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Vitória Mendes - Jogo Com Benefícios
Vitória Mendes - Jogo Com Benefícios
CAPA:
Ellen Ferreira
DIAGRAMAÇÃO:
Vitória Mendes
LEITURA CRÍTICA:
Ana Paula Ferreira
REVISÃO:
Camille Gomes
Amanda Mont’Alverne
ILUSTRAÇÕES:
Rhoops
HDT Arts
— O quê?
— O quê?
Zach surpreende Charlotte e eu ao pedir o número dela. Se
eu disse o que disse, obviamente foi para deixa-la constrangida e
me vingar por ela ter transferido toda a merda de cachorro para
mim.
— Você está falando sério? — pergunto a meu parceiro de
time.
Zach anui e as três garotas da fraternidade que ainda
observam a cena do gramado, soltam um gemidinho.
Olho para Charlotte e um sorriso brilhante toma conta da sua
boca enquanto as bochechas avantajadas estão vermelhas, os
olhos azuis se iluminam quando ela coça a garganta digita o número
dela no celular de Zach.
O trio de garotas riem enquanto me olham, fúria esvaindo por
toda a minha pele.
— Vocês três não cansam de ser fofoqueiras? — resmungo
olhando para elas.
Elas riem ainda mais, contudo cobrem os sorrisos com as
mãos.
— Aqui está. — Charlotte entrega o celular a Zach, que
confere o número.
— Tudo bem, então, eu te ligo — ele diz, guardando o
aparelho no bolso.
— Para falar a verdade, eu tomei a liberdade de dar um toque
para meu número — ela assume e dessa vez as bochechas de Zach
que ficam vermelhas.
— Atrevida — murmuro baixinho, para que ninguém escute.
— Falou algo, Harrison? — Zach me pergunta e eu nego com
a cabeça. — Tudo bem, então, eu vou indo, você não vem?
— Vou me limpar primeiro. — Aponto para meu abdômen e
ele concorda antes de soltar uma risadinha.
As três colegas de fraternidade de Charlotte disparam no riso
no momento em que Zach vira a esquina.
Solto uma bufada de ar.
Eu as odeio, eu odeio muito elas, só não as odeio tanto
quanto odeio Charlotte, que caminha saltitante para dentro da cerca
branca.
— A merda é de cachorro, mas parece que quem está com
constipação é você, Harrison — Shantal observa em meio ao riso.
Ela só podia ser a melhor amiga de Charlotte para ter as
mesmas piadinhas que ela.
— Posso me limpar, garotas? — peço em uma falsa simpatia,
apontando para a mangueira de água na grama logo atrás delas.
As três anuem e eu caminho em passos duros em direção ao
jardim da Kappa Alpha, contudo quando chego de frente a cerca
branca, a portinha é fechada por Charlotte.
— Um litro de água equivale a um dólar. — Pisca duas vezes,
como se fosse um anjo.
Dou um passo para o lado e me apoio na cerca, pulando-a.
— E cada palavra que eu sou obrigado a ouvir quando sai da
sua boca é um segundo a menos de vida que tenho. — Pego a
mangueira e aciono a alavanca para sair água. — Portanto
considere pago.
Assisto Charlotte revirar os olhos azuis antes de me
concentrar em meu abdômen e passar a mão por ele, limpando a
merda restante. As duas loiras, Anna e Dakota, suspiram, levanto os
olhos minimamente e as assisto sob os cílios, morderem o lábio
inferior ao mesmo tempo.
Uma risada rouca escapa da garganta e volto a me
concentrar na minha barriga.
Quando termino de me limpar, tendo tomado praticamente
um banho após ter molhado a minha calça e tênis de corrida
enquanto me limpava, agradeço as garotas que saem antes de mim
quando Charlotte abre a portinha da cerca para elas.
Ao chegar a minha vez, que estou logo atrás das três, Charlie
fecha a portinha e me fita:
— Antes de você ir embora gostaria apenas de te informar
que o inverno está chegando. — Ela abre o portão.
Estreito os olhos e franzo o cenho, a fitando sem entender o
que ela acabou de falar.
— Game Of Thrones já acabou — informo ao passar por ela.
— Quis dizer que o nosso trato acabou, Harrison.
Charlotte dá as costas para mim e começa a caminhar rumo
à entrada da fraternidade.
— O que você quer dizer com isso? — pergunto preocupado,
pois sei bem que quando Charlotte quer aprontar alguma comigo,
ela apenas me lança um sorriso debochada ou dá as costas.
Ou pior de tudo, me olha com escárnio, pende os ombros e
depois os desce, antes de acenar com a mão.
Mas dessa vez, Charlie vai um pouco mais longe ao se virar
quando chega na escadinha de quatro degraus, afiar os olhos em
minha direção e dizer da forma mais angelical possível:
— Uma rajada de vento pode ser congelante para quem está
acostumado com o calor.
Um arrepio súbito percorre por toda a minha coluna, minha
boca seca e meus olhos se fecham com força quando sinto uma
fraqueza momentânea devido as palavras dela, porém endireito
minha postura e assisto ela dar as costas mais uma vez e adentrar a
mansão.
Mais algumas garotas saem e acenam para mim, contudo,
faço o mesmo que Charlotte e me viro, não dando a mínima atenção
para elas.
Pois se Charlotte acaba de quebrar o nosso único acordo,
significa que os jogos irão começar e nenhum de nós dois sairá ileso
deles.
Shantal:
Vc não sabe
Qm
Acabou
De
Perguntar
Por vc
Shantal:
Z
A
C
H
BUNDA FODIDAMENTE LINDA
L
E
W
I
S
Charlie:
Nem fodendo!
Shantal:
Aham
Aham
Ele ficou triste
Quando eu disse
Que vc
Não vinha
Charlie:
Ele tem meu número há quatro dias e não me mandou uma mensagem durante
todo esse tempo, e agora quer saber de mim durante uma festa?
Shantal:
Dá um tempo
Pra ele
Um dia depois
Ele teve jogo
E ainda levou
Todos os gols
De Princeton
Charlie:
Vc está do meu lado ou do dele?
Shantal:
Do seu
Sempre
Mas bem
Que vc
Poderia
Vir dar
Uns
Beijos
Nele
Ele tá gato
Shantal:
Quer dizer
Vc pode
Pular
O beijo
Também
Shantal:
CHARLOTTE!
LEVANTA
DA CAMA
E
PARA DE PENSAR
SE VAI OU NÃO
BEIJAR ELE
SE NÃO QUISER
É SÓ NÃO BEIJAR
Faço o que ela manda, mas não sem antes girar a cabeça
por todo o quarto apenas para ter a certeza de que ela não instalou
nenhuma câmera escondida no cômodo, e está vigiando
exatamente o que estou fazendo.
Charlie:
Parei!
De pensar e roer a unha.
Shantal:
Ótimo
Agora veste
Uma roupa
E vem
Embora
Charlie:
E se ele quiser me beijar?
Shantal:
Vc vira
A cabeça
Assim
Como virou
Pro Daniel
Quando ele
Tentou
A primeira vez
Charlie:
Escreve tudo de uma vez, está me deixando ansiosa!
Shantal:
*dedo do meio*
Só vem logo
Por
Favor
E não coloca um sutiã
Charlie:
Pq não?
Shantal:
Pq assim tem mais chances de ele olhar para seus peitos e não para a boca
Charlie:
Isso vc escreve completo, né?
Shantal:
Vem
Logo!
RÁPIDO
Essa matéria também
Não vai entrar
Na sua cabeça
Da noite
Para o dia
Charlie:
Se vc parar de mandar mensagem pausada, quem sabe eu consiga me arrumar em
paz!!!!
Shantal:
Isso significa
Que você
Vem
?
Charlie:
Sim, eu vou
Mas para de mandar mensagens assim
Zach:
Então, posso te pegar uma bebida?
Charlie:
Claro que sim
*carinha piscando*
Rachel:
Se você ainda estiver com o Alexander
Para agora
Sério Morgan, só para!
Ele tem gonorreia!
MORGAN!
Fazem quatro dias que eu não saio do quarto para mais nada
que não seja comer e ir para pista de gelo, onde tenho torrado todo
o meu salário do mês. Tenho feito isso como tentativa de não cruzar
com Alexander.
No final das contas, parece que ele não me fodeu tanto,
quando Chad ligou no dia seguinte para confirmar que iria me
acompanhar até o final do campeonato e mesmo que eu não
ganhasse nenhuma medalha, eu estaria nas competições
importantes, e isso seria apenas um teste antes de assinarmos o
contrato oficial.
Esse foi o ponto alto do meu final de ano, com certeza.
Sei que ele chegou a conversar com Alexander também, não
fiz questão de saber o conteúdo da conversa, mas aparentemente
foi boa, pois quando eu havia ido a cozinha estavam todos
comemorando, o que eu fingi que não estava vendo, pois tenho
evitado até olhar para ele, embora estejamos na mesma casa por
mais dois dias.
Tudo que eu quero é ir embora de uma vez, chegar em
Hanover, seguir meu cronograma de treino, me preparar para a
próxima fase e mesmo que seja impossível, evitá-lo quando
fazemos exatamente todas as aulas juntos, com certeza será mais
fácil do que estar na mesma casa tendo que ouvir a voz dele quase
que vinte e quatro hora por dia.
Apesar de termos vindo para Miami para visitarmos a cidade
e sair do frio de Connecticut e redondezas, eu me esquivei de todo e
qualquer passeio em família, ou melhor dizendo “família”, dizendo
que estava cansada demais, ou com dor de cabeça.
Pode parecer bobo, mas apenas não consigo encará-lo
depois do beijo.
Mesmo que não tenha significado nada para ele, também não
deveria ter significado nada para mim. Acontece que meio que se
tornou um pesadelo e virou uma chave em mim que até o momento
não havia virado com qualquer outro.
Pois se eu conseguir corresponder, embora que por poucos
segundos, o beijo da pessoa que eu menos suporto nessa vida,
porque eu não conseguiria corresponder de um cara que eu esteja a
fim? Como o Zach, por exemplo? Que parece estar se esforçando
para conseguir esse feito.
