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Parecer Jurídico Nº 1/2021

do Projeto PL 54/2021

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PODER LEGISLATIVO DO MUNICÍPIO DE CRICIÚMA

ASSESSORIA JURÍDICA

PROJETO DE LEI N.° 054/2021

EMENTA: Dispõe sobre a obrigatoriedade de assentos preferenciais em farmácias e drogarias existentes


no município de Criciúma

Dispõe o artigo 30, inciso I, da Constituição Federal, que compete ao Município legislar sobre
assunto de interesse local.

Especificamente o artigo 31 da Lei Orgânica Municipal determina que a iniciativa de proposição


das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer vereador, salvo os casos elencados no
parágrafo único do mesmo dispositivo.
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De início, mostra-se louvável a iniciativa da proponente e de grande espírito público. Trata-se de


iniciativa digna que deseja o bem-estar comum e também tem o fim de zelar pelas pessoas
deficientes, idosas e gestantes.

E, de fato, essas pessoas merecem maior atenção por parte do Poder Público. Fato notado na
existência de leis nessa esteira, eis como o Estatuto do Idoso (Lei n.° 10.741/03), o Estatuto das
Pessoas com Deficiência (Lei n.° 7.853/89). Também novos diplomas com escopo a auxiliar são
de bom alvitre, desde que cumpram a constitucionalidade formal e material.
Nesse quadro, a proposição em comento, sem embargo ser de extrema inteligência a iniciativa e

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de grande espírito público, tem seu caminho por demais tortuoso conforme as justificativas
arroladas abaixo.

O projeto em questão colide com princípio expresso tanto na Constituição Federal quanto na
Constituição Estadual. A ofensa, destarte, é ao princípio da livre iniciativa.

A Constituição Federal declara, em seu art. 1º, inciso IV, a livre iniciativa como princípio
fundamental da República Federativa do Brasil. Em seu art. 170, caput, expressa que a ordem
econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa.

A Constituição Estadual também aponta a livre iniciativa como um dos fundamentos do Estado
de Santa Catarina (art. 1º, inciso V) e como um dos Princípios Gerais da Economia Catarinense
(Título VIII, Capítulo I, art. 135, § 4º).

Como fundamento da ordem econômica, o princípio da livre iniciativa atribui à iniciativa privada o
papel central na produção e na circulação de bens e de serviços, por meio do que se edificam os
pilares da ordem econômica. A função do Estado é a de assegurar a livre iniciativa, e pode
explorar diretamente a atividade econômica apenas quando tal for necessário à segurança
nacional ou diante de relevante interesse econômico (art. 173, CF). Este documento é assinado digitalmente

O artigo 170 da norma constitucional introduz um modelo econômico baseado na liberdade de


iniciativa, que tem por finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da
justiça social, sem exclusões nem discriminações. Daí entende-se que, independentemente de
sua natureza, se pública ou privada, toda a empresa para desenvolver atividade econômica, seja
esta indústria ou comércio, ou ainda, prestação de serviços, regem-se pelos princípios contidos
neste artigo.
No entanto, como qualquer princípio, a livre iniciativa não pode ser considerada absoluta uma
vez que há restrições que a própria ordem econômica, refletida em lei, impõe sobre ela. Todavia,
há de se frisar que a relatividade do princípio da livre iniciativa refere-se, especificamente, às

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restrições impostas em lei para o livre exercício de uma determinada atividade econômica, não
infringindo a dissociação entre o direito de exercer livremente uma atividade econômica e o
direito de administrá-la.

Sobre o tema, assim manifestou-se o STJ:

“A ordem econômica é calcada na livre iniciativa e na liberdade de concorrência, por isso que é
assegurado a todos o exercício de qualquer atividade econômica (art. 170, § único da
Constituição Federal).

"'É vedado ao Poder Público e ao intérprete do ordenamento antever exegese que transponha a
intangibilidade da livre iniciativa que a todos é assegurada em relação a qualquer atividade.

"'O Princípio da Legalidade impõe que se permita o que a lei não proíbe, no campo da 'livre
iniciativa" (Resp n. 740508/SP, rel. Min. Luiz Fux, julgado em 17/08/2006).

Em análise ao projeto, há ofensa à livre iniciativa. Ao proclamar o princípio da livre iniciativa, a


Constituição prestigia o direito a todos reconhecido de explorar as atividades empresariais, e
impõe a todos o dever de respeitar esse mesmo direito, declarando inconstitucionais atos que
impeçam o seu pleno exercício. Esse dever de resguardo à livre iniciativa estende-se também ao
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Estado, que somente pode ingerir-se na exploração das atividades econômicas nos estreitos
limites que a Constituição assim permitir.

De acordo com o Excelentíssimo Procurador de Justiça e Coordenador-Geral do Centro de Apoio


Operacional do Controle de Constitucionalidade do Ministério Público de Santa Catarina, o
Procurador de Justiça Raul Schaefer Filho, esteado em lição de mestre Miguel Reale, o princípio
da livre iniciativa não diz respeito apenas à livre escolha, pelo cidadão, das profissões e
atividades econômicas a serem por si exercidas, mas, também, à livre escolha dos meios e dos
processos tidos como mais adequados para a consecução do fim almejado.

