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Sociedades Ágrafas e

História Antiga
Prof. José Antonio Teófilo Cairus
Prof. Simão Henrique Jakobowski

Indaial – 2021
2a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:
Prof. José Antonio Teófilo Cairus
Prof. Simão Henrique Jakobowski

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

C136s
Cairus, José Antonio Teófilo
Sociedades ágrafas e história antiga. / José Antonio Teófilo Cairus;
Simão Henrique Jakobowski. – Indaial: UNIASSELVI, 2021.
207 p.; il.
ISBN 978-65-5663-598-9
ISBN Digital 978-65-5663-597-2
1. História antiga. - Brasil. I. Jakobowski, Simão Henrique. II.
Centro Universitário Leonardo da Vinci.
CDD 900

Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico! Seja bem-vindo ao Livro Didático de Sociedades
Ágrafas e História Antiga, um tema que consideramos indispensável para
a sua formação acadêmica, pois trata de aspectos constitutivos da sociedade
atual e de como a História advém de uma construção social estabelecida por
diversos tipos de civilizações.

Na Unidade 1, serão abordados os aspectos relacionados aos estudos


dos povos que viveram, principalmente, antes do desenvolvimento da escri-
ta. Além disso, entenderemos como se deu a evolução dos primeiros povos
que viveram na Terra.

Na Unidade 2, adentraremos aos povos que constituíram o que co-


nhecemos como civilizações da antiguidade, para entender o quão impor-
tante foram suas descobertas e construções, bem como nossas primeiras civi-
lizações foram constituídas.

Na Unidade 3, estudaremos as civilizações grega e romana, incluin-


do as principais características políticas, sociais e culturais no aspecto crono-
lógico e temático, apresentando uma síntese das contribuições e do legado
das civilizações grega e romana que exercem uma influência marcante no
Ocidente até os dias atuais. Portanto, conhecer a história de gregos e roma-
nos na Antiguidade é fundamental para entendermos as origens do mundo
em que vivemos, sendo o estudo dessas civilizações primordial para a com-
preensão não apenas do processo histórico do Ocidente, mas também para a
história dos povos, em vastas regiões, da Ásia e da África.

Bons estudos!

Prof. José Antonio Teófilo Cairus


Prof. Simão Henrique Jakobowski
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi-
dades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra-
mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui
para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida-
de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun-
to em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.

Bons estudos!
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você
terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen-
tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS........................................................................................ 1

TÓPICO 1 — FORMAS DE REGISTRO DA HISTÓRIA: COMO SE PRODUZ


HISTÓRIA?...................................................................................................................... 3
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 A IMPORTÂNCIA DOS ESTUDOS PALEONTOLÓGICOS...................................................... 3
3 A ARQUEOLOGIA E SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS...................................................................... 5
4 SISTEMAS DE DATAÇÃO E SUAS DESCOBERTAS.................................................................. 8
5 SOCIEDADES ÁGRAFAS ............................................................................................................... 10
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 13
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 14

TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS.................................................................................... 15


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 15
2 O PERÍODO ANTERIOR AO SURGIMENTO DA ESCRITA E SUAS DIVISÕES.............. 15
3 O PERÍODO PALEOLÍTICO............................................................................................................ 16
3.1 AUSTRALOPITHECUS................................................................................................................. 19
3.2 HOMO HABILIS............................................................................................................................. 20
3.3 HOMO ERECTUS.......................................................................................................................... 21
3.4 HOMO NEANDERTHALENSIS................................................................................................... 22
3.5 HOMO SAPIENS............................................................................................................................ 23
4 O PERÍODO NEOLÍTICO................................................................................................................ 24
5 A DISPERSÃO DOS SERES HUMANOS PELA TERRA .......................................................... 26
5.1 A OCUPAÇÃO DO CONTINENTE AMERICANO E SUAS TEORIAS................................ 27
6 NIÈDE GUIDON E SUAS DESCOBERTAS NA REGIÃO DE SÃO RAIMUNDO
NONATO.............................................................................................................................................. 30
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 34
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 35

TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS


DE VIDA........................................................................................................................ 37
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 37
2 CAÇADORES E COLETORES......................................................................................................... 37
3 O DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA E SUAS RELAÇÕES
COM O SEDENTARISMO............................................................................................................... 39
4 O SURGIMENTO DAS CIDADES, DA ESCRITA E DO ESTADO......................................... 41
5 POVOS ORIGINÁRIOS DA AMÉRICA E SUAS DIVERSAS ORGANIZAÇÕES ............. 43
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 48
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 53
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 54

REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 55
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO.......... 57

TÓPICO 1 — POVOS DA ÁFRICA................................................................................................... 59


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 59
2 OS EGÍPCIOS E SUA ORGANIZAÇÃO....................................................................................... 59
3 PERÍODOS QUE CONTEMPLAM O EGITO ANTIGO............................................................ 61
4 RIO NILO E SUA IMPORTÂNCIA................................................................................................ 63
5 O FARAÓ E SUA DUPLA FUNÇÃO: REI E DEUS...................................................................... 64
6 A VIDA DAS MULHERES NO EGITO ANTIGO....................................................................... 66
7 SISTEMA DE ESCRITA: HIERÓGLIFOS, DEMÓTICO E HIERÁTICO................................ 68
8 RELIGIÃO E O PROCESSO DE MUMIFICAÇÃO..................................................................... 69
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 72
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 73

TÓPICO 2 — POVOS MESOPOTÂMICOS..................................................................................... 75


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 75
2 A MESOPOTÂMIA E SEUS POVOS.............................................................................................. 75
3 A REGIÃO ENTRE OS RIOS TIGRE E EUFRATES.................................................................... 76
4 OS SUMÉRIOS.................................................................................................................................... 77
5 A ESCRITA CUNEIFORME.............................................................................................................. 80
6 OS BABILÔNIOS............................................................................................................................... 81
6.1 O CÓDIGO DE HAMURÁBI....................................................................................................... 81
7 OS ASSÍRIOS...................................................................................................................................... 83
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 86
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 87

TÓPICO 3 — POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO.................................................................. 89


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 89
2 HEBREUS............................................................................................................................................. 89
3 FENÍCIOS............................................................................................................................................. 93
4 PERSAS................................................................................................................................................. 96
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 101
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 102

TÓPICO 4 — POVOS DA AMÉRICA............................................................................................. 103


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 103
2 CIVILIZAÇÃO ASTECA................................................................................................................. 103
3 CIVILIZAÇÃO MAIA...................................................................................................................... 105
4 CIVILIZAÇÃO INCA...................................................................................................................... 108
5 POVOS INDÍGENAS ORIGINÁRIOS BRASILEIROS............................................................ 111
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 113
RESUMO DO TÓPICO 4................................................................................................................... 115
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 116

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 117

UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA.................................................................................................. 119

TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO................................................. 121


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 121
2 HISTÓRIA DA GRÉCIA ANTIGA............................................................................................... 122
2.1 OS MICÊNICOS E SEUS DEUSES............................................................................................ 124
2.2 GRÉCIA ANTIGA: DO PERÍODO ARCAICO AO CLÁSSICO............................................ 126
2.3 ALEXANDRE, O GRANDE E O DOMÍNIO DE ROMA....................................................... 129
2.4 SOCIEDADE GREGA................................................................................................................. 130
2.4.1 Mulheres.............................................................................................................................. 131
2.4.2 Crianças e adolescentes...................................................................................................... 133
2.4.3 Servos................................................................................................................................... 133
2.4.4 Escravos................................................................................................................................ 134
2.4.5 Estrangeiros......................................................................................................................... 135
2.5 COLONIZAÇÃO GREGA.......................................................................................................... 136
2.5.1 Comércio e colonização..................................................................................................... 137
2.5.2 Magna Grécia...................................................................................................................... 138
2.5.3 Colônias gregas nas regiões correspondentes atualmente à França e à Espanha..... 139
2.5.4 Colônias gregas no Ponto Euxino (Mar Negro)............................................................. 139
2.5.5 A relação das colônias com a “pátria” grega ................................................................. 139
2.6 RELIGIÃO DA GRÉCIA ANTIGA............................................................................................ 140
2.6.1 Os deuses do Olimpo......................................................................................................... 141
2.6.2 Templos, rituais e sacerdotes............................................................................................ 142
2.6.3 Mistérios e oráculos............................................................................................................ 144
2.6.4 Festivais e jogos................................................................................................................... 145
2.6.5 Religião pessoal................................................................................................................... 145
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 146
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 147

TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA............................................................... 149


