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“Toda e qualquer produção humana — uma cadeira, uma religião, um computador, uma
obra de arte, uma teoria científica — tem por trás de si a contribuição de inúmeros homens,
que, num tempo anterior ao presente, fizeram indagações, realizaram descobertas,
inventaram técnicas e desenvolveram ideias. Em suma: por trás de qualquer produção
material ou espiritual, existe a História” (BOCK; FURTADO & TEIXEIRA, 1999, p. 39 grifo
nosso).
A história da Psicologia tem por volta de dois milênios (início na Grécia, de 700 a. C. até a
dominação romana, véspera da era crista). O interesse por ela remonta aos primeiros espíritos
questionadores (BOCK; FURTADO & TEIXEIRA, 1999, p. 39 grifo nosso).
”É uma das mais antigas disciplinas acadêmicas, e ao mesmo tempo uma das mais novas”
(BOCK; FURTADO & TEIXEIRA, 1999, p. 39 grifo nosso).
No século V a. C., Sócrates, Platão, Aristóteles e outros sábios gregos se viam às voltas com
muitos dos mesmos problemas que hoje ocupam os psicólogos: a memória, a aprendizagem, a
motivação, a percepção, a atividade onírica e o comportamento anormal, por exemplo.
É indispensável recuperar sua história para compreender a diversidade com que a Psicologia
se apresenta hoje.
Não há uma única forma, abordagem ou definição particulares da Psicologia moderna com
que concordem todos os psicólogos.
O eixo de referência que vincula essas áreas e abordagens distintas é a história da evolução
da disciplina Psicologia.
O conhecimento da história pode trazer ordem à desordem, produzir sentido a partir do caos;
permite enxergar o passado com mais clareza e explicar o presente.
A história nos ajuda a entender o tempo que vivemos, mesmo que saibamos que toda história
é uma narrativa e é arbitrária.
É uma narrativa, porque diz respeito à descrição de fatos que aconteceram (contada por
alguém que não estava no local e nem na mesma época);
É a memória humana preservada e sem ela não podemos ter o senso de uma continuidade,
não poderíamos nem mesmo preservar a cultura e os saberes que nos que nos constituem.
É arbitrária porque é um historiador que conta a história e nada garante que ela seja contada
do mesmo modo por outro historiador. Cada um irá destacar os fatos históricos que considera
mais relevantes.
O historiador, tal como o arqueólogo, trabalha com “fragmentos” = dados históricos, e a partir
desses fragmentos / dados tenta recriar os eventos e as pessoas do passado.
História da Psicologia
Há vários modos de se contar uma história. A seguir nos debruçaremos sobre duas formas: a
evolutiva e a descontínua.
Duas abordagens podem ser adotadas para explicar como a ciência psicológica se desenvolveu
(teoria personalista e naturalista).
▪ Concebe os fatos históricos numa cadeia linear = a evolução está sempre acontecendo
= o futuro é sempre a superação do passado.
1.1 Teoria Personalista: considera que o progresso é decorrente da ação de pessoas que
modificaram o curso da História / figura do precursor.
Há diversos precursores nas mais diversas áreas do saber: Platão, Aristóteles, Copérnico,
Descartes, Newton, Hume, Wagner, Kant, Cantor, Marx, Nietzsche, Comte, Wundt, Saurrure,
Freud, Lévi-Strauss, Foucault etc.
1.2 Teoria Naturalista: considera que a época modela as pessoas e assim os conhecimentos
produzidos.
O Zeitgeist, é a expressão alemã comumente utilizada para designar o espírito [Geist]
intelectual de um tempo [Zeit], de uma época, e que determina inextricavelmente a ação dos
sujeitos históricos
. História Descontínua
▪ Cada momento histórico só pode ser entendido nele mesmo, em seu contexto político
e social.
