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FICHAMENTO 1

Centro de Excelência para o Mar Brasileiro (CEMBRA). O Brasil e o mar no século XXI: Relatório aos tomadores de
decisão do País: Capítulo XVII – Mudanças Climáticas / Cembra, coord. Luiz Philippe da Costa Fernandes, prep.
Lucimar Luciano de Oliveira. – 2. ed., rev. e ampl. Niterói, RJ : BHMN, 2012. 540 p.

O Centro de Excelência para o Mar Brasileiro (CEMBRA), abarca os conceitos sobre as


mudanças climáticas no qual atrela à importância dos mecanismos da circulação geral
do oceano Atlântico Sul para o clima da América do Sul, enfatizando a carência de
pesquisas pertinentes sobre esse assunto. Segundo o Cembra (2012, p.423), existe uma
relação interativa entre o clima da superfície da terra, nas camadas da atmosfera, e os
processos bio-químicos das zonas abissais dos oceanos. Desse modo, a energia do sol
incide sobre a superfície dos solos e com a interação com as correntes dos oceanos gera
um sistema climático complexo. As “ondas curtas” da radiação do sol quando
encontram a superfície do planeta são emitidas de volta para o espaço em forma de
“ondas longas”, estabelecendo um princípio básico da Física, no qual afirma que “todo
o corpo varia sua temperatura e irradia calor, até atingir um estado de equilíbrio
termodinâmico no qual a quantidade de radiação emitida é igual à recebida”
(CEMBRA, 2012, p.424). No entanto, não acontece esse equilíbrio na atmosfera do
planeta, e as variações dessa energia irradiada pode alterar o sistema climático e
ocasionar a mudança na temperatura.

Todavia, as alterações no sistema climático são “múltiplas nas escalas do tempo”, e as


variações podem ser forçadas por esses mecanismos naturais, derivadas desde as
“variações solares, no albedo1 terrestre, na deriva continental, na circulação oceânica,
nos processos biogeoquímicos dos ecossistemas terrestres, atividades vulcânicas e na
órbita do planeta” (CEMBRA, 2012, p.424). Contudo, o processo humano de
degradação ambiental, característico de uma variação não natural, também tem
contribuído para essas alterações, sendo atualmente denotado na emissão de gases de
efeito estufa (GEE) que adelgaça a camada de ozônio, responsável por manter o
equilíbrio do sistema climático da Terra. Nesse sentido, a comunidade científica tem se
debruçado sobre essa problemática para encontrar respostas para entender “a causa, as

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Segundo o Cembra (2012, p.424), representa a relação da radiação refletida pela superfície e a
incidência dessa radiação, medidas em ondas curtas.
formas de manifestação, a intensidade e o impacto dessas mudanças, além de sua
previsibilidade nas escalas do tempo anual e interdecadal” (CEMBRA, 2012, p.425).

Desde a revolução industrial, no século XIX, explica o Cembra (2012, p.425), o uso de
combustíveis fosseis se intensificou no mundo, além do processo de industrialização nos
centros urbanos que contribuiu para o êxodo rural. Essa tendência tem predominado nos
dias atuais, e a população urbana na maioria dos países industrializados é bem maior
que a população rural, o que pressupõe uma maior ocupação urbana em detrimento das
áreas de floresta nativa. Ainda, uma maior demanda por energia e transporte contribuiu
para aumentar a quantidade de gás carbônico, sem contar com o aumento da produção
agropecuária para atender ao mercado consumidor, gerando consigo o aumento de gás
metano na atmosfera e, consequentemente, a emissão de GEE para a atmosfera do
planeta. O efeito estufa, portanto, se tornou um agravante para a questão do equilíbrio
do clima, sendo atualmente um fenômeno em voga nas discussões das políticas
domésticas e externa dos Estados desenvolvidos.

Todavia, os oceanos têm servido como “amortecedores” dos efeitos das variações do
clima, ao longo dos séculos, pois sem a existência das correntes de calor que atuam
amenizando a temperatura do planeta, “levando das regiões tropicais o calor em direção
às altas altitudes”, ele mantem a estabilidade do clima (CEMBRA, 2012, p.426) e,
ainda, vem atuando de forma “altamente eficiente no sequestro de gás carbônico da
atmosfera” (CEMBRA, 2012, p.427). Porém, como enfatiza o Cembra (2012, p.427), os
estudos sobre a importância dos oceanos para o equilíbrio do sistema climático requer
maiores investimentos em tecnologias e pesquisas científicas, representando uma lacuna
na literatura contemporânea2, devido principalmente à pouca “lentidão com que o
oceano reage às alterações no meio ambiente”. No entanto, os estudos desenvolvidos
recentemente tem revelado que a capacidade de absorção do gás carbônico da atmosfera
do planeta, nos últimos 15 anos, teve uma redução drástica, ocasionada pelo aumento da
sua temperatura e, consequentemente, sua acidificação com a redução do pH,
impactando em sua eficiência em sequestrar carbono e “desencadeando um processo de
retroalimentação, aumentando ainda mais a concentração de CO² na atmosfera
(CEMBRA, 2012, p.427).