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 149
2 REPÚBLICA ROMANA.................................................................................................................. 150
2.1 MITO E LENDA........................................................................................................................... 150
2.2 A REPÚBLICA: O INÍCIO ......................................................................................................... 151
2.2.1 Magistrados e funcionários............................................................................................... 154
2.2.2 Assembleias......................................................................................................................... 155
2.2.3 A cúria.................................................................................................................................. 155
2.3 A EXPANSÃO DE ROMA.......................................................................................................... 155
2.3.1 Os irmãos Graco ................................................................................................................ 156
3 FIM DA REPÚBLICA....................................................................................................................... 157
3.1 ROMA IMPÉRIO ........................................................................................................................ 158
3.1.1 As primeiras dinastias no Império Romano................................................................... 158
3.1.2 Os cinco bons imperadores............................................................................................... 160
3.1.3 A dinastia dos Severos....................................................................................................... 161
3.1.4 Dois impérios: Oriente e Ocidente................................................................................... 161
3.1.5 Constantino e o Cristianismo............................................................................................ 162
3.1.6 Império Bizantino (330-1453) ........................................................................................... 164
3.1.7 O fim do Império Romano do Ocidente . ....................................................................... 164
3.1.8 Invasões do Império Romano do Ocidente..................................................................... 165
4 ROMA: ASPECTOS SOCIAIS, POLÍTICOS E CULTURAIS.................................................. 166
4.1 HIERARQUIAS E CONFLITOS................................................................................................. 166
4.1.1 Políticos romanos................................................................................................................ 167
4.2 FAMÍLIA....................................................................................................................................... 169
4.2.1 Mulheres.............................................................................................................................. 170
4.2.2 Casamento........................................................................................................................... 171
4.2.3 Casa e família...................................................................................................................... 172
4.3 RELIGIÃO E ESTADO................................................................................................................ 173
4.3.1 Crenças e influências iniciais............................................................................................ 173
4.4 SÉCULO IV: OS ROMANOS E A ARTE DA GUERRA......................................................... 174
4.4.1 Estrutura dos exércitos romanos...................................................................................... 175
4.4.2 Estratégias............................................................................................................................ 178
4.4.3 Logística............................................................................................................................... 179
4.4.4 Guerra Naval....................................................................................................................... 179
4.4.5 Os espólios do vencedor ................................................................................................... 180
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 183
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 184

TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS...................................... 185


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 185
2 LEGADO DA CIVILIZAÇÃO GREGA........................................................................................ 185
2.1 INVENÇÕES E INOVAÇÕES DO PERÍODO CLÁSSICO GREGO..................................... 186
2.1.1 Arquitetura: colunas e estádios........................................................................................ 186
2.1.2 Escultura Humana em Arte............................................................................................... 186
2.2 A DEMOCRACIA GREGA......................................................................................................... 187
2.3 ENGENHARIA E DISPOSITIVOS MECÂNICOS.................................................................. 188
2.4 RACIOCÍNIO MATEMÁTICO E GEOMETRIA..................................................................... 189
2.5 MEDICINA................................................................................................................................... 190
2.6 JOGOS OLÍMPICOS.................................................................................................................... 190
2.7 FILOSOFIA................................................................................................................................... 191
2.8 CIÊNCIA E ASTRONOMIA....................................................................................................... 192
2.9 TEATRO........................................................................................................................................ 193
3 LEGADO DA CIVILIZAÇÃO ROMANA................................................................................... 194
3.1 O LATIM ...................................................................................................................................... 195
3.2 GOVERNANÇA ......................................................................................................................... 196
3.3 DIREITO ROMANO.................................................................................................................... 197
3.4 TECNOLOGIA E ENGENHARIA............................................................................................ 197
3.5 RELIGIÃO..................................................................................................................................... 197
3.6 CONSIDERAÇÕES SOBRE O LEGADO ROMANO............................................................. 198
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 200
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 202
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 204

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 206
UNIDADE 1 —

SOCIEDADES ÁGRAFAS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• perceber como a história é produzida, reconhecendo sua importância


para a sociedade, de modo a promover uma reflexão sobre a valorização
da história em nossas vidas;

• conhecer como a história dos povos que não possuíam escritas é produzida
evidenciando materiais e métodos utilizados pelos pesquisadores;

• entender como ocorreu a construção social das primeiras civilizações, além


de conhecer os principais aspectos desenvolvidos por elas.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – FORMAS DE REGISTRO DA HISTÓRIA: COMO SE PRODUZ


HISTÓRIA?

TÓPICO 2 – AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

TÓPICO 3 – AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS


MODOS DE VIDA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
TÓPICO 1 —
UNIDADE 1

FORMAS DE REGISTRO DA HISTÓRIA: COMO


SE PRODUZ HISTÓRIA?

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, abordaremos, de maneira mais direta, como a história é es-


crita, quem são os profissionais que produzem a história e qual a sua função na
sociedade. Além disso, mostraremos onde esses estudos sobre a construção da his-
tória acontecem e como são desenvolvidos, abordando os métodos de datação dos
vestígios localizados, bem como os arqueólogos ou paleontólogos os encontram.

Para finalizar, veremos das sociedades ágrafas, mostrando a importância


da pesquisa desse momento histórico e como algumas abordagens não reduzem
esse período a simples leituras minimalistas sem importância para a atualidade.

No decorrer deste livro, o período anterior à escrita não será tratado pela
nomenclatura Pré-história, termo dentro dos contextos atuais da pesquisa em
história que remete, muitas vezes, a uma sociedade sem história, ou seja, que
minimiza os povos que habitaram nesse tempo. Para melhor contextualizar, uti-
lizaremos o termo sociedades ágrafas, pois apenas remete aos povos que não es-
creviam, mas mantinham a construção e o desenvolvimento da cultura humana.

2 A IMPORTÂNCIA DOS ESTUDOS PALEONTOLÓGICOS


Várias situações passaram pelo planeta Terra desde os seus primórdios –
grande parte disso é devido aos estudos paleontológicos. Sem eles, possivelmente,
existiriam muitos mistérios sobre o desenvolvimento e a evolução da vida na Terra.

Partindo disso, é importante definir a palavra Paleontologia, que signifi-


ca estudo da vida antiga, cuja origem é do grego Palaios, que tem o sentido de
“antigo”, Ontos, “coisas existentes” e logia, “estudo”. É a base dos estudos sobre
a história do mundo nas sociedades ágrafas.

Atualmente, a paleontologia é elemento fundamental para os estudos ar-


queológicos e, principalmente, para a escrita da história. É a partir dela que é
possível estudar as evidências da vida de sociedades que não utilizavam a escrita
e, para isso, faziam marcações nas rochas (ou fósseis), proporcionando estudos
evolutivos e temporais, além de auxiliar na busca por minerais (MENDES, 1986).

3
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

A Paleontologia, normalmente, está relacionada com os estudos feitos


com base em dinossauros (Figura 1).

FIGURA 1 – PALEONTOLOGIA RELACIONADA COM DINOSSAUROS

FONTE: <https://bit.ly/3hp0K1a>. Acesso em: 15 abr. 2020.

DICAS

Uma ótima sugestão é o filme “Jurassic World – o Mundo dos Dinossauros”,


que é pautado na ameaça que os dinossauros seriam para a Terra. Além de ser muito bom,
o filme traz, de forma muito evidente, o trabalho do paleontólogo para o mundo.

JURASSIC WORLD – O MUNDO DOS DINOSSAUROS. Direção: Colin Trevorrow. Produzido


por Universal Pictures. Estados Unidos. 2015.

No Brasil, a paleontologia evoluiu após a chegada da comitiva austríaca,


que trouxe a princesa Leopoldina (século XIX): “[...] que viajava para se casar com
o príncipe regente do Brasil, Dom Pedro I. Integravam esta comitiva, a pedido do
rei da Bavária, dois naturalistas: Johann Baptist von Spix e Karl Friedrich Phillip
von Martius” (MOSCATO, 2017). Isso aconteceu principalmente pelo grande de-
senvolvimento que houve no país após o processo de independência de Portugal.

Atualmente, os estudos paleontológicos voltam-se sobretudo para os sí-


tios arqueológicos, buscando explicações sobre como aconteceu o desenvolvi-
mento das espécies na Terra. A função dos paleontólogos é evidenciar e coletar
fósseis, porém isso ocorre com bastante esforço e trabalho, visto que os materiais
que normalmente são coletados podem se deteriorar muito facilmente.

A partir disso, o trabalho de um paleontólogo consiste em:

4
TÓPICO 1 — FORMAS DE REGISTRO DA HISTÓRIA: COMO SE PRODUZ HISTÓRIA?

• Procura de fósseis: normalmente, a comunidade em geral informa às autori-


dades quando algo é descoberto. A partir disso, o paleontólogo faz o estudo
de área e verifica se se trata de um fóssil que deve seguir para estudos em
laboratórios ou não.
• Escavação: conta com instrumentos como picareta, pincel, martelo, lupas, es-
pátulas, fitas métricas, entre vários instrumentos. Nesse momento, deve-se
ter muito cuidado devido ao difícil manejo dos vestígios que podem ser facil-
mente quebrados.
• Laboratório: etapa em que é realizada a descrição e a análise dos fósseis coletados.
• Réplica para estudos: para estudos futuros e não estragar os originais, são
feitas réplicas.
• Divulgação: os estudos científicos precisam ser divulgados nas revistas cien-
tíficas como prova da investigação realizada.

Os trabalhos e os resultados oriundos das atividades de Paleontologia são es-


senciais para conhecermos um pouco sobre como animais e vegetais eram no passado.

DICAS

Uma sugestão de leitura é a obra A Origem das Espécies, de Charles Darwin,


publicada em 1859, que apresenta teorias da evolução das espécies e a seleção natural.

3 A ARQUEOLOGIA E SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS


A escrita dos procedimentos e etapas das pesquisas voltadas às socieda-
des ágrafas decorre, principalmente, do trabalho dos paleontólogos. Os estudos
exigem muita atenção, cuidado e fontes de comprovação. Partindo dos estudos
de procura por fósseis, escavação, análise em laboratório, replicação para estudos
futuros e divulgação para a comunidade científica e comunidade em geral, abor-
daremos as pesquisas arqueológicas e sua importância para a história.

