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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAÍBA

PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA


Comissão de Combate aos Crimes de Responsabilidade e à Improbidade
Administrativa – CCRIMP

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR DO TRIBUNAL


DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA

PIC Nº

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAÍBA (MPPB), por


intermédio de sua 1ª Subprocuradora-Geral de Justiça, atuando por delegação
do Procurador-Geral de Justiça, e ainda, no uso das atribuições constitucionais
e legais, notadamente as previstas nos artigos 129, I, da Constituição Federal,
37, III, e 40, V, da Lei Complementar Estadual no 97/2010, e com base no
conjunto probatório colhido no Procedimento Investigatório Criminal em anexo,
vem, à presença de Vossa Excelência, oferecer

DENÚNCIA

contra XXXXXXXXXXXXXXX, Prefeito do Município de XXXXX, portador do ,


pelos fatos delituosos que passa a expor:

De acordo com as peças de informação encartadas no procedimento


investigatório criminal anexo, o denunciado, XXXXXXXXX, na qualidade de
Prefeito Constitucional do Município de XXXXXX/PB, agindo com manifesta
intenção dolosa, admitiu, durante os exercícios administrativo-financeiros de
2017 e 2018, servidor público contra expressa disposição de lei, bem como,
ordenou e pagou despesas não autorizadas por lei com diárias de servidora
pública municipal.

- Da ordenação e pagamento ilegal de despesas com diárias de servidora


pública municipal – art. 1º, inciso V, do Decreto-lei º 201/67

Dessume-se do procedimento investigatório criminal que o denunciado


XXXXXXXXX, prefeito do Município de xxxxx/PB, ordenou e efetuou despesas não
autorizadas por lei, autorizando o pagamento de diárias em desacordo com a
legislação municipal à servidora pública municipal XXXXX, nomeada por ele
próprio para o cargo de confiança de Controladora-Geral do Município, através
de 06 (seis) despesas empenhadas entre os dias 30.01.2019 a 28.06.2019,
conforme quadro adiante apresentado, totalizando uma despesa ilegal e dano
ao erário de R$ 2.257,50 (dois mil, duzentos e cinquenta e sete reais e
cinquenta centavos).

Na época da ordenação dessas despesas ilegais, a Controladora-Geral


do Município de XXXXX/PB tinha como endereço residencial, conforme dados
extraídos de ficha funcional acostada aos autos (pág. 17, movimento 03 do
PIC), a Rua XXXXX, domicílio este localizado a 58 km (cinquenta e oito
quilômetros) de distância da sede da Prefeitura Municipal de XXXXX (conforme
consulta ao Google Maps), local de lotação (domicílio funcional) e, portanto, de
exercício das funções inerentes ao relevante cargo público ocupado pela citada
servidora.

De acordo com os empenhos anexados na representação pelo


noticiante XXXXX, o Prefeito Constitucional de XXXXX/PB, em flagrante
violação da lei municipal aplicável à espécie, em continuidade delitiva, ordenou
e efetuou, 06 (seis) vezes, entre os meses de janeiro e junho de 2019,
despesas com diárias para ressarcimento desses deslocamentos da
Controladora-Geral do município de sua residência para a cidade de XXXXX.
Conforme informações extraídas do sistema Sagres do TCE/PB
(anexadas na denúncia que resultou na instauração do PIC), foram um total de
06 (seis) empenhos cujos pagamentos – no total de R$ 2.257,50 (dois mil,
duzentos e cinquenta e sete reais e cinquenta centavos) – foram autorizados
pelo alcaide a título de diárias de deslocamento da servidora para o Município
de XXXXX, para ressarcimento de viagens realizadas a partir de XXXXX
(residência da funcionária) nos meses de janeiro, fevereiro março, abril, maio e
junho de 2019:

DESPESA Nº DO DATA VALOR (R$)


EMPENHO
339014 001095 7/3/2019 408,10
339014 001552 29/03/2019 408,10
339014 002264 30/04/2019 408,10
339036 003570 28/06/2019 400,00
339036 003265 06/06/2019 400,00
339014 000416 30/01/2019 233,20

Interessante notar que, na justificativa desses empenhos, chega a ser


informada como base legal a Lei Municipal nº XXXXX, que versa sobre a
unidade fiscal de referência – UFIR adotada na municipalidade (sem relação
com o pagamento de diárias), bem como, em uma das autorizações de
pagamento (empenho 0003570), informa-se que o pagamento foi para custeio
de deslocamentos da sede da Controladoria Geral para “diversos órgãos
públicos municipais”, ou seja, deslocamentos dentro do próprio município, onde
igualmente não existe previsão do pagamento de diárias.

