E CONHECIMENTO HISTÓRICO, Livros Horizonte, Cap. IV, pp. 77-112 Sumário: Filosofia Crítica e Filosofia Especulativa da História (W. Dray) Filosofia Crítica da História (Filosofia da história–Ciência) Filosofia da História Especulativa (Daniel Sousa); A Filosofia da História na Antiguidade (Hecateu) e Idade Média (St. Agostinho); Filosofia da História nos séculos XVII (Bossuet) e XVIII – Turgot, Condorcet, Vico, Voltaire, Montesquieu, Rosseau, Herder, Kant, Hegel... Filosofia da História positivisa: A. Comte Filosofia da História Contemporânea: Neokantismo (W. Dilthey, Wildelband, H. Rickert); O. Spengler; A. Toyebee Filosofia crítica da história (FCH) - (W. Dray; Walsh; P. Gardiner; Mendelbaum) e Filosofia Especulativa (racionalista-naturalista metafísico- teológica): os 3 problemas de uma FCH Filosofia Crítica e Filosofia Especulativa da História (W. Dray): a História como “Historie/Story » Histoiren – realidade do suceder” e “Geschchite - ciência” “Uma introdução à Filosofia História deve começar por distinguir entre dois sentidos que a palavra “História” comummente reveste. Usamo-la, de uma parte, para nos referirmos ao curso d0s acontecimentos: certo extrato da realidade cujo estudo os historiadores transformaram em sua ocupação profissional. De outra parte, utilizamos a apalavra para indicar o prórprio estudo a que se dedica o historiador: com a palavra indicamos certa espécie de investigação a respeito de uma determinada espécie de assuntos. Correspondentemente a esses sentidos, existem disciplinas filosóficas denominadas, frequentemente, Filosofia Especulativa e Filosofia Crítica da História. A Filosofia Especulativa busca descobrir na história o curso de acontecimentos, um padrão ou significado que se situa para além da esfera do historiador comum. A Filosofia Crítica empenha-se em tornar clara a natureza da própria investigação do historiador, de modo a “situá-la”, por assim dizer, no mapa do conhecimento. DRAY, William (1977). Filosofia da História, p. 11 Filosofia Crítica da História (Filosofia da história–ciência) Filosofia da História Especulativa (Daniel Sousa); Filosofia Crítica da História (Filosofia da história–ciência/ Filosofia da Ciência-História): “análise esclarecedora do que os historiadores fazem como investigadores e intérpretes do que descobrem” (SOUSA: 1982: 77): Voltaire, Herder...H. Marrou; Dray Filosofia da História Especulativa – “(...) tenta descobrir o sentido ou signficado que transcende essa atividade de insvestigação de acontecimentos do passado e sua mera descrição pelo historiador, recorrendo-se à intervbenção de entidades extraterrestes ou providenciais pertencentes a um “mundo de valores” diferente e “para além” do mundo vulgar e real em que vivemos”. (Ibidem: 77). Immanuel Kant, Friedrich Schelling, Johann G. Fichte, Friedrich Hegel, etc. Identidade entre Historiografia (o significado profundo ou historicidade dos factos e acontecimentos) e filosofia crítica da história (p. 78) A “Filosofia da História na Antiguidade” (Hecateu de Mileto)
Hecateu de Mileto (500 aC.): “Escrevo o que se segue porque o
acho verdadeiro, visto que as tradições dos Gregos se contradizem e me parecem ridículas”. Historiografia, História e Filosofia da História em Hecateu (Historiografia Grega - Heródoto; Tucídides; Políbio, Historiografia Romana Tito Lívio (lendas), Tácito (vícios e virtudes políticas) Conceitos estratégicos: História: realidade histórica (o passado ou mundo histórico) estudada pela historigrafia; Conhecimento Histórico: conheimento da realidade histórica (passado). Filosofia da História – esclarecimento do conhecimento ou entendimento/pensamento histórico (Historiografia) A “Filosofia da História na Antiguidade”: Homero, Hesíodo, Políbio Primazia da situação natural (tempo ou princípio cíclico e cósmico ininterrupto) da historiografia grega como análise crítica do passado em busca do significado e finalidade da história O pensamento histórico (tempo irreversível próprio da história dos homens) do Cristianismo, que vê os factos e acontecimentos como realização da Providência Divina no seu natural progresso em direçcão à Salvação.
Abordagens Religiosas da História: Homero (Odisseia e Ilíada);
Hesíodo (Os Trabalhos e Os Dias); - tempo cíclico em Platão, Políbio..