O termo arqueologia, com origem do grego (archaios + logos), significa es-


tudo do passado. A principal diferença entre o trabalho de um arqueólogo para
um paleontólogo está no foco de estudo, pois o paleontólogo analisa os restos
de seres vivos, enquanto o arqueólogo lida com os modos de vida e os vestígios
materiais dos povos, buscando caracterizá-los.

5
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 2 – O TRABALHO DE UM ARQUEÓLOGO

FONTE: <https://bit.ly/2QfQqgA>. Acesso em: 27 abr. 2020.

Estudos mais aprofundados passaram a surgir a partir da Idade Média e


início da Idade Moderna:
Mesmo nesse estágio embrionário da arqueologia, já existia a preocu-
pação em desenvolver uma maneira de descrever como determinadas
sociedades se desenvolveram e tiveram etapas distintas nessa trajetó-
ria. Para tal intento, foram criados métodos de estudo, instrumentos
de escavação e técnicas para análise dos artefatos em laboratório (MO-
RELL et al., 2014, p. 11).

A arqueologia, assim como várias ciências, auxiliou a desvendar aspectos


importantes em relação ao passado. As sociedades começaram a perceber que
vários conhecimentos, por muitas vezes, inquestionáveis, puderam obter com-
preensões diferente devido a ciência, iniciando um processo de muitos avanços
na construção histórica e científica do planeta Terra e seus habitantes.

Atualmente, os arqueólogos têm um papel muito importante em nossa


sociedade, pois buscam respostas para muitas perguntas que ainda não foram
respondidas, de forma suficiente, sobre os povos do passado. Nesse momento,
não nos referimos apenas a povos das sociedades ágrafas, mas também a socie-
dades mais recentes, como na Idade Média.

NTE
INTERESSA

Uma boa ideia quando falamos de arqueólogos é assistir aos filmes da franquia “In-
diana Jones” (1981, 1984, 1989 e 2008), que descrevem a rotina de um pacato professor de arque-
ologia que tem uma vida dupla, envolvendo muita aventura em seu contexto. Vale a pena conferir!

6
TÓPICO 1 — FORMAS DE REGISTRO DA HISTÓRIA: COMO SE PRODUZ HISTÓRIA?

O trabalho dos arqueólogos, normalmente, é desenvolvido em sítios arqueo-


lógicos, ou seja, locais predeterminados para realizar suas investigações. É importan-
te salientar que esses sítios são descobertos por meio de estudos de área bem detalha-
dos. A identificação pode se dar também em locais visíveis, como construções, locais
onde há relatos de ocupação, aberturas em florestas com vegetação alterada, sondas,
detectores de metal, entre outras formas que podem ser utilizadas para descobertas.

DICAS

Para compreender melhor um sítio arqueológico e o trabalho de arqueólo-


gos, leia sobre o trabalho da arqueóloga Niède Guidon no Parque Nacional da Serra da
Capivara, que conseguiu auxiliar a história do povoamento da América em diversos quesi-
tos. Além disso, o local desse estudo é fantástico. Conhecendo o trabalho da Niède, verifi-
caremos que as pesquisas arqueológicas não são realizadas de forma rápida, normalmente
levam dias, meses e até anos para conseguir extrair os vestígios.

GAUDÊNCIO, J. S. Niède Guidon: a cientista brasileira responsável pelo tesouro arqueoló-


gico nacional. Revista História da Ciência e Ensino Construindo Interfaces, v. 18, p. 76-87,
2018. Disponível em: https://bit.ly/3eNs0V2. Acesso em: 28 abr. 2020.

Na Figura 3, percebemos o quão delicado e paciente é o trabalho de um


arqueólogo. Nem sempre os vestígios podem ser facilmente identificados. Na
maioria das vezes, após a identificação da área, faz-se uma sondagem e, em se-
guida, iniciam-se as escavações.

FIGURA 3 – ARQUEÓLOGO À PROCURA DE VESTÍGIOS METÁLICOS

FONTE: <https://torange.biz/pt/black-archaeologist-10889>. Acesso em: 28 abr. 2020.

7
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Para conhecer como é o trabalho de um arqueólogo, o Quadro 1 apresenta


mais sobre esse processo.

QUADRO 1 – ETAPAS DO PROCESSO DE ARQUEOLOGIA

Primeira Consiste na análise do ambiente pesquisado. São analisadas informações


etapa como a composição do solo e a existência de determinadas rochas e rios.
É a demarcação do território em quadrantes. Antes da escavação ou
Segunda
decapagem, são feitas trincheiras de, no máximo, 60 centímetros,
etapa
onde são observadas as disposições das camadas geológicas.
Decapagem é uma forma bem delicada de extrair os vestígios utilizan-
Terceira
do pincéis e instrumentos finos. Com ela, é possível identificar pegadas
etapa
e buracos para cabanas. É uma técnica que exige muita paciência.
Fase de escavação é um processo muito complexo tomando cuidado para
Quarta
não se perder nada. Normalmente, elas demoram anos, e tudo o que ti-
etapa
ver relevância precisa ser fotografado, registrado ou até desenhado.
Quinta É a fase final, em que o material é coletado, colocado em embalagens,
etapa identificado e transportado para laboratórios.
FONTE: Adaptado de Heuer (2007, p. 11)

Nem sempre a pesquisa acontece nessa ordem ou se descobrem grandes


coisas, mas é um trabalho delicado, de muita dedicação e paciência. Além disso,
os resultados desse trabalho, muitas vezes, demoram anos para ser expostos à co-
munidade, pois, além de ser um processo complexo, os materiais coletados pre-
cisam ser datados, proporcionando ao pesquisador informações mais concretas.

4 SISTEMAS DE DATAÇÃO E SUAS DESCOBERTAS


Após vestígios, fósseis ou materiais serem coletados nos sítios arqueo-
lógicos, é necessário fazer sua completa identificação, para a qual a datação é
essencial. Esse processo só é possível com a colaboração com demais áreas do co-
nhecimento, como a biologia, a física e a química, pois, para esse processo, deve-
-se investigar as transformações que os materiais sofreram no decorrer do tempo.
Basicamente, investiga-se o tempo em que o objeto ficou exposto aos agentes e
como as suas propriedades foram degradadas.

Para realizar esses testes, abordaremos sobre os três métodos de datação


que são bastante utilizados: estratigrafia, carbono-14 (C14) e termoluminescência.

• Estratigrafia: Weller (1960) afirma que a “A estratigrafia é o ramo da geologia


que estuda as rochas estratificadas e sedimentares, considerando, para as di-
versas unidades estratigráficas, a descrição da sequência vertical e horizontal,
as correlações e o mapeamento”.

8
TÓPICO 1 — FORMAS DE REGISTRO DA HISTÓRIA: COMO SE PRODUZ HISTÓRIA?

NOTA

Para responder à dúvida sobre como a estratigrafia consegue determinar a


idade de um fóssil ou vestígio, cada camada tem um certo tempo de composição e, des-
se modo, na camada em que se encontra o fóssil ou o vestígio, determina-se uma idade
aproximada. Entretanto, isso não traz dados exatos e, no caso de uma situação duvidosa, é
aconselhável realizar outros testes, como o carbono-14.

• Carbono-14 (C-14): é um isótopo radioativo natural de carbono com massa


atômica 14, com isso, todos os seres vivos possuem alguma quantidade de
C14 em seu corpo. Desse modo, quando o ser vivo morre, a quantidade de
C14 diminui devido à desintegração radioativa. Como exemplo, podemos fa-
lar que a meia-vida do C14 equivale a 5740 anos e, a partir disso, mapeiam-se
as datas (um quarto de vida 11480, um oitavo 22960 e assim por diante). O
cálculo se dá a partir do valor de C14 em um fóssil e do quanto ainda resta no
outro. Esse método serve para calcular a idade de fósseis com até 60 mil anos,
porém, em medições com idade acima disso, perde-se a precisão.

DICAS

Assista ao vídeo “Como Funciona a Datação por Carbono?”, do canal Ciência


Todo Dia, que mostra como são datados os objetos utilizando o C14, um dos métodos mais
utilizados para datar a idade de fósseis: https://www.youtube.com/watch?v=lvQa9aGDC_I.

• Termoluminescência: a partir desse método, é possível obter a datação de


fenômenos ou processos geológicos ocorridos há milhares de anos. Para isso,
são verificadas as propriedades termoluminescentes de minerais como carbo-
natos ou quartzos, que, antes de serem soterrados, foram expostos à luz solar.
A técnica pode medir objetos de 1 mil a 500 mil anos atrás. Normalmente, essa
técnica é utilizada para datar artefatos de cerâmica.

9
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

DICAS

A reportagem “Homo sapiens chegou à Rússia antes do que ao resto da Europa, ga-
rantem arqueólogos” envolve o uso do método de termoluminescência para obter resultados nas
pesquisas com materiais arqueológicos. Vale a pena conferir, então acesse: https://bit.ly/2RQkxvI.

5 SOCIEDADES ÁGRAFAS
As sociedades ágrafas, através de descobertas arqueológicas, podem ser conhe-
cidas na atualidade, como aquelas que não desenvolveram nenhum tipo de escritura.