Zach:
*foto anexada*
Ainda acho que você deveria ter passado o ano novo com a gente.
Charlie:
Acredite em mim, se eu pudesse, teria pego o primeiro voo da manhã.
Olho outra vez para a foto que Zach mandou, ele está ao lado
de James, Bellamy, Anna e Dakota, todos estão em uma festa na
fraternidade onde eu vivo. Muitos não viajam durante as festas de
fim de ano, alguns passam apenas o natal com as famílias.
Eu deveria ter feito isso, passar o natal e partido. O que tentei
essa manhã, mas minha mãe foi contra no mesmo segundo em que
comentei. Eu poderia ter ido mesmo assim, contudo, acredito que o
clima entre todos já está pesado demais, e eu não queria piorar
ainda mais as coisas.
Uma resposta de Zach surge no mesmo momento em que
duas batidinhas soam do lado de fora da porta.
— Sou eu, Charlie — Maggie informa.
Largo o celular em cima da cama, mas antes confiro a hora,
faltam vinte minutos para meia noite.
— Uau! — Maggie exclama em um assobio quando abro a
porta. — Você está linda — ela constata.
E no instante em que vejo sua mão fina vir até meu rosto, eu
desvio. Definitivamente entrei em uma crise nos últimos dias e tenho
rejeitado o contato de todos, o toque de Alexander mexeu comigo a
esse ponto.
— Você não vai descer? — ela pergunta, ignorado a minha
reação ao seu quase toque.
— Estou bem aqui — afirmo ao largar a maçaneta da porta e
sentar-me na cama outra vez.
— Posso?
Ela aponta para dentro do quarto, na intenção de entrar e eu
assinalo. Maggie se demora um pouco para vir até mim, em passos
cuidados, ela se senta na outra ponta da cama e cruza as pernas,
sentando-se em cima delas. Ela sorri, toda amorosa, e eu retribuo o
gesto.
— Você lembra que quando era pequena, sempre eu era a
primeira a saber quando você estava passando por algum
problema? — ela pergunta de forma retórica, eu concordo, deixando
que ela continue a falar. — Quando você pensava que estava
encrencada, era então que você corria, porque você sempre disse
que apenas eu iria conseguir acalmar a sua mãe quando ela se
estressasse.
Sinto um sorriso terno puxar em meus lábios, ao engolir em
seco.
— Deve ser porque entre vocês duas, ela é o furacão e você
a calmaria — reflito.
Maggie ri.
— Acho que foi isso que nos uniu durante toda essa vida, o
fato de sermos exatamente o oposto uma da outra, fez com que nós
duas enxergássemos que na realidade, somos igual uma moeda.
Apesar das faces opostas, somos feitas do mesmo material — ela
diz, e eu concordo mais uma vez. — Você sabia que nós duas já
chegamos a nos odiar?
Um vinco se forma no meio da minha testa.
— Uma grande mentira — digo.
Maggie ri outra vez e nega.
— Nós nunca contamos a você e ao Alex, mas nós brigamos
durante o tempo em estávamos grávidas. Não lembro exatamente o
motivo da briga, mas há quem diga que foi por conta dos hormônios
mesmo, pois simplesmente um dia acordamos e não conseguíamos
olhar uma na cara da outra sem brigar. E mesmo a odiando, eu não
conseguia largá-la, e ela da mesma forma.
— Talvez isso explique muita coisa — digo ao analisar e
imediatamente Maggie concorda, sabendo bem sobre o que estou
falando.
— Isso com certeza explica muita coisa — ela afirma. — Mas
não estou aqui para te dar um resumo sobre sua mãe e eu. Apenas
queria saber se aquela Charlie, que sempre corria para mim quando
estava encrencada, está precisando de algo. — Ela me fita, cheia de
ternura.
Se minha mãe não fosse minha mãe, eu, com certeza,
amaria ter Maggie como mãe. E no final de tudo, ela também é
minha mãe, e a amo na mesma proporção.
— Não — minto.
Ela deixa o cenho dela franzir, da mesma forma como o filho
faz quando está desconfiado de algo. Apesar dos dois não
parecerem em nada fisicamente, os gestos e expressões deixam
claro como eles dois são parentes de primeiro grau.
— Nem sobre uma tal briga, e depois de um tal beijo para
você calar a boca? — Ela simplesmente joga.
— Ele te disse, hum?! — Suspiro, frustrada.
Ela nega ao balançar a cabeça.
— Para falar a verdade ele disse a sua mãe, pois assim como
você sempre fez comigo, o Alexander sempre correu até a Alice. —
Sorri em uma linha fina. — E Alice, sabendo que você não diria
nada a ela, me pediu para colher alguma coisa. Nós sabemos o
quanto esses gestos são importantes para você, Charlie, e o que o
Alex fez foi errado, e embora eu não esteja passando a mão na
cabeça do meu filho, ele apenas queria se explicar e no calor da
emoção aquilo aconteceu.
Se não tivesse um espelho logo atrás de Maggie onde eu
consigo ver o meu reflexo direitinho, talvez eu não estivesse
controlando minha cara de tédio, que mesmo usando todos os mais
esforços para não a usar, ela ainda aparece um pouco.
— O que ele fez comigo seria a mesma coisa se eu empurrar
ele em um elevador em um prédio de vinte andares e deixar ele se
virar, enquanto desce todos aqueles andares — me defendo.
— Eu sei — ela concorda de imediato.
— E eu o ouvi falando de mim, então é óbvio que eu iria ficar
com raiva dele.
— Eu sei.
— Se eu falasse por uma hora inteira, ainda não seria
justificava ele me calar daquela forma, antes ele desse um murro no
olho.
Maggie pausa, estreitando os olhos ao me encarar. Se eu
pudesse ouvir seus pensamentos, tenho certeza que ela está
pensando que eu sou doida.
— Eu sei?! — ela responde com dúvida.
— Ele me odeia, e isso não justifica ele dizer o que disse, ou
fazer o que fez.
— Eu sei. Mas sabe outra coisa que eu também sei? — ela
pergunta e deixo que continue. — O Alex não te odeia, Charlie. Ele
pode dizer isso, mas a forma como te olha desde que vocês eram
crianças, só existe admiração e proteção. Portanto, eu sei que ele
jamais iria falar mal de você assim, em um momento tão importante
como aquele.
— Se ele me olha com proteção, eu não quero imaginar
como ele olha para quem ele realmente odeia — digo de prontidão,
ignorando o restante dos comentários.
Maggie dá de ombros.
— Talvez você não acredite em mim agora, mas um dia você
vai — ela afirma.
Volto a fazer uma careta.
— Tive uma vida inteira para isso, não acha que é tarde
demais para que eu, de repente, acredite que Alex se importa
minimamente comigo?
— Por que quando nós somos jovens, somos tão ingênuos e
burros? — ela inquere, mas sem resposta. — Quando eu tinha a
idade de vocês, era ignorante desse jeitinho.
— Eu não sou ignorante. — Faço uma careta, ao franzir o
nariz. — Nem muito menos burra, ou ingênua. Se tem algo que
realmente não sou é ingênua.
— Uhum — ela concorda, irônica.
— Não sou — digo com a voz aguda demais.
— Estou apenas concordando com você, meu amor — ela diz
em um sorriso.
Reviro os olhos quando ela passa mais tempo me encarando.
Maggie abre os braços, em um pedido silencioso para que a abrace
e eu me aproximo dela aos poucos, meus braços circulam sua
cintura enquanto ela começa a passar as mãos entre os fios dos
meus cabelos.
— Mesmo com vinte anos você ainda é muito jovem para
entender a vida por inteiro, Charlie. Eu, que estou quase chegando
nos cinquenta, ainda não sei nada sobre a minha, dirá você que é
tão nova assim e se deixou passar por tanta coisa quando você não
era a culpada pelo que te causaram. Você pode ser forte, Charlie,
mas você ainda vai conhecer muito sobre a vida e o amor.
As palavras de Marjorie me pegam desprevenidas, e eu me
aconchego nela. Eu não abraço muito, eu não dou muito carinho,
nem recebo tanto assim, justamente por isso, mas quando
acontece, eu me entrego. E o que ela me diz me pegam ao ponto de
que eu tenho a enorme vontade de permanecer agarrada assim.
Me pergunto se eu fosse uma pessoa normal, se eu não
tivesse ficado tão traumatizada com o abandono, com o medo de
receber amor e simplesmente um dia ele ir embora, se haveria algo
de diferente na minha vida.
Se eu ainda estaria com o único namorado que tive, ou se
ficaria com todo cara que visse pela frente. Talvez eu pudesse ter
mais amigos também, e quem sabe até mesmo ter um par na
patinação, mas a verdade é que eu nunca me imaginei assim, com
alguém, tanto na vida, quanto na patinação.
Duas batidinhas da porta que ficou aberta, me faz desgrudar
de Maggie. Tiro meu cabelo do rosto no mesmo momento em que
ela se vira para a porta, e nós duas temos a vista de Alexander
encostado na soleira da porta, com uma mão dentro do bolso da
calça.
Essa seria a primeira vez que olho diretamente em seus
olhos, que mesmo virados para mãe, sinto que de alguma forma
eles queimam a minha pele ao ponto de me faltar ar, enquanto paro
para ouvir sua voz rouca.
— Faltam dois minutos — ele avisa, a mãe balança a cabeça
e em seguida ele sai.
Ela se vira para mim, o bom e velho sorriso doce estampado
em seus lábios.
— Que tal esquecer que odeia o meu filho por cinco minutos?
— ela sugere e eu rio.
— Impossível — digo de prontidão.
— É ano novo, Charlie. Vida nova. — Estende a mão quando
se levanta.
— Ranço novo também — digo ao pegar sua mão e
acompanhá-la.
— Ou amores novos. — Ela se vira e me solta uma
piscadela.
Não consigo conter meu descontentamento com sua fala
quando minha boca franze, juntamente a todo o resto do meu rosto.
Quando for a hora, quando for a hora, quando for a hora
Não importará, não importará
Foi como se ele nunca tivesse estado lá
I WAS NEVER THERE | THE WEEKND
Zach:
Seria estranho ou cedo demais se eu admitisse que estou com saudades de
você?