A tese de doutorado do crítico francês Michel Foucault, publicada como História da Loucura na
Idade Clássica – é uma ilustração da história descontínua. Em sua obra, em linhas gerais,
aborda problemas concretos (a insanidade, a prisão, a clínica, o corpo, a medicina, a
sexualidade) num contexto específico, geográfica (a França, na Europa ou no Ocidente) e
historicamente (idade do clássica, do século XVIII, ou na Grécia antiga, etc.).
▪ O passado pode nos mostrar que nada é eterno e que o tempo que vivemos é também
construído, no presente, por múltiplas forças sociais e políticas.
A história revela que há milhares de anos atrás, desde que o homem se percebeu como um
ser pensante, inserido em um complexo chamado “natureza”, vem buscando respostas para
suas dúvidas e fatos que comprovem e expliquem a origem, as causas e as transformações
que ocorrem no mundo e, agora, no universo.
Por muito tempo buscou-se explicações para as questões naturais e humanas através de
personagens mitológicos.
Para os gregos, os mitos eram narrativas sagradas sobre a origem de tudo. Eram tudo em
que acreditavam como verdadeiro. Os poetas-videntes, que narravam os mitos, possuíam
uma autoridade mística sobre os demais, pois eram "escolhidos dos deuses" que lhe
mostravam os acontecimentos passados através de revelações e sonhos, para que esses
fossem transmitidos aos ouvintes.
O mito, sem dúvida, é, por essa razão, uma das primeiras e mais ricas construções do homem
para entender a complexidade da vida. Foi inicialmente uma representação coletiva,
transmitida através de várias gerações e que relata explicações do mundo, como é o caso
da mitologia grega.
A explicação mitológica não se prende à lógica racional, nem busca oferecer comprovações
de suas afirmações. É simplesmente a tentativa do homem de dar nome a uma
complexidade que não consegue compreende com sua razão.
Com o passar do tempo, o MITO parecia não satisfazer os homens, pois se tornava, para
alguns, insuficiente para explicar a quantidade cada vez maior de questões que surgiam.
Assim, surgiu um novo modo de tentar explicar a complexidade da vida e esse novo modo
recebeu o nome de FILOSOFIA e o surgimento desse modo de pensar estava atrelado a
busca de entendimento pela racionalidade.
Na história da FILOSOFIA, existiu um filósofo grego que se tornou o primeiro a efetuar uma
espécie de corte, foi “um divisor de águas”, como se costuma dizer. Trata-se de Sócrates. A
partir dele há uma filosofia pré-socrática e uma filosofia pós-socrática.
Contribuíram para o rompimento com a visão mítica e religiosa que se tinha até então da
natureza (eventos naturais) adotando uma forma científica e racional de pensar. Abaixo
tomaremos notas de um ponto importante destacados em geral por esses filósofos e que
tem relação com nosso tema de estudo.
❖ se o homem o vê é por aquele lhe ser anterior (problemas relacionados com a natureza
do mundo físico).
Com essa dupla maneira de filosofar, os filósofos introduziram duas abordagens opostas no
campo da filosofia: idealismo e materialismo.
Idealistas
Os filósofos idealistas são os que partem da perspectiva de que é a partir do homem que se
pode conceber o que quer que seja. O mundo é aquilo que o homem consegue formalizar
por intermédio da sua percepção. É a ideia que forma o mundo. Essa doutrina filosófica
prega que o mundo material é determinado pelas ideias. E nessa esteira ingressam filósofos
como Pitágoras (pré-socrático), Platão, Descartes, Kant chegando ao apegou na filosofia do
alemão Georg Hegel.
Materialistas
O termo Psicologia vem do grego e compõem-se de duas palavras: psyché (alma) logos
(razão). No sentido etimológico, psicologia seria o estudo da alma. Essa ou espírito seria a
parte imaterial do ser humano e englobaria pensamento, sentimentos (amor e ódio),
irracionalidade, desejo, sensação, percepção etc.