ATENCAO

É importante perceber que as sociedades ágrafas não são apenas aquelas que
existiram antes dos sumérios desenvolverem o sistema de escrita (que, por muitos, foi o
primeiro); várias civilizações mais contemporâneas são consideradas ágrafas, como a dos in-
cas, os indígenas brasileiros, entre outros. Mais adiante, adentraremos na pré-história, por isso
é importante desmitificar algumas situações e a linearidade da história é, talvez, a principal.

No interior dessas sociedades, os registros como pinturas, esculturas, edi-


ficações e desenhos, representam os principais vestígios de pesquisa e conheci-
mento delas, pois, é a partir deles, que os pesquisadores podem conhecer um
pouco sobre como eles viviam.
Com a colaboração de outras ciências, como antropologia, arqueolo-
gia e paleontologia, novos materiais passaram a servir de indícios do
passado de um povo: imagens, relatos orais, vestígios, artefatos, ossos,
armas, fotografias, músicas, construções e outros objetos. Essas podem
ser tão importantes quanto a escrita no processo de resgate do passado
de uma civilização ou comunidade (KUPER, 2008).

Kuper (2008) reflete sobre a importância desses vestígios e de antropólo-


gos, arqueólogos, paleontólogos e historiadores para que possamos saber como
esses povos viviam e o seu desenvolvimento.

Nesse momento, é importante definirmos que a História não é linear, mas


um percurso cheio de rupturas e com diversos momentos ímpares para os povos.
Um bom exemplo é usarmos nossa atualidade, você considera que todos os po-
vos do mundo vivem no mesmo momento histórico?

10
TÓPICO 1 — FORMAS DE REGISTRO DA HISTÓRIA: COMO SE PRODUZ HISTÓRIA?

Partindo dessas bases, iniciaremos tratando da Pré-história, período que


equivale ao surgimento do ser humano, cerca de 4,5 milhões de anos a até apro-
ximadamente 5 mil anos atrás, momento em que os sumérios desenvolveram o
primeiro sistema de escrita.

Por ser um período em que os registros escritos não existiam, sua nomen-
clatura surgiu no século XIX, quando os estudos da história se intensificaram e os
pesquisadores da época a utilizavam para designar o momento em que a huma-
nidade ainda não possuía um sistema de escrita.

FIGURA 4 – TÁBUA COM ESCRITA CUNEIFORME

FONTE: <https://bit.ly/3fhr6zo>. Acesso em: 29 abr. 2020.

Nesse sentido, é importante destacarmos que pesquisas mais recentes dei-


xam o termo, muitas vezes, apenas para fazer uma divisão didática e, formalmente,
chamam os povos desse período de sociedades ágrafas, de modo a não minimizar
sua história, que não foi necessariamente escrita, mas deixada por meio de arte, cons-
truções e vestígios diversos que devem ser considerados e valorizados atualmente.

Contudo, Ripoli (2017, p. 145) afirma que:


O desafio do pesquisador consiste em identificar o que faz parte do
cotidiano dos humanos e, paralelamente, em encontrar meios para que
a pesquisa de história e do tempo, não seja somente conteudista, carac-
terizada por uma organização cronológica sem nenhum vínculo com
as histórias individuais, locais, regionais e nacionais.

Por isso, podemos dizer que nosso posicionamento é voltado para uma
História inclusiva, não europeizada e, principalmente, contextualizada. A Pré-
-história foi um momento ímpar na história que merece grande atenção e, além
disso, um olhar particular para as diversidades em que está envolvida.

Assim, Morell et al. (2014, p. 7) mostram que a história não é linear (Figura 5).
11
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 5 – DIFERENÇAS NO TEMPO HISTÓRICO EM CONTEXTOS MUNDIAIS E BRASILEIROS

FONTE: Morell et al. (2014, p. 14)

A Figura 5 demonstra a importância de entendermos cada período histó-


rico como único para a população que o vivenciou, constatando o fato de que a
história não pode ser aplicada a todos os povos como se fosse única e linear.

12
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Paleontologia é conhecida como o estudo da vida antiga (origem no grego


Palaios, que significa antigo, Ontos, coisas existentes, e logia, estudo). É a
base dos estudos sobre a história do mundo pré-histórico.

• O trabalho de um paleontólogo consiste em: procurar fósseis, escavar, fazer


análise em laboratório, replicar para estudos futuros, divulgar para a comu-
nidade científica e comunidade em geral.

• O termo arqueologia, que vem do grego, significa estudo do passado.

• Há três principais métodos de datação que são estratigrafia, carbono-14 e ter-


moluminescência.

• A estratigrafia através de camadas ou estratos é utilizada para reconhecer a


datação em objetos e fósseis.

• O carbono-14 é um dos métodos mais utilizados para a datação de fósseis,


tendo sua técnica realizada pela desintegração do isótopo radioativo.

• A termoluminescência é utilizada para a datação de objetos e fósseis, identi-


ficando resquícios de luz no aquecimento dos objetos ou fósseis estudados.

• Sociedades ágrafas são aquelas que não desenvolveram nenhum tipo de escritura.

• O período das sociedades ágrafas equivale ao surgimento do ser humano (4,5


milhões de anos atrás) até aproximadamente 5 mil anos atrás, momento em
que os sumérios desenvolveram o primeiro sistema de escrita.

13
AUTOATIVIDADE

1 Recentemente, houve uma discussão em nível federal sobre a profissão his-


toriador, com o veto do presidente derrubado pelo senado. Essa regulamen-
tação visa a tornar legal uma profissão já exercida por muitos e, consequen-
temente, importantíssima para fortalecer essa área de estudos. Responda
em que estudos sobre o passado são importantes para a humanidade?
FONTE: <https://bit.ly/3oewqaK>. Acesso em: 15 jul. 2020.

2 Complete o quadro a seguir citando as três técnicas de datação: estratigra-


fia, carbono-14 e termoluminescência. Evidencie os métodos, tempo máxi-
mo de datação e utilização pelos pesquisadores. Procure acrescentar mais
informações pesquisando a respeito das técnicas.

Estratigrafia
Carbono-14
Termoluminescência
FONTE: O autor

3 As sociedades ágrafas não tinham desenvolvido a escrita, por isso são conhe-
cidas por meio do trabalho de alguns pesquisadores. Escolha uma profissão
para criar um resumo evidenciando seus principais métodos de trabalho.

14
TÓPICO 2 —
UNIDADE 1

AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

1 INTRODUÇÃO

Após conhecermos como ocorre a pesquisa no campo da paleontologia


e da arqueologia dentro da História, aprofundaremos o estudo do período mais
longo transcorrido e datado cronologicamente, o qual se encontra esquecido e
minimizado pela historiografia e por grande parte dos historiadores.

Assim, abordaremos o período anterior ao surgimento da escrita, que se ini-


cia com o surgimento do ser humano a aproximadamente 7 milhões de anos atrás e
vai até o surgimento da escrita por volta de 4 mil anos. Serão apresentadas algumas
subdivisões utilizadas para facilitar o estudo, como os períodos Paleolítico e Neolí-
tico, bem como os primeiros seres humanos que fizeram sua dispersão pela Terra.

Ao final, veremos as teorias da chegada do ser humano ao continente ame-


ricano e toda a discussão que elas geram na comunidade científica. Passaremos
também pelos estudos da brasileira Niède Guidon e as dúvidas sobre as datas em
que os primeiros grupos humanos chegaram ao continente americano e de onde
exatamente vieram, o que ainda permanece sem respostas concretas.

2 O PERÍODO ANTERIOR AO SURGIMENTO DA ESCRITA E


SUAS DIVISÕES
Os períodos históricos não devem ser tratados com linearidade ou até se-
rem conferidos a apenas um povo (europeizados, como muitas vezes acontece).
Contudo, para um melhor estudo dos períodos, uma periodização é necessária.

Quando tratamos do período anterior ao surgimento da escrita, essa divi-


são é feita em dois momentos: o período Paleolítico (aproximadamente 7 milhões
de anos até por volta de 10 mil anos atrás) e o período Neolítico (aproximada-
mente 10 mil anos até por volta de 5 mil anos atrás).

Há também algumas fontes que apresentam períodos como o Mesolítico,


que seria um período de transição entre o Paleolítico e Neolítico com característi-
cas como o fim da última glaciação, o aumento no processo de sedentarização, a
extinção de animais de grande porte e o povoamento da América.

15
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Outra divisão que pode ser considerada em algumas fontes é a Idade dos
Metais. Como o próprio nome diz, é o período em que as principais característi-
cas estão voltadas ao desenvolvimento da metalurgia, mas também do surgimen-
to do Estado, do comércio, das primeiras civilizações e da escrita.

A partir dessa divisão, abordaremos cada período de forma mais apro-


fundada, perpassando pelos dois períodos macros: Paleolítico, Neolítico e, na
medida do possível, o Mesolítico e a Idade dos Metais.

FIGURA 6 – DIVISÕES DO PERÍODO ANTERIOR AO SURGIMENTO DA ESCRITA

FONTE: O autor

3 O PERÍODO PALEOLÍTICO
Como visto, é o período em que surge a espécie humana. Segundo dados
atualizados, isso ocorreu há aproximadamente 7 milhões de anos. Entretanto, há
pesquisas que trazem espécies que podem ser ligadas como o Ramapithecus,
datado há 13 milhões de anos atrás. No entanto, são apenas teorias, sendo impor-
tante trabalharmos com dados mais próximos da espécie conhecida como Austra-
lopithecus, que viveu nos períodos mais recentes entre 4,5 milhões de anos atrás.

