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2. No texto "O cinema como porta: a tela e o limiar", Thomas Elsaesser e Malte Hagener
argumentam que "A porta não só assinala a travessia de um espaço físico para outro, ela
também invoca o transporte de um domínio ontológico ou temporal para outro. Como
vimos em Rastros de Ódio, as portas no início e no fim do filme se abrem e se fecham não só
para uma paisagem real, mas também para os mitos do oeste americano [...] As portas
estão profundamente enraizadas como metáforas em nossa consciência cultural: a porta
que se abre para um futuro brilhante ou se fecha com força; a porta na qual se coloca um
pé ou em que se coloca uma tranca depois que a casa foi arrombada".
Com base no texto e nas reflexões realizadas em sala, escolha uma obra audiovisual
(filme de ficção, documentário, série, reality show, game, etc.) que invoca o "transporte
de um domínio ontológico ou temporal para outro", com ênfase nas diferenças culturais
que se apresentam entre os mundos em trânsito.
Em “Sonhos” (1990) de Akira Kurosawa há a exibição de oito curta-metragens na qual o
diretor relata ser representações fílmicas de seus próprios sonhos, todos os curtas trazem uma
perspectiva de “cinema como porta” tendo em vista algo que é inerente ao campo onírico de
transporte para uma outra possível realidade ainda que inconsciente. Akira Kurosawa explora
muito bem na maioria dos curtas um conceito do que está “dentro” e do que está “fora” sendo
separados principalmente por portões, portas, túneis e até mesmos quadros de galerias, há um
limiar de separação entre o mundo real e um outro mundo fantástico de seus sonhos com
criaturas que fogem ao padrão social. No primeiro curta há o desejo de uma criança em sair
de casa gravado sob uma perspectiva já de fora da casa que já antecipa que essa criança
fugirá mesmo com a intervenção negativa de sua mãe para não fazê-lo, o menino então se
depara com raposas personificadas por pessoas trazendo a perspectiva de outras regras de
funcionamentos porém que correspondem a uma certa diegese onírica, esse menino é
proibido de retornar para casa, a câmera nunca atravessou essa porta da casa pois está
interessada em outras travessias tendo em vista que essa primeira história finaliza com o
menino desaparecendo em um arco-íris. As outras sete histórias também trazem um tom
similar tendo em vista que são todos sonhos elaborados e gravados, mas essa perspectiva de
transporte está presente na maioria deles assim como o choque com essas criaturas que não
são usuais mas que trazem novas perspectivas de vida para o protagonista. Esse personagem
assemelha-se a um andarilho, um viajante que está sempre cruzando esses portais para novas
possibilidades de encontro, constantemente viajando por eles.
"A estética reflexiva modernista também reivindicou para si outra das teorias de
Brecht, a do 'distanciamento', que queria romper o contrato mutuamente conivente do
'faz de conta' entre o espectador e a peça teatral. No cinema, como vimos, esses efeitos
de duplo e espelhamento e o jogo de distância e proximidade, no entanto, eram comuns
desde o início, fosse com intenção crítica e desconstrutiva ou como reviravolta de
enredo, piada ou outra maneira de envolver os espectadores nas tomadas e tomadas
duplas da autoexposição performativa. Porém, nos anos 1960, uma nova urgência ou
incerteza se ligou a esse tipo de reflexividade: já não bastava simplesmente contar uma
história; uma narrativa tinha de assegurar seu direito de ser, recontando seu próprio
surgimento junto com a história (e, às vezes, no lugar da história) que provocara o ato da
narração em primeiro lugar. Como linguagem de um cinema de crise, essa estética
modernista, contudo, mostrou-se extremamente inventiva na transposição hábil do
duplo e do espelhamento - como hesitação, adiamento, subterfúgio ou autoavaliação
crítica - para formas narrativo-pictóricas distintas, fosse por meio da narrativa em
abismo (um filme dentro de um filme), do enquadramento pictórico que destacava a
construção da mise-en-scène, ou de uma paráfrase acentuada de tradicionais clichês de
enredo, padrões de gênero e citações-pastiche. O espectador já não entra num filme
através da ficção da janela transparente nem cruzando limiares claramente marcados",
(Thomas Elsaesser e Malte Hagener, Teoria do cinema - uma introdução através do
sentido, p. 94).
Com base na citação acima, reflita e responda as questões abaixo:
a) A estética reflexiva modernista citada diz respeito a qual das metáforas abordadas ao
longo da disciplina?
b) Cite um filme do período que se convencionou chamar de cinema moderno e
argumente como o filme expõe em sua narrativa a citada "crise da linguagem clássica".
Demonstre seu argumento por meio da descrição de pelo menos uma cena.