Você está na página 1de 19

UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

Larissa Cozandey de Lucas

NOTAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM HISTÓRIA DA


DEFICIÊNCIA NO BRASIL: DO MODELO ‘’ESPECIAL ‘’ PARA
‘’PROCESSOS INCLUSIVOS’’

Rio de Janeiro
2024
UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

Larissa Cozandey de Lucas

NOTAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM HISTÓRIA DA


DEFICIÊNCIA NO BRASIL: DO MODELO ‘’ESPECIAL ‘’ PARA
‘’PROCESSOS INCLUSIVOS’’

Trabalho apresentado como requisito


obrigatório para conclusão do curso de
Pedagogia, no formato de artigo científico,
resultante da pesquisa desenvolvida no
ano de 2024, sob a orientação de Fábio
Roberto Vieira.

Rio de Janeiro
2024
NOTAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM HISTÓRIA DA
DEFICIÊNCIA NO BRASIL: DO MODELO ‘’ESPECIAL ‘’ PARA
‘’PROCESSOS INCLUSIVOS’’

Larissa Cozandey de Lucas

RESUMO

Neste trabalho vamos nos concentrar em discutir os aspectos da realidade


educacional brasileiro no processo inclusivo de pessoas com deficiência em escolas
regulares. O tema tem grande relevância hoje, sobretudo, pela complexidade e
paradoxos, significados e resultados. Para este debate forneceremos cortes de uma
pesquisa etnográfica realizada em 2004, que mostra a dinâmica de uma instituição
especial brasileiro de caráter filantrópico. Num segundo momento, discutimos
conceitos fortemente enraizados em discursos de legitimação de políticas inclusiva.
Para focar nesses conceitos, analisaremos o Documento Subsidiária da
Política de Inclusão.

Palavras-chaves: Educação especial; Processos inclusivos; Educação brasileira;


Política educacional;

INTRODUÇÃO

Os debates em torno da questão das pessoas com deficiência no ensino regular


no Brasil referem-se a um duplo problema. A primeira é o caráter altamente excludente
da sociedade brasileira, não apenas na relação às pessoas consideradas deficientes,
mas torna também referência ao entrelaçamento de relações étnicas, de classe,
gênero, geracional, entre tantos outros que moldam o constituição histórico-social
daquele país onde a democracia, segundo um dos nossos intérpretes clássicos,
sempre foi um “grande mal-entendido” (Buarque de Holanda, 2006). O segundo é o
processo de substituição, para o movimento inclusivo, do conceito e possivelmente
das práticas políticas e pedagógicas reunidas sob a rubrica da integração. Já não se
trata de “integrar” as pessoas com deficiência na normalidade da vida. os “não
deficientes”, mas, quando observadas as diferenças, adaptar os meios e formas de
convivência e de respeito na convivência da pluralidade humano.

O discurso da inclusão encontra terreno fértil nas discussões pedagógicas,


defendendo uma escola que deveria acolher crianças e jovens com deficiência no
ensino regular, de forma que a convivência com colegas e professores pode beneficiar
a socialização e aprendizagem. Esta coexistência também seria benéfica para os “não
deficientes”, que aprenderiam com a multiplicidade de relacionamentos e teriam uma
espécie de espelho de suas próprias limitações. Este movimento teria
necessariamente que ser mediado por condições objetivas que proporcionem
aprendizagem para os diferentes tipos de deficiência: intérpretes de LIBRS (Língua
Brasileira) de Sinais) para surdos, material pedagógico em Braille para adaptações
arquitetônicas cegas para quem se movimenta na cadeira de rodas, etc. Além das
condições objetivas, é necessário rever a formação de professores no sentido de
adaptá-la justamente inclusão e não o esforço de normalização daqueles com
incapacidade.

No entanto, a prática diária nas escolas mostra inúmeras dificuldades que vão
muito além do que é garantido pela mensalidade. A ausência de condições para a
educação inclusiva reside na falta das condições mencionadas no parágrafo anterior,
que não sejam especificamente necessidades especiais, mas necessidades
concretas (Gracía, 1998).

