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2 Por Acaso, Voce. (Duo. Amores de Minas) - S. Evans
2 Por Acaso, Voce. (Duo. Amores de Minas) - S. Evans
S. Evans
Copyright© 2023 S. Evans
1ª Edição
Capa: L.A Designer Editorial
Revisão: Miriã Menezes
Diagramação: S. Evans
Leitura crítica: Camila Rodrigues
Leitura sensível: Maria Eduarda Pereira da Silva
CONTEÚDO ADULTO
Esta obra trata-se de uma ficção. Nomes, personagens e
acontecimentos descritos foram produzidos através da imaginação
da autora. Torna-se mera coincidência fatos que se referem à
realidade.
De acordo com a lei nº 9.610/98, dentro do artigo 184 do código
penal brasileiro, torna-se crime cópia total ou parcial, por quaisquer
meios existentes, sem prévia autorização da autora.
NÃO RECOMENDADO PARA MENORES DE DEZOITO ANOS
Essa obra contém:
Sexo e nudez: Sexo explícito; indução ao ato sexual; masturbação.
Linguagem: Linguagem imprópria e/ou pejorativa.
ATENÇÃO ALERTA DE GATILHO
Esse livro foi escrito com muito carinho, os temas abordados não
foram aprofundados / descritos graficamente, para que gatilhos não
fossem acionados, no entanto a obra CITA: violência obstétrica.
O personagem principal da trama, Carlos Eduardo, passa por
situação de racismo, e a obra foi submetida a uma leitura sensível
sobre o tema .
Edição Digital | Criado no Brasil
Nota da autora
Playlist
Dedicatória
Epígrafe
Prólogo
Parte I
1 - Por acaso, a infância.
2 - Por acaso, a adolescência
3 - Por acaso, a juventude.
4 - Por acaso, a primeira vez.
5 - Por acaso, a decepção.
6 - Por acaso, a rejeição.
Parte 2
7 - Por acaso, a volta.
8 - Por acaso, ele.
9 - Por acaso, Henrique.
10 - Por acaso, o usurpador.
11 - Por acaso, a dona da porra toda.
12 - Por acaso, Belo Horizonte.
13 - Por acaso, o prazer.
14 - Por acaso, a reconexão.
15- Por acaso, o caos.
16 - Por acaso, a mamãe.
17 - Por acaso, o Dudu.
18 - Por acaso, a exposição.
19 - Por acaso, nós dois.
20 - Por acaso, o acidente.
21 - Por acaso, a selva.
22 - Por acaso, a utopia.
23 - Por acaso, a trégua.
24 - Por acaso, o pandemônio.
25 - Por acaso, os laços.
26 - Por acaso, o cabresto.
27 - Por acaso, a festa.
28 - Por acaso, o motivo.
29 - Por acaso, a confissão.
30 - Por acaso, a desconfiança.
31 - Por acaso, a bagunça.
32 - Por acaso, o aniversário.
33 - Por acaso, a consciência.
34 - Por acaso, a estranha.
35 - Por acaso, a demissão.
36 - Por acaso, a ligação.
Parte 3
37 - Por acaso, a hipótese.
38 - Por acaso, a verdade.
39 - Por acaso, o filho.
40 - Por acaso, as lembranças.
41 - Por acaso, a simplicidade.
42 - Por acaso, o plano.
43 - Por acaso, o pedido.
44 - Por acaso, o amor.
Epílogo
Lua de mel em família.
Agradecimentos
Vem aí
Sobre a autora
Olá, leitora, como vai?
Esse livro é um pouco diferente dos que eu geralmente trago, sei
que disse isso em Seleção do Amor, mas é verdade.
Desde que estou inserida no mundo dos romances nacionais, leio
histórias incríveis, com ambientações fantásticas, hots de tirar o
fôlego, e isso é divinamente maravilhoso. Mas sempre senti falta de
livros que se passassem no quintal de casa, no meu caso, em MG.
Quando Nicolas e Loren surgiram para mim, em Seleção do Amor,
numa das cidades que mais amo no mundo, Ouro Preto, fiquei
extasiada e animada do começo ao fim, porém ainda senti que fiquei
devendo mais da performance mineira na literatura nacional, e aí
surgiram o Cadu e a terrível Stella.
Romances de segunda chance têm um lugar especial em meu
coração, e uma cena revive em minha mente desde antes de eu ser
uma escritora publicada. Essa cena tornou-se o prólogo desse livro
— um pouco modificado, mas perfeito dentre as peculiaridades da
história.
Minha intenção não foi escrever um romance regionalista, porém
alguns trejeitos, formas de falar, entre outros elementos precisaram
estar dentro do texto, sempre sinalizados em itálico, para fazer
sentindo na ambientação.
Então, aqui, vocês terão um romance nacional do início ao fim, e
mineiro em cem por cento. Da autora à ambientação total. Espero
que gostem.
Ao ler esse livro, espero que se lembrem que existem três versões
da mesma história: a do Cadu, a da Stella e a sua — que pode te
levar do amor ao ódio por diversos momentos da leitura, afinal esse
é um livro friends to enemies to lovers.
Sem mais delongas, gostaria de lhe deixar ciente: “Amores de
Minas” é uma duologia oposta (sem obrigatoriedade do livro I ou
ordem de leitura), se em “Seleção do Amor”, te entreguei meu amor,
aqui estou entregando meu ódio, mas lembre-se que esses
sentimentos andam lado a lado.
Dito isso, espero você na última página!
Boa leitura.
Essa obra contém uma playlist disponível em plataforma digital, para
acessar basta clicar aqui.
“O amor perguntou ao ódio:
— Por que me odeias tanto?
E o ódio respondeu:
— Porque um dia muito te amei.”
Autor desconhecido.
Para todas as pessoas que precisam de uma segunda chance, seja
ela qual for.
“Te odeio
Mas se ligar
Eu vou na hora
Eu jogo meu orgulho fora
E ainda te imploro pra voltar
(...)
Eu não quero ir ai
Mas eu vou
Eu não quero te beijar
Mas quando eu vi minha boca já beijou
Eu não quero ir ai
Mas eu vou
Eu não quero te amar
Mas quando eu a gente já se amou”
Dennis DJ & Luan Santana
Itaúna, Minas Gerais, Novembro de 2022.
Abro a porta de seu escritório, no mesmo rompante que
entrei nessa mansão, pouco me importando se estou molhando a
porra do carpete importado, ou se a madeira será danificada por eu
estar encharcado da chuva que me acompanhou de Belo Horizonte
até aqui.
Stella está trabalhando a essa hora, como sempre faz.
Ela se assusta, pois, nesse horário e debaixo desse
aguaceiro, todos os empregados já estão recolhidos. Quando
percebe que sou eu, veste sua carapuça antiCarlos Eduardo,
somado a isso tem sua melhor roupa de desdém.
O caralho da camisola longa de seda rosa, com um robe da
mesma cor por cima, através dos quais eu consigo ver os bicos dos
seios da Diaba túrgidos e o colo arrepiado.Só de vê-la minha boca
seca, meu coração dispara, juro que posso senti-la em cada mísera
célula do meu corpo, e sempre foi assim, pois acredito que desde o
dia que a conheci, amei-a em cada minuto da minha vida.
— Carlos, diria que é um prazer ou simplesmente diria boa
noite, mas já passamos dessa fase. São quase 23h, o que diabos
você faz aqui, a essa hora? A contabilidade não entrou em contato
com você?
— Eu não estou aqui por isso. Vim resolver uma situação
entre nós dois que já posterguei muito.
— Bom, não tenho mais nada para tratar com você … se não
está aqui pela demissão, então neste momento está invadindo a
minha propriedade, posso chamar a polícia e… — ergo o envelope
timbrado e lacrado pelo laboratório de análise, coloco-o em sua
mesa.
— Este envelope contém um teste de DNA que eu fiz com o
Henrique. — Vejo-a prender a respiração e olhar-me de boca aberta.
— Estou aqui, humildemente, Stella, te dando o benefício da dúvida.
Você tem duas opções: me conta a verdade e eu não abro o
envelope, nós dois sentaremos e conversaremos como dois adultos
que somos, ou abrirei esse envelope e, dependendo do resultado,
nós dois iremos à justiça e resolveremos isso perante um juiz. —
Vejo-a respirar com mais rapidez, ela engole em seco e, teimosa
como é, ergue o pescoço esguio, me olhando profundamente,
fazendo com que mais uma vez me perca nesse mar de chocolate
que são seus olhos.
— O que me garante que você ainda não abriu esse
envelope e está aqui para me chantagear? — Ela se levanta da
cadeira e circula a mesa.
— Não preciso do seu dinheiro, Stella. Ao contrário de você,
não priorizo o valor da conta bancária, não dou valor a classe social
ou a nenhum outro status.
— Não ligo para isso que você está dizendo, ligo para
caráter, e está aí uma coisa que você NÃO TEM, Carlos Eduardo —
Stella altera o tom da voz. Ela já gritou muito comigo quando pagava
meu salário, calei-me, mas agora não mais.
Cada vez mais, minhas entranhas se reviram. Eu não
acredito nisso.
Porra, Stella, fala comigo!
— Você não liga mesmo para isso, Stella? Não foi isso que
aconteceu há dez anos! — altero o meu tom de voz, para igualar ao
dela. — Como você diz que não tenho caráter? Como tem coragem
de me acusar disso? Se esqueceu como eu sou? Caralho… já
deveria ter aprendido isso, porra.
— Você não me dá o benefício da dúvida para eu saber nada
sobre quem é!
— Puta que pariu, Stella! Você não vê o que está na sua
frente? Quando cheguei aqui, eu tinha cinco anos e desde lá é só
você, diaba, que toma conta da minha cabeça, e isso é ridículo,
porque logo vou fazer trinta anos, caralho. Você foi meu primeiro
tudo, Stella. Meu primeiro beijo, minha primeira mulher… Meu
primeiro e único amor, Stella, sempre foi e sempre será você. É por
isso que estou te pedindo, me fala a verdade, não deixe que um
pedaço de papel me conte algo tão importante.
— O que isso vai mudar na sua vida, Carlos Eduardo?
— Depende, Stella, isso não é sobre mim, é sobre você.
