoa, ela veio direto para as
minhas mãos.
Segurei minha filha e foi como estar segurando o meu coração. Nada
no mundo foi mais importante do que aquele momento. Chorei junto com
Briana e, com o peito recheado de emoção, tirei nossa bebê de dentro da
água, amparando-a em meus braços antes de colocá-la sobre o peito da mãe.
O choro da princesinha tomou conta do quarto e Briana se recostou contra o
meu peito, emocionada, agradecendo a Deus por aquele momento. Eu
também agradeci, sem saber ao certo o que eu havia feito de tão bom para
merecer vivenciar aquela alegria.
— Ela é sua — Briana disse em meio às lágrimas e eu assenti,
beijando sua testa.
— Claro que ela é minha. Sempre foi, Bri, independente de qualquer
coisa.
— Eu sei, mas ela é sua, Levi — disse com mais ênfase, me
encarando antes de voltar a olhar para a bebê. — Veja os olhos dela.
Foi então que eu finalmente enxerguei. A bebê, que ainda resmungava
baixinho, sem entender o que acontecia ao seu redor, tinha os olhos
levemente abertos. Olhos claros e, ainda que não tivessem um verde definido,
estava muito claro que eram como os meus. A sensação de pertencimento
sempre existiu em meu peito e eu sabia que, mesmo se ela não fosse minha
biologicamente, ainda assim, seria minha filha. E, agora, eu só tinha certeza
disso. Ela era minha. Sempre foi minha, assim como Briana também era.
Minhas. Minhas mulheres, os amores da minha vida.
— Eu amo vocês — sussurrei, mal conseguindo conter a minha
felicidade enquanto tocava os cabelos escuros dela, como os de Briana.
— Eu amo muito vocês. Para sempre, Levi.
— Para sempre, Briana.
Um mês depois...
Despertei de repente, sentindo a luz do sol tocar as minhas pernas fora
da coberta e precisando piscar pelo menos duas vezes até me acostumar com
a sua claridade inundando o quarto. Meus seios estavam doloridos,
provavelmente porque estava na hora de dar de mamar e, ao meu lado, a
cama estava vazia. Acabei sorrindo, pois tinha certeza de onde Levi estava.
Exatamente por isso, não fiz nada correndo, fui até o banheiro e levei o meu
tempo para fazer xixi e escovar os dentes, aproveitando aquele início
tranquilo de manhã, antes de ir até o quarto ao lado e encontrar a mesma cena
que sempre aquecia o meu coração.
Lá estava Levi, usando apenas uma calça do pijama, de frente para a
janela, com nossa filha no colo. Ele havia depilado todo o peito apenas para
ter com ela aquele contato corporal — pois leu em algum lugar que era
importante que o pai criasse aquele vínculo especial com a criança, assim
como a mãe o fazia ao amamentar — e era impressionante como nossa filha
se acalmava assim que sentia que estava em seu colo. Ela não era uma
criança agitada, mas toda vez que chorava, Levi era o único que conseguia
acalmá-la. A ligação que os dois tinham me emocionava, como agora. Eu
sempre ficava com um nozinho na garganta e os olhos marejados ao vê-los
juntos. Encostei-me no batente da porta, sem querer atrapalhar os dois, e pude
ouvir Levi cantar:
Nas ruas de outono
Os meus passos vão ficar
E todo o abandono que eu sentia vai passar
Ele sempre cantava para ela e nem sempre era uma música infantil.
Eu podia jurar que, a cada canção escolhida, ele estava se declarando, como
agora. Só quem conhecia sua história entenderia a profundidade daquela letra,
o que realmente significava.
Eu voltei por entre as flores da estrada
Pra dizer que sem você não há mais nada
Quero ter você bem mais que perto
Com você eu sinto o céu aberto[6]
Precisei fechar os olhos por um segundo. Realmente precisei fazer
isso para agradecer, pelo que poderia ser a milionésima vez, os dois presentes
mais incríveis que Deus poderia me dar. Um dia, achei que ter Levi ao meu
lado era um golpe de sorte, mas agora eu sabia que não era sorte, foi Deus
que me abençoou. Ele viu alguma coisa em mim que merecia ter aquele
homem, que merecia ser a mãe da sua filha, e me deu os dois. E eu jamais os
perderia. Abri os olhos ainda marejados e encontrei Levi olhando para mim,
um sorriso brincando em seus lábios enquanto mantinha uma mão sob o
bumbum da nossa filha e a outra em suas costas. Meu Deus, suas mãos eram
tão grandes que quase tampavam a criança.