A garantia de rendimento e permanência de crianças e jovens com deficiência


parece ser, nestas condições, resultado de políticas liberais na forma como
vivenciamos hoje. O primeiro ponto a ser considerado neste quadro é que, também
sem os elementos necessários para fornecer formação educacional eficaz, bastaria
dizer, velado ou não, que esses alunos compartilham com pessoas sem deficiência
os propósitos de sua socialização. Temos aí um reforço do modelo médico-terapêutico
na escola, ou ainda mais a partir de práticas assistenciais, no sentido de que mesmo
sem aquela imersão na aprendizagem do legado cultural de uma sociedade - a
promessa da escola burguesa – haveria uma possibilidade de conhecer outras
pessoas, fazer amigos, ocupar-se fora do mundo doméstico da casa ou o
confinamento de instituições para pessoas com deficiências. Interações com outras
pessoas, sozinho, valeriam a pena. Supõe-se, portanto, desprezo pelo caráter de a
formação intelectual e física que se esperaria da escola, no queque se refere ao
“deficiente”. Esta tabela é completada pela designação da escola de uma tarefa que
os adultos não conseguem realizar, mais ou menos nos cânones, segundo a crítica
clássica de Hannah Arendt (2003), da obrigação das escolas multiétnicas nos Estados
Unidos da América da década de 1950: crianças, aqueles seres humanos que ainda
não são políticos, e professores, aqueles professores cheios de dificuldades para
cumprir sua função do ensino, que resolvem o problema da discriminação social dos
aqueles com deficiência. Afinal, como não é possível ter uma sociedade inclusiva nos
esquemas políticos e económicos, pelo menos exige que a escola seja inclusiva.
Acesso ao conhecimento, torna-se então secundário.

O segundo ponto a ser considerado neste contexto é que em tempos de política


reduzidos à condição de um poder sobre a vida, uma biopolítica (Foucault, 1997),
processos inclusivos podem significar uma inclusão exclusiva (Agamben, 2005), uma
vez que saem daqueles com deficiência ao seu próprio destino, responsabilizando-os
e à escola também, pelo iminente fracasso pedagógico daquela experiência. Os
processos inclusivos pressupõem que cada escola, individualmente, será responsável
por cada um de seus novos alunos com suas especificidades diversas, isentando o
Estado, portanto, da aplicação de políticas específicas para este segmento, incluindo
que se refere aos recursos que lhe são atribuídos.

Considerando o contexto descrito, é apresentado este trabalho, que é uma síntese


provisória de pesquisas em andamento sobre os paradoxos dos processos inclusivos
no Brasil. Isto começa com uma breve exposição do cenário histórico das políticas
públicas destinado a pessoas caracterizadas como deficientes no Brasil, e depois
avançar na apresentação de uma reflexão que tenta demarcar um movimento. A partir
de uma situação demarcada por esquemas de sociedade disciplinar (Foucault, 1975;
Deleuze, 1990), a atenção de pessoas com deficiência passa a ser orientada, como
foi sugerido começando, no quadro de uma sociedade de controle, sob os auspícios
da biopolítica. Estamos nos referindo, essencialmente, a um certo deslocamento: do
quase exclusividade de instituições específicas de saúde, pessoas com deficiência
(as escolas “especiais”, muitas vezes filantrópico), passamos para a convivência com
os processos de inclusão em escolas regulares no âmbito de políticas que anunciam
a inclusão. Se um modelo não exclui necessariamente o outro, é necessário refletir
sobre o que está em jogo nesse trânsito.

Esse movimento se materializa neste trabalho através dos comentários. A primeira


é sobre uma instituição especial, de cuidado de deficientes mentais. É uma instituição
tipicamente disciplina, com suas classificações, conhecimentos, tempos e funções
muito bem definido. O segundo comentário refere-se a um dispositivo legal federal, o
Documento Subsidiário da Política de Inclusão, uma orientação para o movimento
inclusivo de pessoas com deficiência para escolas regulares. Pode-se argumentar que
é a transferência de um modelo disciplinar para outro, de uma escola especial para
uma escola regular. No entanto, há outro fator associado a isso processo. É que a
inclusão dos alunos com deficiência na escola regulação pode significar não apenas
um poder sobre o corpo de cada um, meticulosamente programado em escolas
especiais, mas uma desregulamentação que coloca o controle sobre a vida, na
medida em que, pelo menos incluir, excluir. Isso pode acontecer porque a hipótese de
que, na falta dos recursos necessários para processos inclusivos. Estas são apenas
mais uma estratégia de exclusão e abandono e, portanto, um agravamento do
preconceito. Nestes termos, e tomando livremente a sugestão de Hannah Arendt
(2003), é melhor ser segregado por lei do que ser politicamente discriminado,
especialmente em esta instituição, a escola, que justamente deve apresentar o mundo
e treinar para a vida pública.