Porque, independente desse resultado, amo o Henrique, sendo ele
biologicamente ou não meu filho. E eu amo você. O que mais
preciso fazer para que entenda isso? — Ela me olha pelo que se
parecem horas e a única coisa que muda em suas feições é uma
lágrima que escorre por cada olho. Pego o envelope para abri-lo,
mas suas mãos frias e trêmulas cobrem as minhas.
— Por favor — ela diz tão baixo, que mal reconheço-a —,
não abra esse envelope, eu vou te contar…
Cadu Vieira
Cinco anos
Cadu 10 anos
— Stella, vamos! — Entro em seu quarto gritando, animado.
Mas paro quando vejo-a deitada na cama. — Nasceu mais
maritaquinhas no toco, a mamãe está lá alimentando elas!
— Não vai dar. — Ela abre um olho só, mas está mais pálida
do que costume. — Estou passando muito mal.
— Uai, o que aconteceu? — Aproximo da cama, e coloco a
mão na testa dela.
— Eu menstruei mês passado, e esse mês tá doendo muito.
— Há pouco dias a professora falou disso na aula, e não pareceu
nem um pouco legal.
— Vish, tadinha. — Passo as mãos nos cabelos longos dela,
ela sempre gosta quando faço isso. — O que eu posso fazer para te
ajudar?
— Nada, sua mãe já me deu chá, e minha mãe foi na cidade
comprar remédio.
— Posso fazer carinho, carinho sempre ajuda, ainda mais
que está frio. — Eu ligo a televisão do quarto dela, e levanto a
coberta. — Anda, arreda pro canto.
— Não, a gente já está grande para isso — reclama.
— E desde quando isso é problema? Vaaaaaai, Stella,
arreda! — Eu empurro ela para o canto e, sorrindo, me dá espaço.
— Por que tá rindo?
— Porque estou pensando que quando eu tiver um
namorado, vou ter que colocar vocês dois na minha cama.
— Ah… é só você namorar comigo.
— Carlos, não dá, você poderia ser um irmão para mim.
— Mas não sou, estamos muito longe disso.
— É sim.
— Não sou.
— Aff — ela bufa como uma vaca selvagem —, não vou
discutir com você. Estive pensando, já que não gosta do seu nome,
juntei os dois e fiz um apelido legal.
— Tenho medo disso, você tem um péssimo jeito para isso,
colocou o nome do potro de Floquinho.
— Ele parece um sorvete de flocos, mas é pequeno. — Ela
me empurra com os ombros. — Mas hein, ouve só: Cadu, assim não
te chamo de Carlos, mas a culpa é da sua mãe, não minha, e nem
de Eduardo. Juntei os dois.
— Cadu… Eu gostei disso.
— Eu sou ótima em dar nome, assuma.
Por horas ficamos ali, falando de várias coisas aleatórias. A
noite chega, fazendo Stella se contorcer de dor, e nada do
medicamento chegar.
— Vou lá na cozinha ver se sua mãe já chegou.
— Por favor, sinto que morrerei a qualquer momento.
— Meu Deus, Stella, que exagero.
Visto a blusa de frio e calço as pantufas dela, pois calçamos
o mesmo número agora, e vou até a cozinha.
Seu Vicente está sentado na grande mesa onde tomamos
café todos juntos, e está chorando muito. Minha mãe colocou um
copo na frente dele, está falando muito rápido e baixo, de forma que
eu não consigo entender.
— … Cê tem que falar com a menina Stella, seu Vicente, é a
mãe dela.
— Como? Como que eu vou falar com a Stella que a mãe
dela foi buscar um medicamento e morreu? — Meu coração dispara
no peito, no mesmo instante que lágrimas enchem meus olhos.
Morreu? A dona Lourdes morreu? Como assim?
Ela estava aqui agorinha.
— Eu já tinha falado com ela, Cida, muitas vezes, que não
era para deixar o carro aberto, que bicho entra, ainda mais no frio.
— Seu Vicente bate com a mão na mesa de madeira, fazendo um
barulho alto. — E agora, Cida? A Stella acabou de fazer treze anos,
como que eu vou criar essa menina sozinha? Sem a Lourdes?
— O senhor está muito nervoso, o que o Tião falou?
— Disse que achou o Jipe jogado na margem da estrada,
quando ele reconheceu o carro, correu para lá, e a Lourdes estava
fria já, ele escutou o chocalho, mesmo assim tirou ela do carro.
Lourdes nunca dirige descalça, tá sempre de bota, hoje fez isso, e a
marca da desgraçada está lá no pé dela. E foi há horas, Cida, horas.
— Mãe? A minha mãe? — Eu não escutei os passos de
Stella, olho e vejo-a de meias, por isso levo um susto quando ouço
seu arquejo dolorido. — A minha mãe morreu?
— Tella, calma. — Vou até ela e a abraço.
— Minha mãe morreu, Cadu? — ela agarra meu pescoço e
solta o peso do corpo, levando ambos a escorregar pela parede até
o chão frio.
Seu choro doloroso é o barulho mais medonho que já ouvi na
minha vida, até agora.
Stella Macedo
Dezesseis anos
Minha mãe estava igual pinto no lixo, ligou para vovó em Belo
Horizonte e para minha madrinha que também mora na capital.
Estou deitado na minha cama, quando sinto o celular vibrar
debaixo do travesseiro, desbloqueio e vejo a SMS de Stella,
pedindo para encontrá-la no celeiro.
— Mãe, vou no celeiro com a Stella.
— Leva a lanterna e guarda-chuva, cê sabe como é.
— Já peguei!
Desço cuidadosamente na grama molhada pelo sereno, e
vejo uma luz fraca no celeiro ligada. Empurro a porta, e vejo-a
sentada sobre um colchonete coberto com uma manta florida.
— Você sabe que vai chover, certo?
— Sim, por isso tranca a porta, você sabe que ela abre à toa.
— Sim, senhora, dona Stella. — Faço o que ela pede, tiro as
botas e ainda de meias sento ao seu lado. — Para que me chamou
aqui?
— Quero passar um tempo com você. — Ela encosta a
cabeça no meu ombro.
— Tella, eu não vou morrer, sabe? Ainda virei nos feriados e
férias.
— Promete?
— Prometo — levanto meu dedinho para que ela enrole o seu
no meu e sorrio.
— Trouxe uma coisa para você. Presente. Fecha os olhos e
abre a mão. — Essas coisas de fechar os olhos e abrir a mão com
Stella, nunca foi coisa boa. A contra gosto faço o que ela pede. —
Pode abrir.
Mas que…
— Isso é uma camisinha?
— Lógico!
— Stella! Meu Deus, você não conhece o limite?
— Uai, foi você quem disse que era virgem hoje à tarde!
— Onde você tirou isso?
— Da minha bolsa, oras!
— Você já… — só a possibilidade já estremece meu coração
— Claro. — Mas é a confirmação que o parte em pedaços.
— Tenho vinte anos, e esse é meio que um rito de passagem para a
vida adulta, e como falei mais cedo, a faculdade proporciona coisas
que nunca imaginamos viver na vida.
— Hmm, valeu então.
— Você está com aquela cara.
— Qual cara?
— Aquela que estava com vontade de perguntar alguma
coisa quando eu te ajudava com o dever de casa.
— Não é nada.
— Claro que é, fala logo.
— Foi com quem?
— Com o Leo, mas só a primeira vez. — Claro! Stella é tão
inteligente, como que foi perder a virgindade com o Leonardo
Xavier?
— Teve mais de um cara então?
— Ah sim. — Que ótimo. — Não me olha com essa cara, olha
o machismo. — Cara de tacho? Porque deve ser essa que devo
estar fazendo. — Só os homens podem sair por aí pegando geral?
— Eu não falei isso.
— Mas deve ter pensado. Conheço bem vocês. Vai me dizer
que eu sou a única mulher que você já beijou? — É! Claro que é,
caralho! Que tipo de homem você pensa que eu sou, Stella?
Ninguém nunca tocou meu coração e suspeito que nunca irá tocar.
Isso é o que eu quero falar, mas acabo dizendo…
— Claro que não.
— Pois bem, sempre estou certa. Então vamos logo. — Ela
descruza as pernas, e se senta no meu colo.
— Vamos? Aonde exatamente?
— Uai, vou te ensinar a comer uma mulher… Você ainda
curte mulheres ou…
— Eu sou hetero, Stella — respondo-a quando ela se silencia
por alguns instantes. Mas como assim? — Me ensinar?
— Claro, te ensinei a beijar na boca, agora vamos avançar.
Vai por mim, nenhuma mulher sairá satisfeita se você masturbar a
uretra dela.
— Eu não estou te entendendo, Stella…
— Vamos transar, Cadu. Se você quiser, claro…
Nossa.
Senhora.
Ela não disse isso, não.
Vamos lá, Deus, me faz acordar.
Stella Macedo
Vinte anos
Estou sentada no colo de Cadu, e ele me observa como se
eu tivesse criado chifres.
— Cadu?
— Merda, você falou mesmo o que eu pensei ter ouvido?
— Sobre você perder a virgindade? — ele concorda — Sim!
Sou sua amiga. Não quero que seja um idiota, entrou, saiu, gozou.
Então estou me colocando à disposição para ser sua cobaia. A
menos que não queira, e esteja guardando isso para uma
namorada…
— Não, eu só moro no interior, estudei num colégio elitista e
fiz um total de zero amizades.
— Pois bem, você pode começar me beijando e tirando
minha roupa. — Cadu está estagnado.
Tenho que fazer tudo por aqui?
Coloco a mão na bainha de sua camisa e a tiro.
Nossa…
Quando nasceram esses quadradinhos?
Consigo ver o elástico da cueca boxer e sorrio para ele.
Inclino-me e começo a beijá-lo, primeiro castamente, para então
adentrar sua boca com minha língua ávida, sentindo o gosto de
pasta de dente, instantaneamente sinto-me abraçada por uma
sensação que me aquece, como saudade e pertencimento, é
estranho, mas completamente envolvente.
Parecendo acordar do torpor, Cadu aperta minha cintura,
como fez na tarde em que treinamos os beijos, força-me para baixo,
esfregando minha boceta em seu pau, que aos poucos endurece
embaixo de mim.