— Vem cá — me chamou baixinho e é claro que eu fui correndo, me
acomodando embaixo do seu braço e encostando meu rosto do lado direito do
seu peito. Nossa bebê sempre dormia rapidinho quando ficava deitada do
lado esquerdo, ouvindo as batidas do seu coração. — Estava dormindo de pé?
— Ele riu baixinho.
— Não. Estava conversando com Deus.
— É mesmo? E estava pedindo o quê? Mais um filho meu? —
cochichou como se estivesse falando alguma putaria e não quisesse que a
bebê ouvisse. Precisei rir daquilo.
— Não, por favor. Posso aproveitar a minha primeira filha antes de
você me engravidar de novo?
— Não sei, vamos ver hoje à noite. — Sua mão desceu pelas minhas
costas até parar sobre a minha bunda, dando um apertão que me fez ofegar.
— Um mês. Ainda não acredito que sobrevivi a isso.
— Nem eu — confidenciei, cheia de saudade dele.
Claro, a gente tinha brincado uma vez ou outra debaixo do chuveiro,
mas não era a mesma coisa. Até pensei que passaria tranquila pelo mês do
resguardo, pois muitas mulheres reclamavam de dor e cansaço, mas eu tive
um pós-parto muito tranquilo e tinha um homem como Levi ao meu lado. Era
impossível não sentir tesão por ele. Tinha vontade de devorá-lo.
— Eu estava agradecendo a Deus por ter vocês dois em minha vida —
falei, erguendo meu rosto para encontrar os olhos de Levi.
— Eu também agradeço todos os dias. Você e Ana Vitória são tudo o
que sempre quis, mesmo quando não sabia que as queria.
Era muito fácil sentir vontade de me debulhar em lágrimas de emoção
com aquele homem, mas, ao invés disso, fiquei nas pontas dos pés e dei um
beijo em sua boca, ouvindo nossa filha começar a choramingar,
provavelmente de fome, pois nada no mundo além disso fazia com que ela
quisesse sair do colo do pai. Afastando-me, me sentei na poltrona de
amamentação e Levi a colocou em meus braços. Em poucos segundos, ela já
estava abocanhando o meu mamilo e pousando a mão pequenininha sobre o
meu seio. Ela sempre fazia isso e meu coração disparava mesmo assim a cada
vez que acontecia.
A nossa conexão era tão intensa quanto a dela e a de Levi. Eu a
entendia apenas com um olhar. Passei a mão em seu cabelo preto e sedoso,
contornei sua testa com a pele delicada e alguns tons mais clara do que a
minha, até que ela abriu um pouquinho os lindos olhos verdes e me encarou
por um longo tempo, piscando os cílios grossos e imensos como os de Levi.
A boquinha dela também era idêntica a dele. Eu gerei a criança por nove
meses para ela vir mais parecida com o pai do que comigo, mas aquilo só me
deixava cheia de alegria.
Levi nos deu um beijo e disse que iria preparar o nosso café da
manhã, enquanto nossa bebê tomava o dela em meu seio. Ana Vitória agarrou
meu dedo quando o coloquei embaixo da sua mãozinha e foi impossível não
rir baixinho ao me lembrar da loucura que foi para decidir o seu nome. Levi e
eu queríamos juntar os nossos nomes, só para continuar a tradição que nossos
pais inventaram — ainda que o seu pai não merecesse ser mencionado —,
mas não tinha como. Qualquer mistura com Levi e Briana ficava muito ruim,
até que o nome Ana Vitória surgiu e percebemos que ele ia muito além de
nós dois, pois homenagearia, também, as nossas mães — Analídia e Vitória.
Logo percebemos que não tinha nome melhor no mundo e, quando contamos
para elas, as duas choraram como um bebê.
