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COISAS DO DIREITO

DIREITO ADMINISTRATIVO
Gustavo Fernandes

@gustavo_fernandes_sales
gustavo.fernandes@tjdft.jus.br
AULA 02
REGIME JURÍDICO
ADMINISTRATIVO
1. REGIMES JURÍDICOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:

São as leis, com autorização constitucional, que indicam o regime jurídico a que estará
submetida a Administração Pública: o de direito privado ou o de direito público.
Exemplifica-se com o art. 173, § 1º, da CF, que determina à lei que estabeleça o estatuto
jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que
explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de
serviços, dispondo sobre “a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive
quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários” (inc. II).
Contudo, nunca é integral a submissão da Administração Pública ao direito privado: sempre
há uma derrogação (parcial) do direito comum pelo direito público, com a manutenção de
algumas prerrogativas e restrições (DI PIETRO, 2019, p. 86).
2. CONCEITO:

Regime jurídico administrativo: é expressão que designa o conjunto de regras e


princípios que instituem prerrogativas (privilégios) e sujeições (restrições) à
Administração Pública, elevando-a a uma posição vertical nas relações entabuladas com
particulares.
Não se confunde com a expressão regime jurídico da Administração, que, como vimos,
pode ser o de direito público (regime jurídico administrativo) ou o de direito privado (sempre
derrogado por normas publicísticas).
As restrições são essenciais para a proteção aos direitos individuais frente ao Estado, ao
passo que as prerrogativas permitem à Administração Pública assegurar a supremacia do
interesse público sobre o particular (DI PIETRO, 2019, p. 87).
PRERROGATIVAS RESTRIÇÕES
Autoexecutoriedade Finalidade pública
Autotutela Princípio da legalidade
Poder de expropriar Princípio da moralidade administrativa
Requisitar bens e serviços Princípio da publicidade
Ocupar temporariamente imóveis Princípio da impessoalidade
Instituir servidões Princípio da eficiência
Aplicar sanções administrativas Outros princípios constitucionais implícitos e
previstos em normas infraconstitucionais
Efetivar medidas de polícia Realização de concursos para seleção de pessoal

Rescindir contratos unilateralmente Realização de concorrência pública para a


elaboração de acordos com particulares
Ter privilégios como imunidade tributária,  
prazos diferenciados em juízo, juízo privativo,
presunção de veracidade de seus atos, processo
especial de execução etc.
COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM CONCURSO
Prova: CESPE - 2019 - PGE-PE - Analista Judiciário de Procuradoria. O
conjunto das prerrogativas e restrições a que está sujeita a administração
pública e que não se encontra nas relações entre particulares constitui o
regime jurídico administrativo.
Gabarito: certo.
3. CONTEÚDO DO REGIME JURÍDICO
ADMINISTRATIVO:
A Administração Pública deve sempre se pautar pela busca do interesse público.
a) Interesse público primário: diz respeito às necessidades da coletividade, vale dizer, à
intenção dos indivíduos que integram determinada sociedade, não se confundindo com a
vontade da máquina estatal (CARVALHO, 2019, p. 61).
b) Interesse público secundário: composto pelos interesses do Estado enquanto pessoa
jurídica. O poder público também tem interesses próprios, como a busca pela arrecadação de
tributos e a desapropriação de propriedades particulares. Ao fim, essas atividades acabam por
beneficiar o interesse de toda a sociedade, mas, havendo conflito entre o interesse público
primário e o secundário, deve prevalecer o primeiro, sob pena de configuração de desvio de
finalidade (CARVALHO, 2019, p. 62).
COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM CONCURSO
Prova: VUNESP - 2019 - Prefeitura de Poá - SP - Procurador Jurídico. O
interesse público pode ser classificado em primário e secundário, sendo
correto afirmar que o interesse público primário é o verdadeiro interesse
a que se destina a Administração Pública, pois este alcança o interesse da
coletividade e possui supremacia sobre o particular.