Ergo minha camisa, ficando só de sutiã em sua frente. Vejo-o
hipnotizado, sorrio, sem vergonha alguma, abro o sutiã — pois a
raiva que eu passo quando homens tentam tirá-lo, não está escrita
— e deixo meus seios desnudos à disposição dele.
— Nossa… Meu Deus, Stella.
— Sim, eu sei. Estão à sua disposição. Pode fazer o que
quiser com eles… — Timidamente ele levanta as mãos, grandes
mãos com veias proeminentes, e delicadamente roça meus mamilos
túrgidos, começa como calmaria, antes que perceba, Cadu toma
um em sua boca, passa a sugá-lo com fome, fazendo-me gemer
audivelmente.
Sinto sua língua envolvendo-o, lambendo sua volta, voltando
ao mamilo, brincando com ele, subindo e descendo a língua, até
colocá-lo sobre ela, fechar os dentes por cima e chupá-lo com fome.
— Tem certeza de que nunca fez isso? — gemo segurando
seus cabelos, impossibilitando de sair dali. Sinto seu sorriso e contra
a minha vontade, ele se afasta.
— Sou virgem, não idiota, tenho minha cota de fantasias
sexuais, livros e vídeos. — Antes que eu crie uma resposta atrevida
ao “sabe tudo”, ele passa a dar o mesmo tratamento ao outro seio.
Até o momento nenhum cara deu muita importância a essa
parte do meu corpo, estou eufórica, com a libido subindo cada vez
mais, porque descobri que gosto bastante dos meus peitos sendo
valorizados.
Céus, eu sou uma safada! Estou recebendo uma mamada e
gostando!
Sinto seu pau totalmente, pelo menos acho que sim, rígido
debaixo de mim. Abro minha fivela enquanto rebolo em seu colo.
Delicadamente Cadu empurra meu tronco para trás até estarmos
com ele em cima de mim. Seus dedos abrem o botão da minha
calça jeans, e é só para tirá-la que se afasta.
Minha calcinha pequena o faz sorrir — um sorriso perverso,
que jamais imaginei no rosto do meu melhor amigo, não dirigido
para mim. — Carlos parece perdido quando me vê quase
completamente nua.
Volto a agir, retirando eu mesma a calcinha.
Vejo-o apertar o pau sobre o short e cueca.
— O que você quer aprender? Você quer me chupar, me
tocar, ou meter seu pau em mim? Pode escolher.
— Eu quero tudo, Stella.
— Venha, vamos trabalhar suas habilidades oral e de toque
primeiro. — Abro minhas pernas, deixando que se aproxime. —
Corre o dedo por ela, reconheça seu parque de diversões.
Tremendo um pouco, vejo-o acariciar meus grandes lábios
com seu indicador, a aspereza do seu dedo me estremece. Sinto-me
ridícula, afinal, virgem aqui é ele. Calmamente, Cadu, afunda o
polegar entre eles, primeiro explora um lado, do início até o períneo,
sobe até o clitóris e repete no outro.
Não sei se o que me excita é o toque, a curiosidade ou o
reconhecimento que ele faz em minha vulva.
Quando satisfeito, vejo-o colocar o dedo médio e o indicador
em “V” nos lábios, para abri-los. Cadu admira-me, cuidadosamente
se abaixa, deixando sua língua correr de cima para baixo. Grunho,
ele me olha, e nego.
— De novo, eu gosto de ser lambida. — Ele sorri e faz de
novo, se demorando mais dessa vez. — O clitóris, dá atenção para
ele. — Falo baixo, Cadu sobe o olhar, vejo-o estudando-me,
buscando o que eu falei. Sua língua me toca de novo. — Mais para
cima — guio —, subiu demais, desce um pouco… Isso, mais para o
meio, aí, nesse lugar — quase grito, faço se assustar. — Desculpe,
é só cuidar desse nervinho, está sentindo-o endurecido? —
Milimetricamente vejo-o concordar com a língua parada.
Sua língua desliza ali, sem se afastar muito, e fico perdida
entre achar fofo — toda a atenção e cuidado com que ele me chupa
— ou sentir tesão — pelo mesmo motivo. Sinto-a rodopiar e
discordo, parece uma furadeira, vejo-o voltar a posição de antes,
com mais calma, mais lentidão. É estranho pois estou lisonjeada por
ser ouvida durante uma chupada.
Quase como uma câmera lenta, sinto meu clitóris ser
deliciosamente acariciado, de um lado para o outro, para cima e
para baixo.
Aprende rápido esse menino.
O lisonjeio se estende quando meu grelo está sendo mais
bem tratado por ele do que por mim mesma.
— Trabalha com os dedos também, Cadu — falo baixinho —,
pode meter enquanto me chupa. — O dedo da outra mão, junta-se
ao oral, e antes que eu fale, ele espalha minha lubrificação por toda
a minha boceta, e se estende ao períneo e ânus.
Seu dedo médio pincela minha entrada, fazendo uma volta,
lubrificando-se, para me penetrar.
Ergo o quadril, ele me olha, e só balanço a cabeça,
mostrando que estou gostando. Cadu começa a mover seu dedo
sem deixar de me chupar, mas sinto a falta de mais.
— Pode sugar com os lábios, é gostoso. Os dentes também,
vagarosamente… — Ele faz o que peço, fazendo-me lubrificar mais
a sua volta.
Passo a mover meus quadris em sua direção, mostrando que
quero mais. Mais de tudo que ele está fazendo-me sentir. Sinto
irradiar uma corrente elétrica gostosa pelos meus pés, subindo pela
pernas e coxas, se concentrando em minha boceta.
Gozo.
Estremecendo-me, gemendo, derramando em sua boca.
Mal acredito.
Nunca cheguei a um orgasmo com uma chupada.
Impressionada, deixo o sorriso débil aparecer em meu rosto.
— Foi bom?
— Muito, muito bom.
— Não está falando isso só para me agradar?
— Faça-me o favor, nunca fui mulher disso. Está de
parabéns. Nunca fez mesmo isso?
— E quando eu menti para você? — ele dá de ombros —
Posso ter treinado a língua em uma fruta ou outra, mas você nunca
saberá.
— Ew, sempre irei chupar uma laranja e lembrar de uma
boceta, obrigada por isso. — Rimos da nossa insolência, ele deita-
se do meu lado, apoia-se no braço e me admira.
— Você é tão linda.
— Ora! Obrigada. Você também é. Mas confesso que quero
te ver pelado. — Viro-me para ele, empurro-o para que se deite no
colchão, e puxo seu short e cueca, tudo junto.
Minha Nossa Senhora das bocetas não alargadas.
Que diabos é isso? — sinto que estou invocando entidades
nas horas que não deveria, mas…
— O que foi, Stella?
— Nó… Por que você não me disse que é pauzudo?
— Stella! — ele tenta se cobrir, mas seguro as mãos presas
na lateral do corpo dele. — Ele é normal!
— Vai por mim, né nada! — Robusto, pesado, veiudo, grosso,
e fora da média. Esse é o pau de Cadu. A cabeça arroxeada,
babando, faz eu querer chupá-lo, e sem pensar levo-o à minha
boca. Sugo-o, limpando todo o líquido que está ali, ouço o barulho
gutural da sua garganta e sorrio — Olha, não se acostume, eu não
chupo ninguém, mas como foi atencioso com a sua boca em mim
farei o mesmo com você.
Sem esperar uma resposta, começo a chupá-lo de verdade.
Acompanho sua veia com a língua, descanso-a nas bolas, engolindo
uma, depois a outra, subo até o prepúcio, onde dou sugadas longas
e ritmadas.
— Não faz assim, vou gozar.
— O quê?
— Stella, existe uma diferença de punheta para boquete,
sabia?
— E se eu quiser que você goze na minha boca?
— É só fazer isso de novo… — Diferente, ponho-o totalmente
em minha boca, uma vez e na segunda sinto o jato quente. —
Merda, desculpa, desculpa, rápido demais. — Vejo o desespero dele
e sorrio. Levanto a cabeça, limpando os lábios com polegar.
— Calma, Cadu, relaxa. Não estamos com pressa. — Deito
ao seu lado, vendo-o constrangido esconder seu rosto de mim. —
Para. Não se esconda. Somos amigos.
— Não deixa de ser constrangedor.
— Sabe qual a vantagem de se ter dezoito anos? — digo
acariciado o pau falecido, que vagarosamente deixa uns espasmos
na palma de minha mão.
— Não, qual? — beijo sua boca, com bastante língua,
barulho e saliva. Suas mãos me puxam para cima dele. Cadu tem
um jeito de pegar-me pela cintura que desestabiliza-me. Adiamos
minutos perdidos um na boca do outro, sinto-o relaxar,
vagarosamente vou tirando meus lábios dos dele.
— Que se recupera uma ereção bem rápido. — Aponto com
a cabeça para sua ereção entre nós, e ele sorri satisfeito. — Vou
deixar você por cima, para que consiga controlar, quando for
demais, mas não se acostume, ainda irei cavalgar em seu pau,
quem sabe em uma outra oportunidade.
— Então teremos mais?
— Pela sua chupada, você conseguiu uma segunda vez, se
for bom me comendo, o número é negociável. Sabe como colocar
uma camisinha?
— Ensinam isso na aula de biologia — ele diz ultrajado.
— Vamos nessa então, cowboy! — Vou engatinhando até
onde os pacotes estão esquecidos. Vejo-o suspirar, olhando para
minha bunda, seu pau erguido se mexe em minha direção. — Ainda
chegaremos nessa parte, não seja afoito. — Pisco para ele. Abro o
pacotinho e deixo o preservativo em sua mão. Observo-o apertar a
ponta, e desenrolá-lo como se fizesse isso o tempo todo. — Ora,
ora, quase um profissional. Venha, vamos tirar esse cabaço!
— Meu Deus, Stella, você não consegue ser séria nem nesse
momento?
— Desculpa! Quer carinho?
— Quero!
— É sério?
— Claro, é importante, poxa. — Vejo no seu rosto estampado
como ele está falando sério. Faço minha melhor cara séria.
— Desculpe. Venha, você por cima. — Ele morosamente
estende todo o corpanzil sobre mim, fazendo-me ser envolvida por
um calor gostoso, dando meu melhor sorriso de encorajamento. —
Não precisa se segurar ou ser delicado, mas lembre-se que se for
uma pessoa virgem, precisa estar atento. Pode vir.