Que bom que em dois dias você estará de volta
*emoji de coração*
Daniel:
Então quer dizer que, literalmente, eu não sou mais o seu último beijo? Devo
ressaltar que estou chateado com isso, afinal, esperava que fosse com o Lewis, não o
Harrison.
E falando no indivíduo, é claro que a próxima mensagem
seria de Zach.
Zach:
Podemos conversar no final do seu treino à tarde?
Charlie:
Claro! Hoje o treino deve acabar por volta das 16h.
Alex:
Quem está aí e em que posição?
Torço para que ele tenha feito o mesmo que eu e não ter
colocado a venda por completo. Passam alguns segundos para meu
celular vibrar com a resposta dele.
Bell:
Dakota, Charlotte e Evan
Alex:
Somente eles?
Bell:
Não
Alex:
E as posições?
Alex:
Nesse caso então você deve ser o décimo terceiro, quando
mais alguém entrar, vá para atrás da pessoa.
Bell:
Ok.
Torcer para dessa vez ela não rir.
Daniel:
Ela está bem?
Precisa de algo?
Alex:
Ela precisava que vc não tivesse a embebedado em primeiro lugar
E sim, ela está bem e não precisa de nada de vc, já que vc fez o suficiente
Depois que descemos após o encontro às cegas, Charlotte foi
ao encontro do Daniel e eu vi o momento em que ele ofereceu uma
bebida dela, e a partir dali ela tomou mais umas quatro doses.
Portanto sim, se ela passou mal, ele tem culpa.
Não posso esquecer de James, que também fez o drink que
ela tomou no início da noite que estava forte para um caralho, e
Zach por se aproveitar da situação em que ela estava vulnerável,
piorando tudo de uma vez só.
Sobre o encontro às cegas, eu preciso assumir que beijá-la
da forma como aconteceu, foi surpreendentemente algo fora do
normal. Contudo, eu ainda não sei se foi bom ou ruim. A única
certeza que tenho é que preciso de mais, e que aqueles dez
minutos foram poucos.
No momento em que a vi sair do quarto, totalmente confusa e
curiosa, quis agarrá-la ali mesmo e dizer “fui eu, surpresa”, mas aí
eu levaria outro tapa na cara muito provavelmente e merecido,
talvez. Então me abstive quanto a isso, embora o pensamento de
revelar passasse pela minha cabeça mais vezes enquanto ela dizia
que o meu beijo, foi melhor do que o meu beijo, se é que dá para
entender.
A vontade me veio mais uma vez e eu acabei deixando
escapar quando ela perguntou, mas é óbvio que ela não acreditou, e
aquilo foi como uma facada diretamente no meu peito, quando ela
tão rapidamente negou dizendo que não era. E eu não faço a
mínima ideia porque me senti assim, não é como se eu quisesse
provar algo para mim, é mais a necessidade de provar algo para ela.
— Você ainda está aí? — A pergunta vem quando a água é
desligada.
Talvez por isso eu ainda esteja aqui, enquanto ela permanece
no banheiro. E mesmo que eu não consiga encaixar todas as peças
do que realmente está acontecendo, ainda assim, no momento em
que ela me chama de dentro do banheiro, ao invés de ir embora, eu
respondo.
— Sim, estou aqui.
— Debaixo dos travesseiros tem uma roupa, você pode
pegar, por favor?
— Sério que você sabe falar por favor? — provoco.
— Anda logo! — Ela realmente voltou a todos os seus
sentidos.
Faço o que ela pediu após me levantar, mas me surpreendo
ao pegar a tal roupa que ela pediu. Encaro a peça em minhas mãos,
um tanto quanto perplexo, sentindo um vinco se projetar entre
minhas sobrancelhas e caminho de volta até o banheiro.
Engulo em seco, ainda chocado, e bato na porta, que
rapidamente é aberta apenas um frecha e rouba o que havia pedido
da minha mão.
Poucos minutos depois Charlotte está do lado de fora, os
cabelos presos em uma toalha no topo da cabeça, e ela veste
apenas um moletom que cobre seu corpo até o meio das coxas.
Mais especificamente, o meu moletom. A confusão ainda deve estar
explícita em meu rosto quando eu permaneço encarando-a.
— Você pode ir embora já — ela diz afiada.
— Por que você está dormindo com meu moletom? — eu
pergunto.
— Eu não estou — ela nega rápido e eu aponto para a peça
que ela veste.
— Eu conheço minhas roupas, inclusive a que você nunca
devolveu.
— E nem vou. — Ela ergue o queixo, atrevida. — É mais
confortável do que os meus, talvez seja o tamanho. Agora pode ir
embora — repete.
Maneio a cabeça para o lado, ainda avaliando a situação, que
é estranhamente satisfatório saber que ela usa algo meu e que nem
mesmo tem a intenção de devolver.
— Por que você está sorrindo?
— Eu não estou — digo, mesmo tendo a noção de que os
cantos da minha boca estão erguidos.
Ela cerra os olhos, franzindo o cenho.
— Você é tão estranho, Harrison — ela diz, me empurrando
até a porta do quarto.
— E você é selvagem — Analiso, enquanto ela
permanecesse na tentativa de me expulsar.
Mesmo sabendo que esse está longe de ser o momento
certo, eu não consigo me controlar, pois ver ela vestindo minha
roupa me instiga ao ponto de eu perder total a noção do perigo.
— Eu te mandei ir embora e se você não vai por bem, que
seja por mal, então. — Ela me empurra outra vez e eu acabo
batendo com as costas na porta.
Rio, percebendo que ela não entendeu a minha deixa.
— Por que você acha que eu estava do lado de fora quando
você saiu do encontro? — questiono, o sorriso nunca abandonando
meu rosto.
— Sei lá, porque você é um pervertido? — devolve, ao dar de
ombros. Eu nego. — Você mesmo disse que estava à espera do
Bellamy — ela conclui, perdendo a paciência, e eu sorrio mais
ainda. — Sério, o que você quer aqui ainda? — Cruza os braços
sobre o peito.
— Pense — peço. — O plano era ninguém saber com quem
estava ficando, mas você viu que não funcionou muito bem quando
o Zach saiu e pouco tempo depois a Anna... — instigo um pouco
mais.
Sua feição se fecha, ela cerra os olhos olhando de um lado
para o outro, então ela nega, soltando um risinho nasalado.
— Não foi você — conclui, mesmo que a perplexidade esteja
explícita em seu rosto. — Quer dizer, não pode ter sido você... —
hesita e eu mordo o lábio inferior, apenas deixando que ela conclua
por si só. — Eu pensei que sim quando saí, mas não faria sentido.
Eu também te perguntei e você não disse...
— Eu disse que não ia contar — interrompo. — Porque o
propósito era ninguém saber com quem estava, mas eu acabei
sabendo. — Levanto os ombros. — E se bem me lembro, eu te
disse que fui quando você me acusou de me aproveitar de você —
relembro. — E mesmo assim você não acreditou.
— Porque você está mentindo — ela responde rápido de
novo.
Para provar o meu ponto, passo a desabotoar minha camisa,
assim como estava no início da noite, então a tiro, ficando apenas
de calça. Levanto a sobrancelha e pergunto:
— Estou? — Ela se cala, olhando para os arranhões que
deixou em meu peito em pleno choque. — Se eu me recordo bem,
foi você quem fez isso.
Ela demora alguns segundos, ainda com os olhos fixos em
mim, enquanto nega com a cabeça. Até que sobe o olhar e me
encara.
— Você estava sem a venda?
— Talvez. — Dou de ombros.
— E mesmo sabendo que era eu, você continuou? — analisa,
fria e calculista.
— Talvez.
— Essa é a segunda vez que você se aproveita de mim,
Harrison.
— Não entendi. — Meu sorriso morre.
— Primeiro você me beija do nada, com a desculpa que seria
para me calar.
— Você retribuiu — falo, mas ela não se importa quando
continua.
— Então você tira a venda durante o encontro às cegas, e
vendo que era eu ao invés de se afastar, você continua.
— A venda caiu — minto. — Ou talvez eu só não goste de
seguir as regras mesmo.
Ela solta uma risada blasé.
— Sabe o que também vai cair? — pergunta, dando um
passo em minha direção, nossos olhares nunca se abandonando.
— O quê?
— Suas chances de ser pai um dia.
Não tenho tempo de me preparar quando ela levanta o joelho
e me atinge entre as pernas. Tento respirar fundo ao me curvar,
sentindo a dor fina que sobe no pé da barriga, mas não consigo
entender nem mesmo meus pensamentos nesse momento, dirá
conseguir tomar um pouco de ar decente.
— Vai embora! — grita.
Estou gemendo de dor, e nem consigo me mexer. Fazia
tempo que não recebia uma dessas de Charlotte, muito tempo
mesmo, nem lembrava mais como era a dor, mas quando ela me
invade, a raiva volta também, e porra, isso dói. Contudo, a
satisfação de ver ela toda irada vestindo minha roupa ainda é maior
que a dor, tanto que eu calculo o tempo que a dor vai embora e eu
poderei fantasiá-la exatamente assim.
— Sabe, Charlotte — começo, quando consigo um pouco de
ar. — Você realmente precisa transar. — A raiva em seus olhos
aumenta e por isso eu abro a porta atrás de mim e dou um passo
para trás, segurando a maçaneta como uma forma de proteção em
caso dela querer me atacar após minha próxima fala. — Então ao
invés de correr atrás de qualquer outro atleta, você poderia me ligar.
Ela começa a se aproximar de mim em passos pequenos.
— O. Que. Você. Quer. Dizer? — pergunta pausadamente.
Dou de ombros.
— Estou te propondo um novo jogo entre nós dois, um trato,
um acordo. Um jogo com benefícios — proponho, ainda sentindo a
dor fina circular em meu sangue.
Charlotte para de andar, ficando frente a frente comigo, ergue
o queixo.
— Você só pode estar de brincadeira. — Ela ri, ironicamente.
Nego com a cabeça, tentando transparecer o mais sério
possível.
— Não? — ela pergunta, deixando que o riso vá embora.
— Não.