Ana Vitória era rodeada de amor. Paparicada pelas cinco avós, pelo
avô babão, pelos tios, pelos padrinhos, pelos vizinhos, até mesmo pelo
porteiro. E era uma criança muito simpática, apesar de ainda passar muito
tempo dormindo. Eu mal podia esperar pelo futuro, quando ela começasse a
crescer. Sabia que minha filha seria uma criança excepcional e eu sempre
seria a sua melhor amiga.
Terminei de colocar o último presente que Aninha — tinha que
confessar, apesar do nome lindo, logo demos a ela um apelido — ganhou
dentro do baú perto da mesa pequena e toda enfeitada de arco-íris e
unicórnio, feliz por estarmos comemorando o seu primeiro mês de vida. A
sala do meu apartamento estava cheia com os nossos convidados e pude ver
Aninha no colo de Miriam, que só faltava babar em cima da criança. Podia
até jurar que ela estava menos ranzinza desde que a bebê nasceu. Aninha era
o xodó da família. Estava prestes a me aproximar das duas, quando ouvi o
som da música diminuir na sala e a voz de Levi se sobressair a dos
convidados. Sem entender nada, procurei-o com o olhar e o encontrei
caminhando em minha direção, com aquele sorriso charmoso que me deixava
de pernas bambas. Fiquei tentada a olhar rapidinho para o relógio, só para
saber se faltava muito tempo para cortar o bolo, expulsar todo mundo e dar
para ele em nosso quarto.
Meu Deus, eu era uma tarada!
— Gostaria de um minuto da atenção de vocês — ele pediu, mas não
tirou os olhos de mim. — Quer dizer, talvez demore um pouco mais do que
um minuto, mas vai valer a pena.
— O que você está fazendo? — perguntei baixinho, querendo rir de
nervoso. Não estava entendendo nada. Pensei que Levi responderia a minha
pergunta, mas ele apenas sorriu e pegou em minha mão.
— É engraçado como a vida arruma um jeito estranho de cruzar os
caminhos das pessoas. Eu consigo me lembrar nitidamente de que, na noite
em que nos conhecemos, eu não estava muito a fim de ir para uma boate, mas
fui porque queria dar uma força para aquele idiota ali. — Ele apontou para
Diego, que estava parado ao lado de Malu.
— Não precisa agradecer, irmão. Sempre soube que a minha missão
na vida era arranjar uma gata pra você.
Todo mundo riu, mas Levi logo voltou a me encarar, falando assim
que as risadas cessaram:
— Nunca imaginei que encontraria a mulher da minha vida naquela
noite, mas, assim que te vi, assim que falei com você, soube que era
diferente. Depois de passarmos a noite juntos... — Meu pai pigarreou forte
demais e eu revirei os olhos, sentindo meu coração disparar, enquanto ouvi a
risada de todos mais uma vez. Levi deu a ele um sorriso sem graça, mas logo
voltou a falar: — Você sumiu e eu pensei que tinha perdido a minha grande
chance, mas, então, a reencontrei. E algo dentro de mim me alertou que eu
não deveria te deixar escapar, apesar de você ter batido com a porta na minha
cara depois da nossa primeira conversa.
— Me desculpe por isso — pedi baixinho, rindo.
— Você poderia bater quantas portas quisesse na minha cara, meu
bem. Eu jamais iria embora. Eu nunca vou embora — reforçou o que sempre
me dizia e eu acreditava em sua palavra cegamente. — Eu sei que
começamos tudo ao contrário. Primeiro ficamos juntos por uma única noite,
semanas depois nos reencontramos, eu te engravidei, indo contra todas as
possibilidades e, então, ficamos juntos, mas eu quero mais. Eu quero muito
mais do que ser apenas o seu namorado ou o pai do seu bebê. Eu quero ser
seu, Bri, e quero muito que você seja minha.
Levi soltou a minha mão e, sem que eu esperasse, se ajoelhou aos
meus pés. Pude ouvir os gritinhos ensandecidos das mulheres, mas nada me
fez tirar os olhos dele. Minha boca caiu aberta quando Levi tirou uma
caixinha de veludo do bolso e levantou a tampa, mostrando-me um anel
maravilhoso.
