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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

CENTRO DE ESTUDOS APLICADOS – CESA


CURSO DE BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL
DISCIPLINA: Questão Social no Ceará
Prof.ª. Msª. Priscila Greyce Do Amaral Gomes

Aluna: Ana Keity Pereira Bezerra

Uma expressão da questão social – Maternidade solo, a sobrecarga


feminina.

Fortaleza, Ceará
2022
De acordo com dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, dados estes consideravelmente defasados, tendo em vista o ano da
última pesquisa (2010), no Brasil existem mais de 11 milhões de mães solo, de
casas que são chefiadas e conduzidas integralmente por mulheres, em grande
maioria, mulheres negras. Um dado ainda bem alarmante, é que mais de 5
milhões de crianças sequer possuem o nome do genitor em seus registros de
nascimentos, portanto, deixando para a mãe toda a totalidade de
responsabilidade para com seus filhos. O abandono parental é gritante e pouco
se fala a respeito.

Mas o que é mãe solo? Segundo a Academia Brasileira de Letras, mãe


solo é a “mãe que assume de forma exclusiva todas as responsabilidades pela
criação do filho, tanto financeiras quanto afetivas, em uma família
monoparental. [A denominação mãe solo indica uma forma de parentalidade,
desvinculada do estado civil.]” Embora o nome se desvincule do estado civil, a
nossa sociedade altamente patriarcal, insiste em nomear de “mãe solteira”,
enquanto sabe-se que mãe é mãe independentemente de estar em um
casamento ou não.

É de grande importância também ressaltar, que muitas vezes embora a


mulher esteja em uma relação conjugal, ela passa a viver a maternidade solo,
estando sempre sobrecarregada de todas as responsabilidades com um filho
que não gerou sozinha, e por muitas vezes, tendo que ser mãe até de seu
cônjuge. Todo esse cenário, é nitidamente aceito e não contestado em nossa
sociedade patriarcal, algo que está enraizado desde os primeiros exemplos de
sociedade, onde a mulher sempre ocupava o local de cuidados da família, da
casa, e educação dos filhos, enquanto o homem era provedor do sustento.

Fora a sobrecarga que a maternidade solo apresenta, as mulheres ainda


sofrem com diversos outros fatores do cotidiano, podendo destacar o acúmulo
de função, com as múltiplas jornadas, tendo que, em muitos casos, ter dois
empregos para driblar as dificuldades estruturais e financeiras. Segundo dados,
coletados em março de 2020, pela CAGED - Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados, as mulheres recebem em média 14% a menos que os
homens exercendo a mesma função, formando o grupo com maior dificuldade
de retomada ao trabalho formal, no cenário da pandemia.
O cotidiano da maternidade em si, está longe de ser uma atividade fácil,
tornando-se ainda mais complicada quando encarada sozinha, a realidade está
longe de como ela é romantizada e apresentada pela sociedade, como nas
propagandas do dia das mães. Para combate a essa realidade que não atinge
somente as mulheres e mães brasileiras, se faz necessário a inserção cada
vez maior das mulheres nos espaços públicos e espaços de poder, com intuito
de discutir quais políticas públicas são necessárias e eficazes para acabar, ou
ao menos amenizar as dificuldades de uma maternidade solitária.

No dia 8 de março desse ano, no dia Internacional das Mulheres, foi


aprovado no Senado Federal, a PL 3717/2021 – que determina que mães
solos, passem a ter prioridade de atendimento em politicas sociais e
econômicas. O projeto é do senador Eduardo Braga (PMDB-AM), que institui a
Lei dos Direitos da Mãe Solo, sendo aprovado com várias emendas, na forma
do relatório da senadora Leila Barros (Cidadania-DF). Estão previstas no texto,
medidas como: pagamento em dobro de benefícios, prioridades em creches,
cotas mínimas de contratação em empresas e acesso a credito.

O projeto segue para Câmara dos Deputados. O texto inicial do projeto


beneficiava mães solo com renda familiar per capita inferior a meio salário
mínimo e dependentes de até 14 anos de idade registradas no Cadastro Único
para Programas Sociais (CadÚnico), contudo o senador Rogério Carvalho,
criou uma emenda para aumentar o número de beneficiarias, onde a renda
familiar per capita passa a ser de até 2 salários mínimos e a idade dos
dependentes sobe para 18 anos. Para mães com filhos dependentes com
deficiência, não há esse limite de idade.

Ainda na alteração do texto, é previsto que a mãe solo com renda per
capita de até meio salário mínimo receberá em dobro os benefícios
assistências. Essa cota em dobro, se assemelha com a Lei do Auxilio
Emergencial. Caso o projeto seja aprovado na Câmara dos Deputados, terá
vigência de 20 anos até que a taxa de pobreza em domicílios formados por
famílias monoparentais chefiadas por mulheres seja reduzida a 20%.