16
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 7 – RECONSTITUIÇÃO DE UM RAMAPITHECUS

FONTE: <https://bit.ly/3bo2Tq4>. Acesso em: 5 maio 2020.

O pesquisador Walter Neves, em seu artigo intitulado “E no princípio... era o


macaco!”, apresenta algumas reflexões importantes sobre os primeiros hominídeos:
Com a descoberta dos fósseis de Australopithecus afarensis (entre eles a
famosa Lucy) na Etiópia e na Tanzânia, em meados dos anos 1970, ficou
claro que a bipedia precedeu em milhões de anos a fixação de cérebros
grandes e de capacidade tecnológica. Tendo em vista essa diferença
temporal tão grande, ficou claro também que não foi a fabricação de
ferramentas (e seu diferencial adaptativo), como desejavam Darwin e
muitos outros cientistas importantes, a força seletiva que teria levado à
fixação da bipedia (que por extensão teria liberado as mãos permitindo
a atividade fabril). Hoje, sabemos que os primeiros bípedes, portanto
os primeiros hominíneos, surgiram por volta de sete milhões de anos,
representados pelo Sahelanthropust chadensis, cujos fósseis foram encon-
trados no início do século XXI no Chade (NEVES, 2006, p. 253).

As pesquisas mostram que a evolução humana só foi possível por meio


de mudanças climáticas que afetaram o planeta e, principalmente, o continente
Africano, quando houve o desaparecimento de florestas com vegetação densa
e alta, permitindo o surgimento das savanas. Isso fez com que hominídeos de-
senvolvessem o andar nas duas patas traseiras (possibilitando o uso das mãos e
aprimorando-o) e necessitassem buscar alimentos de outras formas, incluindo o
uso de materiais de apoio, como pedaços de pau.

Heuer (2007, p. 44, grifo no original) fala que:


Essa adaptação de alguns grupos gerou a divisão dos primatas em duas fa-
mílias: a dos macacos antropoides, que continuavam a andar sobre quatro
patas (gorilas, chimpanzés, orangotangos), e a família dos hominídeos, que
se tornaram bípedes e desenvolveram características diferenciadas.

17
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Essa divisão foi fundamental para o desenvolvimento da espécie homo,


que, posteriormente, precisou se adaptar ao meio e construir meios sociais e cul-
turais para sobreviver e desenvolver. A partir disso, iniciamos a nossa trajetória
de desenvolvimento de consciência sobre nós mesmos e sobre o planeta.

Neves (2006) apresenta uma tabela com as principais espécies de hominí-


deos e o tempo em que viveram no planeta, conforme mostra o Quadro 2.

QUADRO 2 – ESPÉCIES DE HOMINÍDEOS

Cronologia Região onde foi


Espécie
(milhões de anos AP) encontrado
Sahelanthropus tchadensis 7,0 Toros-Melalla, Chade
Orrorin tugenensis 6,0 Tugen Hills, Quênia
Ardipithecus kadabba 5,0 Middle Awash, Etiópia
Ardipithecus ramidus 4,2 Middle Awash, Etiópia
Australopithecus
Entre 4,2 e 3,9 Lago Turkana, Quénia
anamensis
Australopithecus afarensis
(também classificado Hadar, Etiópia, Laetoli,
Entre 3,7 e 2,5
como Praeanthropus Tanzânia
africanus)
Australopithecus
Entre 3,0 e 3,5 Chade
bahrelghazali
Kenyanthropus platyops 3,5 Quênia
Taung, Sterkfontein,
Australopithecus africanus 3,0
África do Sul
Australopithecus garhi 2,5 Etiópia
Paranthropus aethiopicus 2,7 Lago Turkana, Quênia
Swartkrans, Kromdraai,
Paranthropus robustus Entre 2,0 e 1,0
África do Sul
Garganta de Olduvai,
Paranthropus boisei 1,75 Tanzânia, Lago Turkana,
Quênia
Garganta de Olduvai,
Homo habilis Entre 2,0 e 1,7 Tanzânia, Lago Turkana,
Quênia
Lago Turkana, Quênia,
Homo rudolfensis 2,3
Malawi
Lago Turkana, Quênia,
Homo ergaster Entre 2,0 e 1,4 Dmanisi, República da
Geórgia
Homo erectus Entre 1,8 e 0,03 África, Ásia, Europa (?)
Homo heidelbergensis Entre 0,8 e 0,2 Europa, África e Ásia

18
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

Homo neanderthalensis Entre 0,2 e 0,03 Europa, Oriente Médio


Surgimento na África:
Homo sapiens 0,2-atual
todo o planeta
FONTE: Neves (2006, p. 258)

Evidentemente, seria complexo fazermos estudos aprofundados sobre to-


dos esses hominídeos, porém vale destacar que o processo evolutivo humano se deu
de forma lenta e gradual, vencendo estágios e adversidades. Na atualidade, muitas
coisas que são óbvias, no início, levaram milhares de anos para ser compreendidas,
como a agricultura, que só aparece por volta de 10 mil anos atrás. Podemos imagi-
nar quantas dificuldades esses primeiros povos tiveram que enfrentar vivendo em
regimes de subsistência e dependendo da coleta e da caça para sobreviver. Quando
estudamos esses tempos, é muito importante não fazer julgamentos preconceituosos
que, muitas vezes, aparecem em comparações, pois a existência humana é fruto de
uma construção histórica, que precisa ser contada novamente, por meio da evolução
da espécie, para que os novos seres humanos possam se desenvolver.

Sobre a sociedade nesse período:


A sociedade paleolítica caracterizou-se pela busca de subsistência, ou
seja, o homem procurava tudo o que era necessário para sustentar a
vida por meio da caça, da pesca, da coleta de frutos, sementes e raízes,
e da confecção e utilização de objetos de pedra lascada, ossos e dentes
de animais. Por isso, o Período Paleolítico é também chamado de Ida-
de da Pedra Lascada (PALEOLÍTICO, c2009-2021).

Todo esse desenvolvimento foi motivado pelas necessidades básicas hu-


manas em relação à fome e à proteção. A partir de desafios que eram impostos no
caminho dos seres humanos, a criatividade, que é única da nossa espécie, ajudava
a vencê-los e proporcionar o desenvolvimento nesses momentos.

Com base nisso, os hominídeos evoluíram. É importante ressaltar que di-


ferenciar o gênero homo e não homo na árvore evolutiva é absolutamente arbi-
trário. São utilizados critérios artificiais para criar os limites entre os grupos, uma
vez que o que ocorre é um continuum entre eles (GAVAN, 1977).

A seguir, apresentaremos algumas espécies que antecederam o homo sa-


piens (atual espécie humana).

3.1 AUSTRALOPITHECUS
Espécie que viveu há cerca de 3,2 milhões de anos na África Oriental. Com
o fóssil de Lucy como seu maior defensor, essa espécie media cerca de 1,20 metro
de altura e pesava em torno de 30 quilos. Sua alimentação era à base de frutos,
vegetais e raízes. Possuíam uma organização em grupos e eram bípedes, fato que
possibilitou maior defesa e a coleta de alimentos mais facilmente.

19
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 8 – LUCY, FÓSSIL E POSSÍVEL FORMA DE QUANDO VIVEU

FONTE: <https://bit.ly/3eNAifC>. Acesso em: 5 maio 2020.

NOTA

O fóssil da Lucy foi encontrado na Etiópia, em 1974. Cerca de 40% de sua ossada
estava fossilizada, algo quase impossível se pensarmos que ela viveu há mais de 3 milhões de
anos. Seu nome foi dado em homenagem a música da banda Beatles “Lucy in the Sky with
Diamonds”. Para conhecer um pouco mais sobre a Lucy, acesse o dossiê: https://bit.ly/3hrUfKS.

3.2 HOMO HABILIS


É o homem habilidoso, nome atribuído devido a sua facilidade em utili-
zar e criar ferramentas. Esses hominídeos viveram entre 2,5 e desapareceram por
volta de 1,5 milhão de anos atrás.

Algumas características desse hominídeo são (HOMO HABILIS, 2020):


entre as espécies pertencentes ao gênero Homo, essa é uma das mais antigas e
menos parecidas com os humanos atuais. Os homens mediam cerca de 1,57 metro
de altura e tinham um peso aproximado de 55 quilos e as mulheres, cerca de 1,20
metro de altura com 32 quilos.

20
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 9 – HOMO HABILIS

FONTE: <https://bit.ly/3hpPMbz>. Acesso em: 6 maio 2020.

Apesar de conseguir utilizar ferramentas, a caça não era muito a sua espe-
cialidade – pesquisas indicam que era carniceiro, aproveitando-se de animais já
mortos e disputando alimentos com abutres e hienas

3.3 HOMO ERECTUS


Espécie de hominídeo que viveu há aproximadamente 1,3 milhão de anos
nos continentes africanos, asiático e europeu. Recebeu esse nome devido a sua
postura ereta, muito parecida com a do homem atual.
A espécie é considerada a mais antiga a ter deixado a África. Sua mi-
gração em direção à Ásia teria ocorrido há no mínimo 1,8 milhões de
anos, tendo seus fósseis encontrados na Ilha de Java. Subsequente-
mente, teria rumado à Europa, atingindo o Cáucaso (região que leva o
nome da cadeia de montanhas entre este continente e o asiático) (POU-
GH; JANIS; HAISHER, 2003; NEVES; PILÓ, 2008; GROVES, 2009 apud
TICHAUER, 2009, p. 23).