— Eu e você? — Ela aponta o dedo entre nós dois.
Anuo.
— Transando? — Ela cerra os olhos.
Balanço a cabeça de um lado para o outro.
— Tipo isso.
— Eu quem bebi demais, mas você enlouqueceu — conclui.
— Você estava lá, assim como eu, e você sabe que aquilo foi
moderadamente… bom?! — pergunto retoricamente, mesmo
sabendo que não foi nada de bom, foi simplesmente o significado de
perfeição.
— Foi legalzinho — ela assume em um sussurro. — Mas só
porque eu não sabia que era você.
Por que ela gosta tanto de me atirar pelo penhasco?
— Você tem suas tais necessidades — relembro a conversa
enquanto estávamos viajando. — As coisas com o Zach acabaram.
— Graças a Deus. — Eu também tenho as minhas. — Dou de
ombros, largando a porta. — E como você disse, o que rolou foi
legalzinho, você não quer nada com afeto e isso é algo que está
longe de acontecer entre nós dois. Então o cálculo é simples, basta
você pensar — digo por fim, ao dar um passo para trás.
Agora é só esperar ela tomar a decisão certa para que
possamos finalmente continuar de onde paramos.
Eu não preciso das suas palavras para me levar
Deixe sua linguagem corporal acertar o tom
Salve todas as suas emoções para o movimento
Não me deixe fazer isso sozinha
ARE YOU | JULIA MICHAELS
Maldito Alexander.
Sim, maldito. Não me importo que esse seja um adjetivo ruim,
ele é um maldito, pronto e acabou, simples assim.
Eu soube, desde o momento em que meus dedos tocaram
aqueles braços, que era ele. Eu senti isso, mas eu preferi mentir
para mim mesma e dizer que não. O pior de tudo para mim foi saber
que ele, em nenhum momento, me imaginou, porque o maldito sabia
o tempo todo que era eu, e mesmo assim ele continuou.
Ele continuou, e não foi legalzinho como eu disse a ele, foi
tudo de bom e mais um pouco, o que não me surpreende nem um
pouco, afinal, eu sempre imaginei que ele seria daquele jeito,
apenas nunca pensei que algo assim fosse acontecer, ainda mais
comigo.
Nem muito menos pensei que ele pudesse cogitar algo a mais
que aquele grande beijo, bom para um caramba, que só de lembrar
ainda molha a minha calcinha inteira. Mas puta merda, hein?! Nem
conseguir mais odiar ele em paz, eu consigo, porque desde que
fechei a porta na cara dele, dois dias atrás, logo após a festa onde
ele me ajudou e em seguida propôs que nós dois...
É difícil até pensar sobre, porque eu sou obrigada a juntar as
minhas pernas todas as vezes em que penso na proposta dele de
nós dois, juntos, na mesma cama, ou em qualquer outro lugar. Ele
dentro de mim. Empurrando. O. Pau. Dele. Que. Parece. Ter. Um.
Metro. E. Meio.
Aqui estou eu, piscando de novo!
Sou obrigada a fazer minha técnica de respiração, ela me
ajuda com a ansiedade, sempre ajudou. Acontece que inspirar e
expirar contando até dez não ajuda muito quando minha calcinha
está totalmente molhada só de imaginar Alexander e eu transando.
Um arrepio percorre minha espinha, pois agora eu acabo de
me lembrar da vez em que ele chamou meu nome enquanto se
masturbava.
E se eu disser sim e ouvir exatamente aquilo, mas
diretamente no meu ouvido?
Não, eu não terei forças para isso. Já não tenho apenas
imaginando como seria, dirá se realmente acontecer.
— Por que essa merda não está funcionando? — sussurro,
frustrada quando começo a respirar outra vez.
— O que não está funcionando? — Shantal pergunta se
pondo ao meu lado. Talvez eu não tenha sussurrado tanto assim.
Viro o rosto para encará-la, eu ainda não a perdoei pelo que
ela fez. Mesmo que não tenha sido a intenção dela que fosse o
Alexander, ela planejou para que fosse o Zach, mesmo depois das
coisas entre nós terem terminado, quando nem mesmo começaram,
entretanto.
— Vai me responder ou vai ficar com essa cara de bunda o
resto da vida para mim? — ela pergunta, uma sobrancelha minha se
ergue enquanto a olho com desdém. — Eu já te pedi desculpas por
te deixar sozinha com o Alexander, mas você tem que entender que
você estava indo vomitar, e eu não aguento ver vômito. Por favor,
me perdoa, Lottie.
— Não me chama de Lottie. — Me viro de volta para a
máquina de café, limpando-a.
— Você vai me perdoar? — ela pergunta com a voz fofinha.
— Não.
— Lottie, Lottie, Lottie — repete por várias vezes.
Respiro fundo ao terminar de limpar a máquina e meus olhos
se reviram.
— Você não tem nenhuma mesa para atender? — pergunto.
— Lottie...
Fecho os olhos com força.
— Tudo bem, se você calar a boca eu te perdoo. — Ela sorri
quando me viro para ela e aponto o dedo. — Mas você vai me
pagar, não sei como, nem onde, mas vai — aviso.
— Permissão para abraçar?
— Negada.
Ela não tem tanta culpa assim por me deixar sozinha com
Alexander, mas quem sabe, se ela não tivesse feito, ele não teria
dito que tinha sido ele e eu pararia de imaginar certas coisas com
ele.
A verdade é que eu apenas estou com raiva, frustrada para
falar a verdade, e precisava de alguém para descontar esse
sentimento e obviamente não seria o Alexander, uma vez que estou
evitando-o.
— Só para provar o quanto eu me arrependo, eu vou até
atender ele na mesa que é sua. — Ela aponta com o queixo.
No mesmo momento eu vejo Alexander sentar na mesa que
fica em uma cabine, no meu lado de atendimento do salão.
— Pode deixar, eu atendo — digo de prontidão no momento
em que vejo que ele não está sozinho.
— Quem é aquela? — Shantal me pergunta.
— Não sei, mas vou descobrir agora. — Lanço um sorriso,
sem nem olhar para minha amiga.
Ao sair de trás do balcão, pego apenas um cardápio e ando
na direção da mesa que ele ocupou, estando sentado de frente para
uma garota de cabelos castanhos longos, que eu tenho quase
certeza que nunca vi na minha vida, ou no campus, antes.
Meus olhos se estreitam à medida em que vou me
aproximando dos dois, ela está de costas para mim, enquanto ele
está todo relaxado. Sinto seus olhos em mim, mas tudo o que
consigo capturar com mais atenção são os cabelos lisos da
desconhecida e agora o sorriso simpático dela quando eu me ponho
ao lado da mesa.
Ela é bonita, isso é um fato. Mas quem é ela? Forço um
sorriso, olhando diretamente para ela, tentando forçar meu cérebro
para saber se já vi a antes, e não me vem nada à cabeça.
— Bem-vindos ao Rosie’s Café, me chamo Charlotte e vou
fazer o atendimento de vocês hoje — digo em uma falsa simpatia o
roteiro de costume, mas dessa vez ele soa realmente falso, ainda
mais quando eu entrego o cardápio diretamente nas mãos da
desconhecida.
— Olá, Charlotte. — A voz dela é tão doce. — Gostaria de um
Pink Limonade, apenas. — Ela me oferece o cardápio de volta.
— Não temos — respondo, mesmo sabendo que tem.
— Chá gelado, então.
— Também está em falta.
Ela sorri. Eu sorrio.
— Coca-Cola zero? — pergunta.
— Normal.
— Normal, então.
— Algo para comer?
— Não.
Me viro para Alexander e para ele eu não preciso fingir
sorrisos, ainda mais quando ele parece estar mais atraente do que o
usual, em uma roupa toda preta e ainda usando uma jaqueta de
couro.
Não quero ter que falar sobre a festa, ou o beijo, ou a
proposta, não quero nem mesmo ter que ficar encarando-o por tanto
tempo, então cito o pedido usual dele.
— Hambúrguer, fritas e Coca Zero?!
— Mas você disse que não tinha Coca Zero. — Ele cerra os
olhos.
Mordo o lábio inferior, porque não posso mandá-lo ir a merda
agora, uma vez que ele já sacou que eu estou tentando descobrir
quem é a garota com ele. Uma coisa que ele não sabe é que eu
quero realmente saber porque ela está aqui, com ele.
Ou talvez ele saiba, mas eu não preciso dessa informação
rodeando meus pensamentos agora.
— Acabei de lembrar que chegou mais cedo. — Me viro para
a desconhecida e lanço um sorrisinho de desculpas.
— Tudo bem, troca pela zero, então — ela pede e eu
concordo.
— Vocês desejam algo a mais? — pergunto após anotar o
pedido no bloco de notas.
— Por que a Shantal está levando um chá gelado para a
mesa do outro lado? — Ele aponta com o queixo e eu me viro.
— Era o último — respondo entredentes.
Ele sabe o que eu estou querendo fazer e quer me ver
constrangida, mas ele não vai fazer isso. Peço licença aos dois e
volto para detrás do balcão, coloco o pedido na janela e aviso.
— Só para constar, acabou o chá gelado e limonadas no
geral.
Emerson, o cozinheiro, levanta a cabeça e me encara
confuso.
— Mas o refil está cheio dos dois.
— Acabou, Emerson, apenas acabou — digo ríspida.
Ele levanta as mãos para cima, me olhando assustado e
apenas concorda.
— Então, quem é ela? — Shantal volta para o meu lado,
colocando a bandeja na frente do seu corpo.
Nós duas nos viramos e eu pego o momento exato em que
Alexander arruma a sua postura, se endireitando no assento, e a
garota, que está de costas para nós, coloca uma mecha do cabelo
para trás.
Que porra é essa que um dia ele faz uma proposta de transar
comigo, e apenas dois dias depois vem jantar com uma garota que
eu nunca vi antes, no restaurante que eu trabalho, durante o meu
turno?
— Uma feia qualquer — minto.
Shantal ri e eu continuo fitando os dois. O movimento no
Rosie’s está tranquilo, apenas três mesas estão ocupadas, incluindo
a que eles estão sentados rindo – por que eles estão rindo? –, me
volto para minha amiga.