Notas históricas sobre políticas para educação especial no Brasil

O século XIX marcou fundamentalmente a modernização do América Latina, e não


foi diferente no Brasil. Naquele século, especialmente na segunda metade, a força da
ciência, do pensamento médico elaborado na forma de higienistas, alienistas,
médicos, cientistas e reformadores sociais. É nos anos 1800 que cria a primeira
universidade do Brasil – tardia em relação às demais países latino-americanos – bem
como a primeira casa de alienado (o que hoje seria um hospital psiquiátrico). Como
mostra Bueno (1999), também no mesmo século em que foram criadas, pelo Governo
do Império, duas importantes instituições de educação especial: a Imperial Instituto da
Criança Cega (atual Instituto Benjamin Constant) e o Instituto dos Surdos-Mudos
(Instituto Nacional de Educação de Surdos INES, como é conhecido hoje), ambos na
capital do Império, a cidade do Rio de Janeiro. Como geralmente acontecia, esses
institutos seguiram o modelo parisiense. O desprezo por as peculiaridades e
necessidades locais com as quais funcionavam como abrigo para inválidos, ao
contrário dos institutos de Paris que funcionavam como escritórios de trabalho. Essa
diferença é explicada devido à natureza desnecessária do trabalho dessas pessoas,
levando em conta que a economia brasileira não era semelhante perto dos franceses.

O final do século XIX e o início do XX testemunharam o crescimento interesse pela


deficiência mental no contexto de preocupações higienistas. Coro com formas
ginásticas (Soares, 2007) e outros dispositivos para normalizar corpos, esse processo
era um dos fundamentos da segregação no ambiente escolar, tendo em conta
Lembre-se de que, por meio de inspeções nas escolas médicas, os alunos diferentes
foram separados dos demais para formar grupos especiais (Bueno, 1999).

Aliada à medicina e à saúde escolar, a psicologia, com a tarefa de desenvolver


processos pedagógicos orientados potencialidades individuais e, desta forma,
sustentar a separação do aluno normal do anormal. Nesse processo eles foram
avaliações psicológicas são fundamentais, na hora de classificar, para organizar os
grupos de forma homogênea. “Além disso, na educação do retardado, procedimentos
médicos tiveram que ser prescritos, incorporando processos de reabilitação.” (Bem,
1999: 93).

Esse crescimento da educação especial está associado à filantropia, que está


intimamente relacionada ao bem-estar. São as instituições filantrópicas (que não são
de responsabilidade do Estado) que determinam os caminhos da educação especial,
uma vez que possuem força e poder de decisão, inclusive no que diz respeito a política
educacional, desvinculando o Estado de uma série de compromissos e encargos. As
instituições filantrópicas lidam com educação especial e, em troca, recebem apoio
para pensar, decidir e construir os caminhos da educação para pessoas que não estão
dentro de escolas regulares.

Vivendo à margem, dependendo de iniciativas de caridade, foi o solo fértil que deu
origem à filantropia assistencial no universo da educação especial, assumindo, em
grande medida, a educação daquelas pessoas que foram e ainda são mal assistidas
Para o estado. Neste modelo, os recursos estatais são alocados, em forma de
acordos, para a iniciativa privada, que, sobretudo, das instituições filantrópicas, é
responsável pela educação especial.
Segundo Kassar (1998), foi em 1961 quando pela primeira vez, a legislação
brasileira aborda a educação especial. Nesse momento da história política nacional,
a lei dizia que a atenção pessoa com deficiência deve preferencialmente ocorrer no
ensino regular e, concomitantemente, tal legislação procurou garantir apoio financeiro
a instituições privadas considerado eficiente.

Esta perspectiva de atenção não é diferente hoje, uma vez que que é garantido o
direito à matrícula ao aluno com diagnóstico de deficiência no ensino regular e, ao
mesmo tempo, investe-se dinheiro públicas em escolas especiais privadas, para que
essas sejam as responsáveis pelo suporte técnico e profissional, oferecendo
aconselhamento, inclusive para escolas regulares. Isto é o que Kassar (1998:18),
chama de “discurso ambíguo”, pois “propõe atenção ‘integrados’ na rede regular de
ensino, delegados às instituições na administração específica a responsabilidade por
parte dos cuidados, através da 'garantia' de apoio financeiro." Além disso

As instituições privadas e organizações de caráter mais assistencial


e filantrópico detêm, na história brasileira, a maior parte das
instalações, dos alunos e dos recursos financeiros vinculados à
educação especial, além de terem grande influência na
definição de políticas. (Ferreira, 1998: 13).