Segundo pesquisas, foi o primeiro hominídeo a conseguir dominar o fogo,


o que proporcionou a ele caçar com maior poder, cozinhar alimentos e, com isso,
melhorar a qualidade destes, possibilitando a sua migração para lugares mais
frios, como a Europa.

O fato de cozinhar os alimentos também proporcionou maior inserção de


proteínas e consequentemente um desenvolvimento intelectual. Além do fogo, o
Homo Erectus organizava abrigos e vestimentas para auxiliar em sua sobrevivência.

21
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 10 – HOMO ERECTUS

FONTE: <https://bit.ly/3okXyF1>. Acesso em: 6 maio 2020.

Sua altura girava em torno de 1,70 metro e seu peso era de, aproximada-
mente, 77 quilos. Um diferencial era do tamanho do cérebro em comparação ao
Homo Habilis, que era cerca de 50% maior.

3.4 HOMO NEANDERTHALENSIS


Descendente direto do Homo Erectus, esses hominídeos viveram
basicamente na Europa na região de Neander. Segundo Tichauer (2009, p. 27):
Ao longo do tempo, o aprimoramento de adaptações culturais do Homo
heidelbergensis, como os supramencionados, além do desenvolvimento
de uma nova indústria lítica, por volta de 250 mil anos, permitira a estes
hominídeos permanecer na Europa e suportar o frio, o que culminou no
desenvolvimento de cérebros maiores até que os de homens modernos
(em média 1.500 cc), baixa estatura, queixo pouco acentuado, fêmures
e tíbias levemente arqueados, arcadas supraciliares salientes, além de
grandes seios da face e nariz enorme. Tratava-se de uma nova espécie:
o Homo neanderthalensis, conhecidos popularmente como “Homem das
Cavernas” ou simplesmente “Homem de Neandertal”.

Ele tinha algumas características desenvolvidas devido ao contato pro-


longado com ambientes frios. Media em torno de 1,60 metro de altura. Uma das
principais características que podemos citar era o início de desenvolvimento de
alguma espiritualidade, pois fazia oferendas com flores aos seus mortos.

22
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 11 – HOMO NEANDERTHALENSIS

FONTE: <https://bit.ly/3w7cCcc>. Acesso em: 6 maio 2020.

Esta espécie chegou a viver na mesma época que o homem moderno, mas
por motivos desconhecidos ele foi extinto.

3.5 HOMO SAPIENS


Nos últimos 100 mil anos, aparece o Homo Sapiens, que nada mais é do que o
homem moderno, ou seja, a espécie que somos atualmente. Como resultado de um
processo de evolução, o Homo Sapiens traz várias características de seus antepassa-
dos: “No entanto, a partir deste momento, tais características foram modificadas
de maneira abrupta. Tal mudança explosiva é denominada Revolução Criativa do
Paleolítico Superior e se caracteriza, antes de tudo, pela injeção de uma de uma
criatividade ilimitada em todos os setores da vida” (TICHAUER, 2009, p. 29).

A partir desse momento, aspectos unicamente humanos apareceram como


a capacidade de se expressar através da arte, posteriormente escrita, sociedades
organizadas, tecnologias digitais. Apesar de alguns autores tratarem o momen-
to em que vivemos como uma nova era, a era da tecnologia, citando que somos
Homo digitalis, Homo cyborg ou qualquer outra denominação que possa aparecer,
ainda na comunidade científica somos considerados Homo sapiens.

Finalizando essa rápida explicação sobre alguns hominídeos que habita-


ram a Terra, queremos abrir um parêntese para falar do período de transição cha-
mado Mesolítico, que muitos consideram na divisão oficial do período anterior
ao surgimento da escrita.

23
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Marcado pelo fim da última glaciação, esse período além da transição do Pa-
leolítico para o Neolítico, marcou a transição de uma economia por diversas vezes nô-
made, caçadora e coletora para uma economia sedentária com produção de alimentos.

Segundo estudos, também foi nesse período que houve a migração para
o continente americano (veremos mais adiante) e a arte e as crenças foram mais
acessadas como genuinamente humanas.

NOTA

Sugerimos os seguintes documentários sobre o desenvolvimento humano


nesse período:
• Faz uma explanação sobre como o ser humano possivelmente conseguiu dominar
a linguagem. É importantíssimo, nesse momento, pois há muitas evidências do sur-
gimento, bem como pesquisas arqueológicas e paleontológicas dessa temática: As
Origens da Linguagem. Documentary on Demand. 2012. Disponível em: https://bit.
ly/3wjcPcv. Acesso em: 16 jul. 2020.
• Bem voltado a pinturas rupestres e sua importância para aquelas sociedades que as
fizeram, confira: Lascaux, a Pré-História da Arte. Forza, 2011. Disponível em: https://bit.
ly/3waF5xP. Acesso em: 16 jul. 2020.

4 O PERÍODO NEOLÍTICO
Período que tem início por volta de 12 mil anos atrás, quando o ser humano
conseguiu mais avanços em relação ao domínio com a natureza. Conhecido tam-
bém como o “período da pedra polida”, trouxe alguns avanços (HEUER, 2007):

• domínio da natureza pelo homem;


• cultivo de alimentos;
• domesticação de animais;
• sedentarização;
• aumento populacional;
• divisão maior do trabalho envolvendo sexos e idade;
• surgimento das primeiras aldeias;

Isso tudo proporcionou mudanças profundas no jeito de viver desses


seres humanos, pois, como não eram mais sedentários e aprenderam a cultivar
alimentos e a domesticar animais, teoricamente, não precisariam se arriscar em
caçadas perigosas e, além disso, teriam comida de maneira mais fácil. “A produ-
ção de um excedente agrícola, somado à atividade criadora, serviu para atender
às necessidades da comunidade em períodos mais duros” (PINSKY, 2001, p. 32).

24
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

Como tinham o necessário para sobreviver, os grupos humanos tinham


tempo para fazer outras coisas, como construir casas, aperfeiçoar instrumentos e
iniciar pequenas organizações sociais.

Foi o momento em que começaram a surgir pequenas aldeias, que pro-


porcionaram, além de segurança para os povos que ali viviam, uma organização
social em que havia, normalmente, um líder escolhido por seus moradores e fun-
ções definidas para homens, mulheres e crianças.

FIGURA 12 – OCUPAÇÕES DOS POVOS NEOLÍTICOS

FONTE: <https://bit.ly/3yb6Nwg>. Acesso em: 16 jul. 2020.

Ao final desse período, há uma subdivisão chamada de Idade dos Metais


(entre 5 e 4 mil anos a.C.), quando os seres humanos conseguiram obter o domí-
nio sobre os metais e, consequentemente, potencializar seus instrumentos para a
agricultura, armas e utensílios para o cotidiano.
Durante esse período, as pequenas aldeias de agricultores transforma-
ram-se em núcleos urbanos, submetidas à autoridade política de um
chefe. As primeiras cidades nasceram no Oriente Médio. Biblos, no atual
Líbano, é considerada a cidade mais antiga do mundo. Há quase 7.000
anos, surgiu uma das primeiras cidades – Çatal Huyuk, no centro-sul da
Turquia. Essa cidade foi habitada por mais de 700 anos e lá eram cultiva-
dos trigo, cevada, ervilha (IDADE DOS METAIS, c2009-2021).

Esse momento foi muito importante para a história da humanidade, pois


os povos conseguiam estocar alimentos e, consequentemente, ter garantias de
sobrevivência em épocas nas quais o alimento não era suficiente.

25
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

ATENCAO

Ressaltamos novamente que esse movimento da história não é linear, pois


citamos comunidades que as pesquisas dizem que foram pioneiras nesses movimentos,
porém, na Amazônia, há povos como os Nukak e Achê que têm uma mobilidade constan-
te, ainda em um modo de vida comparável às organizações sociais desse período.

5 A DISPERSÃO DOS SERES HUMANOS PELA TERRA


Estudos mais recentes apontam o continente africano como o local onde
o ser humano surgiu há aproximadamente 7 milhões de anos. Para Souza (2011):
O comportamento migratório poderia já estar presente em Homo habi-
lis, mas seguramente implantou-se com os primeiros homens arcaicos
e intensificou-se com Homo sapiens, cuja mobilidade fez a espécie per-
correr distâncias cada vez maiores e seguir caminhos já conhecidos.
Esse próprio comportamento levou a desafios frequentes, por obrigar
a espécie humana a enfrentar mudanças nas pressões e interações am-
bientais (SOUZA, 2011, p. 69).

Assim, podemos entender que, a partir do homo habilis, um movimento


migratório se iniciou. Com a descoberta e o domínio do fogo, maiores distâncias
puderam ser percorridas, bem como enfrentamento de animais perigosos e tem-
peraturas baixas puderam ser superadas com mais facilidade.

