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Resumo: Este artigo visa mostrar a importância dos arranjos e adaptações voltados
para grupos de formação, tendo em vista que os grupos iniciantes precisam de
cuidado especial na escolha e execução de repertório. Através de pesquisa na área e
entrevista com professores e regentes de alguns grupos de formação, é possível
constatar a escassez de material voltado para o público iniciante, e é muito difícil
encontrar um site, um canal ou um portal nacional que possa disponibilizar esse
material de forma gratuita, logo, percebemos a necessidade da produção de arranjos
e a criação de um site para essa finalidade. Com isso, este trabalho se propõe a
construir um site que vai ajudar a suprir a demanda do mercado editorial nacional,
deixando disponível um pequeno acervo com arranjos e composições de vários
arranjadores e compositores voltados para as orquestras e grupos sociais. O site
chama-se APOS e todos os arranjos fornecidos nele seguem os parâmetros técnicos
de nivelamento estabelecidos pelo SINOS (Sistema Nacional de Orquestras Sociais)
através da parceria com a FUNARTE (Fundação Nacional de Artes) e a UFRJ
(Universidade Federal do Rio de Janeiro).
1 Introdução
Com isso em mente, passei a desenvolver arranjos que pudessem suprir essa
demanda, o que me despertou o interesse em contribuir para que essa lacuna,
gradativamente, seja preenchida com material devidamente preparado em observância
às recomendações quanto aos níveis técnicos de dificuldade. Através de entrevista com
professores e regentes de grupos de formação localizados na cidade e no Estado do Rio
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https://aporquestrassociais.wixsite.com/apos
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A escola é um espaço que todo cidadão tem para acessar a educação de forma
democrática; entretanto, existem instituições que atuam como entidades “não formais”
ou “não escolares” que, de forma direta ou indireta, oferecem acesso à educação: são os
Projetos Sociais. Todo projeto social, com seus princípios, possui papel fundamental na
sociedade, ao funcionarem como suporte extraclasse para a educação. Para Santos,
Vale ressaltar que a intenção principal da maioria dos projetos sociais não é,
prioritariamente, formar músicos, mas para além disso, atuar como ferramenta de
socialização e educação geral.
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José Antônio Abreu foi maestro, pianista, economista, educador, ativista e político venezuelano, mais
conhecido por criar o modelo de educação musical El Sistema.
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grandes cidades venezuelanas. Segundo Katarina Grubisic, este projeto tinha como
premissa
Muitas outras iniciativas tiveram início na mesma década de 1970, apesar de não
estarem relacionadas ou muito menos trocarem experiências pedagógicas. Na época não
se utilizava a nomenclatura de projetos sociais para as ações com tais objetivos, mas em
suma era exatamente como os atuais projetos, tendo o ensino de música com ênfase na
formação de orquestras. O que foi possível observar foi o surgimento de muitas
iniciativas na América do Sul em se promover a educação musical através do ensino
coletivo, com objetivo de desenvolver aspectos educativos e sociais em jovens e
contribuir para a formação das orquestras sociais. O modelo pedagógico copiado foi em
boa parte o utilizado nos Estados Unidos, país que já tinha vivenciado décadas de
desenvolvimento do ensino coletivo em salas de aulas, e inclusive com a produção de
metodologias específicas e funcionais.
No Brasil, uma iniciativa exitosa ocorreu em 1975, pelas mãos de Alberto Jaffé 3,
e que posteriormente foi a base para o desenvolvimento do Projeto Espiral, um dos
principais projetos com ênfase no ensino coletivo e na formação de orquestras.
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Alberto Jaffé foi violinista, professor e incentivador da implementação do ensino coletivo de cordas no
Brasil. Inicialmente o modelo criado pelo professor Jaffé foi implementado no Centro de Formação de
Instrumentistas do SESI, logo depois o mesmo modelo foi adotado pelo Projeto Espiral.