— O que é? — Minha pergunta não sai nenhum pouco
simpática, pois está mais para um grito.
— Você está com a cara toda fechada e vermelha — ela diz.
— Não estou.
— Suas pupilas estão dilatadas e a veia da sobrancelha está
pulsando.
Levo a mão até a sobrancelha, sentindo que ela realmente
está palpitando.
— Culpa sua — digo.
— Minha?! — ela pergunta em um gritinho fino.
— Ainda não saiu da minha cabeça que você ao invés de me
ajudar enquanto eu vomitava, deixou que ele fizesse, e agora sou
obrigada a atendê-lo, depois da pessoa que eu mais odeio me ver
vomitando — explico.
Shantal ri de novo e eu a fuzilo.
— Isso ou você está com ciúmes da desconhecida.
Ignoro totalmente a palavra com C e volto a olhar para a
mesa onde eles estão.
— Ela não estuda na Dartmouth — aponto.
— Não mesmo.
— Nunca vi ela na Dirty também.
— Nem eu — Shantal concorda pensativa, e tão logo algo
parece se iluminar nela, quando ela se vira para mim, e eu sou
obrigada a deixar de encará-los, fitando-a também. — O Alex nunca
mais saiu com ninguém no campus desde o boato da gonorreia, e
se ele estiver saindo com alguém de fora do campus?
Estalo a língua no céu da boca.
— Ele não está.
— Se estivesse, você estaria com ciúmes?
— Eu já vi ele saindo com várias garotas antes — o que não
deixa de ser verdade — e isso nunca me incomodou antes, e por
que eu teria ciúmes do cara que eu odeio desde que nasci?
— Porque ele foi seu último beijo, talvez?! — Shantal morde o
lábio inferior e estreito os olhos para ela. — Sarah me contou essa
manhã — explica. — Ela esperava que saísse na DM, mas não saiu.
Minha mão se fecha em punho antes de cruzar os braços
sobre o peito. A última atualização que recebemos da Dirty foi na
noite da festa, desde então ela sumiu. Todo o campus esperou por
atualizações das festas do final de semana, mas não recebemos
nada.
E depois que a safada conseguiu até mesmo as imagens de
segurança de uma arena em Miami, milhas e milhas de distância de
Hanover, eu não duvido que ela tivesse uma câmera instalada no
banheiro do encontro às cegas. Mas não. Ela não falou
absolutamente nada, nem mesmo do body shot que James fez em
Dakota às oito da manhã, e havia poucas pessoas na festa ainda.
Mas até eu, que estava tentando dormir depois da proposta
que me fez revirar na cama o sábado inteiro, me deixando com
olheiras horrendas pois eu não dormi, fiquei sabendo da fofoca
inteira. E era esperado que Dirty lançasse um episódio de pelo
menos uma hora, narrando todos os acontecimentos da festa que
durou mais de doze horas, mas ela não o fez.
O que tem ansiado alguns. No meu caso mesmo,
aterrorizado, já que não quero imaginar ela narrando o meu desmaio
e a briga de Alexander e Zach enquanto eu passava mal.
— Por que ela não me contou quando eu perguntei? —
questiono sentindo a raiva emanar na minha pele.
— Você ainda pergunta? — Shantal inquire como se fosse
óbvio. Franzo o cenho, dando a liberdade para que ela continue. —
Você é Charlotte Cameron, e se alguém relaciona você a Alexander
Harrison, você surta.
— Não surto nada.
— Está surtando agora. — Ela sorri convencida.
Me preparo para respondê-la, porém, Emerson toca a
campainha na janelinha e nós duas nos viramos.
Aviso a Shantal que depois a gente conversa enquanto
colocamos as coisas do pedido de Alexander e da desconhecida na
bandeja, ela me solta mais um sorrisinho e eu reviro os olhos.
Caminho até a mesa com o pedido em mãos e eles param de
rir no momento em que eu me aproximo.
— Licença — peço e começo a pôr o pedido na mesa,
começando pelo de Alexander.
Ele observa todos os meus movimentos, sinto meus olhos
faiscarem, também o observando e prestando atenção
principalmente na faceta séria dele, que até três segundos atrás
estava todo risonho.
Estou tirando o último copo da bandeja quando a voz doce,
cheia de falsa simpatia, diz:
— Então se é tão grande, como você acha alguma que
caiba?
Minhas mãos tremem enquanto ouço a pergunta dela, mas
principalmente minha vista escurece e tudo se transforma em uma
confusão quando eu acabo derrubando o copo cheio de refrigerante
e gelo em cima dela.
Poderia ter sido porque eu quis, realmente poderia. Mas não
foi.
Que pergunta foi essa que ela acabou de fazer?
Bom, não interessa agora, porque por mais que ela me
intrigue, no momento eu começo a pegar vários guardanapos.
— Desculpas, mil desculpas mesmo — peço, entregando a
ela os papéis. — Não sei o que aconteceu comi...
— Onde fica o banheiro? — ela pergunta, se levantando.
Aponto para trás de mim e ela corre.
— Desculpa — grito, mesmo sabendo que talvez ela não
tenha ouvido.
— O que foi isso? — Alexander pergunta e eu volto a olhá-lo.
— Eu quem pergunto, o que foi isso? — digo secamente.
Ele balança a cabeça, franzindo o cenho sem entender.
— Não entendi — responde.
— Nem eu, grandão.
Um sorriso se ergue nos cantos da sua boca e como eu estou
no trabalho e de forma alguma quero ser demitida, mordo o interior
da bochecha, me controlando para não mandar o cliente ir à merda.
Respiro fundo e dou as costas para Alexander, andando o
mais rápido que posso. No momento que volto para atrás do balcão,
falo com Shantal, mas sem olhar para ela.
— Você pode limpar, por favor?
Não sei bem se ela responde, pois passo direto para a
cozinha. Emerson não está lá, minhas mãos estão trêmulas, jogo a
bandeja em cima da mesa, que faz um barulho ensurdecedor de
metal contra metal.
Começo a andar de um lado para o outro, tentando respirar
fundo enquanto fecho os olhos.
É a vigésima vez que faço a técnica de respiração apenas
hoje, mas ela simplesmente não funciona.
Que pergunta foi aquela? Por que ela perguntaria algo assim?
Por que eles estavam rindo tanto e pararam quando eu me
aproximei? Mas, principalmente, por que minha cabeça está
fazendo disso um grande caso, quando eu não deveria me importar
tanto assim?
A porta da cozinha range ao se abrir de uma vez, pego o
bloco de notas dos pedidos que está dentro do bolso do avental,
sentindo minhas mãos trêmulas, pensando que é Emerson, ou
Shantal, ou até mesmo Claire, a gerente.
Mas me surpreendo quando me viro e vejo que é Alexander.
— O que está fazendo aqui dentro? — pergunto em tom
acusatório no mesmo instante em que nossos olhos se encontram.
Ele começa a dar passos longos em minha direção.
— Procurando respostas para as minhas perguntas —
declara ao se aproximar.
Quando o sinto tão perto de mim, dou alguns passos para
trás, mas acabo encostando em algo frio e duro. Tateio apenas para
descobrir que é a geladeira, antes que ele esteja frente a frente
comigo, me encurralando contra ela.
Ergo o queixo para conseguir encará-lo quando uma mão
dele fica acima da minha cabeça, encostando na geladeira também.
Pisco os olhos duas vezes, desorientada.
— Não entendi — digo, com a voz fraca ao engolir em seco.
O pensamento que tive antes de Alexander entrar no Rosie’s
volta com tudo agora, principalmente com sua respiração quente tão
próxima de mim, e pelo visto não haverá técnica que dará jeito no
rebuliço que sinto no meu interior, me deixando nauseada.
— Primeiro você bate a porta na minha cara, depois age toda
estranha durante o atendimento e para completar derrama bebida
na minha companhia. Por quê?
Minha garganta seca de repente.
— Por que, o quê?
Juro que não entendi nada do que ele disse, pois tudo que
ouço é Charlotte, Charlotte, Charlotte, ainda mais com a voz rouca
dele, com ele entrando em mim.
Eu nunca me senti tão fraca e pequena perto de Alexander
assim em qualquer outro momento, em toda minha vida. Sou mais
baixa do que ele, isso é inegável, mas me deixando encurralada
dessa forma, mais parece que eu sou uma formiga e ele um
elefante, pronto para pisar em mim.
Minha respiração fica tensa, então eu fecho os olhos e puxo
uma grande quantidade de ar antes de respondê-lo.
— Primeiro, eu bati a porta na sua cara porque você
mereceu. Seus jogos sempre foram baixos, mas você passou de
todos os limites com aquela proposta.
— Que ainda está de pé, a propósito — ele me interrompe,
sugestivo.
Ele está querendo me provocar, isso é só mais um jogo dele,
e eu não vou cair. Eu posso escalar a parede igual Peter Parker,
mas eu não vou cair no jogo dele para depois ser humilhada e
desgraçada, mesmo que minha calcinha esteja encharcada só de
imaginar ele me tocando, ou se tocando, ou meu nome saindo da
sua boca.
Ah! Eu vou enlouquecer!
— Segundo — respiro fundo de novo, voltando ao assunto
anterior e ignorando ele totalmente —, não agi estranha no
atendimento, apenas não queria te atender, já te falei para não vir
aqui durante meu turno, e já te disse para não sentar nas minhas
mesas.
As sobrancelhas dele sobem.
— Eu gosto de ser mal atendido.
Estreito os olhos, bem que eu poderia chutar as bolas dele
mais uma vez.
— E por último, foi um acidente de trabalho, sem querer
derramei a bebida na sua acompanhante. — A palavra parece
amarga na minha boca.
— Sem querer? — ele pergunta.
— Uhum — anuo.
— Engraçado que quando entrei na cozinha, vi os refis de
limonada cheios, chá gelado também. — Me preparo para dar uma
desculpa, mas ele é mais rápido que eu ao continuar. — Você quer
saber o que é grande, que ela perguntou antes de você sujar ela
inteira?
Balança a cabeça, negando.
