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No cenário clínico apresentado, deparamo-nos com a situação da puérpera J.C.

, de 24
anos, que busca atendimento no Serviço de Atendimento Especializado (SAE) após o
diagnóstico de sífilis congênita em seu filho com apenas 4 dias de vida e menciona ter uma
parceira sexual. A Constituição Federal do Brasil assegura o direito à saúde, à igualdade e à não
discriminação, incluindo o acesso a serviços de saúde que respeitem os direitos sexuais e reprodutivos. Esta
realidade requer uma abordagem cuidadosa e informativa, a fim de assegurar tanto o
respeito pelos direitos sexuais e reprodutivos da paciente quanto a garantia do tratamento
necessário para a sífilis e a preservação da saúde do recém-nascido.
Nesse âmbito, a Lei nº 9.263/96 garante o direito à assistência integral à saúde da mulher, incluindo
planejamento familiar e prevenção de ISTs, sofrendo uma alteração em 2022 com a Lei 14.443, de 2022, que
reduziu de 25 para 21 a idade da mulher que deseja a esterilização voluntária,
aumentando ainda mais os direitos reprodutivos no país e garantindo direito de escolha para a paciente J.C. de
24 anos. Com isso, a história clínica deve-se iniciar abordando questões sensíveis, como a
orientação e histórico sexual da paciente e de seus parceiros anteriores, incluindo o genitor
de seu filho. Paralelamente, é relevante adquirir informações pertinentes à parceira sexual
atual da paciente, abrangendo aspectos como nome, orientação sexual, natureza do
relacionamento e a existência de uma comunicação aberta acerca de assuntos relacionados
à saúde sexual entre ambas. Essa abordagem detalhada auxilia na compreensão do risco
de transmissão de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) e na determinação da
necessidade de realizar um rastreamento adicional.
Além disso, questionar acerca do uso de preservativos nas relações sexuais é
relevante, uma vez que, primeiramente, esse hábito pode ter um impacto significativo no
risco de transmissão de ISTs e segundamente a avaliação das opções de contracepção
utilizadas pela paciente e seu interesse em planejamento familiar é essencial, pois isso
pode impactar as escolhas futuras da paciente. Tais direitos sexuais e reprodutivos são respaldados,
por exemplo, por convenções internacionais, como a Conferência Internacional sobre População e
Desenvolvimento (CIPD) e a Declaração de Pequim, que destacaram a importância do acesso à saúde sexual e
reprodutiva, não discriminação e respeito à autonomia das escolhas reprodutivas.
No contexto da história obstétrica, é imperativo indagar sobre sua última gestação e
eventuais anteriores, considerando os cuidados pré-natais realizados e a realização de
testes para ISTs durante o período gestacional. Isso contribui para uma avaliação holística e
abrangente da situação.
Ademais, é crucial explorar o histórico médico da paciente em busca de outras
condições de saúde que possam afetar a gravidez e o tratamento da sífilis, garantindo,
assim, um atendimento integrado.
Em relação à conduta a ser adotada, um conjunto de considerações adicionais se faz
necessário. Primeiramente, é crucial obter o consentimento da paciente, explicando de
maneira clara todos os procedimentos e tratamentos disponíveis, assegurando que a
paciente compreenda plenamente os riscos, benefícios e alternativas. Respeitar o direito da
paciente de tomar decisões sobre sua saúde e corpo, incluindo a divulgação de sua
orientação sexual e práticas sexuais, é um princípio fundamental a ser seguido. Em um
contexto mais amplo, é fundamental destacar que, de acordo com os princípios e diretrizes
do Sistema Único de Saúde, todos têm o direito inalienável à informação, à autonomia e a
não discriminação. Isso inclui também os direitos sexuais e reprodutivos, assim como o
direito de tomar decisões informadas sobre sua saúde sexual e reprodutiva, incluindo a
contracepção e o planejamento familiar.
Nessa esfera, é imperativo que a paciente receba tratamento imediato para a sífilis,
conforme as diretrizes médicas, e seja incentivada a buscar o tratamento de sua parceira,
caso necessário.
A confidencialidade é um pilar essencial a ser mantido, garantindo que todas as
informações fornecidas pela paciente sejam tratadas com o mais alto grau de sigilo, em total
conformidade com as leis de proteção de dados pessoais e direitos do paciente.
Quanto à conduta a ser adotada pela equipe médica, esta deve seguir rigorosamente
as diretrizes clínicas estabelecidas para o tratamento da sífilis congênita no recém-nascido
e em J.C., incluindo o uso de antibióticos e um acompanhamento adequado do bebê.
Ademais, oferecer apoio emocional à paciente é fundamental, reconhecendo a
delicadeza e o estresse associados a essa situação, considerando, também, se há apoio
social disponível para J.C., pois o suporte emocional e familiar pode desempenhar um papel
crucial durante o tratamento e a gestão da situação.
A observância estrita das leis e regulamentos de saúde é essencial para garantir que
J.C. receba atendimento de alta qualidade e que seus direitos sejam protegidos. Isso
engloba o acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva sem qualquer forma de
discriminação, seja com base em orientação sexual ou identidade de gênero.
Portanto, o atendimento clínico a J.C., seu filho e sua parceira devem ser orientados
pelo respeito aos direitos sexuais e reprodutivos, garantindo tratamento adequado,
informações claras, confidencialidade e apoio emocional. Logo, é fundamental que os
profissionais de saúde estejam plenamente cientes das leis e diretrizes que respaldam
esses direitos e atuem de maneira ética e sensível às necessidades desses usuários,
cumprindo, assim, um papel fundamental na promoção da saúde e no respeito pelos direitos
individuais.

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