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O Fado não se vê nem se

ouve simplesmente
acontece
A origem do fado, um estilo musical tipicamente português, é de
difícil localização temporal e geográfica. Mesmo assim, pensa-se
que o fado de Lisboa terá nascido a partir dos cânticos do povo
muçulmano, marcadamente dolentes e melancólicos.
Outras teorias apontam para a origem do fado no lundum, música
dos escravos brasileiros que teria chegado até nós através dos
marinheiros, cerca de 1820. Outra hipótese remete para os
trovadores medievais cujas canções contêm características que o
fado conserva. As cantigas de amigo revelam semelhanças com
alguns temas recorrentes do Fado de Lisboa, assim como as
cantigas de amor possuem a áurea romântica do Fado de
Coimbra. A crítica política e social tão típica do Fado tem
correspondência nas cantigas de escárnio e maldizer.
Nos centros urbanos de Lisboa e do Porto, o fado é um fenómeno
situado nas zonas mais antigas da cidade, e é cantado em casas
típicas, onde a decoração alusiva ao fado - o xaile negro e a
guitarra portuguesa - está sempre presente. Os temas mais
recorrentes passam pelo amor, a tragédia, as dificuldades da
vida, e a saudade, daí o seu tom triste e lamentoso. A ideia do
destino (a palavra fado deriva do latim fatum, que significa
destino) como uma força implacável que está para além da
vontade humana é essencial para a compreensão deste estilo
musical.
A figura de Maria Severa (1820-1846) permanece como a mítica
representante do fado lisboeta de meados do século XIX, tendo
mesmo sido objecto de um romance e peça de teatro com o seu
nome, posteriormente adaptada ao cinema por Leitão de Barros.
Já no século XX, o Fado tem em Amália Rodrigues (1920-1999) a
sua embaixatriz nos maiores palcos de todo o mundo, onde a sua
voz interpretou canções como "Povo Que Lavas No Rio", "Foi
Deus", e "Vou Dar De Beber À Dor". Outros fadistas que fizeram
a história deste estilo musical incluem Carlos do Carmo, Carlos
Ramos, Alfredo Marceneiro, Fernando Maurício, Hermínia Silva,
Lucilia do Carmo, Maria Teresa de Noronha, Antonio Mourão,
Rodrigo, Tristão de Silva, e Maria Alice, entre muitos outros. Nas
décadas de 80 e 90, novas gerações surgiram, das quais se
destacam Nuno da Câmara Pereira, Dulce Pontes, e Camané,
entre outros.
O fado de Coimbra estará associado aos temas do amor -
realizado nas célebres serenatas à pessoa amada - e do findar
de um ciclo da vida concretizado na despedida da universidade.
Nesta variante do fado, destaca-se o nome do guitarrista Artur
Paredes - pai de Carlos Paredes - , intérprete inovador do estilo
coimbrão de tocar guitarra. Grandes nomes do fado de Coimbra
incluem Edmundo Bettencourt (1889-1973), António Menano, e
Armando Goes, entre outros. É de destacar ainda a figura de
Augusto Hilário (1864-1896), natural de Viseu e estudante
universitário em Coimbra, que se notabilizou como singular cantor
de fado e tocador de guitarra, e cujo estilo ficou imortalizado
como Fado Hilário.

A SEVERA e o 13º CONDE DO VIMIOSO

Apesar de Júlio Dantes, no seu romance " A SEVERA " ,ter trocado o
nome do seu grande amor, por pressão do Presidente do Concelho Hintze
Ribeiro e da família do Conde de Vimioso, o nesmo romancista escreveu
uma peça para teatro, representada pela primeira vez no actual S. Luis ( na
época Teatro D. Amélia ). A troca escolhida pelo romancista, onde o grande
amor de Maria Severa - 13º Conde de Vimioso D. Francisco de Paula
Portugal e Casro (1817-1865 ), foi substituido pelo Conde de Marialva era
( que me perdoe o Sr. Doutor De-antes ) bastaste ridícula. O último Conde
de Marialva, D. Pedro José Vito de Menezes Coutinho, tinha " em bom
calão - batido a bota ", em Paris no ano de 1823, tinha a Severa 3 anos de
idade. No entanto, não consegui documentar-me, da existência de "
pedófilos " na época.