Calmamente, sinto sua cabeça robusta adentrando-me.
Seguro em seus braços, olhando em seus olhos achocolatados,
perco-me, e só volto ao momento, quando vejo-o morder a boca,
percebo como estou cheia, minha boceta parece ter encolhido.
— Nossa, é difícil controlar.
— Respira fundo, pode ir com calma — Cadu assente, mas
passa a se mover, primeiro devagar, levanto minha perna a sua
cintura, fazendo-o gemer pois ele consegue se afundar mais em
mim. Aproveito o espaço, e passo a massagear meu clitóris,
seguindo o ritmo de suas estocadas, que não demoram muito
estarem rápidas e profundas. Acelero o toque em mim, sabendo
exatamente onde acariciar-me, onde gozo rápido.
Sinto o calor inundar-me, percebo que Cadu gozou, pois ele
desmonta-se em cima de mim, deixando espaço só para meu dedo
mexer-se, mas como estou próxima, gozo, satisfeita e feliz.
— Eu fiz de novo?
— Relaxa, eu gozei.
— Mesmo?
— Sim. Entenda que é absolutamente normal. — Beijo os
seus lábios, sorrindo, passeio com as mãos em suas costas suadas,
e vejo um brilho diferente no seu olhar. — O que foi? Não gostou da
sua primeira vez?
— Gostei! Demais! Acho que não poderia ser melhor.
— Servimos bem, para servir sempre. Você está me
esmagando — rio, pois seu corpo, muito mais forte e mais alto, está
relaxado sobre o meu.
— Desculpe — ela rola para o lado, suspira e então para.
Sentando assustado, olha para o meio das pernas.
— O que foi?
— A camisinha, ela sumiu. — Levanto-me na mesma hora, e
vejo seu pau sem nada. A porra do calor, não foi orgasmo?
— Merda, Cadu. — Levanto-me e não a vejo. — Onde essa
porra, foi parar?
— Será que ficou dentro de você? — Sua cara assustada me
faz querer rir, mas o momento inapropriado.
— Só pode ser! — deito-me e coloco o dedo buscando o
preservativo idiota. Posso sentir a abertura endurecida, mas meus
dedos não conseguem pinçá-la. — Está aqui, mas não consigo tirá-
la. Você terá que fazer. — Céus! Mal acredito que isso está
acontecendo.
Cadu coloca a cabeça entre as minhas pernas, e dessa vez
não está divertido. Sinto quando ele desliza o preservativo para fora
de mim, e ergue-o na minha frente.
Eu tento, juro, mas não consigo segurar a gargalhada.
Carlos me olha como se eu tivesse um parafuso a menos.
— Admita, foi engraçado.
— Stella, não é engraçado, você pode engravidar!
— Vou tomar uma pílula, relaxa. Agora já foi. Olha pelo lado
bom, nenhum de nós tem alguma DST[4].
— Por que você sempre olha as coisas por outro ângulo? —
Cadu se deita ao meu lado de novo.
— Porque para aquilo que não tem remédio, remediado está.
Sua mãe vive falando isso. Essas coisas podem acontecer. Nunca
ocorreu comigo antes, mas ainda bem que foi com você.
— Vou sentir saudades, Tella.
— É só você ficar — abraço-o e suspiro, por hora cansada de
todas nossas atividades coletivas. Beijo seu peito, e não sei quem
adormece primeiro, ele ou eu.
Cadu Vieira
Dezoito anos
Tec, tec
É o barulho que me acorda, levanto a cabeça para a
penumbra que está o meu quarto, e custo a entender que alguém
está batendo na minha janela.
Será que Cadu voltou?
Quando abro a janela, minha esperança se esvai, é só a
Luiza.
— Nossa, se eu soubesse que me ver te faria tão feliz, teria
vindo mais cedo.
— Desculpe — abro espaço para que ela pule e adentre o
quarto.
— E foi você quem me mandou uma mensagem, chamando-
me. Eu estava em uma festa muito louca da faculdade — ela se joga
na cama cansada —, com sexo em grupo.
— Desculpe.— Deito-me ao seu lado.
— Eu entrei, escondida de madrugada, contei sobre uma
festa louca, com sexo louco e você pediu desculpas duas vezes. Vai
me contar o que está pegando, ou terei que arrancar de você? Sua
cara está péssima. Desembucha.
Esse é o sinal que precisava.
Eu falo tudo, tudo mesmo.
Desde o primeiro beijo, como foi, todas as sensações, depois
como as coisas passaram para um sentimento mais profundo, sobre
meu receio dele ir para tão longe, e então minha proposta idiota
sobre virgindade, e que visitamos o colchonete no celeiro mais
vezes do que pretendia.
E então, o teste positivo em fevereiro e essa noite, desde ele
gritar horrores comigo, meu pai, Leonardo.
Pela primeira vez na vida estou sendo detalhista.
— Porra.
— Olha só, Luiza, não é para você só falar isso. Só porra?
Estou matracando há duas horas aqui.
— E você não gritou de volta para o Cadu?
— Não.
— Isso não me parece em nada com você, Stella. De
verdade.
— Por quê?
— Porque a minha Stella, não assistiria a vida dela se
passando em frente aos seus olhos e não tomaria a frente.Você
nunca foi uma coadjuvante apagada, que só está ali para preencher
um espaço na cena.
— Minha cabeça está explodindo há horas.
— Eu deveria te dar um sermão por me esconder a gravidez,
sou sua melhor amiga, não o idiota do Leonardo…
— Eu estava desesperada!
— Mas, só porque você está carregando meu afilhado, será
poupada disso.
— Obrigada.
— Te desculpo, se me prometer que vai atrás de Cadu, nem
que tenha que bater de porta em porta até achá-lo. Sem gritos, sem
choros.
— Ele disse que não quer me ver nunca mais, que atrapalhei
a vida dele.
— E você disse que o salário dele não paga sua bota. Cê foi
mó escrota.
— Está de qual lado?
— O pau que dá em Chico, bate em Francisco, Stella. Estou
do lado dos dois, de um amor que acompanho desde a infância.
Vocês sempre se amaram. Não sei como isso tornou-se um amor
romântico, mas isso não vem ao caso. O fato é que ambos falaram
muitas coisas que conhecendo-os, pelo menos conhecendo você,
tenho certeza de que foi no calor do momento.
— Não queria falar aquilo, porra, sei que o Cadu vai
conseguir muitas coisas ainda, e o valor da conta bancária dele não
me importa, nem hoje e nem nunca.
— Essa é a Stella que eu conheço. — Ela segura minha mão
por cima das cobertas e então sorri. — Vou ser dindinha, meu Deus!
— Sim, não existe pessoa melhor para esse cargo — alguns
minutos se passam, e ficamos caladas. — Dormiu?
— Não, estou pensando em umas coisas que me contou.
Não é estranho essa história toda do Léo?
— Como assim?
— Cueca, Cadu, ele achar o Cadu…
— Você não é amiga do Leo também?
— Hmm.. sim. Mas a família deles é bem suja. Ainda não me
esqueci que a Júlia cortou as cordas da minha cela na competição
de hipismo.
— Mas eles são irmãos, não farinha do mesmo saco.
— Uma fruta não cai longe do pé, Stella. — Eu bocejo,
fazendo com que ela também o faça. — Vamos dormir, amanhã é
outro dia. Você vai atrás de Cadu, certo? Não seja a orgulhosa que
conheço. E desfaça esse pacto do demônio com Leonardo.
— Sim, para as duas coisas.
Respiro fundo, com tanto sono, que não sei qual de nós duas
adormece primeiro.
A única certeza que eu tenho é que irei acordar cedo e ir até
Viçosa.
Cadu Vieira
Itaúna, Minas Gerais, maio de 2022.
Inspiro e expiro profundamente e quase sinto-me ser
abraçado pelo cheiro do mato, a brisa de ar quente que só o centro-
oeste mineiro consegue transmitir.
Há mais ou menos vinte e três anos eu pisei aqui, ainda
moleque, agarrado na saia da minha mãe. Mesmo pequeno, lembro-
me de pensar “como saímos de Belo Horizonte para vir para o meio
do nada, mãe?”
Na época não entendia que minha mãe era viúva, tinha um
filho pequeno para criar, e os serviços informais do meu pai não lhe
concedeu uma pensão, nem algo do tipo.
Não sabia o quão impactante era para ela trocar nossa casa
de aluguel em um bairro humilde, mas bem quisto, por um barraco
na periferia. Eu não entendia quando mamãe chorava no fim do
mês, ou porque saíamos de um barraco para outro de uma periferia
para outra, pois mais uma vez não conseguimos pagar o aluguel.
Minha mãe tinha que fazer uma escolha: ou alimentar-me ou pagar
nossa moradia.
Quando uma senhora bonita e rica da zona sul ofereceu para
ela um empego em sua fazenda, dona Cida não pensou duas vezes
ao ouvir que não pagaríamos aluguel, alimentação e nem mesmo as
despesas básicas de água e energia.
Lourdes Dias, não sabe, mas ela foi nossa heroína sem capa.
Mal consigo imaginar o que seria de nós se tivéssemos
continuado na capital.
Aqui eu tive a melhor educação, algo que minha mãe só
cogitou me dar em sonhos.
Estudei em escola particular, na mesma da filha de dona
Lourdes e do seu José Vicente, eles custearam tudo, do uniforme à
mensalidade, sem nunca descontar míseros centavos da minha
mãe. No ensino médio, até mesmo um curso pré-vestibular o
fazendeiro, na época já viúvo, pagou. E é graças a ajuda financeira
dele, somado ao meu esforço, que entrei para uma das
universidades mais conceituadas do país, a Universidade Federal
de Viçosa.
Tinha tudo para dar certo, a não ser pelo curso que eu tinha
escolhido. Zootecnia.
Brilhava-me os olhos aprender gerir o que na maioria das
vezes seria o sustento de uma grande fazenda, porém foi um pouco
tarde, quase no fim da graduação, que entendi que eu estava
totalmente errado, mais uma vez, na minha vida.
Mais do que fazer dinheiro em melhorias agropecuárias e
genéticas, gosto de cuidar dos animais.
E lá fui eu, abandonar o curso bem perto do fim, com o pé no
capelo e beca, fazer de novo a prova e ingressar no curso de
medicina veterinária.