— Quero que seja minha esposa. Aceita se casar comigo, meu amor?
— Sim! — gritei, sem ao menos precisar de um tempo para pensar. —
Sim, sim, ai, meu Deus, com certeza é sim!
Rindo, Levi colocou o anel em meu dedo e se levantou, pegando-me
em seus braços e me girando no meio da sala, enquanto eu gargalhava de
emoção e chorava ao mesmo tempo. Ouvi todo mundo bater palmas e
assobiar, mas não foi o suficiente para me fazer largar aquele homem, muito
menos me impediu de dar um beijo em sua boca. Levi retribuiu e me fez
perder o fôlego. Eu podia sentir seu coração batendo tão forte quanto o meu.
— Eu te amo, seu doido!
— Não mais do que eu te amo, meu bem.
Ele se afastou no momento em que todo mundo veio nos abraçar e
desejar felicidade. Eu me sentia nas nuvens, tão feliz que mal podia acreditar
que aquela realmente era a minha vida.
Um ano depois...
Ajeitei a flor branca enfiada no bolso do meu paletó, sentindo meus
dedos tremerem de leve. Minha mãe havia acabado de sair do quarto, então,
eu estava completamente sozinho, junto com o meu nervosismo. Eu iria me
casar. Porra, iria me casar! Mal podia esperar para ver Briana no vestido de
noiva. Só em pensar nisso, meu coração disparava e meu pau começava a
ficar duro. Talvez eu também estivesse ansioso pelo momento de tirá-la de
dentro do vestido e fazer amor com ela. A danada havia saído bem cedo de
casa para fazer um SPA junto com todas as mulheres e Aninha, me deixando
sozinho e com uma ereção gigantesca pela manhã.
Olhei rapidamente em volta, aproveitando um pouco do silêncio e
sentindo seu cheiro por todo o lugar. Meses atrás, fizemos uma grande
reforma e juntamos os nossos apartamentos — logo depois de ter me tornado
proprietário do lugar onde morava — transformando-o em um só. Malu fez o
projeto junto com Diego — precisava ressaltar que o ódio dos dois havia se
transformado em amor, pois agora eram um casal — e agora nossa casa tinha
três quartos, uma sala enorme, uma cozinha grande e uma varanda
aconchegante. Era um lugar maravilhoso e do qual eu me orgulhava. Uma
conquista minha e de Briana.
Distraído, só percebi que meu celular estava vibrando com uma nova
mensagem quando coloquei as mãos no bolso para poder dar uma olhada no
meu corpo inteiro na frente do espelho. Curioso, peguei o aparelho, já
pensando que poderia ser Briana querendo me provocar, mas senti um baque
ao ler o nome de duas pessoas com quem eu não falava há mais de um ano.
Gustavo e Leone, meu pai. Por um momento, pensei em não ler.
Aquele era para ser um dos dias mais felizes da minha vida, não queria me
estressar, no entanto, eu sentia que para dar aquele passo tão importante, eu
precisava fechar esses dois ciclos. Aquela era uma oportunidade. Sem pensar
duas vezes, cliquei na mensagem do meu antigo amigo e comecei a ler o que
me escreveu.
“Levi, soube que vai se casar hoje e fiquei me perguntando se eu
deveria ou não te enviar essa mensagem. Não quero atrapalhar o seu
momento de felicidade e vou entender se deixar para ler o que estou
escrevendo depois (ou se nunca quiser ler), mas eu precisava falar com
você.
Sei que nada no mundo justifica todas as besteiras que te falei no
passado. Preciso confessar que me arrependi assim que saí do seu
apartamento naquele dia, pois sabia que havia acabado de atrapalhar o
seu relacionamento com Briana. Quis me desculpar antes, mas, então,
soube que a bebê nasceu e, bem... Não tive coragem de ir falar com você.
Fiquei com vergonha do que fiz, mas, acima de qualquer coisa, fiquei
com vergonha de mim mesmo.