FIGURA 13 – POSSÍVEL PROCESSO DE MIGRAÇÃO DOS POVOS PELA TERRA

FONTE: <https://bit.ly/33H0lyK>. Acesso em: 7 maio 2020.

26
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

O movimento migratório envolveu a ida ao continente asiático e uma dis-


persão maior entre grupos que foram para Europa e povos que se dissemina-
ram para Ásia, chegando a Austrália. Esse movimento ainda gera muitas dúvidas
quanto à datação, mas pesquisas recentes aproximam os primeiros grupos des-
bravadores de 120 mil a 100 mil anos antes do tempo presente.

5.1 A OCUPAÇÃO DO CONTINENTE AMERICANO E SUAS


TEORIAS
Esse é um assunto responsável por gerar inúmeras discussões entre os pesqui-
sadores. Desde o século XX, várias pesquisas tentam evidenciar aspectos únicos, mas
o que se sabe exatamente, até hoje, é que as migrações ocorreram de formas diferentes.

Há três principais teorias que sustentam o processo de migração do ser


humano ao continente americano:

• A Teoria de Clóvis: cita que o ser humano teria feito sua migração para o con-
tinente americano por meio do Estreito de Bering, que, segundo pesquisado-
res, estava congelado nesse período, devido à glaciação que afetou fortemente
o planeta e congelou os mais de 1.600 km do Estreito. Contudo, essa travessia
não se deu de uma hora para outra, sendo estimado que os grupos humanos
tenham levado uma média de 20 mil anos para fazer a travessia, embora esse
tempo, muitas vezes, coloque em xeque a teoria, uma vez que as pessoas não
possuíam tecnologia para ficarem expostas a um frio tão intenso.

FIGURA 14 – ESTREITO DE BERING

FONTE: <https://bit.ly/3tGzj5i>. Acesso em: 8 maio 2020.

27
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

O Essa travessia ocorreu por volta de 15 e 12 mil anos antes do presente.


Pesquisas mais recentes apontam vestígios humanos com datas superiores
as citadas, colocando novamente a teoria em xeque. Por volta de 11 mil
anos atrás, eles chegariam à América do Sul.

NOTA

Em nenhum momento, discordamos da Teoria de Clóvis, até porque não exis-


tem estudos que a refutem totalmente – apenas foram realizadas algumas pontuações per-
tinentes a estudos futuros.

• Teoria Malaio-Polinésia ou Teoria da chegada pelo mar: os primeiros seres


humanos teriam vindo por meio de pequenas embarcações, aproveitando que
o oceano estava abaixo do normal, devido à última glaciação. Isso resultou
em um aumento de ilhas, pelas quais os seres humanos faziam essa travessia
e puderam chegar ao continente americano. Essa teoria surgiu por artefatos
descobertos em alguns pontos do continente (inclusive na Lagoa Santa, Minas
Gerais), datados de até 14.500 anos atrás. Além disso, os restos humanos en-
contrados nesses sítios assemelham-se aos dos povos da Oceania e da África.

FIGURA 15 – FLUXOS MIGRATÓRIOS PELO MAR PARA A AMÉRICA

FONTE: <https://bit.ly/3bqOl9b>. Acesso em: 8 maio 2020.

28
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

• Teoria Australiana ou Teoria das diversas ondas migratórias para a América:


une as duas teorias citadas anteriormente, porém com datas anteriores. O pes-
quisador brasileiro Walter Neves é um dos grandes defensores dessa teoria.

FIGURA 16 – VÁRIAS ROTAS DO SER HUMANO PARA A AMÉRICA

FONTE: <https://bit.ly/3bqOl9b>. Acesso em: 8 maio 2020.

O Um pouco mais ousada, essa teoria defende que os seres humanos teriam
chegado ao continente americano por volta de 35 mil anos atrás. Um dos
principais argumentos são os traços negroides encontrados em fósseis
como o da Luzia. Basicamente, isso deveria ter acontecido antes de as
populações asiáticas terem sofrido o processo de mongolização.

NTE
INTERESSA

Mongoloides nada mais são do que os traços das pessoas que vivem na Ásia e
em algumas regiões da Rússia, considerados “amarelos”.

POVOS MOGOLOIDES

FONTE: <https://bit.ly/3hmzFeV>. Acesso em: 12 maio 2020.

29
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Atualmente, podemos afirmar que a chegada do homem ao continente americano se deu


em períodos anteriores às datas que a Teoria de Clóvis e a Malaio-Polinésia citam. No Bra-
sil, temos o sítio arqueológico de Santa Eliana, no Mato Grosso, que tem datado vestígios
de ocupações humanos com 25 mil anos.

6 NIÈDE GUIDON E SUAS DESCOBERTAS NA REGIÃO DE SÃO


RAIMUNDO NONATO
É importante falar das pesquisas desenvolvidas pela Niède Guidon, pesqui-
sadora brasileira que afirma que a ocupação humana na América tem por volta de
100 mil anos, porém, essa discussão gera bastante polêmica na comunidade científi-
ca. Funari (2002) corrobora com alguns questionamentos, falando que acreditar na
Teoria de Clóvis poderia reduzir o ser humano a um animal comum, como masto-
dontes ou camelos. É importante refletir que tecnologias para resistir ao frio naquele
momento eram complexas, sendo que o nível de água dos oceanos havia baixado
devido à glaciação, facilitando a navegação pelas ilhas no Pacífico (FUNARI, 2002).

FIGURA 17 – NIÈDE GUIDON

FONTE: <https://bit.ly/3bpCSGT>. Acesso em: 13 maio 2020.

Nascida em São Paulo em 1933, Niède Guidon formou-se em História Na-


tural (1958) pela Universidade de São Paulo (USP) e, após começar a trabalhar no
Museu Paulista da USP, conseguiu ser contemplada com uma bolsa de estudos
para arqueologia pré-histórica na Universidade de Paris.

Retornou ao Brasil por um período, voltando aos trabalhos no Museu, e,


em 1971, iniciou o seu estudo de doutorado novamente na França (Universidade
de Paris) sob orientação do professor André Leroi-Gourhan (1911-1986). Seus es-
tudos tinham como foco a região de São Raimundo Nonato, localizada na Serra

30
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

da Capivara (Piauí), mais especificamente, as pinturas rupestres encontradas na


região, cuja tese foi intitulada de Les peintures rupestres de Varzea Grande, Piauí,
Brésil, ou seja, “As pinturas rupestres de Várzea Grande, Piauí, Brasil”.

FIGURA 18 – PINTURA RUPESTRE LOCALIZADA NA REGIÃO DA SERRA DA CAPIVARA

FONTE: <https://bit.ly/3ydfk1u>. Acesso em: 14 maio 2020.

Niède descobriu sobre estas pinturas rupestres através de turistas que vi-
sitavam o museu, em que trabalhava:
Ao observarem a exposição disseram que na cidade onde viviam, no
Estado do Piauí, também havia “pinturas e desenhos de índios”. Niè-
de anotou o nome da cidade: São Raimundo Nonato, e em 1970, já
estabilizada na França, fez uma viagem ao Brasil para acompanhar
a antropóloga Vilma Chiara numa pesquisa etnográfica sobre a tribo
Krahô no Estado de Tocantins, e assim aproveitaram para visitar as
tais pinturas da Serra da Capivara (GAUDÊNCIO, 2018, p. 79).

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN, 2007)


defende que:
São Raimundo Nonato passou por uma grande mudança na sua histó-
ria, pois neste período a arqueóloga Niéde Guidon teve contato com os
vestígios arqueológicos de milhares de anos atrás. Assim começaram as
pesquisas no que hoje é o Parque Nacional Serra da Capivara e a região de
São Raimundo Nonato transformou-se no berço do Homem americano.

A partir das pesquisas realizadas nesse território, surgiram alguns estudos


que vieram contrariar o que muitos pesquisadores falavam sobre a não presença
de comunidades humanas na região nordeste do Brasil nas datas evidenciadas.
Piveta (2008), em entrevista realizada com a pesquisadora, fala que:
Naquele tempo, todos os pesquisadores diziam que não havia mate-
rial arqueológico muito antigo no Nordeste, uma região seca e desfa-
vorável à presença humana. Niède teve uma grande surpresa quando
saiu o resultado de uma datação feita na França que estimou em 18 mil
anos a idade de um carvão (resquício possivelmente de uma fogueira
humana) encontrado em Pedra Furada. “Chamei o laboratório e disse:
‘Vocês misturaram os carvões. Nessa região não tem nada antigo’. Aí a

31
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

chefe do laboratório me respondeu: ‘A datação é do seu carvão. Volte lá


e amplie sua pesquisa porque tem alguma coisa diferente ali'”, relem-
brou Niède. Nos 10 anos seguintes, a equipe da arqueóloga escavou
750 m² até bater na rocha de base, a quase 8 metros de profundidade.

Esses indícios encontrados por Niède encontravam (e encontram) forte


resistência na comunidade científica, visto que a ocupação humana na região
nordeste acima de 10 mil anos é vista como muito difícil. Isso se dá realmente
porque as teorias mais aclamadas colocariam a migração para a América em da-
tas parecidas, mas vindas de outros locais, como o Estreito de Bering e por ilhas
desembarcando na parte oeste do continente americano, fato que proporcionaria
outros milhares de anos para acesso nessa região.

