Escola deve oferecer espaço para ajudar na revelação de dificuldades
• ANA CLAUDETE M. DE OLIVEIRA ções simbólicas. Também vai-se positivas e negativas, de amor e de Psicopedagoga da Equipe de Projetos Especiais da E. E. E. B. Dolores Alcaraz formando uma vida inconsciente ódio, destruição e reparação. Ela Caldas. Porto Alegre/RS. que trará influências sobre as ati- vive e revive sua experiência de E-mail: anamacoliver@hotmail.com vidades conscientes. relação com o mundo exterior e Reforçando a importância da com ela mesma. Crianças que É importante olhar para a nos- maternagem, Winnicott afirma que brincam evoluem do campo do sa criança e buscar compreendê- uma mãe deverá ser suficiente- concreto para o do simbólico, e la melhor no seu desenvolvimen- mente boa, isto é, a mãe completa as que não vivem esse imaginário to total e na sua individualidade, seu filho no primeiro instante e, sofrerão conseqüências em seu num contexto social. aos poucos, deixa o filho formar desenvolvimento educacional nos O modelo que a criança cons- sua personalidade e fecunda o sentidos afetivo e cognitivo. trói de si mesma reflete a imagem campo cognitivo que é, no fundo, Winnicott coloca que o brincar que é comunicada não só pela for- um mecanismo de defesa contra o ajuda-nos a definir e a redefinir os ma como a tratam, mas também sofrimento desse vazio que a mãe limites entre nós e os outros, au- pelo que cada um diz sobre ela. Para vai deixando. xilia-nos na obtenção de um sen- Bowlby, esse modelo então gover- De acordo com esse ponto de so de nossa própria identidade na o que ela sente em relação a cada vista, o processo educacional ini- pessoal e corporal. O brincar ofe- um dos pais, em relação a ela mes- cia-se muito antes da entrada na es- rece uma base de tentativas para ma, à forma como planeja seu pró- cola. Cordié diz que a criancinha seguirmos avante e estimula a sa- prio comportamento. Esse mode- ouve bem cedo a demanda que lhe tisfação dos impulsos.Por meio lo também governa os medos, as- é feita: ela deve aprender, ela deve do brincar e das gratificações sim como o desejo expresso em ser bem sucedida. Desde a Educa- afetivas que acompanham essa ati- suas fantasias. ção Infantil, alguns pais se inquie- tude, a criança dá vazão à vontade No vínculo familiar, a mãe é a tam com os desempenhos intelec- de descobrir. figura mais marcante e as primei- tuais de seus filhos e com suas pos- Assim sendo, pais e professores ras relações serão sempre impor- sibilidades de sucesso; querem, às podem constituir-se em modelos tantes para o desenvolvimento de vezes, pular o último ano desse eficazes para encorajar a atividade um sentimento básico de con- período, pois um ano de avanço é lúdica entre as crianças, sobretudo fiança. A criança, então, no futu- sempre útil para a preparação para na Educação Infantil. Piaget, tam- ro poderá lidar melhor com as os concursos mais tarde e o suces- bém, ficaria muito agradecido. frustrações que a vida e a escola so neles. A criança percebe muito lhe impuserem, e também com bem que ela tem de responder a A escola e a criança seu professor. uma expectativa. O sucesso é exa- Certas crianças estabelecem Na fase inicial do desenvolvi- tamente esse objeto de satisfação um sentimento de agressão ao mento, a criança e a mãe são quase que ela deve proporcionar aos pais. professor e à escola, inibindo, que um conjunto único e em Boas notas, bons currículos são muitas vezes, a aprendizagem. sintonia, formado pelas necessida- destinados a dar prazer. Ela pode Esse sentimento originariamente des do bebê e a disponibilidade da responder docilmente a essa de- é destinado às figuras parentais mãe para atendê-lo, olhá-lo. Aos manda durante um certo tempo, (aos pais que elas têm represen- poucos, esta unidade vai adquirin- mas, cedo ou tarde, sozinha diante tados dentro de si), porque elas do outra forma, caminhando para da folha branca ou da tarefa a de- têm medo de ir à escola ou fra- uma relação simbiótica dentro de sempenhar, ela será confrontada cassar. Quando a criança pode per- um processo de separação e indi- com o seu próprio desejo. Pode ceber que seus ataques ao profes- viduação, como explica Mahler. começar aí uma antipatia com a sor e à escola são provenientes de Nesse processo, a