Cerdidão de casamento dos pais de Maria Severa

Aos vinte e sete dias do Mes de Abril de mil e oitto Centos e quinze annos,
nesta Parochial Igreja de Santa Cruz da Prideira desta nilla de Sanbtarém,
Corridos os Banhos em cumprimento alguns e observando em tudo o que
determina o Sagrado Concílio, Terendentino, e Constituissonis deste
Patriarchado,de na minha pezença e das Testemuinhas abaxo declaradas e
asignadas, Receberão por Marido, Mulher Severo Manoel e Anna
Gertrudes, elle filho de Pais incognitos, Baptizado na Freguezia de S.
Nicolao desta villa, e morador na Freguezia de Nossa Senhora de Marvilla
desta villa o que tudo mostrou pella Ceridão do Banho da sua naturalidade
e Certidão dos dezoutrigos; ella filha Legitima de Alberto Joze Lobo, e de
Quitéria Maria natural da Freguezia de S. Francisco da Ponte de Soure
Bispado de Porto Alegre o que tudo justificou no Juizo Eclesiastico dests
mesma Villa sendo Viugário Geral o Reverendo Domindos Ferreira do
Salvador, o qual mandado me foi apresentado por Ordem do ditto para que
eu Recebesse por Marido, e Molher os Contraentes asima dittos, a
Contrahante se tem dezcrerignado as Quaresmas do Estilo nesta Freguezia
de Santa Cruz aonde he morador; foro Testemuinhas prezenteque Comigo
asignarão João Godinho, Manoel Martins o qual asignou com o sinal da
Cruz e que confirma para constar faz este termo assente era ut supra.

João Godinho

Manoel Martins

Cuadjutor Francisco Boiz Affonso

Foi na taberna da Rosário dos óculos ( rua do Capelão ), que a nossa


cantadeira conheceu o conde de Vimioso. Mas Severa não tinha poiso certo.
Cantava o fado na tasca do Cegueta, no Café da Bola, mas, dizem as más
línguas, que o seu sítio preferido para cantar o FADO era o café do
Joaquim Silva (moço de forcados), próximo da praça de touros do Campo
de Santana, onde o Conde se juntava com amigos e amantes da arte de
tourear.

O 13º Conde de Vimioso era um hábil cavaleiro e distinto na arte de lidar


com os toiros. Foi durante muitos anos aplaudido na antiga Praça de toiros
do Campo de Santana.

Tudo leva a crer que Maria Severa tinha vivido os três últimos anos da sua
vida, na companhia do Conde. Por ele morreu de amor. Foi a enterrar em
vala comum, como consta na sua certidão de óbito do cemitério do Alto de
S. João, no livro Nº 3, folha 117. Morreu tuberculosa, sem ter recebido a
paga de tantas lágrimas derramadas, talvez porque o seu destino assim o
quis.

