Você está na página 1de 9

ESTADO DA BAHIA

MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE


PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal da Subseção Judiciária de


Feira de Santana/BA

MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE, pessoa jurídica de direito público


interno, inscrita no CNPJ sob o nº 14.222.574/0001-19, com sede na Praça
Manoel Teixeira de Freitas, s/n, Centro, Conceição do Jacuípe/BA, neste ato
representado por seu órgão de representação jurídica, com fulcro no art. 5ª, LV
da CF, assim como nos artigos 186, 187, 927, 944, 945 do Código Civil, vem
perante Vossa Excelência propor a presente

AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO C/C PEDIDO LIMINAR DE


INDISPONIBILIDADE DE BENS

em face de JOÃO BARROS DE OLIVEIRA, brasileiro, ex-prefeito municipal de


Conceição do Jacuípe/BA, inscrito no CPF sob o n.º 180.622.025-34,
domiciliado à Rua Leôncio Ribeiro, n.º 302, Centro, Conceição do Jacuípe/BA,
pelos fatos e fundamentos a seguir deduzidos.

1. DOS FATOS
O réu ocupou o cargo de prefeito do Município de Conceição do Jacuípe/BA,
durante os anos de 2005 a 2008. Durante a sua passagem pelo Poder
Executivo Municipal, o ex-gestor recebeu verbas oriundas do FNDE (Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação), para a efetivação do PTA
(Programa de Trabalho Anual).

1
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

De fato, em 2006, conforme apontam os documentos anexos, o referido Fundo


repassou a importância de R$ 20.790,00, no bojo do processo de concessão
de n.º 23400.003606/2006-93 com o intuito de fomentar a formação dos
professores municipais.

Ocorre que, embora tendo recebido o a cifra supramencionada, a o ex-gestor


não realizou a devida prestação de contas ao órgão federal.

Deste modo, o FNDE, em 2016, passou a cobrar do Município a prestação de


contas relativa ao repasse acima descrito. Por não ocupar a chefia do
Executivo à época, a atual gestora notificou o réu, dando-lhe oportunidade de
apresentar a documentação requerida, conforme não deixa dúvidas a cópia
integral dos autos do processo administrativo de n.º 026/2016, ora anexo.
Diante de seu silêncio, a Secretaria de Educação empreendeu busca por
registros da prestação de contas, sem sucesso.

A questão é que pode o Município vir a sofrer prejuízos inestimáveis, como a


inserção do seu nome no CADIN, restrição que o impediria de firmar novos
convênios, sem contar com a possibilidade de adoção, pelo TCU, do
procedimento de tomada de contas especial, com eventual aplicação de
penalidades como multas e restrições de direito em desfavor da
Municipalidade.

Considerando que o Município, enquanto pessoa jurídica (e representante do


interesse público), não pode ser responsabilizado por uma eventual falha do
réu, bem como tal lapso não pode ser atribuído à atual gestão, vem a
Municipalidade à presença de Vossa Excelência para requerer a aplicação da
Lei e do Direito ao caso concreto, pugnando pelo ressarcimento dos valores
reclamados (mais juros e correção monetária) pelo Fundo federal.

2
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

2. DO DIREITO

2.1 – Da competência da Justiça Federal

A princípio causaria estranheza tramitar sob Vara Federal uma ação movida
por um ente municipal contra seu ex-gestor, eis que, em regra, tais temas são
afetos à jurisdição estadual.

Há, contudo, um detalhe no caso sob análise, que faz subverter o juízo
competente para a causa: as verbas cujo ressarcimento se pleiteia são de
origem federal, eis que oriundas do FNDE.

Como é sabido, a competência da Justiça Federal vem definida no art. 109 da


Constituição Federal, o qual, em seus incisos, define as hipóteses da jurisdição
federal, in verbis:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa


pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés,
assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de
trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
(Destacamos).

O interesse do FNDE mostra-se patente no caso, tendo em vista que os


recursos cedidos provêm de seus cofres. Ademais, por dever moral e legal,
interessa ao ente concedente saber a destinação que foi dada à verba por ele
transferida.