estrutura aprendizagem escolar. sua inveja, pelas diferenças e pela psíquica vai-se organizando na sua dependência do adulto, e que medida em que experiências po- O brincar é importante este adulto é o mesmo que ela sitivas ou negativas, boas ou más A capacidade de fantasiar que odeia e de quem ao mesmo tempo são retidas em sua memória e, as- o brincar permite oportuniza à recebe proteção, passa a suportar sim, serão estabelecidas as fun- criança viver situações afetivas, a dor, a diminuir seus ataques e a incorporar o bom que o outro tem na harmonia desejável entre o neira pessoal, particular de lidar dentro de si e que ela também ago- afetivo, o cognitivo e o psico- com a realidade. Essa maneira re- ra pode assimilar e desenvolver motor, o controle interno neces- presenta uma reedição da história em si mesma. Klein ainda diz que sário para o desenvolvimento des- de suas relações passadas. o impulso de a criança aprender a sas atividades poderá causar eleva- Penso que a prática de sala de respeito do mundo, expressar do nível de tensão e de frustração, aula possa dar espaço (por exem- energia e esforçar-se por alcan- com o conseqüente desinteresse plo, por meio do brincar) para a çar algo deriva dos contatos que pelo aprendizado. É importante que revelação dessas dificuldades que ela experiencia com o corpo da a prática pedagógica leve em con- a criança suporta. Assim, poderá mãe e da proximidade e seguran- ta a capacidade da criança de tole- haver um equilíbrio na organiza- ça do seu seio, bem como das ex- rar frustração que pode estar liga- ção das atividades, para que elas plorações que faz desse seio e, da a uma fragilidade do seu ego, da possam ser pensadas e desenvol- posteriormente, de seu rosto e de sua auto-imagem e do seu nível de vidas com vistas, inclusive, a sa- seus cabelos. Se a mãe tem con- expectativa. nar carências (desamor, desconhe- sideração por essas explorações Enfim, as diferentes fases do cimento do processo evolutivo da e reage de modo apropriado, o processo de aprendizagem, em criança,...) que dificultam, não bebê pode expressar sua energia consonância com o desenvolvi- raro, o aprender e o querer saber. por maneiras que não lhe são as- mento cognitivo, são interdepen- sustadoras. Essa energia básica é dentes do processo de evolução REFERÊNCIAS a libido, pulsão a conquistar, a simbólica que, por sua vez, recebe BOWLBY, J. Uma Base Segura : Aplicações atingir e a dotar um objeto de um influências das atividades Clínicas da Teoria do Apego. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. senso de bondade e satisfação que, pulsionais agressivas e amorosas, FERNÁNDEZ, Alicia. A Inteligência Aprisio- posteriormente, forma a base da na forma de fantasias inconscien- nada. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. autoconfiança. tes e conscientes, que se estabele- FREUD, S. Três Ensaios da Sexualidade. s.l.: Quando a criança volta sua li- cem nos primeiros vínculos s.n., 1905. bido (seu interesse afetivo) para afetivos – as primeiras gratifica- GROLNICK, S. W. O Trabalho e o Brinquedo: o conhecimento e para a escola, ções e frustrações, os sentimen- uma Leitura Introdutória. Porto Alegre: Artes este direcionamento dá a ela a tos de si mesma e a confiança bá- Médicas, 1993. possibilidade de controlar suas sica. MAHLER, Margaret. O Nascimento Psicoló- ansiedades, de encontrar novas A escola, o ensinar e o apren- gico da Criança: Simbiose e Identificação. Por- to Alegre: Artes Médicas, 1993. formas de prazer... der são altamente significativos e MRECH, Leny. Psicanálise e Educação: No- O aprendizado da leitura ou da estão a serviço de várias transfe- vos Operadores de Leitura. São Paulo: Pioneira, escrita exige a integração de vários rências de conteúdos que estão no 1999. aspectos (perceptivos, motores, da inconsciente. E, quando a criança PIONTELLI, Alessandra. Do Feto à Criança: compreensão, comparação, sele- se depara com as primeiras expe- um Estudo Observacional e Psicanalítico. São Pau- lo: Imago, 1995. ção) que implicam certa maturação riências de aprendizagem escolar, egóica. Caso haja uma defasagem revive, repete e expressa sua ma- WEINNINGER, Otto. Melanie Klein: da Teo- ria à Realidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.