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Resumo
Abstract
A school photo album is presented to record activities related to the Science curriculum,
during the period from 2013 to 2019. The records show integration actions between the
school and a university extension project. The organization of the album constitutes a
process of understanding the Science curriculum in a specific school context, enabling
analyzes and reflections in the scope of the materiality of the school and the Science
curriculum. A series of 26 photographs is explored in an attempt to understand elements
of the dynamization of Science teaching and teacher training in the school context.
Portraits selected for that are about outstanding aspects related to the experiences of the
members participating in the project and the materialities that produce and are produced
by the Science school subject. Theorizations about photographs as historical artifacts and
studies on the history of school subjects and school materialities make up the theoretical
framework from which the photographs are analyzed to compose a historical account of
the Science curriculum produced from this relationship between school and university.
Key-words: Science curriculum; school materialities; photographs
Introdução
Inspiradas nas reflexões de Dussel (2019) a respeito das fotografias como fontes
históricas, procuramos refletir, sobre uma série de imagens fotográficas selecionadas para
compor o álbum, a partir de uma abordagem multissensorial que “permita indagar sobre
lo que dice y transmite uma imagem no solamente como texto sino también através de sus
silêncios y de su propria presencia, aun quando sea digital” (p. 53).5 Assim, a
historicidade das fotografias pode ser explorada em meio ao vínculo epistêmico e afetivo
dos investigadores com suas fontes. Nesse sentido, entendemos que não se trata apenas
de observar visualmente as fotografias, mas sim de construir um olhar que se apropria
também de outras possibilidades sensoriais como a escuta e o tato. Em outras palavras,
buscamos compreender tais fotografias em meio ao contexto em que foram produzidas
como registros das diversas atividades de formação de professores e dinamização do
ensino fomentadas pela relação entre uma escola e um projeto de extensão universitária.
Nos dois murais retratados, e cujas fotografias foram selecionadas para esse artigo
(Fotografias 4, 5 e 6), destacam-se alegorias ligadas aos estudos, à passagem das crianças
pela escola e à vivência com a comunidade. Vemos neles a valorização da experiência da
aprendizagem da leitura e da vocação do samba. No primeiro, dos anos de 1930 são os
jovens estudantes que são retratados, em torno do livro, mas tendo por pano de fundo um
cenário natural fictício. Já no segundo painel da área externa, uma produção recente,
exalta-se a imagem do samba carioca, estilizado com a figura do sambista com o violão,
os percursionistas e a passista, também representados em uma paisagem natural fictícia,
mas com aspectos urbanos ao fundo.
As Feiras de Ciências são eventos que podem ocorrer tanto dentro como fora dos
muros escolares, mas são sempre espaços para o incentivo a estudantes de nível básico a
produzirem e apresentarem trabalhos sobre essa área disciplinar. A finalidade principal
desses eventos é valorizar atividades pedagógicas com a participação de professores e
estudantes, “dando oportunidade para o envolvimento com apresentações de trabalhos,
interesse pela pesquisa, socialização do conhecimento, troca de informações, além de
promover a interação entre os participantes e a comunidade escolar, e valorizar a escola
pública como espaço de divulgação da ciência”. Nesse sentido, as Feiras de Ciências
podem ser espaços de valorização da educação científica nas escolas (Candito, Menezes
e Rodrigues, 2021, p. 9 e 10).
No caso das Feiras de Ciências organizadas na EM Chile vale ressaltar a sua forte
relação com o currículo de Ciências pois os trabalhos apresentados pelos estudantes da
escola são planejados e produzidos no contexto da sala de aula como trabalhos
relacionados às atividades de ensino dessa disciplina escolar. Em outras palavras, os
trabalhos são produzidos durante as aulas dessa disciplina escolar. Ademais, também é
importante ressaltar que são orientados por estudantes do curso de Licenciatura em
Ciências Biológicas da UFRJ. Tal envolvimento dos estudantes em formação docente se
configura como parte da integração entre a escola e a universidade.