Essa lei aborda ainda outros pontos de grande relevância para


realização de uma política efetiva, como: atendimento prioritário para mães em
políticas públicas de intermediação de mão de obra e de qualificação
profissional; instituições financeiras públicas e privadas deverão adotar
políticas de concessão de crédito especialmente destinadas a mães solo e a
empresas controladas e dirigidas por elas, com prioridade e condições
facilitadas, inclusive, taxas de juro; programas habitacionais também vão dar
atendimento prioritário à mãe solo, para que ela possa morar em áreas mais
próximas do centro econômico de sua cidade.”

Contudo que foi exposto acima, relaciono essa expressão da questão


social com a minha realidade que está intrinsicamente ligada ao meu cotidiano.
Eu estou dentro desse número exorbitante de mães solo. Não é um assunto
fácil para se relatar, ou até mesmo escrever, tendo em vista que as marcas me
acompanham dia após dia, nessa loucura incessante de assumir todas as
responsabilidades de uma vida que não “fiz” sozinha.

É necessário falar de um tema que está bem próximo a maternidade


solo, a tão dolorida dor do abandono gestacional. Tínhamos sete anos de
relacionamento, dentro os quais, quatro eram de casamento. Perdi um bebê
em setembro de 2018, uma das piores dores que eu pude sentir na minha vida.
Porém no ano seguinte, mas precisamente no dia 4 de junho de 2019, recebi o
positivo mais lindo da minha vida. Mas nem tudo era como eu planejava e/ou
sonhava. No dia 29 do mesmo mês, o genitor da minha filha, saiu dizendo que
iria almoçar na casa da avó e não mais retornou.

Poderia ser cômico, se não fosse trágico. Até hoje, relaciono com aquele
ditado popular – “Foi comprar cigarro e nunca mais voltou!”. Enfrentei uma
gestação sem a companhia de quem deveria ser o meu alicerce, enfrentei
muitos problemas, fui inúmeras vezes humilhada, exposta, até mesmo pela
mãe do genitor, que fazia questão de expor ele nas redes sociais com outras.
Inclusive, como se não fosse pouco, o abandono, os custos que arquei tudo
sozinha (e graças a Deus com ajuda da minha família), ainda cheguei a
receber ameaças das parceiras que meu ex marido se envolvia.

Nunca me ajudou com um centavo para nada de nossa filha, no decorrer


da gestação. Minha filha nasceu um mês antes da pandemia explodir por aqui,
ele esteve junto pra fazer registro e postar, mas questionou e não pagou
pensão nos meses iniciais. Completamente ausente, nunca esteve presente
nos momentos mais importantes e necessários. Hoje, Ana Liz, que é a razão
de toda minha vida, tem 2 anos e 10 meses, não tem o mínimo de contato com
o genitor, que nesse ano de 2022, só a visitou 3 vezes. Visitas rápidas, sempre
ocupado no celular. São três anos de uma maternidade solo, dolorida, cruel, de
muitas dúvidas, medos e incertezas.

E para completar todas as dificuldades que enfrentamos nessa missão


árdua, e romantizada tantas vezes pela sociedade, quando nos denominam
como guerreiras, enfrento um processo judicial que se arrasta na justiça, de
pensão alimentícia. Finalizo meu texto, com uma frase que me deparei no
decorrer da minha pesquisa para construção do mesmo...

“Toda mãe solo é uma aldeia inteira dentro de


si, dando duro pra manter todo mundo vivo,
feliz, alimentado de corpo e alma, os espaços
internos e externos organizados e fazer o que
não fazem por ela: cuidar.”

Fátima Carvalho.
Referencias Bibliográficas

CARVALHO, Fátima. Mãe solo: uma questão de política pública. Portal


PCdoB.
Disponível em: https://mulher.pcdob.org.br/2021/03/11/mae-solo-uma-questao-
de-politica-publica/
Acesso em: 03 dez. 2022.

CAVALLINI, Marta. Mulheres ganham menos que os homens em todos os


cargos e áreas, diz pesquisa. Portal G1. São Paulo, 07 mar de 2018.
Disponível
em: https://g1.globo.com/economia/concursos-e-emprego/noticia/mulheres-
ganham-menos-que-os-homens-em-todos-os-cargos-e-areas-diz-
pesquisa.ghtml
Acesso em: 03 dez. 2022.

Mães solo podem ter prioridade em políticas públicas e benefícios em dobro.


Agência Senado. 08 mar. 2022.
Disponível: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/03/08/maes-
solo-podem-ter-prioridade-em-politicas-publicas-e-beneficios-em-dobro
Acesso em: 03 dez. 2022

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