Chorai, fadistas chorai

Que a Severa se finou


O gosto que o FADO tinha

Tudo com ela acabou

A SEVERA and
the 13th COUNT OF VIMIOSO

Even though in his novel "A SEVERA " Júlio Dantes changed the name
of his great love, at the request of the President of the municipal council
Hintze Ribeiro and the Count of Vimioso’s family, the novelist wrote a
play for the stage, performed for the first time in the theatre now known
as S. Luis (at the time it was called Teatro D. Amélia). The alteration
made by the novelist, in which the great love of Maria Severa – 13th
Count of Vimioso D. Francisco de Paula Portugal e Casro (1817-1865) –
was replaced by the Count de Marialva, was rather ridiculous (if you will
forgive me Doutor De-antes). The last Count de Marialva, D. Pedro José
Vito de Menezes Coutinho, had, in good slang –“ kicked the bucket”, in
Paris in 1823, when Severa was three years old. However, I was unable to
find out if there were records of “paedophiles” at the time.
Marriage certificate of Maria Severa’s parents
On the twenty seventh day of the month of April in the year one thousand
eight hundred and fifteen, in the Parish Church of Santa Cruz da
Prideira in the town of Santarém, the Banns having been published and
observed in all ways determined by the Holy Council, Terendentino, and
Constitutionalist of this Patriarchate, in my presence and that of the
Witnesses declared below and duly signed by them, will receive as
Husband and Wife, Severo Manoel and Anna Gertrudes, he son of
unknown parents, Baptized in the Parish of S. Nicolao of this town, and
resident in the Parish of Nossa Senhora de Marvilla of that town as
shown in the Certificate of Banns of his nationality and Certificate of
dezoutrigos; she legitimate daughter of Alberto Joze Lobo, and Quitéria
Maria natural of the Parish of S. Francisco da Ponte de Soure Diocese of
Porto Alegre duly justified at the Ecclesiastical Court of this same Town
whose Vicar General was the Reverend Domindos Ferreira do Salvador,
who ordered me to represent him so I could pronounce as Husband and
Wife, the Bride and Groom aforementioned, the Contrahante has
described the Customary Forty Days in this Parish of Santa Cruz where
he resides; were present with me the signed Witnesses João Godinho,
Manoel Martins who signed with the sign of the Cross and which
confirms to be officially stated, this term registered era ut supra.
João Godinho
Manoel Martins
Coadjutor Francisco Boiz Affonso
In the tavern of Rosário dos óculos ( rua do Capelão ), our singer made
the acquaintance of the Count of Vimioso. But Severa had no fixed place
for playing. He sang fado in the Cegueta tavern, and at the Café da Bola,
but, as rumour would have it, his favourite place to sing FADO was the
café which belonged to Joaquim Silva (member of the group who jump
on the back of the bull in bull fights), near the bull ring in Campo de
Santana, where the Count met up with friends and aficionados of the art
of bull fighting.
The 13th Count de Vimioso was a fine gentleman, distinguished in the art
of working with bulls. For many years he was applauded in the old Bull
Ring in Campo de Santana.
It would appear that Maria Severa lived with the Count for the three last
years of her life. She died for love of him. She was buried in a common
grave, as stated in her death certificate in the cemetery of Alto de S. João,
in book Nº 3, page 117. She died of tuberculosis, with no payment for the
many tears she shed, perhaps because this was to be her destiny.