Kassar (1998) coloca um ponto de extrema importância no debate no que ele diz
sobre filantropia:

instituições “privadas” se apresentam na história da atenção aos


deficientes mentais como extremamente fortes, com lugar garantido
nos discursos oficiais, chegando ser confundida com a própria atenção
“pública” aos olhos da população, pela “gratuidade” de alguns
serviços. (Kassar, 1998:16)

A falsa gratuidade deve ser entendida pelo fato de que embora as pessoas que
frequentam ambientes filantrópicos não seriam obrigadas a pagar pelos serviços
prestados (apenas contribuir com quem puder e também com o valor
que desejar), estes locais recebem ajuda governamental para se sustentarem, bem
como também realizando campanhas frequentes de arrecadação de fundos que eles
têm a contribuição da sociedade em geral. Sendo assim, apesar de não cobrarem
pelos seus serviços, as instituições filantrópicas não estão públicas.

É nessa perspectiva de “favor”, em que a garantia de frequentar tal instituição não


é da esfera do direito, como é o caso com as escolas públicas, mas na esfera da
previdência, que anula o exercício da cidadania baseado na caridade. Se trata de
conceber tais sujeitos em condição de inferioridade, portanto não é uma oferta de
direito, são mais como uma concessão.

Momento filantrópico – institucionalização da deficiência em

uma experiência concreta

Escrevemos neste capítulo uma situação específica, embora não singular, onde o
modelo disciplinar de Educação especial. Refere-se à organização disciplinar dos
tempos e funções em uma instituição filantrópica tradicional no Brasil, com diversas
unidades espalhadas por todo o território nacional, com relativa autonomia
administrativa e pedagógica. Os dados são provenientes de uma pesquisa etnográfica
realizada anteriormente 10 (Gonçalves,2004).

Primeiro passo para acolher uma pessoa com diagnóstico de deficiência mental
em uma escola especial, é a seleção. Consiste numa avaliação do futuro aluno,
realizada pela equipe técnica, além de entrevista com os responsáveis, sobre sua
educação, seu possível diagnóstico, problemas de saúde, complicações (ou não) no
parto, entre outras. Uma vez feita a seleção e a orientação que ela possa indicar (por
exemplo, atendimento psiquiátrico), o aluno aguarda sua vaga passando por
avaliações (Educação Física, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Psicologia e Pedagogia),
e recebe uma inscrição ou aguardar na lista de espera para poder se inscrever.

A partir da avaliação mencionada, é decidido em qual grupo incorpore-o. Estes


são compostos por pequenos grupos de estudantes, de acordo com a faixa etária e o
grau de comprometimento cognitivo. Os grupos são organizados da maneira
explicada abaixo.

A primeira delas é uma turma de Educação Infantil, com crianças de até os seis
anos de idade com qualquer deficiência da qual caracteriza a presença de deficiência
mental, como é habitual em da instituição, além de três turmas de ensino fundamental,
um formado por quem frequenta o ensino regular e recebe atenção paralela na escola
especial, tentando ajudá-los seu processo de escolarização. Os grupos de Educação
Fundamental, por sua vez, são formados por crianças e jovens de sete a quatorze
anos. Depois de completados quatorze anos, os alunos podem ser orientados a
Grupos de Trabalho, Iniciação ao Trabalho, Gabinete Pedagógico, A.L.O.u Orientação
para o Trabalho.

Os Grupos de Trabalho desenvolvem atividades lúdicas e manuais (cortar e colar,


pintar, desenhar, argila...) e trabalhar diretamente com conteúdo mais elaborados,
como o reconhecimento de letras, números e do calendário, escrevendo seu nome,
identificando-se identidade, entre outros. Há poucos alunos nos Grupos de Trabalho
que são realmente alfabetizados.

A iniciação ao trabalho traz aos alunos mais independente e com um nível


avançado de compreensão, capaz de realizar tarefas mais elaboradas, como fazer
trabalhos manuais para serem comercializados em festas da comunidade, entre as
próprias pessoas profissionais e para pessoas (familiares dos alunos ou não) que eles
visitam a escola. Entre eles temos o trabalho com tear, pintura empano de prato,
crochê e bordado em tecido. Dois alunos desse grupo se juntam alternadamente
durante a semana para ajudar o professor do grupo de Educação Infantil. Eles ajudam
a cuidar das crianças, acompanhando-os à sala de jantar e ao pátio, entre
outras atividades.