Ademais, o próprio órgão federal tem notificado o Município no intuito de cobrar


a prestação de contas do convênio, o que evidencia seu interesse em conhecer
a destinação e aplicação das cifras transferidas.

3
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

Reconhecendo-se o interesse do FNDE no caso, surge de modo cristalino a


conclusão de que a Justiça Federal é competente para processar e julgar a
demanda. Este é o entendimento extraído de diversos acórdãos do TRF, cujos
exemplos a seguir transcrevemos, senão vejamos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO


PROPOSTA POR MUNICÍPIO CONTRA EX-PREFEITO.
LEGITIMIDADE DA UNIÃO PARA FIGURAR COMO ASSISTENTE DO
AUTOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PRECEDENTE DA
CORTE. 1. A União não tem legitimidade para ingressar como
litisconsorte ativa em ação de ressarcimento proposta por Município
contra seu ex-prefeito objetivando a restituição de verba por ela
transferida ao ente político-administrativo e sujeita à prestação de
contas à mesma. 2. Admite-se a intervenção de entidade federal
como assistente do autor vez que tem legítimo interesse em
participar da relação processual como repassadora dos recursos e
interessada na sua boa aplicação, sendo competente a Justiça
Federal para o julgamento da demanda. (TRF-1 - AG: 55755 BA
1997.01.00.055755-8, Relator: JUIZ FEDERAL WILSON ALVES DE
SOUZA (CONV.), Data de Julgamento: 20/11/2003, TERCEIRA TURMA
SUPLEMENTAR, Data de Publicação: 29/01/2004 DJ p.100).
Destacamos.

Segue na mesma toada, a jurisprudência:

PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE


RESSARCIMENTO PROPOSTA POR MUNICÍPIO CONTRA EX-
PREFEITO. UNIÃO FEDERAL COMO ASSISTENTE DO AUTOR.
POSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
PRECEDENTES DESTA EG. CORTE. 1. Ficando evidenciado que a
União tem a expectativa de que os recursos federais repassados
aos municípios, decorrentes de convênios assinados, sejam
corretamente aplicados, resta, portanto, caracterizado o seu

4
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO
interesse na causa promovida pelo município contra seu ex-
prefeito, cobrando valores que não foram aplicados de acordo com
as disposições dos respectivos convênios. Precedentes. 2. Em
havendo a possibilidade de intervenção da União Federal no presente
feito, na condição de assistente simples, é a Justiça Federal competente
para processar e julgar a ação ressarcitória (art. 109, I, da CF/88). 3.
Agravo provido. (TRF-1 - AG: 38333 PI 1999.01.00.038333-0, Relator:
JUIZ FEDERAL MOACIR FERREIRA RAMOS (CONV.), Data de
Publicação: 03/07/2003 DJ p.230). Destacamos.

Arrematando tal entendimento, cite-se a súmula n.º 208 do STJ, que assim
afirma:

Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal


por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão
federal.

Diante disto, tem-se por inequívoca a competência deste Juízo para conhecer a
demanda, requerendo, portanto e de logo, que sejam intimadas, por
intermédio de seus representantes judiciais, a União Federal (AGU) e o
FNDE (Procuradoria Federal) para manifestar seu interesse em integrar a
lide.

2.2 – Dos termos do convênio (PTA) firmado entre as partes

Como já dito, o Plano de Trabalho Anual, garante, por meio da transferência de


recursos financeiros da União, iniciativas que favoreçam o desenvolvimento do
ensino nos estados, municípios e DF.

Não é demais insistir que o direito à educação possui previsão constitucional,


motivo pelo qual é obrigação dos entes públicos zelar não só pela prestação
adequada de tal direito, mas garanti-lo em boas condições à sociedade, o que,

5
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

por sua vez, só é possível mediante a adequada gestão de recursos e pessoas


com vistas aos fins colimados constitucionalmente.

Sua importância, portanto, é fundamental, sobretudo em Municípios de


pequeno e médio porte, cuja receita é basicamente composta por
transferências oriundas dos estados-membro e da União. Nestes casos, a
ausência de tais verbas praticamente inviabiliza que os munícipes tenham
acesso à educação.