— Nã... — Minha voz sai aos frangalhos e coço a garganta
apenas para respondê-lo. — Não.
Ele sobe a mão que estava livre e no instante em que as
pontas dos seus dedos encostam no meu pescoço, toda a minha
pele arrepia – toda –, e posso jurar que meu coração parou de bater
também.
Poderia ser um ataque nervoso normal, mas não é isso,
porque se fosse eu estaria igual uma louca, com o suor frio
escorrendo, enquanto eu estaria querendo me livrar da agonia.
Porém, a única coisa que escorre em mim é a lubrificação da minha
boceta.
— Você quer — ele insiste.
— Não quero. — É óbvio que quero, mesmo sabendo qual é
a resposta.
— Quer sim.
— Não quero não.
— E se eu te dissesse que também quero?
— O quê?
— Você sabe o que.
Engulo em seco.
É possível um contato visual fazer a pessoa gozar? Porque
eu posso jurar que isso vai acontecer.
Os olhos de Alexander me queimam ao ponto de o fogo subir
por todo o meu corpo, inclusive meu rosto que sinto arder.
— Sobre o que você está falando? — Ele realmente acaba de
me confundir.
— Nem eu sei — ele assume.
Seu rosto se aproxima do meu, ele respira fundo também,
soltando o ar devagar, as pupilas estão dilatadas e isso é sexy pra
caralho.
Não deveria estar assumindo isso, pois eu não faço a mínima
ideia de quando eu passei de repugnar os olhares de Alexander,
para simplesmente desejá-los.
Dizem que homens tem duas cabeças, a de cima e de baixo,
mas para falar a verdade, as mulheres também, porque tudo que
ouço do meu cérebro é “Se controle, Charlotte”, enquanto minha
boceta pulsando diz “Me coma, me coma, coma”.
Nossos rostos estão perto demais, menos de um centímetro,
é tão perto que minha boca sente os lábios dele se mexerem
enquanto ele fala:
— A única coisa que sei é que a proposta ainda está de pé.
— Fecho os olhos, sentindo que o próximo passo dele é me beijar.
Contudo, acabo me espantando quando ele se afasta de vez,
tirando a mão do meu pescoço e a outra de cima da minha cabeça e
dá um passo para trás. Há um sorriso mordaz em sua boca quando
abro os olhos.
Bato os cílios incansáveis vezes, tentando entender o que
acaba de acontecer. Endireito minha postura e desencosto da
geladeira, ainda com Alexander me encarando.
— Não é permitida a entrada de clientes na cozinha — digo,
voltando aos meus sentidos e ignorando totalmente a última fala
dele, ao voltar para a proposta.
Ele joga os ombros para cima.
— Eu já estava de saída mesmo, tenho uma entrevista para
terminar.
Entrevista?
Ele deve perceber a confusão no meu rosto, quando se
explica.
— O nome dela é Natany, e ela faz parte da coluna de
esporte universitário da ESPN, e está entrevistando alguns caras do
time — ele explica.
— Eu não perguntei. — Guardo o bloco de notas no avental
de novo e tiro a caneta de trás da orelha.
— E o grande que estávamos falando era sobre a cabeça do
James e capacetes, brincadeiras internas. — Ele me solta uma
piscadela.
— Eu realmente não quero saber. — Sorrio, dessa vez
sincero, pois é como se um peso acabasse de ser tirado das minhas
costas.
— E eu quero uma resposta — ele diz.
Meu coração erra a batida, pois mais uma vez ele voltar ao
assunto.
Por sorte, um anjo chamado Emerson entra na cozinha feito
um furacão, e eu nunca agradeci tanto por isso, pois mesmo
aliviada, se eu for pressionada mais uma vez como fui por
Alexander, talvez eu ouça a voz do meu ponto g, e não da minha
razão.
— Ei, cara, para fora! — Emerson diz.
Alexander se vira para ele, pedindo desculpas, e começa a
caminhar para fora da cozinha. Eu observo os seus passos e como
ele é capaz de dominar todo e qualquer lugar onde ele esteja, até
mesmo uma cozinha gordurosa.
Antes de passar pela porta, Alexander se vira mais uma vez e
diz com a voz rouca:
— Não esquece do meu pedido, Charlotte.
Fico fraca outra vez e ele sai da cozinha. Junto minhas
pernas, sentindo meu clítoris pulsar, pois é instantâneo a forma
como todos os pensamentos me atingem de uma vez só, e para
completar ele falou meu nome.
Isso é demais para mim e eu acabo de constatar que sim,
dessa vez, apenas dessa vez, eu sou uma formiga que daria tudo
pela tromba do elefante, mesmo que eu odeie e saiba que ele é bem
maior do que eu, tenho a certeza de que a picada dele seria mais
satisfatória que a minha.
Não me deixe esperando
Eu estive esperando a noite toda para chegar mais perto
E você já sabe que eu faço isso por você
Você conhece as sensações, conhece as sensações
Que vou te causar
VIBEZ | ZAYN
Que atrevido.
Apago a mensagem onde estavam as regras e reescrevo,
acrescentando que se eu não posso falar com o Zach, ele também
não pode transar com outra, e se ele fizer isso, o acordo chegará ao
fim antes mesmo de começar.
Charlie:
Agora está!
Vc podia não ter gonorreia
Mas eu não vou arriscar
Cadê vcccc
?????
ALEXANDER
Quando vejo que as mensagens chegaram e mesmo assim
ele não me responde, me apresso em ligar para ele e me
surpreendo quando a chamada cai porque ele está em outra
ligação.
Ele não estaria simplesmente indo atrás de outra assim tão
rápido, não é?
Se ele ousar em fazer isso, eu juro que eu pego ele pelo
pescoço e antes de o matar, corto o pau dele fora, fazendo picad...
Meu celular vibra, pego-o rapidamente para ver a resposta.
Alex:
Estou em ligação com sua mãe
Para de ser surtada
Charlie:
Eu não sou surtada
Alex:
Vc refez as regras em um minuto e mandou mais cem mensagens
Isso é coisa de gente surtada
Alex:
Surtada!
Vc ligou para a Alice?
Vai para o Dunk’s?
Precisam de carona?
Alex:
O Bellamy quem vai dirigir
Inclusive, sua lata velha não está ligando
Com quem vc está vindo?
Dá pra vc me responder?
De mãos dadas...
Sério?
Acrescenta na lista de regras
PROIBIDO FALAR COM O DANIEL TAMBÉM!
Ainda vestindo um pedaço de pano
Charlotte!!!???
Onde está a merda do seu celular?
Pqp
Estou no banheiro dos funcionários
Venha logo!
É estranho e perturbador também, mas eu sorrio ao ler todas
as mensagens. Daniel tenta se esgueirar ao meu lado e eu escondo
a tela.
— Com licença?! — peço retoricamente.
— Quem está te fazendo sorrir assim? — ele pergunta, pouco
se importando em ser invasivo.
— Minha mãe — minto ele franze o cenho, sabendo disso. —
Cadê a Ariel mesmo?
— Jogo de vôlei na Filadélfia. — Ele dá de ombros, fazendo
biquinho triste. — Saudades da minha ruiva.
— Então se preocupa com a viagem dela, não com as minhas
mensagens — digo ao me levantar.
— Onde você vai? — Shantal pergunta.
— No bar.
Minto de novo, pois se eu dizer que vou ao banheiro, sei que
uma delas irá se levantar e oferecer para se juntar a mim. Garotas
têm essa mania de que, se uma vai fazer algo, as outras se juntam,
então é melhor mentir que arriscar.
Quando ninguém protesta, eu me afasto, outra vez andando
por entre as pessoas, mais especificamente garotas atacando o time
de hóquei.
Ao chegar no corredor dos banheiros, vejo que só há os
banheiros de clientes e ambos têm pessoas entrando e saindo.
Pego o celular para ligar para mandar uma mensagem para ele,
contudo, sou pega de surpresa quando uma mão tampa a minha
boca e pega meu corpo por trás.
O grito que solto é abafado, mas não dura tanto tempo assim,
quando a porta fechada e o autor que quase me fazer ter um ataque
cardíaco me gira, ao me soltar e eu começo a bater nele.
— Você está louco? — vocifero.
Ele tapa minha boca de novo.
— Silêncio ou vão ouvir seus gritos daqui, e eu não estou
falando no sentido bom — avisa, mantendo o contato visual comigo.
Levanto a mão apenas para bater nele de novo e Alexander
solta minha boca.
— O que estamos fazendo aqui? — pergunto ao me afastar
dele.
— Você veio com o Daniel? — pergunta ao estreitar os olhos.
Dou de ombros ao me sentar na bancada na pia e cruzar os
braços depois de colocar o celular ao meu lado.
— Meio óbvio, você não acha? — respondo retórica ao
levantar as sobrancelhas. O vinco na testa de Alexander aumenta.
— Eu te ofereci carona.
— E?!
Não consigo entender onde ele quer chegar e mesmo assim
ele vira de costas para mim, respirando fundo e coçando a têmpora.
— Precisamos refazer as regras — declara ao se virar outra
vez. — De novo, já que você fez isso mais cedo.
— Se você está se referindo a mensagem que eu estaria
proibida de falar com ele, não vai acontecer.
— Por que não? — Ele dá um passo ao se aproximar.
— Porque não — respondo apenas.
— Se é para ser exclusivo, você não deveria andar com ele
de mãos dadas por aí. — Dá outro passo.
— O que você quer dizer com isso? — a pergunta sai ríspida
demais.
— O cara estava te comendo até poucos meses...
É automático quando minha mão voa na cara de Alexander,
estalando um tapa audível em seu rosto.
— Espero que você não termine essa sua frase — aponto.
Alexander volta a me olhar, passando a mão na mancha
vermelha que acabei de deixar em seu rosto, com um sorriso sádico
que me faria molhar a calcinha, caso eu estivesse usando uma,
aparecendo nos cantos dos seus lábios.
Ele não tem mais para onde andar, portanto, abro as pernas,
deixando que ele se aproxime ainda mais.
— Estranho, mas sempre que você me bate eu fico com
tesão, patinho feio — confessa sorrindo.
— Vai à merda, Alexander.
Ele sorri ainda mais.