Até então foi sucesso.
Percebi que sentia mais prazer em remover miíase do que
calcular valor de sêmem ou óvulo. Eu sei, não é nada agradável
para quem tem estômago fraco.
Encontrei minha paixão, me formei, mudei-me para Belo
Horizonte após a formatura, e comecei a trabalhar em uma das
clínicas veterinárias mais conceituadas da cidade, na zona sul, bem
no coração da Savassi.
Um salário ótimo, ainda mais para mim, que nunca me
importei com plantões noturnos, e até mesmo trocava com os
colegas os fins de semana, fazendo uma renda extra que me
permitiu comprar minha picape Strada 0km à vista.
Era para eu me sentir feliz, bastante feliz.
Mas o caso é que eu não estava. Nem um pouco, longe
disso.
Eu amo animais, isso não é discutível.
Mas nada ali me desafiava. Estava cansado de tratar alergia
alimentar, otite, depressão, insuficiência renal, gastrite, obesidade e
erlichiose[5] nos cães e gatos da família rica.
Meu trabalho voluntário em ONGs era o que mais me deixava
animado nos últimos tempos.
Uma vez questionei a Nicolas[6], meu melhor amigo, o que era
felicidade. E lembro-me como se fosse hoje, o cara mais inteligente
que conheci na minha vida, sorriu e respondeu:
— É só um estado passageiro, Cadu. Poderia ser como água,
em sua forma sólida nos polos, mas é como ela em estado gasoso,
frágil, rápida e passageira. Essa é a felicidade, então cabe a nós
aproveitarmos antes que termine de evaporar.
Foi pensando nisso, no pequeno lapso que é a felicidade que
decidi pedir conta, e aceitei o trabalho na Fazenda Vale dos
Periquitos.
Onde jurei nunca mais colocar os pés.
Quando, aos dezoito anos, juntei a mala de mão com minhas
roupas, não pensei que eu voltaria.
Jamais imaginei que voltaria depois de tudo. Essa é a
verdade.
Mas é como fala aquela música, vai que bebereis.
Aqui jazo eu, há vinte minutos rodando na estrada de chão
batido, levantando a poeira vermelha atrás de mim, deixando minha
picape branca pedindo socorro, um lava a jato e um esteticista
automotivo. Aliso o banco de couro, sintético, e suspiro
pesadamente.
Itaúna modernizou tanto nos últimos anos. Quando era
pequeno, lembro-me da primeira vista, não tinha um prédio, e para
mim que estava acostumado com a capital, foi um baque
significativo, e hoje, ao passar pelo centro, me senti em Belo
Horizonte por alguns instantes.
Mas foi por pouco tempo, minutos depois já é notável que
estamos no interior. A calmaria, os carros parando na faixa de
pedestre, sem um semáforo, deixando as pessoas atravessarem,
idosos sentados às 11h da manhã na praça jogando dominó, os
cumprimentos de cabeça e acenos de mão, deixa claro que todo
mundo se conhece, e os que não se conhecem, com certeza sabe
quem é seu pai, mãe ou algum parente seu.
Eu nem sabia que sentia falta, até rever isso.
Luan Santana chora no meu som, em uma versão mixada,
enquanto absorvo a paisagem, e curto meus últimos minutos de paz
e preparo minha áurea para rever a Demônia.
Começo a já fazer minhas preces a Nossa Senhora
Aparecida, pedindo que ela me abençoe, dobre minha paciência e…
Que porra é essa?
Misericórdia Mãezinha do céu, desculpa.
Uma égua branca, linda, está pastando na margem da
estrada, solta, sem nenhuma amarra.
Estaciono bem próximo da cerca marginal, e desço do carro.
Uma nuvem de poeira cobre meu vans old skool branco,
fazendo-me rir ao lembrar de Nicolas falando que eu não combino
com o campo.
É Nickinho, talvez eu precise me adaptar.
A fim de evitar um possível coice, aproximo-me da égua em
sua lateral, e vocacionado para que ela me olhe. Sem vontade
nenhuma, ela levanta a cabeça e me olha com desdém. Sua crina
está trançada diversas vezes, presa com tererê colorido. Observo-a
e percebo que se trata de uma Mangalarga Marchador. Pura,
aparentemente.
— Ei, moça — chego mais perto dela, vendo se ela aceita
meu toque, esticando a mão calmamente — o que você está
fazendo aqui sozinha, hein? Você pode causar um acidente. —
Toco-a, e ela inclina-se ao carinho. — Humm, você é carente, é?
Onde está o seu dono, hein? — Olho a sela cara que está
perfeitamente alinhada no dorso do animal. Passo a procurar algum
indício a quem pertence, até que ouço o farfalhar da mata fechada
ao meu lado.
— Tira a mão da minha égua! — A voz arfante e altamente
reconhecível, mesmo depois de tantos anos, faz meus pelos se
arrepiarem de gastura. — A capital te deixou surdo? Eu mandei tirar
as mãos da minha égua.
— Uma vez foi perfeitamente audível, Stella.
— Uai, o que tá esperando então? — Viro-me para sua voz, e
estagno ao olhar seu rosto.
Suas bochechas estão coradas, a única covinha que ela
carrega do lado direito não está aparente, mas as sobrancelhas
marcantes estão franzidas e o rosto tenso fazem a boca larga e de
lábios grossos ficarem mais proeminentes.
O cabelo longo demais, que na sombra parece ser preto, mas
ao sol sei que é castanho, está bagunçado, mesmo sendo liso com
leves ondulações, olho-a de cima abaixo e percebo que Stella Dias
Macedo parece intocada pelo tempo. Ainda reconheço a moça de
quase vinte e um anos que quebrou meu coração, na mulher de
trinta e um anos parada na minha frente.
As vestimentas também parecem não ter mudado nada, mas
isso faz é tempo, desde que me lembro dela, é a mesma coisa: uma
bota de montaria, que compraria todo meu guarda roupas com
certeza, uma calça jeans skinny, às vezes — muito raramente —
uma flare, um cinto largo, com a fivela oponente na frente, uma
regata de cor clara na primavera e verão, que ela substitui pela
camisa xadrez de flanela escura no outono e inverno. Na cabeça
sempre tem um chapéu tradicionalmente branco, ou um boné com o
brasão da Fazenda, raro são os momentos em que ela está com os
cabelos soltos como agora, o que eu estranho.
— Achei que você tinha ido estudar, mas voltou mais
ignorante do que foi, não sabe o que é soltar uma égua, diabo?
— Desculpe, eu… Quer dizer, desculpa nada! Eu estava
tentando tirar a égua da estrada, preciso passar.
— E tirou essa carteira onde, hein? Quer que eu tire o carro
para você? As autoescolas de Belo Horizonte não ensinam a
desviar de obstáculos? — Respiro pesadamente, engolindo a raiva
que seca a minha garganta. Ela já está próxima a mim, e pega a
guia da égua.
— Não vou gastar meu tempo com você, Stella. Ótimo que
chegou, tira a égua da estrada, e pronto… Vou seguir caminho.
Aliás o que você estava fazendo no meio da mata?
— Não sabia que te devo satisfação, e você pensa que tá
indo onde?
— Eu também não te devo satisfação nenhuma. — Olho-a de
cima. Por mais que Stella tenha 1,70m, eu supero sua altura, em
dezesseis centímetros.— Mas se quer tanto saber da minha vida,
estou indo para a Vale dos Periquitos. — Sua boca se abre como
quem irá começar uma briga, e minhas costas tencionam, pois sei o
que essa boca é capaz, tanto para o prazer quanto para me destruir.
— O que você está indo fazer na minha casa?
— Uai, Stella, seu Vicente não te contou? Prazer, Carlos
Eduardo, médico veterinário responsável pela Vale do Periquitos. —
Sorrio de satisfação ao ver o choque em seu rosto.
— O quê? Como assim? — Ela me mede de cima abaixo e
balança a cabeça desacreditada. De repente começa uma crise de
risos descabida, em segundos está gargalhando. — Não sabia que
era comediante, Carlos, você tem futuro. — Eu odeio que me chame
de Carlos, a Diaba sabe disso.
— Não estou entendendo os risos, Stella.
— Você se olhou no espelho hoje?
— Várias vezes.
— Pois deveria voltar, pois essas roupas de mauricinho, além
de ridículas, não dão credibilidade nenhuma a essa história sem pé
nem cabeça que está contando. Eu sou responsável por contratar e
demitir, e você é a última pessoa que contrataria. Quer dizer, nem
assim, eu mesma ingressaria na faculdade de medicina, me
formaria, ao invés de deixar meus animais sob o seu cuidado.
— Que bom que foi seu pai então que me contratou, eu
odiaria ter que ver sua cara todos os dias.
— Olha aqui, seu…
— Dona Stella, seu chapéu e seu topper... — Um rapaz
musculoso, vestido tipicamente como um peão da fazenda, porém
um tanto desalinhado surge do lugar que ela saiu há pouco. Olho
para seu cinto, percebo que ele está torto e com a fivela larga
parcialmente aberta, fixo os olhos na regata, e posso ver o relevo
dos bicos de seus seios.
Como dois e dois são quatro percebo o que eu ainda não
havia concluido. Stella estava transando na mata, com um cara que,
por nomeá-la como dona Stella, deve ser funcionário na fazenda.
Mordo o lábio, eu preciso do emprego, evitando que os
dizeres mais esdrúxulos saiam da minha boca.
— Você estava transando no meio do mato, Stella?
— Não lhe diz respeito minha vida, Carlos. — Minha bile sobe
à garganta e eu a engulo, mas isso não evita que sinta o gosto
amargo na boca. — Mas estava sim, e você como o belo empata
foda que é, veio mexer na minha égua.
— Você não tem vergonha não? Stella, se você me escutou
conversando com o animal, estava logo à margem da mata, e
ainda…
— E daí?
— Quer saber? Você está certa. Foda-se. Só espero que no
meio você tenha esfregado sua boceta num monte de aroeira[7], que
se coce inteira, e…
— Quem você pensa que é? Carlos… — um ônibus escolar
se aproxima, trazendo a nuvem de poeira, para ao se aproximar de
nós, e buzina. — Merda.
— Oi, mãe — um garotinho coloca a cabeça para fora e
balança o braço — posso descer aqui e ir de garupa?