Por isso, é fundamental a correta prestação de contas dos valores recebidos


em razão de tais transferências. A razão disto é muito simples: quando a
prestação não é fornecida, ou, embora fornecida, não é aprovada, o ente
beneficiado se torna inadimplente, não podendo receber os recursos do
FNDE, fato que se encontra na iminência de ocorrer com a
Municipalidade.

2.3 – Da obrigação de ressarcir e dos atos de improbidade

A obrigação de reparar os danos, sejam patrimoniais ou extrapatrimoniais, vem


prevista na legislação civil, mais especificamente no art. 186 do Código Civil,
que assim diz, in litteris:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou


imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Além disso, a conduta do réu violou, por assim dizer, pelo menos duas esferas
jurídicas, cada uma delas portadora de consequências específicas.

Ao não prestar contas dos valores mencionados, o réu causou dano ao erário
público e em razão disto, deve ser obrigado a ressarci-lo.

6
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

Sob outro aspecto, a conduta do réu se enquadra nos artigos 10º e 11º da Lei
de improbidade administrativa. Neste sentido, o art. 37º § 4º da Carta Magna
afirma que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos
direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da
ação penal cabível”.

A lei prevê três modalidades de atos ímprobos: a) os que importem em


enriquecimento ilícito; b) que causem prejuízo ao Erário; c) e os que atentam
contra princípios da administração. Como se vê, o réu praticou pelo menos
duas das três modalidades legais de improbidade.

O artigo 11 da lei em comento, classifica como ato de improbidade a conduta


que lesa princípios da Administração. Dispõe a norma:

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra


os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que
viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade
às instituições, e notadamente:
(…)
VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo”.

Isto sem contar a violação a princípios da Administração Pública, em especial


os da legalidade, moralidade e publicidade.

A moralidade administrativa é inerente à própria legitimidade dos atos dos


agentes públicos. Na espécie, o réu deixou de prestar contas de recursos
públicos, cuja finalidade é atender a direito fundamental estampado na
Constituição Federal de 1988 (direito à educação), conduta que fere o princípio
da moralidade.

7
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

Por fim, no que tange ao princípio da publicidade, leciona com maestria Maria
Sylvia Zanella di Pietro:

O princípio da publicidade, que vem agora inserido no artigo 37 da


Constituição, exige a ampla divulgação dos atos praticados pela
Administração Pública, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em
lei.

No caso vertente, até o momento não foi explicado o modo como tal recurso foi
gasto pelo ex-gestor, ora réu. Ou seja, não se sabe como foi utilizada a verba
publica, fato que implica em ofensa ao princípio da publicidade.

3. DOS PEDIDOS

Diante disto, vem o autor perante Vossa Excelência para requerer o seguinte:

1) Sejam intimadas a União Federal e o FNDE para que manifestem seu


interesse no feito;

2) A citação do réu, para querendo, contestar os fatos e argumentos contra ele


tecidos sob pena de revelia;

3) Que liminarmente e sem a oitiva da parte adversa, seja declarada a


indisponibilidade de bens do réu, de modo a garantir o sucesso da futura
execução contra ele deflagrada;

4) No mérito, sejam confirmados os efeitos da liminar, para julgar


procedente a lide, condenando a ré à devolução da importância ora
reclamada, devidamente atualizada e corrigida com juros de mora;

5) A produção de todos os tipos de prova em Direito admitidos;

8
ESTADO DA BAHIA
MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DO JACUÍPE
PROCURADORIA DO MUNICÍPIO

6) Que se dê ciência ao MPF sobre o feito, para que este órgão, querendo,
tome as providências que entender pertinentes;

7) A condenação do réu no pagamento das custas processuais e honorários


advocatícios.

Dá-se à causa o valor de R$ 20.790,00 (vinte mil, setecentos e noventa reais).

Nestes termos,
Pede deferimento.

Conceição do Jacuípe/BA, 10 de novembro de 2016.

Tiago Sabóia
Procurador do Município

Você também pode gostar