O Gabinete Pedagógico está dividido em atividades conexas pedagógico e


preparação de trabalhos manuais. Por esta razão, ao contrário do que grupo de
iniciação ao trabalho, o foco é a atividade com conteúdo que envolvem Escrita, Leitura,
Matemática, Geografia, etc. Este grupo faz trabalho manual apenas por diversão.
Alguns destes alunos também frequentam o ensino regular e têm no Gabinete
Pedagógico um reforço daquilo que é suposto ser aprendido na escola.

Os jovens e adultos que compõem este grupo são independentes e não


apresentam alto grau de comprometimento cognitivo. São os alunos que mais créditos
recebem, pelo fato de cursarem ônibus sozinhos, porque eles entendem e executam
muitas tarefas que eles são confiados. E principalmente por ter expectativas de que
aqueles alunos poderão ingressar em outros espaços sociais (ensino regular,
mercado de trabalho).
A.L.O é a sigla para Atividades Laborais Ocupacionais. A característica deste
grupo são os limites extremos dos alunos, tanto físico quanto cognitivo. A proposta
desse grupo são atividades ocupacionais, sendo o trabalho com conteúdo
praticamente inexistentes. As dinâmicas referem-se a atividades para elevar a auto
estima, desígnios, conversas, a tentativa de extinguir hábitos que não são socialmente
apropriados e aceitos, trabalham com barro. É um grupo que apresenta dificuldades,
inclusive, em participar de atividades externas, dependendo da locomoção
prejudicada de seus membros.

O grupo Idoso é formado por idosos dessa faixa etária. Geralmente em escolas
especiais podemos encontrar alunos acima dos setenta anos de idade. A saída
dessas pessoas do a escola é dada apenas por vontade própria e/ou familiar, estado
de saúde enfraquecido ou morte. A obra está ligada à música, dinâmica de
relaxamento, caminhadas, seções de vídeo e outras atividades recreativas.

Por fim, o grupo de Orientação para o Trabalho. Este é o único grupo que
permanece na escola em período integral, por esse motivo, é oferecido um almoço. O
trabalho com esses alunos tem a visão de seus inserção no mercado de trabalho.
Enquanto isso, dois aspectos são contemplados para a composição desse grupo: o
primeiro é a autorização da família (ou responsáveis); a segunda é ter o “perfil” estar
no mercado de trabalho.

O perfil é identificado pela independência, pela eficácia compreensão do que lhe


é solicitado, pelo bom comportamento, responsabilidade e assiduidade. Em grande
medida, características e respostas que os educadores julgam antecipadamente como
apropriadas. Esses alunos têm aulas pela manhã com um professor e outro pela tarde.
A professora da manhã propõe mais um trabalho específico, referente à escrita e aos
números. Eles também discutem sobre diferentes profissões, sobre documentos
pessoais (Documento de identidade, certidão de nascimento...), entre outros
romances. A professora da tarde procura reforçar o trabalho desenvolvido pela
manhã, além de proporcionar atividades mais descontraídas. É ocaso de pintura em
madeira, gesso e trabalhos em tear. Os materiais feitos por esses alunos são
expostos à venda, bem como também aqueles produzidos pelo grupo iniciação ao
trabalho.
Três alunos desse grupo exerciam trabalho remunerado quando a etnografia foi
realizada. Eles ajudaram no escritório de fotocópias que pertence à instituição que
mantém a escola especial. Aqueles três jovens frequentam a escola em apenas um
período, oposto ao de trabalho.

As mulheres desse grupo ajudam nos trabalhos dentro de suas próprias escolas,
como descascar e cortar legumes para as refeições, organizar e limpar as mesas da
sala de jantar, varrer os lanches e às vezes ajudam nos serviços de secretariado,
tarefas tipificadas como “feminina”, o que mostra a reprodução do estratégias de
discriminação de género também na educação especial.

Embora existam especificidades em relação aos grupos, existe uma rotina que
abrange toda a instituição. No momento em que os alunos cheguem à escola até o
início das aulas eles se encontram no pátio ou na sala de jantar (em dias de chuva) e
são acompanhados pelos preceptores. Oito da manhã é o sinal para os alunos e os
professores vão para suas salas de aula. O recreio é dividido em duas partes: uma às
dez horas é dado o sinal para o lanche, e daqui a quinze minutos faça a refeição. Os
alunos têm mais quinze minutos para ficar à vontade, quando costumam ouvir música,
eles conversam, brincam, dançam. Supervisão de alimentação e recreio também é
feito pelos preceptores.