Cry, fadista, cry


With the passing of Severa
The very taste of FADO
Has left us

Prefácio do FADO

Deixem-me que me apresente.... eu sou o FADO. Por favor não me


confundam com o meu homónimo "fado" que tem a sua origem no
vocábulo latino "fatum", que quer dizer destino, aquilo que tem de
acontecer. Não, eu sou o FADO, expressão musical umas vezes cantado,
outras maltratado e no sentir, dos mestres, lagrimado nas cordas de uma
Guitarra Portuguesa. Mas já que a nossa cultura parece ser parente
próximo do meu homónimo, por favor dêem-me o privilégio de me
defender. Não me façam velho, porque não o sou e não me troquem a
nacionalidade, porque tenho muito orgulho em ser português. Se querem
saber o nome dos meus pais não leiam certidões de nascimento erradas.
Sejam cuidadosos na procura. Se por vezes sou melancólico, não nasci no
Norte de África, caso contrário teria casa no Algarve (último reduto da
cultura Muçulmana). Há quem confunda o meu gingar com o balancear
das Caravelas. Pouco provável. Sabem é que eu enjoo, senão teria
aproveitado os cruzeiros do Infante D. Henrique e seria personagem
célebre dos nossos Descobrimentos. Que eu saiba, Luís de Camões não
era fadista. Já agora e aproveitando o tempo de antena que me estão a
conceder fazia uma pequeno reparo às pessoas que elaboram os
dicionários e as enciclopédias. Não leiam só o livro do Tinop. Procurem
outras opiniões. Certamente passariam a conhecer-me melhor. Alberto
Pimentel chamou-me de "Triste Canção do Sul". Se por um lado fiquei
triste (não se esquecam que eu já entrei em revistas!). por outro lado
fiquei a saber que um senhor chamado Lacerda, na quarta edição de um
dicionário que elaborou, deu-me a conhecer em 1874. Se não faço parte
de dicionários anteriores, ou fui bébé durante muitos anos, ou então
tenho razão: não sou muito velho. Querem que eu seja a canção nacional
mas os meus amigos não vão na conversa. Não represento os Viras
minhotos nem as Arruadas alentejanas, não sei fazer o sapateado do
Fandango nem as voltinhas do Corrido algarvio. Os mais letrados
querem que eu seja doutor mas, se é certo que Augusto Hilário me levou
para Coimbra, os estudantes criaram uma Guitarra e uma maneira
própria de cantar. Eu sou o Fado de Lisboa, embora tenha um primo que
estudou em Coimbra, que se veste de capa e batina, que se chama Balada.
Ainda não havia telenovelas, já queriam que eu fosse brasileiro.
Confundir danças de umbigada, destinadas a distrair os marinheiros,
com FADO, só porque no Brasil existia essa dança, é o mesmo que pedir
ao seu mecânico para colocar no seu automóvel, aquando da revisão,
velas (de pano). Os mais saudosistas defensores do nevoeiro (desculpem o
aparte, por acaso as raparigas do Boletim Meteorológico até são
simpáticas) querem que eu também tenha participado nas desavenças de
4 de Agosto 1578, onde El Rei D. Sebastião se perdeu em Alcácer Quibir.
Estas crónicas foram feitas em francês por um senhor chamado Caveiral.
Alguém pouco cuidadoso traduziu para português, a palavra Guiterne
(viola de arame) como Guitarra, não desfazendo... até tem uma bela
sonoridade. A propósito de Guitarra Portuguesa. Sabem como a conheci?
Encontrei-a na esquina de uma rua e "vivemos o amor com carácter de
urgência", parafraseando Fernando Pessoa.

Como o Sol ainda vai alto e o burrinho anda bem se querem saber mais
de mim arranjem um tempinho da vossa vida agitada e leiam o livro que
o José Lúcio escreveu. Para os entendidos ele não vai contar novidades,
para os estudiosos talvez encontrem pontos de discórdia, mas como da
discussão nasce a luz, acendam-se as velas porque se vai cantar o Fado.

Mais não digo e aos costumes disse nada.

Do vosso amigo.

O Fado
FADO Preface

Let me introduce myself.... I am FADO. Please do not confuse me with my


homonym "fado" whose origin is to be found in the Latin word "fatum",
which means destiny, that which is predetermined. No, I am FADO, a
form of musical expression sometimes sung, sometimes ill-treated and
with no feeling, by the masters, crying on the strings of a Portuguese
Guitar. But as our culture appears to be a close relation of my homonym,
please allow me the privilege of defending myself. Don’t treat me as old
for I am not and I will not change my nationality because I am proud to
be Portuguese. If you wish to know my parents’ names do not read false
birth certificates. Take care while searching. Although I am sometimes
melancholic, I was not born in North Africa, if I were I would have a
house in Algarve (last refuge of the Muslim culture). There are those who
confuse my swagger with the swaying of the Caravels. Rather unlikely. I
get seasick; otherwise I would have taken advantage of the cruises of
Infante D. Henrique and become famous in our Discoveries. As far as I
know, Luís de Camões was not a fado singer. While we are on the subject
and there is still time, I should like to make a small remark to the people
who make dictionaries and encyclopaedias. Do not only read the book by
Tinop. Seek other opinions. You will certainly get to know me better.
Alberto Pimentel called me "Triste Canção do Sul" (The Sad song of the
South). If on the one hand I am sad (do not forget I have appeared in
reviews!), on the other hand you should know that a gentleman called
Lacerda, in the fourth edition of a dictionary he made, says I was heard
of in 1874. If I am not in previous dictionaries, or was a baby for many
years, or if I am right: I am not very old. They want me to be the national
song but my friends do not agree with this. I do not represent the Vira
dances from Minho, nor the Arruadas from Alentejo. I do not know how
to do Fandango tap dancing nor the running version of Fado from
Algarve. The more lettered wish me to have a doctorate but, Augusto
Hilário really did take me to Coimbra, and the students created a
Portuguese Guitar and a specific form of singing. I am Lisbon Fado,
although I have a cousin who studied in Coimbra, who wears a cloak and
cassock, and is called Ballad. There were no mobile phones then. They
even want me to be Brazilian. To confuse umbilicus dances, destined to
entertain sailors, with FADO, just because this dance exists in Brazil, is
the same thing as asking the mechanic when checking your car to fit it
with spark plugs made of cloth. The most nostalgic defenders of the state
of confusion (excuse the remark on the side, in fact the girls at the
Meteorological Bureau are quite nice) also want me to take part in the
discussions about August 4th 1578, as to whether El Rei D. Sebastião was
lost at Alcácer Quibir. These narratives were made in French by a
gentleman called Caveiral. Some negligent person translated into
Portuguese the word Guiterne (metal stringed guitar) as Guitar, with no
offence... it has a fine fullness of sound. As for the Portuguese Guitar; do
you know how I came to meet up with it? I found it on the corner of a
street and "we lived love with a sense of urgency", to paraphrase
Fernando Pessoa.
As the Sun is still high in the sky and the donkey is trotting well, if you
wish to know more from me find some time in your busy life and read the
book José Lúcio wrote. The connoisseurs will find nothing new, the
students may perhaps find points of disagreement, but as light comes
from discussion, light the candles because we are about to sing Fado.
I shall say no more and have said nothing about usage.