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Algumas considerações sobre o tema são encontradas nos artigos da Science Beat, datado no ano de
2001, disponibilizado no site: <https://www2.lbl.gov/Science-Articles/Archive/sea-carb-bish.html>.
Para agravar os desafios nesse cenário, explica o Cembra (2012, p.427), o aumento do
volume dos oceanos, propiciado pelo degelo das geleiras continentais e das calotas
polares, aumentou sua massa e volume, gerando o aumento do nível médio dos mares.
Algumas dessas evidências podem ser percebidas, por exemplo:

[...] várias ilhas na Oceania encontram-se em perigo de submersão.


Em 2007, cerca de 2.000 residentes das Ilhas Carteret, na Papua Nova
Guiné, tiveram que ser evacuados, em consequência do avanço do mar
sobre suas casas, constituindo, possivelmente, a primeira comunidade
de “refugiados do clima”. Outros exemplos são as Ilhas Kiribati e
Tuvalu, também ameaçadas de submersão (CEMBRA, 2012, p.427).

Desse modo, a evidência das mudanças climáticas como consequência desse fenômeno
do aumento dos níveis dos mares tem cada vez mais ganhado notoriedade nas pesquisas
científicas, como destacou os indicadores do Intergovernmental Panel on climate
Change (IPCC), que afirma que houve um aumento de 30 a 50 cm no nível global
(CEMBRA, 2012, p.428). Contudo, para alguns especialistas, essa estimativa é um tanto
conservadora, devido às consequências que podem ser sentidas nos regimes dos ventos
e chuvas, e nas interações dos oceanos com a atmosfera, podendo “desencadear no
futuro uma era glacial no hemisfério norte”. Segundo o Cembra (2012, p.428), no
hemisfério Sul essas alterações globais podem ter consequências em escala regional,
principalmente nas áreas costeiras que estão em situação de vulnerabilidade, devido às
inundações, às alterações nos sistemas de ressurgências e intrusão de águas do mar em
lençóis aquíferos. Outra preocupação nas costas litorâneas, reitera o Cembra (2012,
p.428), se deve ao fenômeno do El Ninõ, às mudanças no regime de monções que
alteram a circulação atmosférica e a precipitação das chuvas no continente, ou aos
ciclones extratropicais, como o caso do Furação Catarina, ocorrido em 2004.

Nesse sentido, entender a importância do oceano para manutenção do equilíbrio do


sistema climático requer esforços tanto da comunidade científica, como de cooperação
internacional. Segundo o Cembra (2012, p.428), a partir da década de 1980, esse tema
foi adotado pelo programa Toga-TAO, cujo objetivo era entender o “efeito acoplado
oceano-atmosfera conhecido como El Ninõ-Southern Oscillation (Enso)”, no qual foi
constatado a influência do oceano para o clima do planeta. Com isso, outros programas
de estudo foram sendo organizados atrelando as áreas da meteorologia à de
oceanografia. No Brasil, não obstante, alguns programas também ganharam
notoriedade, desenvolvendo estudos teórico e modelos numéricos, bem como outros
estudos de observação na América, como o caso do Projeto Pirata, no Atlântico
Tropical, e do Consórcio South American Climate Chanhe (SACC), no Atlântico Sul.
Segundo o Cembra (2012, p.428), embora no Brasil os estudos ainda sejam escassos,
podemos destacar:

[...] o primeiro é um ambicioso programa tripartite, conduzido pelo


Inpe e pela DHN (Brasil), pelo Institut de Recherche pour le
Développement (IRD) (França) e pela National Oceanic and
Atmospheric Administration (NOAA) (Estados Unidos). O segundo é
um consórcio de instituições do Brasil, da Argentina, do Chile, do
Uruguai e dos Estados Unidos financiado pelo Inter-American
Institute for Global Change Research (IAI), com o objetivo principal
de entender o papel do Atlântico Sul no clima regional (CEMBRA,
2012, p.428).

Portanto, explica o Cembra (2012, p. 429) a circulação oceânica tem grande relevância
para a variabilidade do clima, e precisa ser entendida essa dinâmica nos movimentos das
correntes em grandes escalas espaciais-temporais (quilométricas), bem como os agentes
fornecedores de energia, por exemplo, “a gravidade terrestre, os gradientes de densidade
resultantes das diferentes distribuições de temperatura e salinidade, e o arrasto do vento
na superfície do mar”. Todavia, os vento interferem nos movimentos das correntes
oceânicas até 1.000 metros de profundidade, com velocidades de 0,1 a 1,0 metros por
segundo (m/s), sendo conhecida essa ação como “circulação forçada pelo vento”. A
circulação do vento é responsável pelo transporte do excedente de calor dos trópicos
para as latitudes médias, e nas altas latitudes essa redistribuição de calor é completada
pela circulação atmosférica (CEMBRA, 2012, P. 429).