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O projeto em tela extrapola esses limites, pois obriga instalação de assentos, sem sequer
regulamentar quem tem capacidade física-estrutural do seus estabelecimento, bem como e
capacidade econômica de suportar a limitação de seu comercio. Gerando clara quebra na
isonomia entre os grandes empresários e os pequenos, vez que uns suportariam tal adequação
e outros perderiam o poder de comerciar.

Assim, o princípio da Isonomia aqui está plenamente ferido.

Ao contrário do que se poderia supor, não há no projeto em tela nenhum fator que pudesse
legitimar essa intervenção e fazê-la compatível com as disposições constitucionais.

Em caso semelhante, o nosso Tribunal de Justiça declarou inconstitucional a Lei nº 6.723/2016,


promulgada por esta Casa Legislativa, senão vejamos:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI N. 6.723/2016, DO MUNICÍPIO DE


CRICIÚMA - FORMA DE VENDA E PREÇO DIFERENCIADOS - CIRURGIA DE REDUÇÃO DO
ESTÔMAGO - INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL - VÍCIO EXISTENTE - AUSÊNCIA DE
RAZOABILIDADE - OFENSA À LIVRE INICIATIVA E À LIVRE CONCORRÊNCIA -
FUNDAMENTOS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL E DO ESTADO DE SANTA
CATARINA - VIOLAÇÃO AOS ARTS. 1º, IV, E 170 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E ARTS.
1º, V, E 135, CAPUT E § 4º, DA CARTA ESTADUAL 1 "Ao proclamar o princípio da livre
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iniciativa, a Constituição prestigia o direito a todos reconhecido de explorar as atividades


empresariais, e impõe a todos o dever de respeitar esse mesmo direito, declarando
inconstitucionais atos que impeçam o seu pleno exercício. Esse dever de resguardo à livre
iniciativa estende-se também ao Estado, que somente pode ingerir-se na exploração das
atividades econômicas nos estreitos limites que a Constituição assim permitir" (ADI n.
2010.029348-6, Des. Jaime Luiz Vicari). 2 A livre iniciativa diz respeito à livre opção por meios e
por processos tidos pelo empreendedor como mais vantajosos para a consecução do fim
pretendido, não somente à livre escolha, pelo cidadão, das profissões e atividades econômicas
que almeja exercer. 3 A outorga de privilégios a quem realizou cirurgia de redução de estômago
junto a restaurantes e similares da cidade, além de desarrazoada, é evidentemente ofensiva ao
art. 135, caput e § 4º, da Constituição Estadual. A autonomia de que goza a municipalidade
para disciplinar assuntos de interesse local não lhes proporciona o direito de inviabilizar a
livre concorrência e a liberdade do exercício das atividades econômicas. (TJSC, Direta de

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Inconstitucionalidade n. 4003730-49.2016.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j.
15-02-2017). Grifei

A garantia da liberdade de iniciativa ao setor privado é tão expressiva que prejuízos causados a
empresários pela intervenção do Poder Público no domínio econômico são passíveis de ser
indenizados em determinadas situações, com fundamento no art. 37, §6º, da CF, que consagra a
responsabilidade objetiva do Estado. O STF, inclusive, já entendeu que "a intervenção estatal na
economia possui limites no princípio constitucional da liberdade de iniciativa e a responsabilidade
objetiva do Estado é decorrente da existência de dano atribuível à atuação deste" (CARVALHO
FILHO, José dos Santos. Manual de direito Administrativo. 28. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo:
Atlas, 2015. p. 947-948).

Desta feita, o presente projeto não pode desrespeitar os princípios gerais da atividade econômica
e da isonomia. Dessa forma, prevalece o direito à livre iniciativa, haja vista ser irrazoável a
intromissão pretendida no PL em análise.

Assim sendo, esta Assessoria Jurídica opina pela ilegalidade e inconstitucionalidade do


presente Projeto de Lei, visto que o projeto em questão ofende o princípio da livre iniciativa.

É o parecer, salvo melhor juízo.


Este documento é assinado digitalmente

Criciúma/SC, 29 de julho de 2021.


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OAB/SC N. 9.514
LEO CASSETARI FILHO
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MANIFESTO DO DOCUMENTO
Parecer Jurídico
Protocolo Nº: 60809 Protocolo Data: 29/07/2021
Documento Nº: 1/2021 Processo Nº: 635/2021

Gerado por Leo Cassetari Filho na repartição Assessoria Jurídica dia 29/07/2021 às 15:57

CHAVE DE AUTENTICAÇÃO DO DOCUMENTO


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Documento eletrônico assinado digitalmente conforme DOC-ICP-15 de 25/8/2015.

Nome Leo Cassetari Filho


Data 29/07/2021 15:58
CPF/CNPJ 790.XXX.XXX-34

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