Os filósofos gregos começaram a buscar respostas racionais para perguntas sobre a vida
humana, sobre as coisas que nos circundam. Perguntas como: de onde viemos? Para onde
vamos? Por que isso é ou não assim? O que fazemos neste planeta?, passaram a ocupá-los
e as respostas que produziram são apresentadas em suas obras.
Sócrates nasceu em Atenas (469 a.C.-399 a.C.) e se tornou um renomado filósofo ateniense
do período da Grécia clássica.
Sua filosofia é conhecida principalmente através dos relatos em obras de escritores que
viveram mais tarde, especialmente dois de seus alunos, Platão e Xenofonte, bem como pelas
peças teatrais de seu contemporâneo Aristófanes.
Atribui-se aos diálogos de Platão o relato mais abrangente de Sócrates a ter perdurado da
Antiguidade à atualidade.
Ao definir a razão como peculiaridade do homem ou como essência humana, Sócrates abriu
um caminho que seria muito explorado pela Psicologia moderna. Isso quer dizer que as
teorias da consciência são frutos dessa primeira sistematização na Filosofia.
Sócrates dizia que a Filosofia não era possível enquanto o indivíduo não se voltasse para si
próprio e reconhecesse suas limitações. Para tal, formulou a máxima que atravessa séculos
e que se expressa sob a forma: "Conhece -te a ti mesmo“. Maiêutica.
Discípulo direto de Sócrates e principal transmissor de sua obra, Platão, que viveu em
Atenas, no período de 428/427 a.C.-348-347 a.C., foi um dos mais importantes filósofos
gregos, sendo recorrentemente referenciado por diversos autores dos mais heterogêneos
campos do saber. Foi quem inicialmente definiu um “lugar” para a razão humana no corpo
(é na cabeça que se encontraria a alma do homem).
Esse filósofo grego concebeu a alma como uma instância separada do corpo. Afirmou que a
medula seria o elemento de ligação da alma (que está na cabeça) com o corpo. Para ele,
quando o homem morria, a matéria (o corpo) desaparecia, mas a alma ficava livre para
ocupar outro corpo e assim sucessivamente.
Psyché: seria o princípio ativo da vida. Tudo o que cresce, reproduz-se e se alimenta possui
uma psyché ou alma. Nesse sentido, os vegetais, os animais e o homem teriam alma.
Portanto, posterior ao corte socrático, mas ainda na Antiguidade, no século III a. C., surgiram
estas duas escolas filosóficas que foram denominadas de ESTOICISMO e EPICURISMO.
O ESTOICISMO foi a escola filosófica fundada pelo filósofo grego Zenão de Cítio, a qual
aderiram alguns pensadores que passaram a ser designados de estoicos. Esses afirmavam
que todo universo corpóreo é governado por uma razão divina, que lhe garante a harmonia.
Esse universo corpóreo foi denominado de Kosmos.
O plano ético dessa escola filosófica baseava-se não no prazer, mas na busca da felicidade
por intermédio da virtude.
Tal como para Aristóteles, que escreveu que não há nada no intelecto que antes não tenha
passado pelos sentidos, pela experiência sensível, para os estóicos, a mente humana é
concebida como uma tabula rasa, uma herança que determinará o pensamento do filósofo
empirista inglês John Locke.
Desse modo, pode-se dizer que o ESTOICISMO é uma escola filosófica materialista. E, se
tudo é material, toda atividade é movimento. Assim também deve-se conceber a ideia de
Deus materialmente, tal como a alma e as propriedades das coisas.
O EPICURISMO foi uma escola filosófica também pertencente aos séculos III e IV a. C. e que
foi fundada pelo filósofo grego Epicuro. Os adeptos dessa escola foram chamados de
epicuristas e afirmavam que a verdade provinha apenas da sensação.
Os epicuristas acreditavam em deuses, mas defendiam que eles não intervinham no mundo
material.