— Oi, amor, não a mamãe está trabalhando, desce em casa,
a Cida está te esperando para o banho e almoço. Já vamos tirar o
carro e a égua, Solange — ela sorri simpática para a motorista.
— Tudo bem, dona Stella — a motorista sorri simpática.
Pelo jeito, nada mudou por aqui.
Stella tem tudo que quer, na hora que quer.
E antes que Stella volte a bater boca comigo, viro de costas e
entro no carro, dando partida, acelerando bastante para subir toda a
poeira nela.
Pelo retrovisor vejo ela montando na égua, e o peão logo
atrás dela.
Minha Nossa Senhora Aparecida, eu estava fazendo uma
prece, me desculpa a interrupção, mas essa capeta me tira do sério.
Me ajuda a aguentar essa mulher, pelo amor que a Senhora
tem a mim.
E pensar que nunca me esqueci desses olhos achocolatados.
Stella Macedo
Ainda estou tremendo quando desço da minha égua na porta
de casa.
Não, meu pai não faria isso comigo.
Não é possível.
— Valentino, guarda a Lua pra mim — falo entregando as
rédeas da minha égua ao capataz que acabou de descer da minha
garupa.
Valentino é um homem bonito, tem trinta e cinco anos, e
quando preciso de alívio sexual, grande parte das vezes, é ele quem
me auxilia. Sua pegada é forte, as mãos são ásperas, e seu cabelo
grande é um charme a parte.
Às vezes tudo que uma mulher precisa é de um pau acima da
média e um copo d’água.
Mas na raiva que eu estou agora, nem se juntasse os paus
de todos os peões da fazenda e o rio São Francisco todinho, me
sentiria melhor.
Como meu pai tem coragem de fazer isso comigo?
E eu nem posso chamá-lo de fodido.
Vejo a picape branca do idiota, e a vontade que tenho de
jogar esterco nela, o que me reduziria a uma adolescente, é bem
grade.
Adentro a casa, virada no Jiraya, passo pela cozinha, e mal
vejo a cara de Cida, não acho Henrique por perto, imagino que está
no banho, sem pensar demais, arreganho a porta do escritório do
meu pai.
—... dir desculpas, eu não tinha o direito. — Ouço-o falando,
sem se importar que estou parada feito um furacão — De toda
forma, sei que já conversamos pelo telefone — ele e meu pai se
falam pelo telefone? — e por e-mail — meu pai responde os e-mails
dele? Porra, eu tenho que acessá-lo e responder os fornecedores,
porque papai diz que “quem precisar de mim, deve me ligar” — mas
gotaria de reforçar que sou enormemente grato por tudo que o
senhor e a dona Lourdes fizeram por mim, e se hoje sou médico
veterinário, foi porque vocês investiram em uma excelente educação
para mim.
— Carece disso não, Carlos, ocê e sua mãe são da família.
— Carlos está de costas para a porta, e meu pai está despojado,
como uma galinha ao sol, em sua cadeira de couro, pernas
cruzadas sem nenhuma preocupação.
Bato meu pé no chão, esperando que eles me notem.
— Pai — chamo, antes que ele resolva continuar batendo
papo, como se tempo não fosse dinheiro —, bença — aproximo-me,
e beijo sua careca.
— Deus te abençoe, onde que cê tava?
— Medindo terra com o Valentino. — Vejo Cadu balançar a
cabeça em negativa e bufar como um boi bravo — ele nunca saberá
que na minha cabeça ainda o chamo assim.
— Voltou rápido, uai, mas ainda bem que chegou, contratei
um médico veterinário, o último cê deu cabo nele.
— Eu não. Ele. Matou. Meu. Touro. Procriador — estou
cansada de repetir essa história. — Mas falei que ia contratar, já até
entrevistei, pai. Joaquim começa amanhã. — Bom, depois que eu
ligar e informar que o emprego é dele, mesmo que ele não me
passe muita segurança.
— Não tem problema, a fazenda é grande, precisa de mais
de um, e Carlos conhece aqui como a palma da mão. E cê olhou o
tal do biólogo pra cuidar da praga?
— Sim, Luana começou ontem.
— Bom, então não tem pendência, leva o Carlos para o
Matheus, tem uma papelada lá pra registro e pega a documentação
dele e manda pra Luiza em BH,e…
— A gente pode conversar a sós antes? — interrompo-o, não
quero discutir a demissão desse babaca na frente dele. Tenho ética.
— Vou ver a minha mãe e descer as malas — Cadu se
levanta, entendendo o recado.
— Gracinha preparou o quarto de hóspedes pro cê, é do lado
do quarto do Henrique, espero que goste.
— Seu Vicente, não precisa disso, posso dormir com minha
mãe, tranquilamente.
— Claro que precisa, cê já é homem, não pode ficar
dormindo com a sua mãe. No alojamento está cheio, e como cê é
cria daqui, não tem problema ficar dentro de casa com nós.
— Então muito obrigado. Vou deixá-los a sós.
— Pode chamar Gracinha, ela te leva ao seu quarto, e fica à
vontade. Bem-vindo de volta. — A porta mal se fecha, e já paro na
frente do meu pai.
— Como assim, você contratou o Carlos Eduardo, pai?
— Uai, ainda não me aposentei, ainda sou dono dessa
fazenda. Qual o problema?
— Você não pode me delegar uma função e cuidar dela.
Como vou dispensar o Joaquim agora?
— Já falei pra contratar o menino, uai.
— Dois veterinários? A documentação pede um.
— Se a gente tivesse dois, não estávamos nessa peleja,
Stella.
— Por que tinha que ser o Carlos? Não conhece mais
nenhum veterinário? Nessas bandas é o que mais tem.
— Stella, não tenho que justificar minhas decisões procê. Eu
tava tomando café esses dias, e a Cida tava no telefone, de vídeo,
com o menino. Ouvi o papo deles — meu pai agora é fofoqueiro, era
só o que me faltava mesmo. — O menino tava procurando um
emprego e era questão de dias até cê espantá o coitado do médico,
pois fui lá e fiz a proposta. Resolvido. Mas me diga, qual é o
problema com o menino da Cida? Ele te fez alguma coisa? Quer me
contar algo, fia?
É sempre esse mesmo questionamento. Há dez anos eu
ouço: Quer me contar alguma coisa?
— Não tenho — digo firme —, mas não quero trabalhar com
ele, eu o odeio.
— Mas por quê? O que aconteceu? Cês não eram unha e
carne, Stella? O Eduardo é um menino bom, confiável, generoso…
— quem vê cara, não vê coração mesmo, céus! — Sempre pensei
que ele seria meu genro. — Minha garganta seca na hora, e
engasgo com uma lufada de ar — Do nada, ele é a pior pessoa do
mundo?
Eu me recuso a abrir essa caixinha de Pandora.
— Não quero vê-lo.
— Simples, deixe-o trabalhar, não interfira no serviço dele. Só
apresenta ele o povo que precisa, e pronto.
— Você o colocou para dormir no quarto do lado do meu.
— E??? — suspiro frustrada e sento-me. Se eu sou teimosa,
só tinha uma pessoa a quem puxar, e ela está bem na minha frente.
Mamãe era tão maleável, pacifista. Mas aí eu tinha que puxar meu
pai. E entrar numa queda de braço, ou no caso: poder, com ele é
batalha perdida — Sabe, Stella, não tô convencido de que sei tudo
que eu preciso sobre ocê e o Eduardo.
— O que você precisa saber é que ele é um idota, egoísta,
egocêntrico, sem nenhuma moral e não honra nem o pau que ele
carrega no meio das pernas.
— Minha fia, por que tanta raiva? Seu coração é muito duro,
Stella, cê devia aprender a perdoar, sua mãe te ensinou isso. —
Sorrio sem humor, e quero dar uma resposta malcriada, mas limito a
lembrá-lo quem é meu pai.
— Falou o homem que comprou a fazenda de herança de
João Gomes Xavier, só porque ele beijou a sua namorada no ensino
médio. No caso a minha mãe. — Sua gargalhada alta faz com que
eu queira sorrir e quase esqueço que Cadu é o novo colaborador da
fazenda.
— Por isso eu disse: sua mãe te ensinou. Vai trabalhar,
Stella, cê fala que tempo é dinheiro.
— Vou ver o Henrique e já vou. — Levanto-me para seguir
minha vida, mas paro de costas quando ouço-o de novo.
— O seu problema Tella é achar que eu sou besta, e a Cida
também. Boa tarde.
Pronto.
Voltou.
A raiva todinha.
Por que diabos esse trem tinha que voltar ?
Inferno.
Seu Vicente poderia nos matar, ser um serial killer, que não
perceberia, pois todo o caminho de volta foi feito sem que eu note
onde estamos.
A chegada em casa foi silenciosa.
Toda a fome de comida que eu sentia se esvaiu, e fui direto
para o meu quarto.
Merda, não consigo acreditar que realmente aconteceu.
Como eu posso amá-la ainda? Depois de tudo o que
aconteceu?
Porra, ela teve um filho de outro cara, e…
E daí, Carlos Eduardo? Foda-se.
O Henrique é uma criança tão adorável, carinhosa, esperta…
Mas você terá que amá-lo também, pois ele é parte da Stella.
E eu não amo cada parte dela?
Algum dia, deixei de amá-la?
Tem oito dias que vi Stella entrar em seu carro afoita, pedindo
que eu cuidasse de Henrique, e as poucas notícias que tenho é que
ela chegou bem, e que o prejuízo foi grande.
Ando fazendo tudo no automático, levanto, ajudo Henrique
com as coisas para escola, nos dias de natação e inglês o levo e o
busco, mesmo que ele tenha Bruno que já fazia isso. Acho que se
pudesse, amarraria o menino nas minhas pernas.
Sei que negligenciei o meu trabalho, e acabei
sobrecarregando Joca.
Mas aqui parece que todo mundo está sobrecarregado. Seu
Vicente tem "cansaço" escrito na testa.
Os búfalos irão chegar na semana que vem, e estamos
finalizando a limpeza do incêndio hoje a tarde.