Começamos esta seção ainda nos remetendo a Escolano Benito (2020), que nos
chama atenção para a inteligência das coisas. Ele afirma: “Algunos materiales escolares
tienen una semántica bien acreditada. No solo se concibieron y usaron para instrumentar
acciones de enseñanza y aprendizaje sino que comportaban una determinada e intuible
“inteligencia”. En otros objetos las significaciones pueden ser menos visibles, pero en
estos que aquí se presentan son manifiestos los atributos culturales que acompañan a su
mera fisicalidad, lo que requiere un análisis “intelectual” de los materiales” (p. 797).11
Neste sentido, as fotografias selecionadas para compor o álbum fotográfico, com vistas a
dialogarmos sobre os materiais didáticos, se dividem em dois tipos, uma parte delas
registrando os objetos aos quais foram atribuídas finalidades na educação científica,
especialmente consagrando os processos de produção do conhecimento científico nos
processos de ensino. Alguns são oriundos da indústria de produtos pedagógicos,
“equipam” a escola, mas exigem o modo adequado para seu manuseio e trazem implícito
a sua valorização como objeto, e aludem ao modo encontrado pela escola, para a guarda
e a proteção desses equipamentos. Na outra parte, aparecem os produtos pedagógicos,
que são fabricados na própria escola, ressignificando a prática educativa das Ciências,
como é o caso dos painéis, que neste álbum não são concebidos apenas como registros de
atividades, mas como materiais educativos com finalidades didáticas.
Por outro lado, na mesma Sala de Ciências também podem ser observados dois
armários brancos de portas transparentes (fotografia 13). Nestes pode-se perceber a
presença de modelos pedagógicos do corpo humano, da molécula de DNA, de uma célula,
de um vírus e ainda de representações de processos celulares como a mitose e a meiose.
Parte desses materiais são industriais, mas a outra parte é formada por materiais
produzidos em atividades docentes e discentes de ensino de Ciências. São objetos que
resultam dos processos alquímicos de ensinar e aprender formando tanto os estudantes
como os professores.
Fotografia 16 (2014)
Outras materialidades que chamam a atenção nas fotografias tomadas durante esse
período na escola são os painéis elaborados para a divulgação e socialização das
atividades produzidas em meio ao currículo d disciplina. Tais atividades são registradas
a partir de desenhos, fotografias, imagens recortadas e até roteiros impressos de atividades
desenvolvidas para o ensino. Podemos observar tais produções nas fotografias 17, 18, 19
e 20. Elas mostram como as Ciências foram registradas tanto em painéis no interior da
sala de Ciências como também nos corredores da escola.
Mas a tematização das Ciências não se limitou ao espaço da referida sala, como
indicam as fotografias 19 e 20 que mostram outros painéis localizados em espaços de
circulação da escola. Ao observar essas fotografias podemos notar a divulgação da sala
de Ciências na fotografia 19, com imagens de materiais e atividades que mostram para a
comunidade escolar como a sala de aula foi transformada em sala de Ciências. Já a
fotografia 20 é uma divulgação da Feira de Ciências ocorrida em 05 de novembro de
2014.
O registro fotográfico desses painéis nos indica como se tornou relevante mostrar
o quanto as atividades de Ciências saíram dos espaços das salas de aula, passando a fazer
parte do currículo escolar como um todo. Isto também foi evidenciado nas fotografias 10
e 11, de uma atividade da Feira de Ciências ocorrendo numa sala de música. Nesse sentido
é interessante destacar que a organização do álbum aqui apresentado vem elucidando
aspectos interessantes que mostram como os limites da organização disciplinar do
currículo escolar podem ser subvertidos em meio a um dinâmica curricular proposta por
uma disciplina como a de Ciências.