Esse termo serve para designar, segundo Marcondes (2014, p. 84), “a influência da cultura
grega em toda região do Mediterrâneo Oriental e do Oriente Próximo desde as conquistas
de Alexandre [...] até a conquista romana do Egito em 30 a. C., que passa a marcar a
influência de Roma nessa mesma região”.
Ainda segundo esse autor, “Embora houvesse uma filosofia desenvolvida em Roma e escrita
em latim, ela resultava em grande parte de desdobramentos das escolas filosóficas gregas,
sobretudo o estoicismo e o epicurismo”, escolas que nos deteremos a seguir.
Antes de chegarmos à Idade Média, iniciada pela queda do último imperador romano (476
a.C.), mas já na era cristã, surgia o filósofo e teólogo santo Agostinho, que se tornou bispo
de Hipona.
Marcondes (2014, p. 111) eleva-o ao lugar de “filósofo mais importante, devido à sua
criatividade e originalidade, a surgir no pensamento antigo desde Platão e Aristóteles”.
Também o considera “um pensador do final do período antigo, ainda profundamente ligado
aos clássicos, mas já refletindo em sua visão de mundo e em suas preocupações as grandes
mudanças pelas quais passa sua época e prenunciando o papel que o cristianismo terá na
formação da cultura ocidental, para o que contribui de forma decisiva” (MARCONDES, 2014,
p. 111).
Das três contribuições ao desenvolvimento da filosofia destacadas por Marcondes (2014, p.
112), a segunda é particularmente relevante para nosso enfoque. Trata-se da sua “teoria do
conhecimento em ênfase na questão da subjetividade e da interioridade”.
Atingir uma verdade eterna é condição de possibilidade para o conhecimento e esse supõe
algo de prévio. Nesse sentido, sua posição é inatista, pois supõe que o conhecimento não é
derivado inteiramente da apreensão sensível ou da experiência concreta, necessitando de
um conhecimento prévio que sirva de ponto de partida para o próprio processo de
conhecer.
Não se restringido à tese platônica, Agostinho introduz sua contribuição com a teoria da
interioridade e da iluminação. Marcondes (2014) o considera o primeiro a desenvolver, com
base em concepções neoplatônicas e estoicas, uma noção de INTERIORIDADE que
prenuncia o conceito de SUBJETIVIDADE do pensamento moderno. Em sua filosofia
encontra-se a oposição (interior-exterior) e a concepção de que a interioridade é o lugar da
verdade. É olhando para a sua interioridade que o homem a descobre ou “no homem interior
habita a verdade”. Essa interioridade “é dotada da capacidade de entender a verdade pela
iluminação divina” (MARCONDES, 2014, p. 114). A mente humana, acrescenta Marcondes
(2014, p. 114), “possui uma centelha do intelecto divino, já que o homem foi criado à
imagem e semelhança de Deus. A teoria da iluminação vem assim a substituir a teoria
platônica da reminiscência, explicando o ponto de partida do processo de conhecimento e
abrindo o caminho para a fé”. (MARCONDES, 2014, p. 114).
Algumas das características desse momento era a autoridade da Igreja ao impor sobre os
homens sua doutrina como verdade que não podia ser questionada. A razão foi amalgada à
fé, permanecendo quase indissociáveis. Temendo perder a autoridade, a Igreja, por meios
dos seus representantes, reprimia toda ideia que poderia traçar novos caminhos para a
ciência, impedindo seu livre desenvolvimento.
Nesse sentido, o homem não podia ser objeto de investigação científica, pois o corpo era
representado como sacrário da alma.
Apesar da forte pressão exercida pela Igreja, particularmente alguns pensadores, como
santo Anselmo, conseguiram destacar-se, mas, sem dúvida, foi são Tomás de Aquino,
filósofo e teólogo que pertenceu ao período da alta escolástica, quem conseguiu reorientar
o pensamento Ocidental para o campo da investigação filosófica.