— Vou levar isso como um feliz aniversário, Alexander. — Ele
finge uma voz fina ao colocar a mão em minha perna, dando mais
abertura. — E o que estou prestes a fazer com você, como meu
presente de aniversário.
Ele me pega pelos joelhos e me puxa, suas mãos sobem em
minhas coxas, subindo o vestido até minha cintura, onde ele aperta
com força, ao olhar para baixo e perceber que eu não visto nada em
baixo.
— O que? — decido perguntar quando os lábios dele tremem
e eu não consigo decifrar se ele está sorrindo ou com raiva.
Balança a cabeça em negativa e em seguida volta a ficar
meus olhos.
— Não sei se agradeço por você facilitar meu trabalho ao
estar sem calcinha, ou se te amaldiçoo por usar um vestido assim e
ainda estar sem nada, e sentando ao lado do seu ex na minha
mesa.
Mordo o lábio inferior e ele quebra o contato por um milésimo,
desviando os olhos para minha boca, Alexander engole em seco.
— Fiquei gostosa nele, não foi?! — Sorrio de canto.
— Razoável. — Ele engole em seco outra vez, não concorda,
mas há um brilho em seus olhos.
Uma risadinha escapa por meus lábios e eu subo a mão,
deixando as pontas dos meus dedos roçarem na alça do vestido.
— Bom... — Dessa vez eu desvio os olhos, fitando meu
ombro, e Alexander me acompanha. — O Daniel quando viu até
perguntou se deveria se considerar um azarado.
Os lábios dele tremem outra vez e as pupilas dilatam, ele
suga o interior das bochechas e confesso que isso chega a ser
divertido. Quando criança, Alexander nunca gostou de dividir suas
coisas e ele agia assim sempre que outra criança ameaçava pegar
algo dele.
E mesmo sabendo que eu estou longe de ser um brinquedo,
nós estamos em um jogo, chega a ser óbvio que ele não quer que
ninguém, especialmente Daniel ou Zach, roube esse jogo dele.
— Ele é um azarado? — pergunto, me fazendo de inocente,
com a voz calma e controlada.
Alexander me olha, ele não move a cabeça, não diz que sim,
nem que não. Ele também não fala nada e é muito bom ver a raiva
emanando em sua face, ele não consegue se controlar e eu sorrio
com isso.
— Azarado ou não, você não vai mais falar com ele — ele
avisa e eu largo a alça do vestido.
— Vou sim — respondo, pegando a bainha do vestido me
preparando para descê-lo, e a mão dele agarra a minha, me
impedindo de ajeitar a roupa.
— Não vai — murmura, trincando os dentes.
— Se eu estou dizendo que vou, é porque vou — digo.
Ele encosta a testa na minha, sua respiração quente me
invadindo e seus olhos ofuscando toda a minha visão, o castanho
claro tornando-se uma linha fina que abraça o preto das pupilas.
— Não vou discutir isso com você, Charlotte — sussurra, o
hálito carregado de menta e cerveja me tomando. — Não antes de
fazer o que quero.
— Nós não vamos transar — digo de imediato e acabo
soltando um gritinho quando ele me puxa ainda mais, minha bunda
ficando na beirada da pia, e eu sinto a sua ereção encostar na
minha boceta. — Eu acho — suspiro quando a excitação atravessa
meu corpo.
— Eu não vou te comer aqui — confessae sua mão sobe. As
pontas dos dedos passando pela lateral do meu pescoço, ao colocar
meu cabelo para trás. — Apenas te experimentar. — Ele afasta o
rosto do meu, mas tão logo se põe no vão do meu pescoço, ainda
sussurrando. — As regras dizem que eu não posso te beijar, mas
posso te chupar, onde — os lábios encostam na minha pele — eu
quiser — completa.
Minha boceta pulsa, mas não sei ao certo o que me atinge
mais, o pau dele duro, coberto pelo jeans, roçando no meu ponto
sensível, ou, a língua dele que se arrasta na extensão do meu
pescoço, e eu acabo deixando minha cabeça cair para trás.
Subo as mãos, agarrando os bíceps tensionados dele com
força e juro que posso sentir minhas unhas atravessarem o tecido
fino da camisa de algodão que ele usa.
Os dedos de Alexander entram em meus cabelos e ele puxa
ainda mais minha cabeça para trás, enquanto a outra mão trabalha
em descer a alça do vestido e revelando meu peito. Minhas pernas
se agarram ao redor da sua cintura quando a mão dele se espalma
em meu seio, o reivindicando em uma pegada bruta, apertando-o.
Ele não me beija em momento algum, isso é certo, mas à
medida em que sua boca desce em meu pescoço, clavícula e
escapula, envia uma palpitação diferente e tensa até o meu centro.
Ao chegar no arco do meu seio ainda coberto, devido ao
decote aberto e também a outra alça que já desceu em meu braço,
ele finca os dentes no tecido e revela meu outro peito.
Enquanto ele começa a dar atenção a um mamilo com os
dedos, a boca trava no outro bico, chupando-o e, porra, tudo o que
consigo fazer é respirar fundo e apertar ainda mais seus braços.
— Definitivamente você pode me chupar — concluo ofegante,
fechando os olhos.
Ele belisca meu mamilo e minha coluna se empertiga.
Ele troca as atenções e eu não sei bem se agradeço por isso,
se peço por mais, ou apenas imploro para colocar sua língua onde
eu realmente estou necessidade. Mas quando abro os olhos e o
olho, há um sorriso convencido em seu rosto quando ele afasta a
boca do meu peito.
— Um gemido seu chamando pelo meu nome seria um bom
presente de aniversário — diz.
Respiro fundo e ele pega minhas pernas.
— Vai sonhando — respondo, mesmo que eu sinta minha
boceta piscar como se estivesse soletrando o nome dele.
Ele pende os ombros, ajusta meu corpo mais uma vez e
ainda com as mãos em minhas pernas, desliza as pontas dos dedos
em minhas coxas e se agacha, sua cabeça se ajustando no meio
das minhas pernas.
Eu poderia agradecê-lo por ler meus pensamentos, mas isso
seria demais. Contudo, minha boca grande é mais forte que eu,
quando eu solto um gemido, no instante em que sua língua passa
por toda a extensão da minha boceta.
Seguro a beirada da bancada da pia com uma mão e os
cabelos dele com a outra, deixando que meus dedos adentrem aos
fios ondulados, a fim de mantê-lo ali quando ele faz movimentos
circulares em meu clítoris e alterna com a lambida em toda a
extensão.
As mãos de Alexander apertam até minha bunda, apertando-
a. Sinto minhas carnes tremerem, e isso está tão bom.
— Uh... — Deixo escapar quando ele deixa a pontinha da
língua mais dura e entra em mim.
Cerro os olhos, pois se fechar agora vou sentir as estrelas
piscando, e eu não preciso disso agora.
Quero falar alguma coisa, qualquer coisa, mas sou totalmente
incapaz, sentindo meu corpo ficar mole e desfalecer. O agarre nos
cabelos dele se torna mais intenso e o aperto em minha bunda
também. Alexander tira a língua de dentro de mim, me lambendo
inteira e voltando a atenção ao meu clítoris.
Agora, seus lábios se fecham no pontinho, a sucção
tornando-se forte e me levando cada vez mais próximo ao orgasmo.
O celular começa a vibrar do meu lado e eu tiro a mão de seu
cabelo para pegá-lo, mas ele me impede, ao agarrar minha mão.
Suspiro.
Mais gemidos escapam dos meus lábios, meus joelhos
apertando os ombros largos dele. Ele lambe, chupa e me suga, essa
sequência me deixa cada vez mais louca, vozes do lado de fora do
banheiro também me chamam atenção, além do celular que não
para de vibrar.
O alarme do meu celular toca.
Meia noite.
Oficialmente meu aniversário.
Alexander me lambe mais uma vez e eu não consigo, muito
menos faço qualquer esforço para lutar contra o orgasmo quando
ele me invade, através das luzes piscantes quando sinto meus olhos
se revirarem e o tremores em todos o meu corpo, acompanhando o
arrepio que sobe por toda a extensão da minha espinha.
Apesar do barulho incessante do alarme, minha pele inteira
pega fogo, o calor sobe por meu pescoço e rosto, onde sinto leves
pinicadas.
Estou respirando fundo ainda, quando Alexander fica de pé
de novo, enquanto ajusta meu corpo. Abro os olhos quando ele
começa a ajeitar meu vestido, subindo a alça e também descendo a
saia, e para isso, ele me põe de pé, me segurando pela cintura com
um braço.
— Feliz aniversário, Charlotte — diz ao pegar lenços de
papéis no suporte que há ao lado da pia, me entregando. — Não vai
ser legal abraçar suas amigas, e seu ex, toda gozada.
Pego os papéis e me afasto dele, espalmando minha mão em
seu peito e o empurrando. Desço a mão entre minhas pernas e
começo a me limpar.
— Obrigada — digo, sem ânimo algum, ainda sentindo
choques em meu corpo. — E tem uma calcinha na minha bolsa —
informo, ao pegar a bolsa e abri-la.
Subo os olhos e Alexander está sorrindo, negando com a
cabeça.
— Você é insanamente inacreditável — responde trincando
os dentes.
Dou de ombros ao rir e passar a calcinha de renda em
minhas pernas.
— Eu não sei você — pauso, ao terminar de vestir a peça —,
mas eu não vou passar os meus vinte e um anos, trancada em um
banheiro com você. Então, tchau! — digo pegando o restante das
minhas coisas e me afastando dele, mas ainda assim viro ao
destrancar a porta. — Foi um presente de aniversário, legalzinho —
minto, e ele estreita os olhos, ao colocar as mãos no bolso.
— Sai logo daqui, Charlotte. — Sei que ele quer rir também,
mas decido não forçar quando meu celular toca outra vez.
Eu sinto como se estivesse me afogando
Você está me puxando para baixo e
Você está me matando lentamente
Eu sinto como se estivesse me afogando
I FEEL LIKE I’M DROWING | TWO FEET
Alex:
Onde vc está?
Charlie:
Pq?