From your friend.


Fado

As Cegadas

Algumas curiosidades sobre as "Cegadas".

Existiram vários tipos de "Cegadas". Não havendo uma data rigorosa para o seu
aparecimento eu arrisco a data de 1880 para o aparecimento dos primeiros
espectáculos de rua, cantadas em tom maior, em FADO Corrido. As "Cegadas não
eram mais que uma crítica, cantada em verso, dos costumes e desavenças da época.
Nela participavam quatro homens, um, vestido com saias que representava a
mulher do lupanar, cantadeira e mulher de vida fácil, outra personagem o Janota,
também conhecido pelo "pagantes" (que só pagava quando a sua protegida lhe
fornecia empréstimo a fundo perdido). Participava também um polícia que
empunhava uma espada de pau e tinha por função manter ou provocar a
desordem e finalmente o Galego. Foram muitos os Galegos que emigraram para
Lisboa. Faziam os trabalhos que ninguém queria, muitos deles conseguiram subir
na vida e ainda existem hoje em Lisboa muitos restaurantes dessa proveniência.
Durante os três dias do Entrudo estas boas almas, de bolsos depenados, actuavam
nos bairros de Lisboa onde a populaça assistia em redondel e os mais priveligiados,
não fosse o Diabo tecê-las, assistiam a estas fadistices de rua nos seus camarotes
(nas janelas dos prédios que circundavam o local onde a "Cegada" tinha lugar), no
final, os quatro actores diziam a célebre frase "cinco reis, dê reis, tudo é dinheiro".
Como nem sempre os assuntos versejados eram do agrado do auditório, havia
sempre alguém que se picava, em geral a pancadaria final fazia inveja aos
produtores de filmes de Cowboys americanos. Ou porque os actores se cansaram
das nódoas negras, dadas sem intensão pelas cargas policiais, ou porque o FADO
se tornou mais polido, as "Cegadas" tornaram-se dramáticas e passaram a evocar
situações históricas cantadas em tom menor, mais propício ao ambiente evocado.
Serviam de tema o drama de D. Inês, o exílio de Camões ou o nevoeiro que
impediu o regresso de D. Sebastião. Quando a República passou a ter os seus
adeptos e Marx e Lenine começaram a ser lidos, as "Cegadas" começaram a ser
políticas e serviam de campanha política para a sensibilização da opinião pública
para a queda da Monarquia. Já agora, permitam-me o aparte: terá alguma coisa a
ver com o assunto as campanhas política actuais serem uma grande cegada? O
FADO serviu, uns anos antes da queda da Monarquia em 1910, como canção
política. A provar esta afirmação João Black, socialista republicano que começou a
cantar em1893, deslocava-se muitas vezes ao Alentejo para cantar os seus
Alexandrinos políticos, a que ele chamava cantigas ao domicílio. Se vivesse na
época actual eu chamar-lhe-ia especialista em presidências abertas.