O termo circulação denota um “circuito fechado”, no qual o calor é transportado por


linhas de correntes que giram em sentido horizontal. Assim sendo, nos sub-trópicos, a
circulação dos ventos nos oceanos formam grandes células de circulação anticiclônicas
(sentido horário no hemisfério norte e anti-horário no hemisfério sul), enquanto o
“efeito de Coriolis” (decorrente da esfericidade e a rotação da terra) tornam as correntes
do lado oeste das bacias oceânicas mais intensas que as do leste (CEMBRA, 2012, p.
430). A circulação termo-halina, que demostra a diferença de temperatura e salinidade
das correntes oceânicas, em escala global, são medidas por um “circuito
tridimensional”, no qual redistribui o calor para todas as bacias.
Segundo o Cembra (2012, p.431), no Atlântico Sul é formado o ramo superior da
circulação termo-salina, constituída de águas mais frias e menos salinas enviadas do
Oceano Pacífico, enquanto no Oceano Índico as águas são mais quentes e mais salinas e
seguem para o sul da África provocando o “vazamento das agulhas”. Ou seja, essas
águas são aprisionadas em anéis ou laços (ou correntes de agulhas), provocando
instabilidades hidrodinâmicas ao gerar um processo de retroflexão que volta em direção
ao leste. Dessa forma, os anéis concentram grande quantidade de água com temperatura
5º mais alta e 0,3 psu3 de salinidade a mais do que o Atlântico Sul.

No lado oeste da bacia oceânica do Atlântico Sul, explica o Cembra (2012, p. 432), as
águas são mais frias e menos salinas devido à Corrente Circumpolar Antártica (CCA),
no qual uma parte fica e a outra flui para o norte, em direção à Argentina, alimentando a
Corrente de Malvinas, retornando em direção à Corrente do Brasil (CB), reintegrando à
CAA. Nessa região de confluência, uma parte dessas águas se mistura com o oceano
Pacífico, formando a massa de água do Atlântico Sul.

Figura 1 – Correntes oceânicas do Oceano Atlântico

Fonte: http://afmata-tropicalia.blogspot.com/2012/03/blog-post_28.html

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A unidade de medida utilizada para mensurar aa salinidade da água é o psu, ou seja, a Practical Salinity
Units ouUnidades Práticas de Salinidade.
A corrente Sul-Equatorial é formada pelas massas provenientes dos oceanos Atlântico e
Índico, formando a camada superior da região subtropical do Atlântico Sul. Ao se
dirigir para noroeste aproxima da costa brasileira, bifurcando na corrente do Brasil ao
sul e na corrente norte do Brasil, ao norte, formando um complexo de correntes no
Equador (CEMBRA, 2012, p.433). No entanto, reitera o Cembra (2012, p. 433), nos
estudos de Goni et al.4 (2008 apud CEMBRA, 2012, p.433) e Sato e Polito5 (2008 apud
CEMBRA, 2012, p.433) têm revelado o aumento do “vazamento de agulhas” devido ao
deslocamento do sistema de ventos da corrente do Atlântico Sul para o sul e o aumento
do seu giro subtropical em 40%, entre 1992 e 2006, levantando a hipótese do aumento
de calor na superfície do oceano e maior salinidade.

No Brasil, a hipótese levantada por esses cientistas por meio do uso de satélites levou
para a necessidade de monitoramento da região oceânica sudeste, com a proposta
similar ao do Projeto Pirata, no Atlântico Tropical, o instituto Nacional de Ciência e
Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC), instalou boia meteo-oceanográfica
para observar na superfície do oceano, a temperatura, salinidade, precipitação pressão
atmosférica e velocidade do vento, bem como em uma profundidade de até 500 metros.
Assim, através do satélite disponibilizado pelo Global Telecommunication System
(GTS), mantido pela Organização Meteorológica Mundal (OMM), foi possível
acompanhar a evolução desses eventos associados às condições oceânicas da costa
brasileira.

4
Goni, G.F.; Bringas, P.; Dinezio. Observed variability of the South Atlantic subtropical gyre. Geophys.
Res. Letters, 2008.
5
SATO, O.; POLITO, P. Influence of salinity on the interannual heat storagetrends in the Atlantic stimated from
altimeters and the Pilote Research Moored Array in the Tropical Atlantic data. Journal of Geophysical Research,
2008.

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