Políbio de Megalópolis (210-127 aC, Histórias em 40 Vols): a história
depende da normas de atuação da Natureza e do destino (Tijé): “o destino guia os que lhe obedecem, arrasta o que lhe resiste”. A “Filosofia da História na Idade Média” - St. Agostinho (354-430) e a Teologia da História Do tempo cíclico da Natureza ao tempo linear/progressivo da história humana: “(...) a teologia da história, que inicia a “filosofia metafísica da história” de Santo Agostinho, e que representa uma manifestação bem definida do pensamento histórico do cristianismo, substitui o ciclo da Natureza pela criação desta por Deus. Daí que o conceito do princípio linear da teologia augustiniana, em substituição do princípio cíclico platónico, passe a ser a partir da Idade Média, a novidade “metafísica histórica”. Sobretudo, porque A Cidade de Deus de Santo Asgostinho substitui a crença nas forças cegas do destino pela fé de que existe uma vontade suprema que estabelece a ordem e consegue que colaborem com ela todas as vontades conscientes dos homens”. (Ibidem: 81) Luta entre a Civitas Dei e a Civitas Terrena: O Conhecimento Histórico de Dante a Descartes: séc. XVI e... Dante de Alighieri (1265-1321) e a exaltação pró-humanidade: na sua crítica ao providencialismo da história, admite a vontade de Deus, mas afirma que “a existência de homem se afirma por si mesma e de modo que a história terá de explicar a sua própria obra”. Dante inspira a visão Renascentista do homem e da história. Maquiavel via o sentido do conhecimento histórico como a arte de um círculo, que começa e termina no homem. Francis Bacon (1561-1626): o conhecimento histórico como registo dos acontecimentos do passado/mera manifestação da memória. René Descartes (1596-1650): o conhecimento histórico (a história) não pode fazer do pasado ser uma evidência nem alcançar a objectividade, evidenciada pelo conhecimento inato ou lógico-matemático; Jacques Bénigne BOSSUET (1681). Discurso sobre a História Universal (recorda-nos Políbio). Fala das épocas do mundo, que vão desde Abrão e a Criação (1ª epoca) até Constantino ou Paz da Igreja (10ª epoca) O Conhecimento Histórico em John Locke, David Hume e Giambattista Vico David Hume (1711-1776): o conhecimento histórico como sistema de crenças baseado na autoridade do testemunho. John Locke (1632-1714). No Ensaio sobre o Entendimento Humano (1790), Locke introduziu a ideia de análise conceptual e o papel da experiência (contra o inatismo cartesiano) como os fundamentos do conhecimento.
“Mas é de um modo directo e como novidade que Giambattista
Vico – Ciência Nova de 1725, em oposição ao despropósito da certeza logico-matemática de Descartes, inicia uma análise específica sobre o cohecimento histórico”. (Ibidem, 85) Giambattista Vico (1668-1744) – Ciência Nova, 1725
“A nossa Ciência (a História), portanto, surge para
descrever de uma vez a história eterna ideal pela qual passa ao mesmo tempo a história de cada nação no seu aparecimento, desenvolvimento, maturidade, declíneo e decadência... É verdade que os próprios homens fizeram este Mundo de nações (e nós fizemos disso o principal princípio incostestável da nossa Ciência...) mas este Mundo, sem dúvida, brutou muitas vezes, de uma inteligência diferente, às vezes, completamente contrária e sempre superior aos fins particulares que os próprios homens tinham em vista”. (VICO apud SOUSA: 86). As 3 épocas da História: época dos deuses, heróis e homens. Giambattista Vico (História) versus René Descartes (Matemática)
“O desafio de Descartes ao valor do conhecimento histórico
forneceu ao contexto linguístico para a primeira tentativa sofisticada de dar à história uma base epeistemológica distinta quer da ciência natural quer da prática. Num período em que o foco intelectual da Europa incidia em França, é por demais surpreendente que um savant napolitano isolado (i.e, Vico), antes do despertar do Iluminismo, tivesse traçado as linhas mestras de uma ciência da história a partir de uma filosofia que somente mostrava interesses pelas certezas de um sistema dedutivo evidente por si mesmo (...) Neste clima, pouco propício, Giambattista Vico procurou elaborar as pressuposições dos estudos desprezados pelos cartesianos (i,e, a História e o conhecimento histórico)”. HADDOCK, B. A. (1989). Uma Introdução ao Pensamento Histórico, p. 87. Filosofia da História nos séculos XVIII – Turgot, Condorcet, Vico, Voltaire, Montesquieu, Rosseau, Herder, Kant, Hegel.. Panteísmo: identificação de Deus com a Natureza como Mundo. Deus é o móbil do desenvolvimento histórico, a possível razão suprema e o “arquicteto do Universo” como diz Voltaire.
Anne Robert Jacques TURGOT (1727-1781). Econonomista fisiocráta e
político. Obras: O Conciliador (1754); Cartas sobre a Tolerência Civil (1766); Reflexões sobre a Formação e Distribuição das Riquezas (1766); Cartas sobre a liberdade de Comércio das Sementes (1770).