É importante destacar que não há o dever legal de o servidor público


municipal residir na cidade onde exerce as suas funções, sendo sua obrigação,
contudo, deslocar-se até o município onde deve cumprir a sua jornada de
trabalho. Em optando por residir fora do município, deve, às suas expensas,
deslocar-se para o local de trabalho, caso não esteja executando suas funções
de forma remota ou virtual, segundo o disciplinamento normativo local, não
podendo o encargo dessa opção ser transferido ao município empregador,
gerando uma despesa ilegal e lesiva ao erário público.

Neste sentido, a Lei Municipal nº XXXXX (cópia nos autos) que


regulamenta a concessão de diárias para os servidores no âmbito do Município
de XXXXX/PB, estabelece que a diária só será concedida quando o servidor se
deslocar da sede do Município para outra localidade do Estado ou Território
Nacional, e desde que esteja a serviço do Município. Senão vejamos:

Art. 1º - Os servidores públicos municipais da Administração Direta,


Direta Descentralizada e Fundacional do Poder Executivo, quando se
deslocarem a serviço, em missão, estudo, representação ou no
interesse do Município, para outra localidade do Estado da
Paraíba ou do Território.
(...)
Art. 3º. Não se concederá diária:
II – quando o deslocamento constituir exigência permanente para
o desempenho das atribuições do cargo ou função (destaques
nossos).

Portanto, a lei municipal apenas permite o pagamento de diárias para


fora do Município de XXXXX, quando o servidor se desloca para outras cidades
ou unidades federativas. A legislação não autoriza no caput do art. 1º - e veda
expressamente no art. 3º, inciso II -, o pagamento de diárias para dentro do
Município de XXXXX, ou seja, para que servidores de seu quadro funcional se
desloquem até a cidade para trabalhar, como também, para deslocamentos
internos no âmbito territorial do município.

A infração penal decorrente do pagamento de despesas com diárias,


com violação à legislação municipal, subsume-se ao tipo penal e configura o
crime de responsabilidade previsto no art. 1º, inciso V, do Decreto-Lei nº
201/67, que tem a seguinte redação:

Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal,


sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do
pronunciamento da Câmara dos Vereadores:
(...)
V - ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou
realizá-Ias em desacordo com as normas financeiras pertinentes
(negrito nosso);
Assim sendo, ao ordenar e pagar 06 (seis) despesas ilegais,
totalizando R$ 2.257,50 (dois mil, duzentos e cinquenta e set reais e cinquenta
centavos), para que a servidora pública XXXXX, entre os meses de janeiro e
junho de 2019, se deslocasse da cidade de XXXXX para o Município de
XXXXX/PB, onde exercia o cargo público comissionado de Controladora Geral,
bem como, para que esta se deslocasse dentro do território municipal, terminou
o denunciado, na qualidade de ordenador de despesas, por incidir na citada
prática delituosa.

Além da subsunção da conduta ao tipo legal (tipicidade formal),


encontra-se presente também o dolo de agir e de causar prejuízo ao erário,
mediante o pagamento de vantagem indevida à funcionária pública (tipicidade
material), uma vez que o alcaide tinha pleno conhecimento e vontade de agir
em desacordo com a lei municipal, sendo a servidora beneficiada pela
ilegalidade integrante do primeiro escalão na hierarquia administrativa,
nomeada em comissão diretamente pelo próprio acusado para exercer o cargo
comissionado (de confiança) de Controladora-Geral do Município.

- Admissão ilegal de servidora pública. Da contratação de XXXXX sem


contratação ou concurso, mediante pagamento de notas de empenho
avulsas como prestadora de serviços gerais (faxina) – art. 1º, inciso XIII,
do Decreto-lei º 201/67

Segundo se depreende das peças amplexadas ao Procedimento


Investigativo em anexo, o denunciado XXXXX, na qualidade de Prefeito
Constitucional do Município de XXXXX/PB, agindo com manifesta intenção
dolosa, admitiu, durante os exercícios administrativo-financeiros de 2017 e
2018, servidor público contra expressa disposição de lei.