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Em 2012, a então publicação VivaMúsica4 lançou seu anuário com uma matéria
especial, denominada “Cidadania Sinfônica”, dedicada aos projetos sociais. Foi
realizada uma “detalhada amostragem com doze projetos sociais do Brasil, e um
mapeamento nacional que reuniu dados de noventa e dois projetos sociais, que tinha no
ensino de instrumentos musicais sinfônicos sua base de desenvolvimento musical”
(VIVAMÚSICA, 2012). Atualmente no Brasil, o ensino coletivo da música através da
formação orquestral é cada vez mais presente nos projetos sociais e, consequentemente,
a formação de orquestras está em amplo crescimento. Inúmeros projetos sociais utilizam
e valorizam a educação musical através da formação orquestral, o que mostra o quão
importante é a música como ferramenta de inserção social.
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VivaMúsica! foi uma empresa de comunicação com a missão de despertar e nutrir o interesse por
música clássica no Brasil. Desenvolveu projetos editoriais nas mídias impressa, eletrônica, digital e
social, utilizando canais próprios ou em parcerias. Foi fundada pela jornalista Heloisa Fischer em 1994 e
funcionou até o ano de 2015.
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[...] é forte a influência que o regente exerce sobre a motivação dos músicos.
Além disso, mostra que a didática do regente, sua dinâmica de ensaio, as
ideias que transmite, a relação que mantém com os músicos, as opiniões, o
estilo de conduta e seu conhecimento técnico e musical interferem muito
sobre o desenvolvimento técnico e musical dos estudantes e sobre a
motivação dos músicos profissionais. (PORFIRIO; FIORINI, 2016, p. 6).
Devido ao elevado número de grupos musicais que vêm sendo formados pelos
projetos sociais, o regente cada vez mais se depara com muitos desafios do ponto de
vista pedagógico. Talvez um dos maiores desafios encontrados pelos regentes-
educadores seja a escolha de repertório. No cenário editorial internacional é possível
adquirir obras e arranjos com nivelamento, porém quando se trata de repertório nacional
é difícil encontrar, o que torna inviável a inclusão de material nacional para esse
público.
Eles trabalham com arranjos e adaptações que facilitam a execução, mas sem
ter procedimentos pedagógicos e metodológicos graduais para os naipes, o
que faz com que a técnica e o repertório fiquem limitados, provocando
ausência de perspectivas de novos desafios nos participantes. Essas ações
estão coerentes com a proposta dos programas desses projetos, que não é
formar músicos, e sim criar oportunidades de evolução pessoal, inclusão
social e cultural, mas se organizassem as ações técnicas e de repertório de
forma progressiva, os resultados poderiam ser melhores e mais completos.
(BUENO, 2016, p.36 e 37).
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O Guia, lançado em 2008, reuniu informações específicas para o melhor trabalho do regente de banda.
Em quatro artigos, abordou a questão histórica, o processo de análise de uma obra, a tabela de parâmetros
técnicos para banda de música e a como se construir um arranjo musical para banda.
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TPTC: Tabela de Parâmetros Técnicos para Cordas
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https://sinos.art.br/repertorio-sinos/
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precisa ser observado é o ponto de convergência desde a iniciação dos alunos em seus
instrumentos. O início do aprendizado com cordas se dá a partir das tonalidades de lá
maior e ré maior, sendo que com os sopros ocorre a partir dos tons com bemóis, mi
bemol e si bemol. Sendo assim, o que é bem simples e orgânico no início para cordas,
pode ser extremamente difícil para sopros.
Lógico que o arranjador que escreve um arranjo pode observar o nível de cada
aluno e escrever o que cada um pode tocar e o arranjo servir como um material
pedagógico valiosíssimo. É possível incluir os sopros em alguns trechos do arranjo, com
suporte para as linhas melódicas ou apoio nas marcações rítmicas ou condução
harmônica. E isto pode ser mesmo a partir do nível 1, desde que o arranjador
personalize seu trabalho para o grupo a que se destina. Entretanto, o que discuto aqui é a
preparação de um material pedagógico genérico, que pode atender a grupos de forma
precisa e eficaz, com possibilidade que se ajustam melhor às realidades de cada projeto
social. De forma geral, a junção dos instrumentos de sopros com as cordas se torna mais
fluida e funcional a partir dos níveis 2 ou 2,5.