O QUADRO DE MALHOA

Será que alguma vez teve a curiosidade de visitar o museu da cidade de Lisboa? De
certeza que já teve oportunidade de saborear este belo quadro"O FADO". José
Vital Branco Malhoa, pintor famoso, nasceu nas Calda da Rainha em 1855, e
faleceu em 1933, em Figueiró dos Vinhos. Veio para Lisboa aprender o ofício de
entalhador, mas era seu fado mudar a sua arte para a pintura. Frequentou a
Academia de Belas Artes de Lisboa e foi um atento observador da Mouraria, zona
que o inspirou para a criação do seu célebre quadro "O Fado".

Algumas curiosidades sobre o quadro de Malhoa.

Na época, os pintores contratavam modelos vivos para melhor poder expressar a


sua arte, foi na Rua do Capelão que Malhoa contratou o Ambrósio Guitarrista e a
Adelaide da Facada (tinha na face esquerda uma grande cicatriz e talvez por esse
facto ela a encubra com a mão, virando a cara ao pintor). O Ambrósio Guitarrista
fez a vida negra a Malhoa. Por ser desordeiro passava mais tempo no calaboiço do
que em liberdade, facto este que fez atrasar, em muito, a conclusão do óleo.
Recriando no seu atelier (Casa António Anastácio) um cenário natural, esta obra
foi finalizada no ano de 1910. Nem sempre o quadro de Malhoa foi conhecido por
"O Fado". Em 1912 esteve exposto em Paris com o nome "Sous le Charme", em
Buenos Aires "Será Verdade" e em Liverpool "The Natice Song". Em 1917 foi
adquirido pela Câmara Municipal de Lisboa pelo valor de quatro mil escudos.

Malhoa quis homenagear e dar dignidade ao FADO. No entanto numa entrevista


dada a um jornal nega esta afirmação. Possivelmente, este facto deve-se à polémica
gerada à volta da aquisição do quadro pela Câmara Municipal de Lisboa. Foram
muitos aqueles que se insurgiram em relação a esta aquisição alegando existirem
pintores mais consagrados internacionalmente.

O "Fado" de Malhoa retratava uma cantadeira acompanhada por um tocador que


ostentava com um certo sentimento a sua banza (Guitarra Portuguesa). Muitos
foram aqueles que confundiram este quadro com a figura de Severa acompanhada,
possivelmente, pelo Sousa do Casacão. As chinelas são idênticas, a cabeleira é farta
a saia tem rodapé. No quadro não faltam ainda pequenos pormenores como a
imagem de Cristo na parede onde as mágoas eram afogadas no fundo de uma
garrafa de vinho.

A GUITARRA E O FADO
A palavra GUITARRA, não identifica nenhum instrumento em especial, excepto se
a localizar temporalmente e geograficamente. Cada país tem a sua guitarra. Se for
a Espanha comprar uma " guitarra ", o empregado traz-lhe uma viola. Já agora,
quando é que será, que a rapaziada passa a chamar às "guitarras eléctricas de
violas eléctricas, às guitarra de Folk violas de Folk e os cursos de guitarra clássica,
passam a ter o nome correcto de viola dedilhada.

Mas, como terá aparecido no vocabulário musical a palavra GUITARRA e


especificamente em Portugal.

A palavra GUITARRA, sem especificar a que tipo de guitarra no referimos, tem a


sua origem etimológica na língua Grega, "Kythara", que os latinos transformam
em "Cithara".

Dentro da mitologia existem, várias lendas sobres a origem desta palavra:

A palavra GUITARRA, proveio de " CYTHERON " , nome de uma montanha


habitada por musas.

Do antigo nome " CYTHARA ", nome de ilha grega - CERIGO , paraíso da poesia
e do amor, onde existe um templo dedicado a Vénus.

Atribui-se a invenção de um cordofone, um mouro/espanhol, que viveu na idade


média de nome AL-GUITAR.