Gabarito: certo.
4. PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:
Não há hierarquia entre regras e princípios, mas apenas funções distintas e igualmente
essenciais para o funcionamento do sistema jurídico (SOUZA NETO; SARMENTO, 2014, p.
389-91).
“O principal valor subjacente às regras é a segurança jurídica. (...) [Regras] tornam o
Direito mais objetivo, mais previsível e, consequente, realizam melhor o valor segurança
jurídica. (...) [Os princípios] dão unidade ao ordenamento, permitindo articular suas
diferentes partes – por vezes, aparentemente contraditórias – em torno de valores e fins
comuns. Ademais, seu conteúdo aberto permite a atuação integrativa e construtiva do
intérprete, capacitando-o a produzir a melhor solução para o caso concreto, assim realizando
o ideal de justiça.” (BARROSO, 2019, p. 209-10).
Para Di Pietro (2019, p. 92) os dois princípios basilares do Direito
Administrativo são:
a) Princípio da legalidade, garantidor da liberdade do indivíduo; e
b) Princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, o
qual permite que a Administração Pública exerça as suas funções em prol do fim
público.
Doutrina majoritária: são princípios basilares (ou supraprincípios) do
Direito Administrativo (MELLO, 2013, p. 57):
a) Princípio da supremacia do interesse público sobre o particular; e
b) Princípio da indisponibilidade do interesse público.
Princípios constitucionais expressos:
CF, Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
Princípios reconhecidos:
Lei 9.784/1999, art. 2º: legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade,
proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
interesse público e eficiência.
De algum modo – reza a doutrina –, todos eles são constitucionais, expressa ou
implicitamente (CARVALHO, 2019, p. 66).
5. LEGALIDADE
Liberdade de ação em geral: está retratada no art. 5º, inc. II, da CF, sede do princípio
da legalidade, in verbis: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei.”
Legalidade no âmbito do Direito Administrativo: vem expressa no art. 37, caput, da
CF, constituindo diretriz básica da conduta dos agentes estatais.
Consoante leciona Meirelles (2016, p. 93), “a legalidade, como princípio de
administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua
atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum”. O
particular, por sua vez, é titular do direito fundamental de fazer tudo aquilo que a lei não
proíbe (autonomia da vontade).
COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM CONCURSO
Prova: CESPE - 2018 - PGE-PE - Procurador do Estado. O princípio da
legalidade veda à administração a prática de atos inominados, embora
estes sejam permitidos aos particulares.
Gabarito: certo.
EXCEÇÕES AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE:
Celso Antônio Bandeira de Mello leciona que, no ordenamento jurídico brasileiro, há três
exceções ao princípio da legalidade (2013, p. 109):
a) a edição de medidas provisórias (CF, art. 62): são medidas efêmeras e excepcionais
para regular certos assuntos; (é uma exceção porque não é editada pelo processo legislativo
do congresso nacional (representantes do povo) mas tão somente unilateralmente pelo chefe
do executivo, embora posteriormente eventualmente venha a ser convertida em Lei).
b) vigência do estado de defesa (CF, art. 136): situações de anomalia extremada
permitem que o princípio da legalidade sofra transitória constrição, autorizando restrições aos
direitos de reunião, sigilo de correspondência, de comunicação telegráfica e telefônica, entre
outros; e
c) vigência do estado de sítio (CF, art. 137): abrange cerceamento de mais direitos, a
exemplo da permissão para realização de busca e apreensão em domicílio e detenção em
edifício não destinado a acusados ou condenados por crime comum.
PRINCÍPIO DA JURIDICIDADE
A teoria jurídica contemporânea entende que o princípio da legalidade deve
ser visto de uma forma ampliada: o Estado deve se submeter não apenas à lei
em sentido puramente formal, mas ao Direito (princípio da juridicidade), isto
é, a todos os valores extraídos expressa ou implicitamente da Constituição
Federal (MEIRELLES, 2016, p. 93; DI PIETRO, 2019, p. 32-3).