A verdade, era que antes mesmo de você contar que iria ser pai,
eu já sabia que eu era pai. Sim, você não leu errado. Meses antes de você
conhecer a Briana, uma garota com quem eu estava ficando me contou
que estava grávida de um filho meu e eu não acreditei. Não quis aceitar a
possibilidade de que aquela criança poderia ser minha. Como o bom
covarde que sou, fugi e fiz de tudo para esquecer esse assunto. Como se
isso não bastasse, ainda tive a coragem de falar para você, naquela
conversa no chiqueiro, que se eu estivesse em seu lugar, assumiria o filho
se fosse meu, mas não foi isso que fiz.
Durante meses, eu neguei a existência daquele bebê, Levi, e ficava
puto em ver que você estava lidando muito bem com o que estava
acontecendo em sua vida. A bebê que Briana carregava poderia não ser
sua filha e você queria assumi-la, enquanto eu sequer queria pensar na
possibilidade de aquela criança ser minha. Ou seja, eu sentia raiva
porque você não se comportava como eu. Eu queria que você agisse como
eu estava agindo e isso era loucura, cara, porque você é um homem
infinitamente melhor do que eu era.
Eu sempre tive pais amorosos, o seu pai era um merda. Ainda
assim, de nós dois, você era o que estava abraçando a ideia de ser pai,
enquanto eu estava fugindo. Depois de tudo o que falei em seu
apartamento, me obriguei a colocar a cabeça no lugar e entendi que eu
não poderia mais agir daquela forma. Não poderia mais ser um covarde.
Mal conseguia dormir pensando naquela criança. Peguei meu celular e,
pela primeira vez, liguei para Marcela para saber se estava tudo bem e,
claro, ela desligou na minha cara.
Entrei nas redes sociais dela e descobri que estava bloqueado de
tudo. Àquela altura, eu sabia que o bebê já tinha nascido e eu sequer
fazia ideia se era menino ou menina, se estava bem ou não, se precisava
de alguma coisa. Nunca me senti tão culpado na vida e resolvi correr
atrás, Levi. Sei que não nos falamos há mais de um ano, que saí do
chiqueiro, porque os meninos também estavam decepcionados comigo,
mas preciso que saiba que conviver com você me ajudou a ter clareza e
mudar as minhas atitudes.
Com muito esforço, consegui me aproximar de Marcela e, agora,
sou pai de um menino de quase três anos. Ele é lindo, se chama João
Marcelo, e é tudo o que eu nem sabia que precisava. Sou grato a Marcela
por ter sido uma ótima mãe e, agora, me esforço para ser o melhor pai.
Sou presente na vida dele e o amo com todo o meu coração.
Por isso que resolvi mandar essa mensagem para você. Eu espero
que exista mais homens no mundo como você e não como eu. Quem dera
Marcela tivesse recebido o meu apoio desde o começo, tenho certeza de
que tudo seria diferente. Pelo menos eu aprendi a lição e, hoje, meu
objetivo é ser o melhor pai do mundo para o meu moleque.
Espero que você e Briana sejam muito felizes e que, um dia, vocês
dois possam perdoar a burrada que cometi. E, claro, que um dia você
conheça o meu filho, assim como espero conhecer a sua menininha.
Estou feliz por você, meu amigo. E tenho muito orgulho do
homem que você é.
Até algum dia.”
Precisei me sentar, pois o choque me fez perder um pouco a
estabilidade das pernas. Sem conseguir acreditar em tudo aquilo, li a
mensagem de Gustavo mais uma vez, sem imaginar que algo assim poderia
ter acontecido em sua vida. Realmente, depois da nossa briga, nunca mais o
vi e os meninos disseram que ele se mudou. Acho que até eles perderam o
contato com Gustavo, então, receber notícias suas à essa altura do
campeonato me pegou totalmente de surpresa. Saber que ele era pai... Porra,
aquele babaca! Por que não se abriu com a gente? Por que não nos contou o
que estava acontecendo? Com certeza, o ajudaríamos a enxergar que estava
errado e que precisava descobrir se o filho era dele ou não.
Consegui escrever uma resposta para ele, sendo muito sincero,
dizendo que me decepcionei, mas que o tempo havia curado a mágoa e que,
com certeza, queria conhecer o seu filho. Tinha certeza de que Briana
também gostaria que ele se reaproximasse. Também expressei que estava
feliz por ele ter tomado a decisão certa e ido atrás da criança, que era uma
vítima em meio a tudo aquilo. Que bom que agora ele podia exercer o seu
papel de pai. Esperava que ele se mantivesse firme naquela missão.