Entre dez e trinta e dez e quarenta e cinco, eles têm o momento de higiene
(escovam os dentes). Nesse momento os alunos vão para o banheiro com a escova
e pasta de dente e a toalha, sendo auxiliado quando necessário, pelo professor da
turma e pelo fonoaudiólogo nessa tarefa. Ao meio-dia, as atividades do período
matinal. Os alunos que estão esperando para sair são supervisionados pelo preceptor,
bem como aqueles que chegam para ter aulas da tarde. Às treze horas começam as
atividades do turno da tarde.

Às quinze é o intervalo para o recreio, com a mesma dinâmica da manhã. Das


quinze e meia às quinze e quarenta e cinco, a higiene, às dezessete horas termina o
dia. Os estudantes permanecem além desse cronograma, assim como acontece com
os da manhã, permanecem sob a responsabilidade do preceptor.

A rotina também inclui outras atividades: duas vezes por semana os alunos têm
aulas de Educação Física e outra aula de Artes. Os grupos também contam com a
atenção de profissionais da Psicologia, Fonoaudiologia e Fisioterapia. Esse cuidado é
realizado em grupo e é a cada quinze dias porque tentamos dar ênfase à atenção
educacional e não clínico, e porque há poucos profissionais para o número de alunos
a serem atendidos.

Nas escolas especiais (estamos falando daquelas onde alunos são diagnosticados
como deficientes mentais) temos dois profissionais responsáveis por trabalhar com a
corporeidade dos alunos: o professor de Educação Física e o fisioterapeuta.

Tecendo algumas reflexões sobre o “documento subsidiário à


Política de Inclusão

Neste capítulo nos concentramos na análise do corpo no Documento Subsidiário


à Política de Inclusão, produzido pela Secretaria de Educação Especial/Ministério da
Educação, ou seja, em um breve clipe sobre o que existe hoje no Brasil Os conceitos
discutidos no Documento estão relacionados à construção de uma visão simplista e
reducionista em relação à inclusão de pessoas com diagnóstico de deficiência em
instituições regulares de ensino. Vale destacar também que tal documento tem como
objetivo orientar a trajetória das práticas educativas inclusivas

Começaremos o que propomos destacando a demanda por democratização. Este


conceito que aparece como consequência das conquistas dos movimentos que
reivindicam aos direitos humanos. Podemos lê-lo no documento:

Os importantes avanços produzidos pela democratização da


sociedade, em grande parte promovida pelos movimentos de direitos
humanos, apontam para a emergência da construção de espaços
sociais menos exclusivos e alternativas para convivência na
diversidade. (Documento Subsidiário à Política de Inclusão, 2005: 7)

Estas não são questões exclusivas do cenário brasileiro. Em portanto, parece que
aqui podemos perguntar-nos se a “democratização” não pode cumprir outra função, a
de neutralizar as diferenças sociais e convulsões que se originam daí. Assim, outra
questão se torna presente: até que ponto o discurso da construção de uma a
sociedade inclusiva não pode ser visto como um mecanismo de contenção? Ou ainda
mais: podemos realmente falar de uma conquista? Estaremos sendo ingênuos por
acreditarmos em sua existência ou pessimistas por desacreditá-la? Podemos e
devemos pensar num processo dialético, em que conquista e concessão coexistem
no mesmo contexto?

Vale lembrar Hannah Arendt (2004), quando trabalha com o problema da


segregação racial nos Estados Unidos da América.

{...} a igualdade como tal tem uma importância na vida política de uma
república maior do que qualquer outra forma de governo. Isto que está
em jogo, portanto, não é apenas o bem-estar da população negra,
mas, pelo menos no longo prazo, a sobrevivência da República.
(Arendt, 2003: 200)

Arendt aponta para um equilíbrio de relações políticas que ainda hoje é bastante
atual: esse equilíbrio precário entre conquista e concessão. Não é por acaso que as
concessões são resultado, precisamente – ou apesar – dos esforços dos movimentos
populares em Brasil. Mas, por outro lado, a concessão torna-se necessária para
garantir a “sobrevivência da república” e as relações de poder que o compõem.

Embora ter direito à escola regular possa significar uma conquista para as pessoas
com deficiência, suas famílias e todos que apostam no movimento de inclusão, por
outro lado, convivem com destruição das condições educacionais, com a falta de
condições real, com a óbvia falta de respeito pela educação, acaba naturalizar aquilo
que deve ser repudiado. Em outras palavras, isso parece ser a sensação: mesmo que
um aluno cego não tenha acesso a materiais em Braille na sua escola; mesmo que o
aluno surdo não conta com suporte linguístico de intérprete de LÍNGUA; por mais do
que as barreiras arquitetônicas tornam a locomoção do aluno com deficiência física;
mesmo que os professores assistentes não sejam contratados; mesmo que não
existam locais adequados para limpeza, rampas, barras de ferro nas paredes, móveis
adaptados e, pior ainda, por mais que o conhecimento seja desprezado, ainda estar
na escola é uma conquista.