Bem por isso, o art. 2º, parágrafo único, da Lei 9.784/1999 dispõe que nos
processos administrativos deve ser observado, entre outros, o critério de
“atuação conforme a lei e o Direito” (inc. I).
COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM CONCURSO
Prova: VUNESP - 2019 - TJ-RS - Titular de Serviços de Notas e de
Registros - Provimento. Com a constitucionalização do Direito
Administrativo, deve se compreender o princípio da legalidade sob a
perspectiva da juridicidade, que representa o dever da Administração
Pública se vincular ao conjunto de normas constitucionais e
infraconstitucionais que compõe o sistema.
Gabarito: certo.
6. PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO
O princípio da supremacia do interesse público sobre o particular não está expresso na
Constituição Federal, mas é implicitamente dela extraído.
Conforme leciona Daniel Wunder Hachem (2011), a par de uma interpretação sistemática
que abrange diversos dispositivos, os fundamentos específicos dos quais se pode deduzir o
princípio em tela são os arts. 3º, IV e 66, § 1º, da Carta Política. O primeiro, ao dispor que é
objetivo fundamental da República “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem,
raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”; o segundo, ao outorgar ao
chefe do Executivo a competência para vetar um projeto de lei quando for “inconstitucional
ou contrário ao interesse público”, a revelar a supremacia, sobre os demais, dos princípios
da constitucionalidade e do interesse público.
Inspirador tanto do legislador, no momento da elaboração da lei, quanto do
administrador público, na execução das atividades estatais, o princípio da supremacia do
interesse público é uma reação contra o individualismo jurídico e instrumento necessário para
a consecução do bem-estar coletivo.
Os interesses da sociedade devem prevalecer diante de necessidades específicas do
particular, individualmente considerado. Por isso a Administração Pública é dotada de
prerrogativas, situando-se em posição privilegiada quando se relaciona com os particulares.
Ao praticar atos administrativos, a autoridade pública deve se nortear pelo interesse
público, e não pelas suas próprias vontades, sob pena de se caracterizar o desvio de poder ou
de finalidade.
Conceito de “interesse público”: para Bandeira de Mello (2013, p. 62), o
interesse público pode ser conceituado como “o interesse resultante do conjunto dos
interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua
qualidade de membros da Sociedade e pelo simples fato de o serem”.
Veja-se a diferença entre o interesse pessoal de alguém em não ter seu imóvel
residencial desapropriado, e o interesse do mesmo indivíduo, igualmente pessoal, mas
na qualidade de membro da sociedade, de que exista o instituto da desapropriação,
para possibilitar a abertura de estradas, a construção de escolas públicas etc. Por isso é
que o mestre reconhece que os interesses públicos correspondem à “dimensão
pública dos interesses individuais” (2013, p. 66), sendo equivalentes aos interesses
primários do Estado, que são os interesses da coletividade como um todo.
Aspectos (HACHEM, 2011):
(a) fundamento normativo: encontra-se implícito na Constituição;
(b) estrutura jurídica: estabelece a preponderância do interesse público
(interesse primário, relativo ao conjunto de interesses que os indivíduos
possuem quando considerados como membros da sociedade) sobre o interesse
privado (interesses secundários da pessoa jurídica estatal, interesses pessoais do
agente público e interesses exclusivamente privados dos indivíduos,
singularmente considerados);
(c) conteúdo jurídico: é traçado pelo sistema normativo, que caracteriza
determinados interesses como públicos através da Constituição, das leis e dos
atos normativos com ela consonantes.
Modernamente, alguns autores buscaram “desconstruir” o princípio em questão,
argumentando pela prevalência de interesses individuais protegidos sob a forma de
direitos fundamentais, bem como pela substituição da ideia de supremacia do
interesse público pela de ponderação de interesses.
Doutrina de peso, contudo, rejeita essa ideia, pois, ainda que haja casos específicos
em que interesses individuais devam prevalecer diante do interesse coletivo, a regra
continua sendo a supremacia do interesse público, pilar do Direito Administrativo.