Com se tudo isso me rondando, ainda tenho Nicolas, de
atestado há dias — e essa situação é preocupante demais, pois o
menino já foi trabalhar com infecção intestinal onde ele ia no
banheiro a cada duas linhas escritas no quadro — desde quando ele
deixou a Inglesa no aeroporto, suas redes sociais estão
depressivas, eu mesmo já até pedi para seguir Loren para conseguir
enviar uma mensagem direta, clamando que ela responda o coitado,
mas ela não aceitou a solicitação. Está deprimente.
— Dudu, posso tirar o Mandioca para fora? — Joaquim
gargalha no fundo pela frase dita pelo garoto. Idiota.
— Hoje é sábado, Rique, não são nem sete da manhã,— pois
a criança tem um relógio biológico afiado — não tem para quê pegar
o… Madioca. — Joaquim ri ainda mais alto.
— Por favor, Dudu, vou só deixá-lo pastar um pouquinho.
Vocês não estão fazendo nada de legal hoje, é um saco ficar nesses
computadores.
— Tudo bem, mas não monte nele, está ouvindo? Você ainda
não está pronto para isso.
— Tá bom! — ele sai saltitando e vai em direção aos
estábulos.
— Pegou o Mandioca hoje?
— Joaquim, pensei que tinha terminado a faculdade, mas
pelo jeito, mal saiu da quinta série.
— Sério, não consigo segurar, é muito engraçado, admita. Só
é aceitável porque ele é criança. Mas imagine só um adulto falando
que vai “montar no Mandioca”, “por o Mandioca para fora”, é cômico.
— Gargalho junto com ele.
Termino de preencher os dados de vacinação de todos os
indivíduos da fazenda no software que Stella comprou para integrar
toda a fazenda — quer dizer, terminei até Henrique resgatar mais
uma dúzia de animais e trazer as fêmeas prenhas para cá — e nem
acredito que cheguei ao último.
Passo a conferir os termolábeis, atualizando a planilha de
validade.
— Engraçado… — confiro a validade — Joaquim, você
conferiu a data de validade deste soro antiofídico quando chegou?
— Não foi você?
— Não, tenho certeza de que não estava aqui quando
chegou a geladeira e os insumos dela.
— Então se não foi você, fui eu. Por quê?
— A validade está muito próxima. Precisamos mesmo manter
isso? É um gasto.
— Precisamos, estamos longe demais da capital. Pelo menos
uma unidade.
Percebo que a sala está há tempo demais só com o ASMR[21]
do teclado de Joca e o zumbido da geladeira, por isso vou atrás de
Henrique.
A cena em minha frente, me paralisa. Rique está montado
sem sela nenhuma no pônei, e é com desespero que vejo o cavalo
receber o comando de Henrique e titubear.
Começo a ir na direção deles para não assustá-los, mas de
nada adianta minha cautela, pois o pônei manca, e não consegue
segurar o peso dos dois, e acaba caindo por cima de Henrique, e
meu coração para.
Cadu Vieira
— Cadu, tá tudo bem! — Camila, a pediatra do pronto-
atendimento, que inclusive fez inglês comigo, fala e sinto a bigorna
saindo do meu colo — foi só um susto, a queda foi baixa, se fosse
um cavalo normal seria perigoso. Sei que o cavalinho caiu por cima
dele, mas fiz todos os raio-x e eles não detectaram nada. Se ele
sentir dor, receitei um remedinho, mas vai ficar tudo bem.
— Cê não vai doar o Mandioca, né, Dudu? — Sua cara
assustada me amolece o coração que estava fechado de medo até
segudo atrás.
— Não, Henrique, claro que não. — Beijo sua testa, pego a
receita e os exames, preparando para despedir da médica. —
Camila, muito obrigado, de coração, nem sei como agradecer, você
foi tão rápida e eficiente!
— Magina, não precisa. — Ela toca meu ombro e sorri.
— Eu insisto, muito obrigado!
— Se insistir mesmo, podemos beber uma cerveja, colocar o
papo em dia. — Fico instantaneamente sem jeito, e sorrio, buscando
uma escapatória. Eu não sei mais lidar com mulheres, é isso
mesmo, Diaba? O pensamento faz com que eu queira sorrir, mas
seguro para que a médica interprete de forma errada. — O convite
não tem data de validade.
— Obrigado, pelo convite e todo o resto…
— Dudu, eu quero ver o Mandioca. — Henrique balança a
minha mão, puxando-me.
— Mas ando cheio de coisas para fazer, estou bem garrado.
Mas a gente se vê por aí. Precisamos ir. Obrigado por tudo. — Ando
lado a lado com ele até o carro — Como está se sentindo,
campeão?
— Bem, falei que não precisava de médico.
— Rique, você caiu do cavalinho.
— Mas ele quem está machucado, cê devia tá cuidando dele.
Vamos, quero ver como ele está.
— Estamos indo, rapazinho. Se aquiete.
Faço o caminho da cidade para casa com Henrique sentado
na frente, se sentindo o último biscoito do pacote, por ter idade para
isso. Ele vai o caminho todo mexendo no meu som, e reclamando
das minhas músicas.
— Olha só, estamos chegando e você não vai sair da minha
visão, estamos entendidos? Não queremos deixar sua mãe brava.
— Tá bom, Dudu. Nem precisamos contar para ela.
— Precisamos, sim. Omitir é mentira não dita.
— Aff. Tá, a gente conta. Será que ela chega hoje?
— Bem, uma hora ela tem que voltar para casa.
Antes que eu estacione corretamente, Henrique solta o cinto
de segurança quicando afoitamente no banco, esperando para
descer.
— Vamos, Dudu, o Mandioca não está bem.
Sigo o menino até o estábulo, e quando entro os animais
estão todos agitados nas baias batendo nelas, relinchando. Que
merda é essa?
— Henrique, faz um favor, querido, vai até o celeiro e chama
o Joaquim, fala para ele vir e trazer a maleta.
— Ai, meu Deus, o Mandioca vai morrer?
— Não, não é isso — disfarço sorrindo —, só não demora.
Começo a olhar para ver se vejo algo por ali, pois cavalos
não se assustam à toa, mas não encontro nada.
— Chamou? — Joaquim chega com Henrique.
— Sim, veja como os animais estão.
— Estranho, vamos ver baia a baia, vamos levá-los ao pasto.
— Posso ajudar? Por favor, gente! — Henrique se prontifica,
pegando a corda para começar a conduzir os animais para fora.
Percorro da primeira a oitava baia, achando estranho Lua não
estar ali, e quando abro, não é nada bom. A égua está deitada, com
a respiração arfante.
Ouço o guizo[22] que me estremece. Merda.
— Joaquim, onde está a Luana? — Meus olhos varrem a
baia, e a vejo em posição de alerta.
— No pasto.
— Tira o Henrique daqui, e chama ela, tem uma cascavel
aqui, e ela picou a Lua.
— Puta que pariu!
— Rápido, tira o Henrique.
Afasto-me com cuidado, sem nunca tirar os olhos dela,
procuro algum instrumento, alguma coisa que ajude quando a
bióloga chegar.
Luana chega até sem fôlego na porta do estábulo, com um
gancho nas mãos.
— Sorte eu sempre andar com isso e saber fazer manuseio
de serpentes. Pega um daqueles tonéis plásticos de 50l com tampa,
por favor, destampe e o coloque perto de mim, depois se afaste.
Faço o que ela pede, e a observo da porta, há uns seis
metros de distância, vejo-a estender o gancho, e o barulho da
serpente aumentar. Rapidamente Luana a coloca no tonel, e o
fecha.
— Prontinho. Só tem essa?
— Não sei, foi a que eu vi.
— Vou continuar aqui, já liguei para os bombeiros, devem
chegar a qualquer momento.
— Já posso entrar? — Joaquim pergunta olhando-nos da
porta.
— Sim. Chama aquele ridículo do capataz, e uns peões para
te ajudar a tirar os cavalos enquanto eu examino a égua.
Uma grande movimentação começa ali, e estou absorto em
meu trabalho. Ausculto os pulmões e percebo a contrição deles,
procuro pela picada, e a acho escorrendo sangue na pata traseira
esquerda.
Joaquim chega trazendo o soro e o suporte para mim, e a
coitada da égua nem treme ao ser perfurada.
— Cara, acho que você não vai gostar disso. — Joaquim grita
de algum lugar.
— O que aconteceu?
— O Mandioca tá mal. — Levanto rapidamente, e vejo-o
atendendo o pônei.
— Ele morreu? — perco o sentido das pernas, imaginando o
pior.
— Não, está vivo. Venha, me ajuda a ver se ele foi picado
também.
Estamos afoitos, buscando enxergar perfuração nos lugares
mais comuns quando esse tipo de acidente acontece, e então
somos tomados por um furacão chamado Stella.
— EU DEIXEI HENRIQUE COM VOCÊ POR OITO DIAS E
CONSEGUIU LEVÁ-LO AO HOSPITAL?
— Stella, ele está bem.
— NÃO GRAÇAS A VOCÊ. E AINDA O TROUXE SEM
CINTO DE SEGURANÇA?
— Stella — falo baixo —, a gente já conversa, não precisa
gritar, preciso cuidar disso aqui.
— PRECISO, PRECISO SIM. SAÍ POR MÍSEROS OITO
DIAS, E MINHA ÉGUA FOI PICADA, MEU FILHO ACABOU DE VIR
DO HOSPITAL, E…
— CALA A BOCA, STELLA! PARA DE GRITAR, VOCÊ ESTÁ
ATRAPALHANDO.
— NÃO GRITA COMIGO. EU QUERO UM PARECER
MÉDICO AGORA.
— EU NÃO TENHO UM PORRA. NÃO TEM COMO TE
FALAR COMO A ÉGUA VAI FICAR. SE SENTE BEM AGORA?
Preciso que o soro faça efeito, e…
— POIS TRATE DE FAZER ALGUMA COISA, QUERO UMA
RESPOSTA AGORA SE NÃO…
— Se não o quê? — levanto e deixo Joaquim sozinho,
arranco as luvas com raiva. — Fala.
— SE, CARLOS EDUARDO, SE QUALQUER COISA
ACONTECER COM ELA OU MEU FILHO, NÃO RESPONDO POR
MIM.
— O que você vai fazer? Vai me processar porque sua égua
foi picada por uma cobra e morreu? Adivinha? Todo mundo morre.