Não está claro, portanto, se a reivindicação da Política de inclusão se faz pelo viés
da conquista/concessão ou pelo viés de favor. Ainda assim, mesmo nos termos de
Arendt (1993a), as leis podem nos dar uma falsa ideia de liberdade, uma vez
supostamente não seremos vítimas de interesses individuais (ou de pequenos grupos)
de possíveis governantes. Isto não é uma crítica a democracia e defesa da tirania,
mas de uma tentativa de mostrar que o aparato legal não é tão seguro assim, já que
um governo pode ser autoritário também tendo uma série de leis a serem obedecidas.
No final, “(...) a diferença entre a tirania e o governo autoritário sempre foi que o tirano
governa de acordo com sua própria arbitrariedade e interesse, sendo que o a maior
parte do governo autoritário draconiano é limitado por leis” (Arendt, 1993a: 97), o que
indica que limita o autoritarismo, embora não aponte para liberdade.

Outro aspecto que se destaca é a ênfase dada à importância de coexistência na


diversidade em tempos em que a intolerância se torna tão presente. É um fato que
vivemos com intransigência em relação às diferenças étnicas, religiosas, de gênero e
de orientação sexual, entre inúmeras outras situações. Mas não podemos credenciar
apenas à escola a tarefa de transformar os sujeitos em indivíduos mais tolerantes e
solidários. Expressão tensa, incluindo resistência, da sociedade em que está inserida,
a escola, como estrutura para receber os novos e treiná-los para a vida pública, não
pode resolver os problemas de todo o tecido social, este não é o seu papel.

Esta reflexão coloca-nos diante das ilusões de uma educação redentora,


transferindo a responsabilidade de “criar alternativas” que superem o preconceito. A
responsabilidade de cuidar disso é atribuída à escola, um problema social complexo:
o da intolerância, ou mesmo o da inclusão.

{...} a escola sofre pressão para acompanhar o novo tempo e sim


administrar com a diversidade do público que deve participar. Um
público de “aprendentes da cidadania” que, para exercê-lo, eles
querem mais do que o mero direito de expressão. Mas também um
público cheio de especificidades que não eram respeitados,
considerados e atendidos em suas diferenças nunca fará da escola
um dos espaços possíveis em que o exercício de uma política inclusiva
contribui para a construção de uma sociedade mais justa. (Documento
subsidiário à política de inclusão, 2005: 7)

É uma ilusão associar as crianças, imediatamente, em construindo um futuro


melhor. Esquecemos que os preconceitos são socialmente construídos, então, à
medida que as crianças são formadas através das relações sociais eles também são
formados. A ideia de pureza, de ausência de perversidade nas crianças nasce de uma
concepção romantizada da infância.
Quem quisesse seriamente criar uma nova ordem política através da
educação, isto é, nem através da força e coerção, nem através da
persuasão, ele será forçado ao terrível Estado a ser fundado. (Arendt,
1993b: 177)

Hannah Arendt critica o modelo de educação contemporânea, demarcado por uma

{...} educação progressista que, abolindo a autoridade dos adultos,


nega implicitamente a sua responsabilidade pelo mundo em que as
crianças colocam e rejeita o dever de guiar as crianças através aquele
mundo. Chegamos ao ponto em que se pede às crianças que mudar
e melhorar o mundo? (Arendt, 2003: 203-204)

Procurar abolir a intolerância propondo a inclusão dentro das paredes da escola,


é uma forma bastante reducionista de abordar um problema de tamanha
complexidade. O discurso inclusivo está se tornando tecida a partir de conceitos e
expressões muito nobres e inquestionáveis. Quem entre nós seria capaz de
questionar o conceito de cidadania? Quem entre nós seria capaz de se isentar da
responsabilidade pela construção do processo inclusivo?

Nesta perspectiva, a inclusão social deixa de ser uma preocupação a


ser compartilhada entre governantes, especialistas e um grupo
delimitado de cidadãos com alguma diferença e torna-se uma questão
fundamental da sociedade. (Documento subsidiária da política de
inclusão, 2005: 7)

Como foi dito anteriormente, a aprendizagem não parece desempenham o papel


fundamental no processo inclusivo, mas a convivência, socialização, estar junto,
aprender com diferenças e tolerância. Isso acaba descaracterizando a função social
da escola: a de transmitir/construir conhecimentos que não sejam apenas na esfera
da espontaneidade. A escola deve estar comprometida apresentar o mundo às
crianças, e não apenas ensinar-lhes a "arte de viver". Pois “(...) uma educação sem
aprendizagem é vazia e, portanto, muita coisa degenera, muito facilmente, em retórica moral
e emocional.” (Arendt, 1993b: 196).