A representação apresentada perante a Procuradoria Geral de Justiça


informa que XXXXX foi ilegalmente admitida pelo denunciado para trabalhar no
Município de XXXXX/PB, a título de prestação de serviços, recebendo valores
com base em notas fiscais avulsas, para desempenhar funções como
AUXILIAR DE SERVIÇOS GERAIS em unidades de saúde municipais,
trabalhando na realização de faxina e remoção de entulhos.

De acordo com as notas de empenho anexados aos autos, no ano de


2017, o denunciado realizou pagamentos mensais relativos à prestação de
serviços, de valores próximos ao salário mínimo, totalizando R$ 7.914,00 (sete
mil, novecentos e catorze reais), valor próximo ao limite previsto para dispensa
de licitação à época, assim evitando a emissão de alerta pelo Tribunal de
Contas.

Após um intervalo de quatro meses, já com o advento do Decreto nº


9412, de 18 de junho de 2018, que elevou o limite para dispensa de licitação, o
denunciado passou a realizar novos pagamentos no ano de 2018, no valor
mensal de R$ 1.000,00 (mil reais) em janeiro/2018 e os demais 11 meses no
valor de R$ 1.080,00 (mil e oitenta reais), totalizando R$ 11.800,00 (onze mil e
oitocentos reais).

Foram expedidos ofícios requisitórios com vistas a melhor instruir este


fato específico, aportando nos autos diversos documentos comprovando que,
XXXXX, sem qualquer concurso público, processo simplificado, contrato
temporário ou mesmo uma dispensa de licitação para contratação de prestador
de serviço, foi simplesmente admitida ao serviço público municipal para prestar
atividades de natureza permanente como auxiliar de serviços gerais,
recebendo remuneração através de notas fiscais de prestação de serviços sem
qualquer ato ou contrato administrativo ou procedimento licitatório, frise-se.

O Município de XXXXX/PB, sem ter como justificar, terminou por


confirmar a ilegalidade praticada pelo seu gestor.

Em primeira resposta, através do Ofício 01/20-SCG-ASSJ, o Município


de XXXXX informou que deixava de remeter o contrato temporário de XXXXX,
vez que a referida senhora não era contratada por excepcional interesse
público, mas sim prestadora de serviços esporádica, sendo paga por serviços
realizados de forma avulsa, através de emissão de nota fiscal, não possuindo
nenhum vínculo formal com a municipalidade.

A CCRIMP então enviou novo ofício requisitando cópia das notas


fiscais e empenhos alusivos aos serviços em tese prestados por XXXXX em
favor da edilidade, nos anos de 2017 e 2018. Através do Ofício 01/20-SCG-
ASSJ, o Município encaminhou cópia dos processos de pagamento à XXXXX
nos anos de 2017 e 2018.

Analisando os documentos, constata-se que, entre os meses de março


a setembro de 2017, o prefeito municipal, de forma habitual, ordenou o
pagamento de despesas no valor de R$ 7.914,00 (sete mil, novecentos e
catorze reais), fracionadas em 08 (oito) empenhos, valor pouco inferior ao limite
de dispensa de licitação na época dos fatos, o que ludibriou a fiscalização
permanente do Tribunal de Contas.

Com o advento do Decreto nº 9412/2018, que alterou o limite de


dispensa de licitação, após um breve intervalo de quatro meses, foram emitidas
novas notas de empenho com o pagamento entre fevereiro a dezembro de
2018, no valor mensal R$ 1.080,00 (sendo apenas o primeiro pagamento de R$
1.000,00), totalizando R$ 11.800,00 (onze mil e oitocentos reais).