Vai caçar meu registro médico alegando isso? Boa sorte. EU DEI O
MEU MELHOR. Mas infelizmente a morte é um destino de tudo que
tem vida. Não fui eu quem coloquei a PORRA de uma cobra dentro
do estábulo — percebo as pessoas à nossa volta nos olhando. — E
sobre Henrique, eu dei o meu melhor, cuidei dele como se fosse
MEU FILHO, fiz tudo que pude, MAS ELE É CRIANÇA. CRIANÇAS
SE MACHUCAM, CARALHO.
— Vai continuar gritando? — olha em volta para os
empregados que nos assistem como um espetáculo caro.
— Parece que é só assim que você escuta. Não é a primeira
vez que questiona minhas ordens ou decisões médicas. Estou
cansado, cansado pra caralho.
— Não faria isso se eu confiasse em você. — Suas palavras
duras, sussurradas tão frias quanto gelo, me atingem de uma forma
inesperada.
— O que mais preciso fazer para que confie em mim? Me
fala, Stella, pois é insustentável viver com você assim. Essa
gangorra acaba comigo. Estamos bem em um dia, mal no outro.
Cansei de brincar de fogo e gelo com você, pois estou me
queimando já, Stella. Todas as palavras que podia te falar eu disse.
Admiti que te amo, estava bêbado, não em coma alcoólico, trato
bem seu filho, estou a sua disposição, e o que mais você quer
agora? Anos atrás o problema era dinheiro, meu salário não pagava
a sua bota, e agora? QUAL É A PORRA DO PROBLEMA?
— Cadu, eu… — aguardo que ela fale, mas Stella só me
olha.
— Você o quê, Stella? Fala. — Stella fica estagnada, me
olhando, e não fala mais nenhuma palavra. — Quer saber? FODA-
SE. Eu me demito. Já queria fazer isso há muito tempo, mas
protelei, porque sou idiota, e não é de hoje — sorrio amargo — Não
dá para ficar trabalhando com você no meu encalço, delegando
funções na base do grito sendo que você não tem nem mesmo a
mínima noção da medicina veterinária.
— O quê? Você não vai se demitir nada!
— Você não manda em mim.
— Larga de ser teimoso, você não tem lugar para ir.
— Eu vou para a casa do caralho. — Viro-me e saio,
entrando em meu carro, acelerando tanto que a poeira vermelha
sobe pelo quintal.
Quando Stella diz, não vou te dar vantagem, ela quer dizer
exatamente isso, sem nenhuma leviandade.
Deixei-a lidando com o que quer que fosse sobre o laudo da
perícia, e desde então estou sentado em minha mesa, com um
milhão de burocracias para resolver. Preciso coletar sangue de Lua
e Mandioca para análise de novo, para conferir o sistema
imunológico após o antiofídico, preciso providenciar a vacinação
obrigatória dos búfalos novos, e Joaquim ganhou uma semana de
folga pois deixei-o na mão por quase um mês inteiro.
Abro a porta do quarto de Henrique, mas já se passam das
22h30, e vejo-o esparramado na cama, com Milk e Abelhinha de um
lado, Tigrinho do outro. Sorrio para a cena, adentrando o quarto
para cobri-lo e beijar sua testa. Seus pequenos companheiros
continuam em um sono profundo.
A casa está silenciosa, minha mãe deita-se junto com as
galinhas, seu Vicente não muda muito.
A única porta aberta é do quarto de Stella, e tem uma luz
fraca acesa, encosto no batente, e vejo-a sentada em sua cama,
com uma maldita camisola longa, azul, dessa vez, lendo um livro.
— Posso entrar? — pergunto.
— Onde você estava? Não veio jantar.
— Minha chefe é adepta do: quem tem dó é instrumento
musical. Estava trabalhando.
— Ela é uma mulher esperta! Mas, já sabemos disso. Entra, e
fecha a porta.
— Estava me esperando? — faço o que ela pede, deito ao
lado livre da sua cama. Ela coloca seu livro de lado, e se vira para
mim
— Você disse que é simples assim, e eu estava esperando
que terminasse aquilo que disse mais cedo — sua mão começa a
acariciar meu braço, e não importa onde Stella me toque, a ligação
é direta no meu pau.
— Essa parte de nós dois é a mais simples, Stella… —
coloco minha mão na fenda da camisola, e arrasto meus dedos por
suas pernas, subindo em direção as suas coxas. — Pois o menor
pensamento que tenho de você me excita — puxo-a em minha
direção —, seu cheiro já está impregnado em mim, se fecho os
olhos, é a imagem dos seus seios que tomam-me — coloco o nariz
em seu pescoço cheiroso e inspiro. Stella não perde tempo e
avança sobre mim, beijando-me, adentrando minha boca com sua
língua, montada em meu pau endurecido e pedinte.
Minhas mãos entram na maldita camisola, e não encontra
nenhuma barreira no meio de suas pernas, gemo ao fundar meu
dedo entre os lábios molhados, e escorregadios de sua boceta.
Stella rebola em minhas mãos e grunhe em minha boca.
Viro-nos na cama, e a coloco sob mim, tomando controle do
beijo, penetrando-a com um dedo, e depois outro, alargando-a,
esfregando as paredes rugosas, tirando-os e colocando-os, ao
mesmo tempo em que paro de beijá-la.
— Cadu! Volta aqui!
— Calma, querida, não estamos com pressa. Quero te amar
e te foder a noite toda, não precisamos ter pressa, temos todo o
tempo do mundo. — Tiro os dedos encharcados dela, e lambo-os,
deixando-a atônita. — A cada vez que te provo, você fica mais
gostosa, quero ter acesso total ao seu corpo, vamos tirar essa
camisola. — ergo o tecido macio pelo seu corpo, e mais nada me
impede de vê-la.
Levanto sua perna, trazendo o pé para minha boca onde
começo a beijar o dedão, passo com beijos leves para a panturrilha,
e…
TAP, TAP, TAP.
— Stella, me ajuda, Stella! — paramos enrijecidos.
— Você ouviu isso? — Ela pergunta olhando para a janela de
madeira maciça. — Estou ficando doida? — ela puxa a camisola,
vestindo-a de novo, pegando o robe que está na cabeceira.
— Não, eu ouvi. Acho que devemos chamar a polícia, cadê
seu celular?
TAP, TAP, TAP.
— Eu ouvi você! Por favor me ajuda, Stella, socorro! —
reconheço o timbre da voz, mas não consigo defini-lo.
— Foi essa voz — ela arregala os olhos — que ouvi hoje
cedo, é muito igual.
— Não vou te fazer mal, vim te ajudar! — ao mesmo tempo
que escutamos bater na janela, batidas tomam a porta do quarto.
— Fia, o que é isso? — levanto-me e abro a porta para Seu
Vicente, que adentra o quarto com uma espingarda.
— Eu não, sei, eu…
— Sou eu, Stella, Leonardo. Abre aqui, eu posso explicar.
Stella Macedo
— Sou eu, Stella, Leonardo. Abre aqui, eu posso explicar.
Em um instante estou parada, tentando absorver e processar
o que acabei de ouvir, e no outro, é só o borrão de Cadu abrindo a
janela, e pulando-a.
Meu pai corre para ver o que está acontecendo pela janela,
enquanto fico congelada na beira da cama.
— Cadu! Solta ele! — papai grita da janela, mas a única coisa
que ouço são grunhidos e barulho de socos — ACODE, CIDA!
MISERICÓRDIA!
— EDUARDO! — ouço a voz de Cida no quintal. — SOLTA
ELE!
— Fia, pelo amor de Deus! Tira o homem de lá. — Meu pai
me sacode, e só assim corro pela casa abrindo a porta.
É como um déjà-vu. Eduardo em cima de Leonardo,
socando-o.
A diferença é que Léo está sujo, com barba e cabelos
gigantes, e todo maltrapilho e esquelético. Encontra-se tão magro,
mas tão magro que suas roupas dançam em seu corpo.
Cida tenta tirar Cadu, sem sucesso.
Bruno e Chico já tentaram puxá-lo, mas só levaram um
safanão dele.
— Ei, Cadu! — aproximo-me do embolo que são os dois, e
toco o braço dele — Cadu, solta ele! — Carlos parece não ouvir
nada — AMOR! SOLTA ELE CADU! SE VOCÊ FOR PRESO VAI
FICAR SEM A GENTE DE NOVO!
— Pai? PAI??? — Ouço a voz de Henrique, e só assim Cadu
parece raciocinar — POR QUE CÊ TÁ BATENO NO MOÇO? —
Cadu joga o corpo raquítico de Leonardo no chão, mas não
satisfeito, pisa no pescoço dele.
— Liga para a polícia, Stella! — Cadu fala baixinho — traz
umas cordas pra mim, Tião, por favor. — A respiração de Cadu é tão
alta que parece um boi bravo depois de uma briga.
— Amor… — me aproximo, e pego seu rosto — por favor,
solta ele. Meu pai está ligando para polícia — vejo meu pai
assentindo —, você está assustando nosso filho, para de apertar o
pescoço dele, ele não vai em lugar nenhum, solta, por favor. —
Cadu me olha em dúvida, e a contragosto solta-o.
— Eu quero matar ele de verdade, Stella — fala baixinho.
— Lembra-se do que conversamos hoje? Ele pode ser a
única esperança. Por favor, se acalme, Henrique está assustado, vai
com sua mãe, e bebe uma água, a polícia já vai chegar.
— Vem, fio — Cida parece menor ainda perto dele —, cê tá
todo sujo, e molhado.
— Esse filho da puta mijou em mim!
— Papai? Vem com a vovó. Tô com medo — Henrique pega
a mão do pai, e faz carinho.
— Vai, eu vou ficar, aqui, toma um banho, e dá um banho no
Henrique, por favor.
Vejo o contragosto e a dúvida estampados em seu rosto, mas
quando Rique o olha, Cadu concorda e vai com eles.
— O que é pra fazer, Dona Stella? — Tião aparece com umas
cordas, Bruno e Luiz a tiracolo.
Olho o rosto de Leonardo, completamente desfigurado,
manchado de sangue, cheio de rugas, nada normais para sua idade,
o corpo que um dia foi malhado não parece pesar mais de cinquenta
quilos, para um homem de 1,80m é muito pouco.
— Lava ele na ducha, vou pegar umas roupas para ele vestir,
sem condições de a polícia chegar e vê-lo assim. Já volto.