Fotografias: as materialidades produzindo o ensino de Ciências
A seleção da série de fotografias para o álbum mostrada até aqui contribui para
um olhar sobre a forma escolar com que o currículo da disciplina foi se dinamizando
durante os anos entre 2013 e 2019. A fotografias 21, 22, 23, 24, 25 e 26 que apresentamos
nesta seção nos levam a explorar mais imagens que retratam essa dinamização. São
registros em que os objetos materiais do ensino de Ciências aparecem em situações de
ensinar e aprender com base em atividades práticas e experimentais. Uma aluna
manuseando vidrarias e mostrando o resultado de um experimento de extração de DNA
de morango está no foco, que nos chama a atenção, da fotografia 21. É uma atividade
ocorrida em uma das aulas de Ciências em que os objetos de vidro se parecem com os de
um laboratório científico. Assim, na execução dessa experiência notamos os sentidos que
esses objetos tomam como parte de uma cultura científica escolarizada.
Fotografia 21 (28/12/2014)
A atividade está ocorrendo na sala de Ciências, uma sala de aula comum da escola
que vai se transformando à medida que vai sendo habitada por objetos e atividades
relacionados ao currículo de Ciências. Mas é importante notar nessa fotografia o roteiro
da atividade, uma folha de papel em cima da mesa. Este é um material com orientações,
problematizações e exercícios que acompanham toda a atividade e que é parte da tradição
experimental que caracteriza a disciplina escolar.
As atividades práticas estão também relatadas nas fotografias 22 e 23 que retratam
materialidades produzidas por alunos para a Feira de Ciências. Nestas imagens podemos
observar uma atividade experimental e um modelo. Em ambos os casos o que chama a
atenção são os materiais utilizados para a produção de atividades elaboradas pelos
próprios alunos. Na fotografia 22 vemos um experimento, explorando o conceito de
pressão atmosférica, montado com objetos caseiros como uma garrafa, um prato, uma
vela e água colorida com tinta azul. Neste caso, ao analisarmos a imagem podemos
interpretar as transformações que determinados aspectos ligados a uma cultura de
natureza científica podem sofrer nas dinâmicas curriculares de ensinar e aprender
Ciências na escola.
Numa série final de três fotografias, 24, 25 e 26, o foco é em atividades de aulas
ocorridas na propalada sala. Pode-se ver assim os materiais didáticos que são parte dessas
aulas. Na fotografia 24, os estudantes estão ocupados em observar um caixa de insetos,
organizada por eles. Essa observação é parte de uma aula sobre esses animais. Observar,
descrever, comparar são ações valorizadas pelos modos de ensinar e escolarizar as
Ciências que refletem elementos de uma cultura científica que é parte dos conhecimentos
que constituem o currículo de Ciências na escola.
Fotografia 24 (2019) Figura 25 (2019)
Por fim, na fotografia 26 trazemos a sala de Ciências dominada por uma aula de
Ciências. É possível reconhecer na sala alguns elementos já mostrados em outras
fotografias como, por exemplo, o armário com portas transparentes ao fundo, o painel na
parede ao lado direito e ainda as mesas coletivas ocupadas pelos alunos. No momento
retratado, estes estão atentos ao professor que está acompanhado de uma adestradora de
falcões. Ela tem na mão um falcão.
Fotografia 26 (2019)
A partir dessas três fotografias é possível compreender as aulas nessa sala a partir
de diversos elementos tradicionais dos currículos de Ciências: as coleções com seus
exemplares, os modelos que representam aspectos importantes do que se quer ensinar
sobre os seres vivos e os próprios seres vivos, como é o caso da presença do falcão na
fotografia 26. Todos esses elementos compõem uma cena da disciplina Ciência em que
há uma mescla de tradições acadêmicas, pedagógica e utilitárias como argumentadas por
Goodson (1983, 1997, 1998, 2001).
No caso do currículo de Ciências desta escola, entendemos que ele é parte das
construções culturais, sociais e históricas já arquitetadas por uma comunidade disciplinar
que ao longo de sua história vai produzindo formas de ensinar Ciências. Tais formas de
ensinar podem assim ser compreendidas como o resultado de processos de alquimia
curricular que produzem a disciplina, seus modos de ensinar, seus materiais didáticos e
seus alunos e professores.