Conforme aduz Carvalho Filho (2019, p. 36), “se é evidente que o sistema jurídico
assegura aos particulares garantias contra o Estado em certos tipos de relação jurídica,
é mais evidente ainda que, como regra, deva respeitar-se o interesse coletivo quando
em confronto com o interesse particular”.
7. INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO
Se os interesses defendidos pelos administradores públicos são os da coletividade,
e não os seus próprios, não se encontram eles à sua livre disposição.
Por isso é que o administrador não pode deixar de punir condutas ilícitas que
chegam ao seu conhecimento ou renunciar ao exercício das competências legais.
Cuida-se, sob certo aspecto, de uma limitação à atuação dos agentes públicos e
pessoas administrativas.
Art. 2º, par. único, inc. II, da Lei 9.784/99: nos processos administrativos, deve ser
observado o critério de “atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia
total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei”.
8. IMPESSOALIDADE
1. Em primeiro lugar, veda que a Administração atue com vistas a privilegiar
ou prejudicar pessoas determinadas. Exemplos disso são a instituição do regime
de precatórios (CF, art. 100) e a imposição de realização de concursos públicos
e licitações (CF, art. 37, II e XXI). De algum modo, essa faceta da
impessoalidade consagra a isonomia (igualdade) (MELLO, 2013, p. 117).
2. A Administração Pública deve sempre voltar-se para o interesse público, e
não para a consecução de interesses privados, confundindo-se, de certo modo,
com o princípio da finalidade (MEIRELLES, 2016, p. 97).
3. Em um terceiro sentido, significa que os atos praticados pelos agentes
públicos são imputados ao órgão ou entidade da Administração Pública, e
não a eles próprios (teoria da imputação volitiva).
Por isso mesmo, o STF firmou a seguinte tese: “A teor do disposto no art. 37,
§ 6º, da Constituição Federal, a ação por danos causados por agente público
deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado
prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima para a ação o autor do
ato, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou
culpa” (RE 1.027.633, j. em 14.08.2019).
4. Traduz a ilicitude da conduta de associar os atos públicos à imagem
pessoal dos agentes estatais. Nesse sentido, dispõe o § 1º do art. 37 da CF: “A
publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos
públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela
não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem
promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.”
A Lei 9.784/1999, no art. 2º, parágrafo único, inc. III, prescreve para o
processo administrativo o critério de “objetividade no atendimento do
interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades”.
Resumo. INTERESSE PÚBLICO:
1) ausência de privilégios ou prejuízo direcionado
2) ações contra o Estado e não contra o agente
3) vedação à promoção pessoal de agentes públicos
9. MORALIDADE ADMINISTRATIVA
Lei 9.784/99, art. 2º, par. único, inc. IV: nos processos administrativos será observado
o critério de “atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé”.
Trata-se de princípio que exige observância à honestidade, à lealdade e à boa-fé na
condução da atividade administrativa. Não se trata da moral comum – como adverte
Meirelles (2016, p. 94), emprestando de Hauriou –, mas de uma moral jurídica,
entendida como “o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da
Administração”.
Sempre que em matéria administrativa se verificar que o comportamento da
Administração ou do administrado que com ela se relaciona juridicamente, embora em
consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as regras de boa
administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia comum de honestidade,
estará havendo ofensa ao princípio da moralidade (DI PIETRO, 2019, p. 106).
Associada tanto à impessoalidade quanto à moralidade, está a vedação ao
nepotismo.
Súmula Vinculante 13: “A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente
em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da
autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em
cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em
comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração
pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações
recíprocas, viola a Constituição Federal.”