Depois de enviar a minha resposta, lembrei-me da mensagem do meu
pai e respirei fundo antes de abrir. Diferente da de Gustavo, não encontrei um
texto, mas um áudio de pouco mais de um minuto. Fiquei surpreso ao ouvir
sua voz levemente emocionada.
— Filho, bom dia. Soube que hoje é o seu casamento... Não estou
enviando esse áudio para cobrar um convite, pois sei que não mereço, mas
decidi falar com você, porque quero que saiba que estou muito feliz por saber
que está se casando e por saber que é um pai incrível para a sua menininha.
Não estou surpreso, porque sempre soube que você seria incrível, só estou
orgulhoso. Estou realmente orgulhoso por você ser um homem tão diferente
do que eu sou, Levi. Espero que você seja muito feliz nessa nova fase da sua
vida e que sinta, de onde estiver, o amor que sinto por você. Mesmo não
sabendo me expressar direito, eu te amo, filho. Viva bem.
Há muito tempo eu não pensava no meu pai. Briana e Aninha eram a
minha vida e, agora, não existia espaço para mágoa e rancor, apesar de eu
saber que uma parte de mim sempre se ressentiria dele — o que era natural,
pois meu pai nunca foi um pai de verdade. No entanto, ele não visitava minha
mente com a mesma frequência que antes e, finalmente, a sua ausência
deixou de representar a sua presença em minha vida. Agora, ele apenas não
fazia mais parte de mim ou de quem eu era. Ainda assim, foi bom ouvir a sua
voz, saber que sentia orgulho e que me amava. No final, isso era tudo o que
um filho queria — além do primordial, que era a presença dos pais, o apoio e
o carinho.
Limpando a garganta, enviei para ele:
— Oi, pai. Foi bom receber a sua mensagem no dia de hoje. Sim, eu
estou muito feliz e me esforço para ser o melhor pai do mundo para a minha
filha e o melhor homem para a minha futura esposa. Acho que, no final, você
sempre me deu o exemplo do que eu não deveria ser e devo te agradecer por
isso. Uma parte minha também te ama e eu espero que você fique bem.
Adeus.
Eu dei adeus, mesmo sabendo que nos reencontraríamos em alguma
parte do caminho, mas não queria pensar naquilo agora. Naquele momento,
eu só queria pensar no meu casamento e na minha felicidade.
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À Sua Espera
Dono de uma das maiores fazendas de criação de cavalos do Brasil,
Ramon Baldez estava acostumado a comandar o seu império com punhos de
ferro. Reconhecido como um profissional sério e respeitado, pensava que
tinha todos os âmbitos da sua vida sob controle, até descobrir que o seu sócio,
Abraão Rodrigues, havia sofrido um grave acidente de carro.
Com o sócio em coma, Ramon se vê diante de um enorme dilema:
tomar para si a responsabilidade de lidar com Gabriela, a filha de Abraão, que
se vê sem o pai, seu único parente vivo. Sabendo que não poderia dar às
costas para a jovem de dezenove anos, ele a acolhe em sua fazenda, enquanto
Abraão está em estado grave no hospital.
Ramon acreditava que cumpriria o papel de amigo da família ao estar
ao lado de Gabriela naquele momento tão difícil para a menina. O que ele não
poderia imaginar era que, ao assumir a responsabilidade de cuidar dela, iria
descobrir que esteve durante toda a sua vida à espera de conhecê-la, para
encontrar o seu verdadeiro amor.
Mas como ele poderia aceitar que estava perdidamente apaixonado
por uma menina? Seria ele capaz de se entregar a esse sentimento, sendo
quase dezenove anos mais velho do que ela.
E o mais importante: conseguiria lidar com o fato de Gabriela
reascender um passado que, para ele, já estava enterrado?
Ramon irá descobrir que, às vezes, a vida toma caminhos
inexplicáveis para juntar dois corações que se amam.
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A Morte de um Solteirão
O Astro Pornô