Alex:
Vc não quer que eu repita a pergunta
Charlie:
No meu quarto
Pq?
Alex:
Estou indo aí
Alex:
Espero que vc quebre a perna
Charlie:
Vc por acaso está tentando me desejar boa sorte?
Alex:
É meio óbvio, não acha?
Charlie:
Qual o seu problema que não pode dizer apenas boa sorte?
Falar que eu devo quebrar a perna é no mínimo insensível
Alex:
Mas é assim que fazem no teatro
Charlie:
*foto anexada*
Isso parece um teatro para vc?
Não consigo distinguir se pelas mensagens Charlotte está
sendo apenas Charlotte, ou ela está estressada. A imagem que ela
manda é do casal que está se apresentando, então eu também tiro
uma foto e encaminho para ela, do meu ponto de vista.
Alex:
Pode não ser teatro, mas a bundinha deles dois é um espetáculo à parte
Charlie:
Onde vc está?
Charlie:
*foto anexada*
Espero que isso aqui dê sorte
Obrigada por vir
E para de olhar para bunda das pessoas nas apresentações!
*emoji de coração*
Meu pai.
É difícil conseguir raciocinar esse momento e a voz que
acabo de ouvir chamar meu apelido de infância.
Minha vista escurece ao mesmo tempo em que tudo ao meu
redor parece girar.
Lottie.
A palavra, juntamente a voz rouca e o sotaque espanhol
acentuado, reverberam repetidas vezes na minha cabeça e
enquanto eu tento assimilar que o que acabo de ouvir é real, sinto
as rosas caírem das minhas mãos.
Pisco os olhos e noto que a minha frente, Alexander parece
estar tão surpreso quanto eu.
Ao mesmo tempo em que sinto meus pelos se arrepiarem,
enquanto os milésimos de segundos se transformam em horas,
minha pele também formiga, minha boca seca e um nó se
transforma no fundo da minha garganta.
Giro a cabeça para o lado, pois sinto que meu corpo está
petrificado, e então eu o vejo.
Cabelos castanho escuros com alguns nuances grisalhos,
olhos tão escuros que posso jurar que são pretos, cobertos por
pequenas rugas nas pontinhas, barba aparada e mandíbula
quadrada e o cenho naturalmente franzido junto aos outros detalhes
me mostram que ele é o mesmo homem que fez suas malas e foi
embora de casa catorze anos atrás, só que agora um pouco mais
velho.
Tento engolir, mas parece que não há uma gota sequer de
saliva na minha boca, e a bola que parece agora habitar minha
garganta se nega a descer.
Assisto ele dando mais um passo em nossa direção, ou
melhor dizendo, em minha direção, e a confusão dentro de mim
aumenta gradativamente. Eu tento falar algo, tento me afastar, tento
perguntar o que ele está fazendo aqui. Quero perguntar se ele viu
minha apresentação, como ele sabia onde eu estaria, se ele
acompanhou não apenas essa competição, mas as tantas outras.
Se ele sabe que mesmo quando ele me deixou eu continuei
patinando, pois foi a única forma que eu encontrei de me libertar da
falta constante que ele fazia. Se ele sabe que cada medalha e troféu
que ganhei ao longo de uma vida recheada de apresentações,
competições, saltos e quedas, e cada foto postada nas minhas
redes sociais, eu esperei por uma curtida ou um comentário dele.
Eu quero perguntar se ele faz ideia de como foi difícil chegar
até aqui sem ele, e que por conta da sua ausência, eu passei a ter
medo de receber carinho, afeto e de me achar digna do amor.
Pois foi graças a ele, a pessoa que mais me demonstrou
carinho e afeto por sete anos, e um dia simplesmente sumiu, eu
fiquei com medo de me entregar a qualquer pessoa, pois para mim,
se isso acontecesse, significaria que com o passar do tempo eu
seria abandonada.
E que mesmo diante de todo o meu esforço de tentar manter
contato, as inúmeras ligações e mensagens de voz que deixei, as
cartinhas que escrevi pedindo para visitar, a falta de parabéns
durante catorze aniversário, como quando eu precisava dele para
me acompanhar nas aulas de direção, tirar dúvidas sobre mecânica
do meu carro velho e ele nunca veio. Nunca entrou em contato,
nunca me visitou, nem mesmo mandou um cartão de feliz
aniversário.
Ele apenas me abandonou.
Meu pai me abandonou.
Meu pai, que se separou da minha mãe e que escolheu me
deixar mesmo antes de assinar os papéis do divórcio.
Ele dá mais um passo em minha direção, enquanto eu
continuo parada, sem conseguir me mover, ele abre os braços, com
um sorriso que parece terno sobe pelos cantos da sua boca e me
chama outra vez. Minha respiração estanca, um único pingo de suor
desce por toda extensão da minha coluna, se ele der mais um
passo, ele estará me abraçando.
— Ei, Rafael. — Alexander entra no pequeno espaço que há
entre mim e meu pai, o chamando.
— Alexander?! — ele pergunta, a voz parecendo
genuinamente confusa.
— O único. — Posso não estar vendo Alexander agora, mas
ele está sendo irônico, enquanto eu tento respirar. — Já faz quanto
tempo que não nos vemos? Quinze anos?
Catorze. E definitivamente ele está sendo irônico.
— Não faz tanto tempo assim — meu pai tenta desconversar.
Tudo o que posso assistir é as costas de Alexander, e ele se
endireita. Conhecendo-o tanto quanto conheço, ele está fuzilando o
homem que me deixou.
— Não quinze anos exatamente, você tem razão! Faz catorze
anos e oito meses, eu não gosto muito de fazer contagem de dias,
mas da última vez que você me viu seria catorze anos, oito meses e
cinco dias, mas se eu for contar a última vez que te vi, que foi pela
janela da sala da minha casa, colocando as malas dentro de um
carro, daí nós podemos diminuir um dia nessa questão.
Silêncio.
Alexander não se move, nem mesmo um centímetro durante
esse tempo, suas costas permanecem eretas e sua respiração
aparentemente tranquila, enquanto eu inspiro com força e expiro
com leveza, tentando fazer a contagem ouvindo todo o diálogo.
— Olha só...
Meu pai começa quebrando o silêncio, mas tão logo
Alexander o interrompe.
— Eu não sei o que você veio fazer aqui, Rafael, mas é
melhor você ir embora — ele o corta.
Um riso rouco escapa do outro homem.
— Eu vim parabenizar a minha filha — ele responde, e é com
as duas últimas palavras dele que eu sinto algo molhado em meu
rosto, descendo por minha bochecha. — Você pode me dar licença,
para que eu possa abraçar ela?
— Não.
— Como é?
— Eu disse que não, você não pode abraçar a Charlotte.
— Garoto, da última vez que eu te vi, você não tinha os dois
dentes da frente, e agora porque está mais alto do que eu, se acha
no direito de mandar e desmandar na minha filha?
— Eu não mando nela. — Mesmo que Alexander esteja
perdendo a paciência, sua voz é limpa. — Mas eu não vou deixar
você encostar um dedo em Charlotte depois de tudo o que você fez.
— E o que eu fiz?
Silêncio outra vez.
— Nada. — É a primeira vez que Alexander se move,
erguendo os ombros. — Aí que está o X da questão, você não fez
absolutamente nada, e é por isso que te peço gentilmente para ir
embora.
— Alexander... — A voz do meu pai reverbera e, então,
finalmente eu consigo me mover, ficando ao lado de Alexander.
Minha vista está embaçada e meus olhos ardendo, e isso é
por conta das lágrimas que encharcam meus olhos, eu pisco
tentando controlá-las, e mesmo assim elas continuam descendo.
Subo os braços, contornando meu corpo e me sentindo frágil, como
se estivesse a ponto de quebrar. Pois ao mesmo tempo em que
sinto que preciso correr para os braços do meu pai, eu o quero
longe de mim.
— O que você está fazendo aqui? — pergunto e ele sorri para
mim, porém, antes que ele possa me responder qualquer coisa, eu
continuo. — Você não acha que está um pouco atrasado para
abraçar a sua filha? Filha que você abandonou? Filha que você
nunca nem mesmo fez questão de dar o sobrenome, porque não
combinava com o nome que minha mãe havia escolhido? A filha que
depois que você foi embora, deixou vários recados na caixa postal e
você nunca respondeu nenhum deles?
Ele estende as mãos e eu recuo um passo para trás.
— Se você quisesse mesmo me abraçar, você não viria atrás
de mim em um dia tão importante assim, então vai embora. —
Passo a mão no rosto, limpando a lágrima.
— Lottie...
— Vai embora! — vocifero, olhando-o nos olhos. — Você já
fez isso antes, então apenas dê a porra das suas costas para mim
outra vez, e vai embora!
Quando ele demora mais de dois segundos para fazer o que
eu peço, quem acaba se virando sou eu, e eu corro. Sem fazer ideia
de para onde eu vou, eu apenas corro, meu pulmão ardendo pela
falta de ar, meus olhos se desmanchando em água e a fúria
tomando conta de cada célula do meu corpo.
Porque um dos momentos mais importantes da minha vida,
acaba de se transformar em meu maior pesadelo.
— Charlotte! — Ouço meu nome e quando paro de correr,
encontro Alexander, e eu nunca pensei que poderia agradecer a
presença dele, como estou agradecendo mentalmente agora.
— Você pode pegar minhas coisas com a treinadora e me
encontrar lá fora? — pergunto e ele apenas anui.
— Você está bem?
— Eu só preciso sair daqui, Alexander.
Ele assente de novo e tão logo se afasta, voltando para o
mesmo corredor onde eu saí às pressas há tão pouco tempo.
Alex:
Saindo da academia em dez
Zach:
*vídeo anexado*
Se vc contar qualquer coisa ao Alexander sobre o que acaba
de acontecer, toda a internet terá acesso a esse vídeo
[1]
Tradução livre: boca suja, no sentido de falar coisas obscenas.
[2]
GQ (originalmente Gentlemen's Quarterly) é uma revista mensal sobre moda, estilo e
cultura para os homens, através de artigos sobre alimentação, cinema, fitness, sexo,
música, viagens, desporto, tecnologia e livros.