Voltaire – Ensaio sobre os Costumes e o Espírito das Nações (1745).
Nesta obra admitiu que o “Cristianismo é um produto histórico” embora seja um grande mal por conduzir a guerras que a “humanidade apenas progride (libertar-se das guerras e religiões) devido ao esforço insistente das gerações dos homens”. É graças à razão e a liberdade humana que os homens alcançam o progresso. Filosofia da História nos séculos XVIII – Turgot, Condorcet, Vico, Voltaire, Montesquieu, Rosseau, Herder, Kant, Hegel... Montesquieu (1689-1755). Em Cartas Persas, O Espírito das Leis e Meus Pensamentos (História) assumiu-se como um crítico da História e à verdade histórica: “As histórias são factos falsos elaborados sobre os verdadeiros ou melhor quando se conhecem os verdadeiros...” Para Mostesquieu, as leis/instituições são padrões comportamentais compatíveis com a ordem natural (identificação da Sociedade e Natureza) comuns a todo o Universo. Não faz a história depender de Deus, mas do “determinismo geográfico” (o homem e as suas circunstâncias).
Jean Jacques Rosseau (1712-1778). Em Discurso sobre a Origem e os
Fundamentos da Desigualdade entre os Homens e Contrato Social distingue entre a espontaneidade natural do homem (o homem natural) e a sua situação social e cultural da qual depende o seu entendimento do significado progressivo da interpretação da história Filosofia da História nos séculos XVIII – Turgot, Condorcet e Voltaire.
Marquês de Condorcet – Esboço de um Quadro Histórico dos
Progressos do Espírito Humano (1795)
Bossuet, Turgot e Condorcet (Segunda metade do Séc. XVIII):
conciliam a progressiva história humana com o cristianismo, que Turgot dizia ser uma “religião natural” que buscava a fraternidade universal entre os homens como sugirira Bossuet. Condurcet elabora o princípio da ordem e progresso que A. Comte tomaria como as directrizes do Positivismo. Turgot, Condorcet e Voltaire (análise crítica e interpretativa pessoal da história) transformaram a teologia da história em filosofia da história quando acharam por bem “secularizar a providência divina pelo progresso e previsão humanos” (p. 90). Filosofia Metafísica da História nos séculos XVIII – Herder, Kant, Hegel e sua crítica no Séc. XIX - Dilthey, Wildelband e Rickert
Panteísmo: identificação de Deus com a Natureza e Mundo. Deus é
o móbil do desenvolvimento histórico, a possível razão de ser da Natureza - “a Natureza como móbil da história”. Ilumisnismo: a principal fonte de conhecimento e de compreensão é a razão ou Espírito. Desenvolve uma filosofia metafísica da história com Herder, Kant e Hegel (mas também com Fichte e Schelling) Johanathan Herder (panteísmo teológico): Immanuel Kant (panteísmo lógico-formal): Frederich Hegel panteísmo teológico-estatal):
Estes autores desenvolvem uma “linha metafísico-teológica da
filosofia da história” (p.92), i.e, a Filosofia Especulativa da História A “linha metafísico-teológica da filosofia da história” em Herder J. G. Herder (1744-1803). Ideias para a Filosofia da História da Humanidade (1784). Como pensador social naturalista e teólogo panteísta protestante, Herder salienta a relevância da “raça”, clima, meio geográfico, tipos de vida e educação, as ocupações primitivas e costumes dos antepassados (»» Nacionalismo) como elementos essenciais para a compreensão da história da humanidade e dos povos cuja flor é a cultura: “A história da Humanidade não é mais do que uma história natural das forças, das ações e das tendências humanas, subordinadas ao lugar e à época”. (HERDER apud SOUSA: 92). Com Herder acentua-se a clivagem entre o mundo natural e o mundo do Espírito que já vinha de Descartes, Monstesquieu, Rosseau, pois é pelo entendimento biológico da “perplexidade da história” que se edifica o humanismo concebido como seguimento das leis da trajectória da Natureza (nascer, viver e morrer) contra a tradição considerada um ópio do Espírito.