Assim, nos anos de 2017 e 2018, de forma dolosa, permanente e


habitual, o denunciado determinou o pagamento de uma despesa total de R$
25.914,00 (vinte e cinco mil, novecentos e catorze reais) para uma servidora
admitida contra expressa disposição legal, com violação ao concurso público,
sem a existência sequer de um contrato temporário ou de um procedimento de
licença licitatória, sendo remunerada mediante notas avulsas para realizar
serviços de limpeza (faxina), atividade permanente e corriqueira da
administração pública municipal e que, portanto, deveria ser exercida por
servidores do quadro efetivo do Município, ou, em última análise, através de
contratação temporária, desde que em conformidade com a lei municipal,
precedidos os pagamentos, portanto, da publicação de ato ou contrato
administrativo indicando os direitos e obrigações do servidor admitido.
Não restam dúvidas, portanto, de que o denunciado, ciente da ilicitude
e das consequências de sua conduta, sem justificativa válida e agindo com a
inequívoca intenção de burlar as normas dispostas no artigo 37, incisos II e IX,
da Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos


Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação
prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de
acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na
forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em
comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;
IX – a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo
determinado para atender a necessidade temporária de excepcional
interesse público.

No caso concreto, o denunciado não utilizou qualquer meio


constitucional e legal de acesso aos cargos e funções públicas para admitir
XXXXX ao serviço público municipal, uma vez que ela não se submeteu a
concurso público, não foi realizada contratação temporária, nem tampouco ela
foi nomeada para exercer função de confiança. Simplesmente, sem qualquer
ato ou contrato administrativo, o denunciado XXXXX admitiu XXXXX, emitindo
notas de empenho sob a rubrica de prestação de serviços sem qualquer
amparo legal ou contratual.

A infração penal decorrente da admissão ilegal de servidor público tem


adequação ao tipo penal e configura o crime de responsabilidade previsto no
art. 1º, inciso V, do Decreto-Lei nº 201/67, que tem a seguinte redação:

Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos


Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário,
independentemente do pronunciamento da Câmara dos
Vereadores:
(...)
XIII – nomear, admitir ou designar servidor, contra
expressa disposição de lei (negrito nosso);
Ao lançar o expediente de admitir XXXXX como se fosse prestadora de
serviços, sem qualquer ato administrativo ou contrato temporário, realizando
pagamentos através de notas avulsas, terminou por admitir servidor público
contra expressa disposição legal e constitucional, agindo com pleno
conhecimento em face da habitualidade da infração penal praticada, perpetrada
entre março e setembro de 2017 e, após um breve intervalo, retomando a
conduta delituosa durante todo o exercício de 2018.

- Conclusão

Os fatos restaram devidamente demonstrados, por meio de farta prova


documental e oral que instruem o presente procedimento investigatório, a
materialidade dos delitos e indícios de autoria, razão pela qual se faz imperiosa
a oferta da presente denúncia.

Ante o exposto, por sua conduta dolosa, encontra-se XXXXX, incurso


nas penas do artigo 1º, incisos V (crime continuado e praticado seis vezes,
artigo 71 do Código Penal) e XIII (crime habitual e permanente), em concurso
material (artigo 69 do Código Penal), razão pela qual REQUER o MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DA PARAÍBA, por sua 1ª Subprocuradora-Geral de
Justiça, o registro e autuação desta exordial acusatória e do procedimento de
investigação criminal n° 002.2019.047027 que, em seguida, seja notificado o
imputado para apresentar, querendo, resposta preliminar, nos termos do art. 4º,
da Lei no 8.038/1990, recebendo-se, em seguida, a presente peça incoativa e
procedendo-se à citação para interrogatório e ulteriores atos processuais,
prosseguindo-se até final julgamento e condenação.

Outrossim, o Ministério Público do Estado da Paraíba, nos termos do


artigo 387, IV, do CPP, requer que o denunciado seja condenado a ressarcir o
erário no valor de R$ 28.170,50 (vinte e oito mil, cento e setenta reais e
cinquenta centavos), corrigido monetariamente, valor este referente à soma
das quantias de R$ 25.914,00 (vinte e cinco mil, novecentos e catorze reais),
decorrentes da admissão ilegal deXXXXX, com R$ 2.257,50 (dois mil, duzentos
e cinquenta e sete reais e cinquenta centavos) referentes a diárias ilegalmente
pagas a XXXXX.

Por fim, nos termos do artigo 92, I, do CP, requer que seja decretada a
perda de cargo, função pública ou mandato eletivo do acusado.

Em anexo, segue o procedimento de investigação criminal n° XXXXX.

João Pessoa, data eletrônica.

XXXXX
1ª Subprocuradora-Geral de Justiça
Presidente da CCRIMP

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