O site "APOS - Arranjos para Orquestras Sociais” tem por objetivo contribuir
diretamente para o surgimento de novos repertórios direcionados para orquestras e
grupos iniciantes, de forma a ajudar no desenvolvimento do trabalho das orquestras de
formação e oferecer um canal de distribuição para que arranjadores e compositores que
tenham os mesmos interesses sociais, possam fornecer seus arranjos e composições
gratuitamente. Está hospedado na plataforma do WIX, no plano gratuito, através do
endereço https://aporquestrassociais.wixsite.com/apos e já conta com arranjos
disponíveis, os quais podem ser baixados sem custo algum para o usuário. É solicitado,
no entanto, que seja feito o cadastro e login, para controle de acesso e mailing.
Como esta pesquisa direciona a uma atividade sem fins lucrativos, e com
objetivo tão somente de somar forças para potencializar e democratizar o acesso ao
repertório preparado com base no nível técnico de dificuldade, foi criado um fluxo
simples para os arranjadores e compositores que tenham interesse em contribuir com
arranjos e composições para a pesquisa e disponibilização no site. O interessado precisa
se cadastrar e preencher o formulário online, e anexar o termo de autorização de uso da
obra, e do registro sonoro e audiovisual, igualmente disponível. Foi também criado o e-
mail apos.repertorio@gmail.com para de igual forma ser um canal de comunicação com
os arranjadores e compositores.
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Todas as informações desse artigo são tratadas no site, sendo que o próprio texto
pode ser lido diretamente, sem a necessidade de se baixar o PDF. A TPTC também pode
ser baixada, bem como outros artigos e material correlatos, para melhor informação ao
usuário e apoio ao arranjador e compositor.
Outro ponto que precisa ser observado com cuidado diz respeito às adaptações
dos arranjos para a realidade brasileira, a exemplo do uso das sincopas, encontradas na
estrutura básica de boa parte dos gêneros de nossa popular como o choro, o samba, o
baião e o maracatu. Na estrutura definida como parâmetros técnicos, se considerar essa
figuração rítmica dentro dos parâmetros norte-americanos, um determinado arranjo que
tenha sincopa e sua escrita estaria classificado entre os níveis 3 e 4. No Brasil, o mesmo
arranjo poderia ser considerado com a classificação 2 ou 3, levando-se em consideração
a indissociável presença desta figuração rítmica em nossa cultura, nas danças e nos
cantos. A percussão ainda pode apresentar função de auxílio na construção rítmica das
obras e ser incluída desde os primeiros níveis, mas importante que seja escrita
corretamente na grafia tradicional, de maneira a inserir e relacionar o instrumento de
percussão ao estilo e apresentar toda a ideia musical, mesmo que os alunos ainda não
tenham domínio de leitura. A seguir, vamos acompanhar como pode se dar a construção
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utilizados na versão original entraram em desuso e, apesar das partes serem transpostas
no cotidiano das orquestras profissionais, o procedimento não é viável para as
iniciantes. A seguir, podemos observar no original, a letra H de ensaio, até o quinto
compasso, na tonalidade de mi maior e com os detalhes do tema cantabile e o
acompanhamento em pizzicato com os violinos e viola. A dificuldade para um grupo de
formação é grande aqui e as decisões precisam estar embasadas na análise técnica do
trecho (fig. 4).
Figura 6: Trecho original da seção das cordas, final da obra “O Guarany”, editoração: André Schwartz.
Fonte: www.musicabrasilis.org.br
Exemplo 7: Mesmo trecho final da obra “O Guarany”, seção das cordas. Fonte: Editoração própria.
Considerações finais
continuada, para que possamos refinar os parâmetros técnicos que temos por referência
para a definição de dificuldade de um determinado arranjo ou obra original.
Referências
GUEST, I. Arranjo: método prático. Rio de Janeiro: Lumiar Editora, 1996. vol. I, II e
III.
SANTOS, Cláudia Elisiane Ferreira dos. Os princípios compositivos cante e dance com
a gente aplicados a arranjos musicais escolares – Tese (doutorado) – UFBA -
Salvador, 2018.