A proposta de inclusão vai além do caráter educativo e legalmente significa um


projeto de empresa, conforme seção a seguir:
As referências habitualmente feitas relativamente à inclusão em
campo da educação considere as dimensões prática educacional
pedagógica e jurídica. Sem dúvida, dois campos importantes quando
a implementação destes se destina a ideais. No entanto, uma
extensão importante da discussão sobre os percursos das políticas
públicas para a inclusão escolar seria a consideração do contexto em
que almeja uma sociedade inclusiva. (Documento subsidiário para
política de inclusão, 2005: 22)

Mais uma vez estamos perante a responsabilidade das escolas para uma
sociedade melhor para se viver. Mais uma vez é depositado em crianças e aos jovens
a árdua tarefa de transformar o mundo, como criticou Arendt (2003b).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os processos que visam incluir as pessoas com deficiência nas escolas regulares
propõem-no como uma solução para vários dos problemas do modelo disciplinar da
escola especial. Na verdade, o apostar na coexistência e na pluralidade é democrático
e pode compor um projeto de formação avançada. Por outro lado, espalha-se um
discurso capaz de sensibilizar a todos para a importância de possibilitar àqueles a
quem é atribuída a condição de súditos, a entrada em escolas regulares. Essa
conscientização envolve a mobilização de sentimentos e valores humanísticos, como
o respeito pela diferença, à igualdade de oportunidades, à tolerância; para a
democratização espaços, entre muitos outros.

As condições para inclusão nas escolas regulares enquanto isso, eclipsam uma
certa exibição em relação aos novos alunos em que se refere à transmissão de
conhecimento, à apresentação de mundo (Arendt, 1993b), ao escolher a coexistência
entre diferentes um dos fatores mais importantes do processo. Viver juntos, respeitar,
tolerar, constituem o leitmotiv da educação inclusiva. Também é colocado, a
responsabilidade dos adultos, ao exigir que as crianças sejam os responsáveis pelo
mundo, exigindo que sejam mais tolerantes, fraterno, que construa regras de
convivência para que no futuro em seguida, podemos ser mais felizes.

É verdade que segue o modelo disciplinar como eixo na escolaridade, mas, diluída
na não identidade de aluno, cada pobre também é jogado a favor da sua própria sorte,
uma vez que as condições de objetivos de ensino-aprendizagem estariam garantidas
no novo processo. Em outras palavras, ao se tornarem “sujeitos-alunos”, eles se
sujeitam ao controle da escola neoliberal, à qual é atribuída a responsabilidade
através de suas próprias rachaduras.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

• SOARES, C. L. Educação Física: raízes europeias e Brasil . 4 ed. Campinas: Autores


Associados, 2007.
• DOCUMENTO SUBSIDIÁRIO À POLÍTICA DE INCLUSÃO. Ministério Da
Educação/Secretaria De Educação Especial. Brasília, 2005.
• GONÇALVES, G. C. Nas contradições da educação especial: em foco o movimento
apeanho. Florianópolis: FAED/UDESC, 2004. (Monografia de Especialização em
Educação Inclusiva).
• GARCIA, R. M. C. A educação de indivíduos que apresentam sequelas motoras: uma
questão histórica. Cadernos CEDES. Campinas, v. 19, n. 46. set/1998. p. 81-98.
• FREIRE, P. Extensão ou Comunicação? 11 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 2001.
• FOUCAULT, Michel. Surveiller et punir. Paris: Gallimard, 1975. ______. Il Faut Défendre
la Société. Paris: Seuil, 1997.
• FERREIRA, J.R. A nova LDB e as necessidades educativas especiais. Cadernos CEDES.
Campinas, v. 19, n. 46. set/1998. p. 7-15.
• BUENO, J.G.S. Educação Especial Brasileira: integração/segregação do aluno diferente.
São Paulo: EDUC, 1999.
• BUARQUE DE HOLLANDA, S. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
• KASSAR, M.C.M. Liberalismo, neoliberalismo e educação especial: Algumas
implicações. In: CADERNOS CEDES 46 - A nova LDB e as necessidades educativas
especiais, 1998.

Você também pode gostar