Ainda, tem o STF afastado a aplicação da Súmula Vinculante 13 a cargos
públicos de natureza política, ressalvadas as situações de inequívoca falta de
razoabilidade, por manifesta ausência de qualificação técnica ou
inidoneidade moral (Rcl 28.024-AgR, j. 29.05.2018). Por isso, ao menos
abstratamente, não configuram nepotismo a nomeação de irmão de governador
de Estado a cargo de secretário de Estado (Rcl 6.650 MC-AgR, j. em
16.10.2008) ou a nomeação da esposa de Vice-Prefeito para ocupar cargo de
secretária municipal (Rcl 29317 AgR, j. em 19.03.2019).
COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM CONCURSO
Prova: CESPE - 2019 - TCE-RO - Procurador do Ministério Público de
Contas. Constitui violação aos princípios constitucionais da administração
pública a nomeação de cônjuge de prefeito para o cargo de secretário
estadual, mesmo que o nomeado possua inegável qualificação técnico-
profissional e idoneidade moral.
Gabarito: errado.
10. PUBLICIDADE:
A Administração Pública, por não agir em interesse próprio, mas em busca
da consecução do interesse público, tem o dever de divulgar amplamente os atos
por ela praticados e permitir o acesso do público em geral e dos interessados à
informação, ressalvadas as hipóteses de sigilo legal.
Art. 2º, par. único, inc. V, da Lei 9.784/1999: nos processos administrativos
será observado o critério de “divulgação oficial dos atos administrativos,
ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição”.
CF, Art. 5º, XXXIII - “Todos têm direito a receber dos órgãos públicos
informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que
serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas
aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do
Estado”.
CF, Art. 5º, LX - “A lei só poderá restringir a publicidade dos atos
processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.”
A publicidade poderá se dar por meio da publicação do ato ou, em alguns
casos, pela sua simples comunicação aos destinatários.
Em geral, os atos administrativos que não geram efeitos externos à
Administração não precisam ser publicados, a exemplo de uma portaria que cria
um grupo de trabalho, bastando a ciência dos interessados.
Lado outro, quando o ato gerar efeitos externos à Administração (como um
edital de abertura de concurso público) ou quando houver norma legal
determinando a publicação, está será impositiva.
A publicação pelos meios oficiais gera presunção absoluta de ciência do interessado
(ALEXANDRE, 2018, p. 311). O STJ relativiza essa presunção no caso da comunicação
da nomeação de candidato aprovado em concurso público e de convocação para
etapas subsequentes, atos que não se contentam com a simples publicação no Diário
Oficial, pois seria desarrazoado que o candidato ficasse checando o diário oficial por
lapso temporal que pode chegar a quatro anos. A comunicação deverá ser pessoal, por
telegrama, contato telefônico ou e-mail (STJ, AgRg no RMS 32.511/RN, j. 4.11.10).
A doutrina tem entendido a publicidade dos atos administrativos como requisito de
eficácia (não de validade), embora eles já sejam existentes e válidos desde a edição
conforme à lei (CARVALHO, 2019, p. 75). Também por isso, atos inválidos não se
convalidam com a publicação (MEIRELLES, 2016, p. 100).
O agente que negar publicidade aos atos oficiais ficará sujeito às sanções da Lei de
Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92, art. 11, IV).
O STF entendeu que “é legítima a publicação, inclusive em sítio eletrônico
mantido pela Administração Pública, dos nomes dos seus servidores e do valor
dos correspondentes vencimentos e vantagens pecuniárias” (ARE 652.777, j. em
23.04.2015). Esse entendimento está alinhado com o que fora decidido no SS 3902-
AgR-segundo, j. em 09.06.2011, quando a Corte havia decidido que “a remuneração
bruta, cargos e funções por eles [servidores públicos] titularizados, órgãos de sua
formal lotação, tudo é constitutivo de informação de interesse coletivo ou geral” e que
“quanto à segurança física ou corporal dos servidores, seja pessoal, seja
familiarmente, claro que ela resultará um tanto ou quanto fragilizada com a
divulgação nominalizada dos dados em debate, mas é um tipo de risco pessoal e
familiar que se atenua com a proibição de se revelar o endereço residencial, o CPF e a
CI de cada servidor”.