Herder e a biologização da história: a humanidade e o humanismo enraizam-
se em disposições biológico-hereditárias (i.e, genéticas) espácio-temporais, que são “forças vivas”, que determinam a cultura no seu processo cíclico A “linha metafísico-teológica da filosofia da história” em Immanuel Kant e Friedrich Hegel Immanuel Kant (1724-1804): Ideia de uma História Universal de um Ponto de Vista Cosmopolita (1784). Kant destaca a natureza empírica da “ciência história” em contraposição com a Natureza cujas leis são objecto de estudo da “ciência racional”. Porém, a história é justificada metafisicamente, pois quem ordena e planifica a sucessão dos acontecimentos empíricos é a própria Natureza interpretada teisticamente (teísmo). Para Kant, a história é o “desenvolvimento da actividade do homem em nome da liberdade da espécie humana". Segundo Sousa, tanto Herder como Kant, “recorrendo-se à Natureza, desenvolvem uma “justificação teológica em termos panteístas” (SOUSA: 98). Hegel vai aprofundar na sua “teologia da história pensada a partir da fenomenologia do Absoluto (Deus) e da Razão nas suas Lições sobre a Filosofia da História: “Hegel apresenta-nos aqui a Histótria do Mundo como um processo racional e como um curso racional necessário do Mundo-Espírito”. (SOUSA, 100): “A História do Mundo não é outra coisa senão o progresso da consciência liberdade ...tendo em consideração os seus objectivos essenciais e fins.” (Idem). A condições dessa liberdade são a sociedade e o Estado que são formas do Espírito Objectivo A Filosofia da História segundo o Positivismo: uma filosofia metafísica? Partindo de Condorcet (Ordem e Progresso) e Saint-Simon e Turgot (lei dos três estádios do desenvolvimento espiritual do ser humano – teológico, metafísico, e científico ou positivo), August Comte (1798- 1857), baseou-se nas ideias de uma ciência baseada em factos e leis, generalizando os princípios das ciências naturais às ciências sociais, e identificando o social com o “físico”. É por isso, que a sociologia nasce como física social e a história, treconsiderada como uma ciência das leis invariáveis dos factos do desenvolvimento humano em busca da ordem e progresso, como partes das leis da natureza na sua dinâmica – “estudo dinâmico da vida colectiva”/ dinâmica social que se explica pela dinâmica da própria Natureza. Com isso, Comte recaiu na Metafísica.
A história positivista – “a história em si mesma como uma série de
factos ou de acontecimentos e tornar a historiografia como um pensar sobre esse realidade – a histórica” (SOUSA: 102) A Filosofia da história como Contemporânea Contra as interpretações teológico-metafísicas e racionalista-naturalista que visam uma interpretação global de todo o desenvolvimento histórico, a partir de um móbil extra-humano, natural ou supernatural imaginário ou metafísico, o século XIX caracteriza-se pela reação anti-especulativa da história por W. Dilthey, Windelband e Rickert Dilthey: no seu projecto de uma Crítica da Razão Histórica, distinguiu entre o conhecimento histórico causal e experimental das Ciências Naturais e a compreensão ou entendimento (verstehen) das C. do Espírito. Windelband (1894): separa as ciências naturais (nomotéticas) das ciências históricas (ideográficas) dos acontecimentos históricos singulares e individuais. Desenvolve as bases de uma filosofia da cultura e dos valores. Rickert: numa perspectiva subjectivista iniciada em Dilthey (vivências), aplica a doutrina dos valores ao estudo da história enquanto estudo não de factos mas das “realidades da nossa razão”, que são únicas e individuais – Concepção individualista-espiritualista de Windelband e Rickert A Filosofia da história como Contemporânea
Com Dilthey, Windelband e Rickert, chegava ao fim as grandes
visões da teologia-filosofia da história/ filosofias dogmáticas da história iniciada em Santo S. Agostinho.
Nascimento de tipologias históricas ou visões críticas da História
com O. Spenlger (1880-1936, A Decadência do Ocidente – 1918-1922); A. Tooynbee (Um estudo da História), Nicolai Bardiaeff (a história como liberdade criadora do Espírito), Keyserling (advento da síntese do Oriente e do Ocidente), Telhard de Chardin (História Evolutiva até à Noosfera – mundo do Espírito e do pensamento). Spengler e Toyenbe desenvolvem “tipologias históricas” em termos relacionais “culturas” (tradições) e “civilizações” (forma mais elevadas da vida de um povo ou nação) concebidas como organismos vivos sujeitos a ciclos biológicos (da vida à morte). A Filosofia crítica da história/ filosofia da ciência histórica Filósofos Analíticos anglo-americanos como W. Dray, Walsh, P. Gardnier e Malndelbaum desenvoveram a filsofia crítica da história com base em 3 problemas essenciais: - se a natureza da explicação histórica é científica e válida, por não se basear em conhecimewnto das leis gerais, mas sim em factos indiciduais e únicos; - a natureza particular ou individual histórico da história e dos agentes que a explicam (unicidade do objecto histórico); o problema da objectividade histórica: como alcançar a objectvidade daquilo que é único, particular e individual ou será a explicação histórica é holística? Filosofia crítica da história/ filosofia da ciência histórica: “uma filosofia da ciência que especialmente se dedica à análise conceptual dos vários elementos que constituem o sistema de conhecimento da história como ciência” (SOUSA: 109). Fim Muito Obrigado