Pela análise e leitura comparada, de vários documentos que abordam este assunto,
é tido como certo a existência de dois tipos de guitarras, na Península Ibérica, na
Idade Média: a Guitarra Mourisca e a Guitarra Latina. A primeira de forma
ovalada, a segunda com enfraque, isto é, em feitio de oito.

Se puder e tiver paciência para isso, consulte o livro de Juan Bermudo,


"Declaracion de Instrumentos Musicales" publicado em 1555, que se encontra na
Biblioteca Nacional de Paris (está escrito em Espanhol do séc. XVI e existe uma
edição fac-similada na Biblioteca Nacional de Lisboa).

Ainda hoje, muitas são as pessoas que confundem viola com guitarra. A confusão,
está na pouca identidade da cultura musical Portuguesa. Muitos são os professores
que dão "as aulas de guitarra clássica" quando o instrumento que ensinam, se
chama de viola ou violão, em Português.

Para os mais cépticos, consultar o dicionário de música, de Thomaz Borba.

Musicólogos atentos estudaram, a terminologia utilizada pelos escritores


Portugueses, chegando a conclusão, que se a palavra VIOLA já era utilizada no
século XV e, a palavra GUITARRA só é utilizada no século XVIII. Tem a sua
lógica, porque é nesse século que a Guitarra Portuguesa, corta o seu cordão
umbilical. Não como os mais saudosistas pretendem, ter estado presente em
Alcácer-Quibir, batalha no norte de África onde D. Sebastião perdeu a vida, ou
talvez não, em 5 de Agosto de 1578. Segundo as crónicas do frade francês Caveral,
os portugueses teriam deixado ficar no campo de batalha, 10.000 guitarras. Quem
analisou este documento e o traduziu para português, não teve o cuidado de
traduzir a palavra "guiterne" para Viola. Assim, tendo em conta a veracidade dos
documentos analisados, poderei afirmar que primeiro apareceu a Guitarra
Portuguesa (final do século XVIII), só depois aparece o FADO (como expressão
musical).

Portugal é um País muito rico, nos diversos Cordofones que apresenta. Assim,
além do Violão tradicional de 6 cordas, companheiro das Fadistices da Guitarra
Portuguesa, existem várias violas de arame, com características bem definidas:

A Viola Amarantina (Amarante), Viola Braguesa (Braga), Viola Beiroa (Castelo


Branco), Viola Toeira (Coimbra), Viola Campaniça (Alentejo), Viola de Arame
(Madeira ), Viola da Terra (S. Miguel, Açores) e Violas de 15 e 18 ordens da
Terceira (Açores).

Cada um destes instrumentos, tem uma afinação própria, um determinado número


de cordas, enfim uma personalidade enraizada, por mãos calejadas, que os tocam
com a sabedoria adquirida ao longo de gerações. Só porque são do povo e não do
ambiente clássico, ninguém tem o direito de os destruir.

Gosta que lhe troquem o nome, ou o façam passar por outra pessoa?

Apesar da Guitarra Portuguesa ser um bocadinho mais velha que o FADO, não me
diga que estes assuntos não são cativantes.

Recomendo-lhe o livro de Armando Simões, A GUITARRA bosquejo histórico


(1974).