A Lei que regulamenta a hipótese do art. 5º, XXXIII, da CF – também atendendo
ao comando do art. 37, § 3º, II – é a de n. 12.527/2011, a qual se aplica aos órgãos
públicos integrantes da administração direta dos Poderes Executivo, Legislativo,
incluindo as Cortes de Contas, e Judiciário e do Ministério Público; às autarquias, as
fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais
entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e
Municípios; e, inclusive, às entidades privadas sem fins lucrativos que recebam, para
realização de ações de interesse público, recursos públicos diretamente do orçamento
ou mediante subvenções sociais, contrato de gestão, termo de parceria, convênios,
acordo, ajustes ou outros instrumentos congêneres (arts. 1º e 2º).
Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a
informações aos órgãos e entidades referidos na lei, por qualquer
meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do
requerente e a especificação da informação requerida (art. 10).
São vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos
determinantes da solicitação de informações de interesse público (art.
10, § 3º).
A informação em poder dos órgãos e entidades públicas, observado
o seu teor e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da
sociedade ou do Estado, poderá ser classificada como ultrassecreta,
secreta ou reservada (art. 24).
Os prazos máximos de restrição de acesso à informação vigoram a
partir da data de sua produção e são os seguintes (art. 24, § 1º):
I - ultrassecreta: 25 (vinte e cinco) anos;
II - secreta: 15 (quinze) anos; e
III - reservada: 5 (cinco) anos.
As informações que puderem colocar em risco a segurança do
Presidente e Vice-Presidente da República e respectivos cônjuges e
filhos(as) serão classificadas como reservadas e ficarão sob sigilo até
o término do mandato em exercício ou do último mandato, em caso
de reeleição (art. 24, § 2º).
Para a classificação da informação em determinado grau de sigilo,
deverá ser observado o interesse público da informação e utilizado o
critério menos restritivo possível, considerados: I - a gravidade do
risco ou dano à segurança da sociedade e do Estado; e II - o prazo
máximo de restrição de acesso ou o evento que defina seu termo final
(art. 24, § 5º).
O acesso a informações também pode ser alcançado por meio de dois
importantes remédios constitucionais: o habeas data, de cunho jurisdicional,
previsto no art. 5º, LXXII e regulamentado pela Lei 9.507/1997, e os direitos
de petição e de obter certidões em repartições públicas, de cunho
administrativo, previstos no art. 5º, XXXIV.
Lei 9.051/95: as certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de
situações, requeridas aos órgãos da administração centralizada ou autárquica,
às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às fundações públicas
da União, dos Estados, do DF e dos Municípios, deverão ser expedidas no
prazo improrrogável de quinze dias, contado do registro do pedido no órgão
expedidor (art. 1º), e nos requerimentos, deverão os interessados fazer constar
esclarecimentos relativos aos fins e razões do pedido (art. 2º).
11. EFICIÊNCIA:
A eficiência foi incluída expressamente no rol do art. 37, caput, da
CF pela Emenda Constitucional 19/1998.
É reputado o mais moderno princípio da função administrativa,
“que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade,
exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório
atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros”
(MEIRELLES, 2016, p. 105).
Segundo Carvalho Filho (2019, p. 32), “o núcleo do princípio é a
procura de produtividade e economicidade e, o que é mais importante, a
exigência de reduzir os desperdícios de dinheiro público, o que impõe a
execução dos serviços públicos com presteza, perfeição e rendimento
funcional”.
A eficiência da administração pública, ao lado da qualidade na
prestação dos serviços, constitui o núcleo da chamada Administração
Pública Gerencial, que procurar superar o modelo burocrático.
Nesse contexto, foi editada a Lei 13.726/2018 (Lei da
Desburocratização).
12. CONTROLE OU TUTELA:
Por esse princípio, autoriza-se o controle ou tutela por parte da
Administração Direta, nos limites da lei, sobre as atividades
realizadas pelas entidades da Administração Indireta, com o
objetivo de garantir a observância de suas finalidades institucionais.