Notas
1. O trabalho é o resultado dos estudos desenvolvidos a partir do projeto “Currículo de Ciências na Escola
Municipal Chile: apontamentos para um olhar sócio-histórico sobre o ensino, os materiais didáticos e a
formação docente”, em estágio de pesquisa sênior (pós doutorado) realizado na UNICAMP - Universidade
Estadual de Campinas.
2. Inicialmente o projeto de pós doutoramento propunha um estudo sobre o currículo de Ciências a partir
dos materiais didáticos produzidos, mobilizados e analisados na EM Chile por professores e futuros
professores, procurando-se organizar um acervo desses materiais na escola. No entanto, o fechamento das
escolas e das universidades em 2020, provocado pela pandemia da Covid 19, nos levou a refletir sobre
outras possibilidades de produção de um olhar investigativo sobre essas materialidades. Passamos assim a
nos debruçar sobre os arquivos de fotografias digitais, produzidos ao longo do período do estudo, para a
organização de um álbum que nos possibilitasse analisar os registros fotográficos elaborados por
professores, bolsistas e licenciandos.
3. Com apoio do Programa “Apoio à Melhoria do Ensino em Escolas da Rede Pública Sediadas no Estado
do Rio de Janeiro” da Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro pelo Edital FAPERJ No. 34/2013;
e dos Programas Institucionais de Bolsas de Extensão e Iniciação Artística e Cultural da UFRJ (PIBEX,
PROFAEX e PIBIAC)
4. São documentos esparsos, que foram produzidos com distintas funções no registro das atividades e, que
passam a fazer parte de um pequeno acervo visando a memória do projeto, bem como a análise que se
oferece nesse artigo.
5. (...) que “permita indagar sobre o que diz e transmite uma imagem não somente como texto, mas também
através de seus silêncios e de sua própria presença, ainda que seja digital” (tradução nossa).
7. Informação retirada da placa da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro que divulga o Projeto Educativo
2008: A presença da Arte Brasileira nas Escolas Municipais do Rio de Janeiro.
9. Pedro Antonio dos Santos Bonfim Gonçalves, retratado nesta fotografia, desenvolveu suas atividades
de estágio supervisionado de Prática de Ensino em Ciências Biológicas na EM Chile durante o ano de
2019.
10 Adriano da Silveira Ramos da Silva e Mirian Bittencourt Sathler Figueiredo, retratados nesta fotografia,
participaram das atividades de extensão na EM Chile como bolsistas PROFAEX/UFRJ e PIBIC/UFRJ.
11 “Alguns materiais escolares têm uma semântica bem estabelecida. Eles não somente foram concebidos
e usados para instrumentar ações de ensino e aprendizagem, como também carregavam uma determinada e
intuitiva “inteligência”. Em outros objetos as significações podem ser menos visíveis, porém nestes que
aqui se apresentam são manifestos os atributos culturais que acompanham a sua mera fisicalidade, o que
requer uma análise “intelectual” dos materiais” (tradução nossa).
12. O movimento de renovação do ensino de Ciências no Brasil ocorreu fortemente influenciado pelas
mudanças curriculares das disciplinas científicas nos Estados Unidos, como resultado do lançamento do
primeiro satélite artificial, em 1957, pela União Soviética. Três instituições nacionais participaram desse
movimento: o Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC); a Fundação Brasileira para o
Desenvolvimento do Ensino de Ciências (FUNBEC); e o Projeto Nacional para a Melhoria do Ensino de
Ciências (PREMEN). E também foram criados os Centros de Ciências em seis cidades do país que
promoveram projetos idealizadores de materiais didáticos e atualização de professores (Krasilchik, 1978,
1995; Barra & Lorenz, 1986).
Referências Bibliográficas
Correspondência