As Origens do FADO
como Expressão Musical

Se já leram mais de 60 livros sobre este delicado assunto, de certeza que têm a
noção de que vou falar de um assunto polémico. Se são estudiosos da matéria,
nalguns pontos de certeza que estaremos em discórdia. Mas quando se investiga
um determinado assunto criamos dentro de nós um conceito sobre a matéria
estudada. Não sou detentor da verdade pura, mas sou contra as burrices de
idiologias não fundamentadas. Falar de FADO é ler e reler as diversas opiniões,
mastigá-las bem, dar sete voltas à língua... botar faladura e seja o que Deus quizer.
Qualquer que tenha sido a origem do FADO a opinião de Alberto Pimentel, para
mim, é a mais credível. No seu livro "Triste Canção do Sul" ele é bem claro nas
suas investigações. Luis de Camões, na sua epopeia "Os Lusiadas" utiliza 18 vezes
a palavra fado. É precisamente aqui que o leitor menos atento começa por ter
conceitos errados sobre a origem do FADO. A palavra fado é uma coisa e FADO,
como expressão musical, é outra. A comprovar esta afirmação está o estudo feito,
por Alberto Pimentel, da literatura portuguesa do século XVI, XVII e século
XVIII. Tinop não partilha da mesma opinião. Vislumbra no FADO uma origem
marítima. É pouco provável. Sendo Portugal um país com tão grande extensão
marítima, O FADO teria aparecido em diversos pontos de Portugal, levado por
marinheiros e constaria dos arquivos e diários de bordo, por exemplo na Ponta de
Sagres, onde existiu a Escola Náutica. Outra opinião não fundamentada é a
visualização de semelhanças entre o FADO e o Lundum, dança de umbigada
africana. Se assim o fosse, mais uma vez ele teria sido levado para outros pontos e
não teria ficado circunscrito à zona de Lisboa. Estabelecer uma ligação directa do
FADO com a nostalgia das Mornas, com o Tango argentino, com as Festas de S.
João de Braga ou com a solidão de um marinheiro no alto mar, implicaria que o
mesmo tivesse aparecido no pulsar de outros povos de culturas bem diferenciadas
da portuguesa. Que os portugueses de agora possam saborear o FADO em diversos
pontos do nosso território, não faz do FADO a canção nacional. Cada província
portuguesa tem maneiras de estar de cantar e de sentir bem distintas. Retomando
as ideias de Alberto Pimentel, primeiro nasceu o homem e depois a expressão
musical. Isto é, primeiro nasceu o fadista e depois o FADO. Mas o primeiro fadista
não cantava. A ele eram encomendados, por ser destro no manejo da navalha, o
fado de muita gente. Esta personagem aparece com toda a lógica com a
instabilidade do país, aquando da fuga da família real para o Brasil. Napoleão
Bonaperte decreta o Bloqueio Continental e Portugal vê-se evadido e saqueado
pelas tropas Napoleónicas. As ruas mal iluminadas e as casas, de gente
endinheirada, abandonadas aguçam o apetite à mão do alheio. Um país saqueado
tem fome, e casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão. As vinganças
e os ajustes de contas fazem aparecer no nosso país esta personagem de melenas
compridas que encobriam a sua face, o juiz de todas as discórdias. O fadista era
temido por tudo e por todos, gabando-se, nas tascas mal iluminadas, dos seus feitos
heróicos. É bem provável que nas sua visitas a casas de pessoas endinheiradas, que
acompanharam a fuga da família real para o Brasil, ele tenha descoberto a
Guitarra Portuguesa e na sua companhia comece por cantar as suas proezas.

A Guitarra Portuguesa que encontra os seus primeiros adeptos no Porto tem a sua
origem próxima num instrumento inglês chamado Cistre (não confundir com
Sistro, forquilha de madeira com soalhas de metal - da família dos Chincalhos),
que entra pela Barra do Douro onde atracavam os barcos que faziam as trocas
comerciais com os ingleses. O Mestre de Capela do Porto António da Silva Leite,
devido ao entusiasmo crescente por este instrumento, nacionaliza-o e escreve um
estudo para Guitarra, dedicado a Dona Antónia Magdalena e coloca-o à venda
1200reis, no dia 15 de Março de 1796. As músicas propostas por este estudioso são
Minuetes, Marchas, Alegros e Contradanças. Neste estudo de Guitarra não consta
qualquer referência a nenhuma expressão musical que tenha a ver com FADO. Se
o mesmo já existisse, também ele deveria ter sido comtemplado por este professor
de música. Só a partir desta data, a palavra Guitarra passa a pertencer ao
vocabulário português. De salientar a importância de um outro Método datado de
1789, escrito por Paixão Ribeiro para Viola de Arame de 12 cordas e 5 ordens com
o título "A Nobre Arte da Viola". A Guitarra de Silva Leite só tinha 10 cordas, as 4
primeiras ordens duplas e as restantes singelas (utilizava a afinação natural - do
agudo para o grave Sol, Mi, Dó, Sol, Mi, Dó) pela análise destes documentos
podemos afirmar que a Guitarra nasceu sem conhecer o fado.

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