13. AUTOTUTELA:
Conforme anota Di Pietro (2019, p. 98), “enquanto pela tutela a
Administração exerce controle sobre outra pessoa jurídica por ela mesma
instituída, pela autotutela o controle se exerce sobre os próprios atos, com
a possibilidade de anular ou convalidar os ilegais e revogar os
inconvenientes ou inoportunos, independentemente de recurso ao Poder
Judiciário”.
Súmula 473 do STF: “A administração pode anular seus próprios atos,
quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se
originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou
oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os
casos, a apreciação judicial.”
Essa atuação da Administração Pública há de ser feita, inclusive,
de ofício, mas não afasta a possibilidade de controle jurisdicional, em
decorrência do princípio da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º,
XXXV).
A análise da boa-fé, nesse caso, é essencial. É nesse sentido que
dispõe o art. 54 da Lei 9.784/99, quando prescreve que “o direito da
Administração de anular os atos administrativos de que decorram
efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos,
contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-
fé”.
14. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA:
A CF, no art. 5º, inc. LV, dispõe que “aos litigantes, em processo judicial
ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório
e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
A CF resguarda aos servidores públicos a estabilidade, após três anos de
efetivo exercício, que só poderá ser suprimida mediante sentença judicial
transitada em julgado ou mediante processo administrativo em que seja
assegurada a ampla defesa (art. 41, § 1º).
Em várias outras passagens, assegura a ampla defesa a membros do Poder
Judiciário, do Ministério Público e do Tribunal de Contas em casos de
aplicação de penalidades, como forma de concretizar o princípio do Estado
de Direito.
Ampla defesa e contraditório, portanto, consagram: (i) o direito de
informação (Recht auf Information); (II) o direito de manifestação (Recht auf
Äusserung) e (III) o direito de a parte ver seus argumentos considerados (Recht
auf Berücksichtigung).
A Lei 9.784/99 dispõe no art. 2º, par. único, inc. X, que nos processos
administrativos deve-se respeitar a garantia dos direitos à comunicação, à
apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de
recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de
litígio.
Embora o STJ tivesse editado a Súmula 343 (“É obrigatória a presença de
advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar”), o STF
editou, posteriormente, a Súmula Vinculante 5 (“A falta de defesa técnica por
advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição”),
prejudicando aquela proveniente do Tribunal da Cidadania.
Súmula Vinculante 3: “Nos processos perante o Tribunal de Contas da
União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder
resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o
interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial
de aposentadoria, reforma e pensão”.
STF: “Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança
legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de cinco anos para
o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria,
reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de
Contas”. Por se tratar de ato complexo – conforme reconhecido expressamente
pelo STF nesse julgado –, a aposentadoria só se aperfeiçoa após o julgamento
da legalidade pelo TCU, sem participação dos interessados (sem ampla defesa e
contraditório), por constituir exercício da competência constitucional (CF, art.
71, III). Contudo, em observância à segurança jurídica, aplica-se, por analogia,
o prazo quinquenal do Decreto 20.910/1932. (RE 636.553/RS, j. em 19.2.2020 -
Informativo 967-STF).
15. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE:
Trata-se, em boa verdade, de características dos atos administrativos
decorrentes dos princípios da legalidade e da supremacia do interesse público
sobre o privado. Há dois aspectos a serem ressaltados:
a) a presunção de veracidade, que diz respeito à certeza dos fatos e, assim,
enseja a inversão do ônus da prova dos fatos alegados no ato administrativo; e
b) a presunção de legitimidade, que traduz a ideia de que a Administração
Pública atuou com observância das normas legais. Como consequência, as
decisões administrativas são de execução imediata (DI PIETRO, 2019, p. 96).
São presunções relativas (juris tantum), que admitem prova em contrário.
COISAS DO DIREITO
DIREITO ADMINISTRATIVO
Gustavo Fernandes

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