A partir das escavações do grupo de Niède, Gaudêncio (2008) ainda colo-


ca que os primeiros resultados foram impressionantes:
Durante as escavações no Boqueirão Pedra Furada em 1981, Niède re-
cebeu a notícia dos laboratórios franceses que suas amostras apresen-
tavam resultados de 18 mil anos BP, algo até então inédito, fazendo
com que ampliassem as escavações, até chegar na rocha de base, a qua-
se 8 metros de profundidade. Ademais, foram encontrados artefatos
como instrumentos cortantes e pontiagudos (facas, raspadores, perfu-
radores feitos de quartzo e quartzito) achados nos solos arqueológicos
junto às fogueiras, e destas foram extraídos os carvões de lenha com
um lado queimado, caracterizando assim, resquícios possivelmente
provenientes de fogueiras humanas (GAUDÊNCIO, 2008, p. 80).

FIGURA 19 – BOQUEIRÃO DA PEDRA FURADA – PIAUÍ

FONTE: <https://bit.ly/3oeSm5u>. Acesso em: 14 maio 2020.

Esses resultados vão contra pesquisas norte-americanas que contestam


veementemente essas datações. Niède e seu grupo vão além, afirmando que a
presença humana na América já existia por volta de 100 mil anos atrás, números
que divergem (e muito) dos apresentados por outros grupos de pesquisa.

Para Niède, uma via possível para ocupações humanas no nordeste brasi-
leiro ocorreu devido a uma:
32
TÓPICO 2 — AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

travessia por via marítima, há cerca de 100 mil anos. A pesquisadora


acredita que o Homo sapiens chegou à América vindo da África por
via oceânica, atravessando o Atlântico. Este percurso pode ter sido fei-
to pela costa Oeste da África, utilizando acorrente oceânica Benguela
e depois a corrente equatorial do Golfo da Guiné, seguindo até a costa
nordestina brasileira, atravessando o Atlântico de ilha em ilha, já que o
mar estava 140 metros mais abaixo do nível de hoje, havendo naquele
período um número maior de ilhas. Porém, Guidon não exclui a hi-
pótese de existirem outros caminhos para a América, vindos da Ásia,
ilhas Malásia, Indonésia e Oceania (GAUDÊNCIO, 2008, p. 82).

Atualmente, na região, tem-se o registro de aproximadamente 1.300 sítios


arqueológicos e muitas deixas para estudos posteriores. O local é considerado um
museu a céu aberto.

Estudos recentes já descobriram que grupos humanos podem ter vivido


há mais de 100 mil anos na América, devido a alguns registros que ainda neces-
sitam de muito estudo e levantamento de provas. Todavia, com certeza, deve-se
defender o apoio às pesquisas realizadas, pois, somente com trabalho sério, será
possível descobrir como foi a ocupação do continente americano.

Portanto, possuímos várias dúvidas sobre muitos aspectos desse longo


período anterior à história da escrita. Muitas, talvez, nunca sejam sanadas, en-
quanto outras tantas pesquisas e estudos sérios poderão auxiliar o ser humano a
conhecer um pouco melhor as suas origens.

33
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• O período em que as sociedades ágrafas se desenvolvem na Terra vai de apro-


ximadamente 7 milhões de anos atrás até por volta de 4 mil anos.

• Para facilitar o estudo, os pesquisadores dividem esse período em quatro par-


tes: paleolítico, mesolítico, neolítico e Idade dos Metais.

• Paleolítico é o período da pedra lascada, que abrange desde o surgimento do


ser humano até por volta de 100 mil anos atrás.

• Mesolítico é um período de transição caracterizado por grandes mudanças


climáticas.

• Neolítico é o período da pedra polida, em que a agricultura e a domesticação


de animais surgiram e foram aprimoradas.

• Idade dos metais é o período em que os seres humanos já tinham domínio


sobre alguns metais, como ferro e bronze, e, a partir disso, várias ferramentas
e armas puderam ser criadas, facilitando a vida das comunidades humanas.

• Os seres humanos apareceram pela primeira vez no continente africano.

• Acredita-se que, com o domínio do fogo e o fortalecimento dos grupos com


ferramentas melhores, o ser humano pôde fazer seu processo migratório,
indo, primeiramente, para os continentes asiático e europeu, e, posteriormen-
te, Oceania e América.

• Há muitas divergências sobre a chegada do ser humano à América – é certo,


porém, que não foi apenas de uma maneira.

• Teoria de Clóvis fala que os primeiros grupos humanos passaram a pé pelo


estreito de Bering, que, segundo estudos, estava congelado.

• Teoria Malaio-Polinésia aborda onde os primeiros seres humanos teriam mi-


grado para a América de barcos, passando de ilhas em ilhas.

• Teoria Australiana fala que os seres humanos vieram de ambas as formas,


mas com datas mais antigas do que as teorias abordam.

34
AUTOATIVIDADE

1 Sabemos que não há um consenso entre pesquisadores sobre a chegada do


ser humano ao continente americano. As três teorias (Clóvis, Malaio-Poli-
nésia e Australiana) colocam pontos de vista consideráveis e comprovados.
Disserte sobre qual teoria você mais compactua e por quê.

2 A historiadora Niède Guidon apresenta uma visão bem crítica sobre a che-
gada do ser humano à América. Pesquise e responda: por que os cientistas,
muitas vezes, não consideram seus estudos?

3 Considerando as quatro divisões do período anterior ao surgimento da


escrita, preencha o quadro a seguir, abordando os avanços propostos por
cada um. Use sua criatividade e capriche nos detalhes.

PERÍODO DESCRIÇÃO

FONTE: O autor

35
36
TÓPICO 3 —
UNIDADE 1

AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS


MODOS DE VIDA

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, estudaremos, de forma mais aprofundada, os primeiros po-


vos que se constituíram no planeta, como foi o seu desenvolvimento, bem como
aspectos relevantes no caminho até o surgimento das primeiras cidades.

Nesse processo, destacamos o processo de sedentarização que os seres hu-


manos conseguiram obter e os aspectos ligados a esse processo, como o aumento
das comunidades humanas e o desenvolvimento de ferramentas mais úteis para
a agricultura, caça e defesa de suas comunidades.

2 CAÇADORES E COLETORES
A partir do aparecimento dos primeiros seres humanos, alguns hábitos
foram moldados com o decorrer do tempo. No período Paleolítico, os seres hu-
manos viviam, basicamente, da caça e da coleta de alimentos.

Uma das ligações mais fortes com o nomadismo era a relação alimentícia.
Esses povos dependiam do “hoje”, ou seja, dependiam de “achar” alimentos ou con-
seguir caçar (nesse termo, podemos incluir a pesca) – basicamente, os primeiros seres
humanos dependiam de condições favoráveis para conseguirem se desenvolver.

ATENCAO

Nesse momento, é importante definir o conceito de nomadismo, que se refere


a povos que não possuem moradia fixa, ou seja, que dependem de recursos naturais para
sua sobrevivência – quando esgotados, era preciso migrar para um lugar que pudesse for-
necer sucessivamente suas necessidades.

37
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Consequentemente, esse processo de nomadismo tem total relação com a diás-


pora do ser humano pelo planeta. Klein aborda, em seu livro O despertar da cultura, que:
Os mais antigos representantes da linha humana ainda se pareciam
e agiam muito como os macacos, e um eventual observador poderia
tê-los confundido com um tipo de chimpanzé. No entanto, havia uma
diferença essencial: no chão, preferiam caminhar de pé, sobre duas
pernas. Tecnicamente, eles são conhecidos hoje como australopitecos,
mas, na aparência e no comportamento, podiam se chamar macacos
bípedes (KLEIN, 2005, p. 25).

Podemos entender que esse processo de nomadismo × sedentarismo é resulta-


do evidente de construções sociais que somente os seres humanos podem desenvolver.

Esse movimento acaba perdendo força a partir do momento que os se-


res humanos conseguiram encontrar alimentos em abundância em algum local
e fixaram suas moradias por faixas mais extensas de tempo. Isso proporcionou,
para muitos grupos, percepções imprescindíveis para uma melhora na qualidade
de vida daquelas comunidades, como a ideia de que uma definição de tarefas
nos grupos, bem como técnicas primitivas de agricultura foram essenciais para
aprimoramentos nas relações sociais, além de proporcionarem uma qualidade de
vida ainda maior para as comunidades.

Grande parte dessas percepções se dá pelos registros que os humanos


deixaram nos lugares onde habitavam. Esses registros podem ser vestígios ou,
em tempos mais recentes, pinturas rupestres nas cavernas.

FIGURA 20 – PINTURA RUPESTRE EM LASCAUX, NA FRANÇA

FONTE: <https://bit.ly/3eM9qg7>. Acesso em: 11 maio 2020.

A partir dessas pinturas deixadas em vários cantos do planeta, os cien-


tistas podem descrever como foi o processo de sedentarização, bem como a
evolução dos humanos.

38
TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS DE VIDA

DICAS

Vale a pena relembrar o documentário “Lascaux, a Pré-História da Arte”, sugeri-


do no Tópico 2, pois mostra como essas pinturas eram realizadas, além de demonstrar em
quais condições os povos as realizavam. Não deixe de conferir!

3 O DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA E


SUAS RELAÇÕES COM O SEDENTARISMO
A partir do momento em que os povos pré-históricos se aglomeraram
(normalmente, perto de grandes rios, devido à facilidade de encontrar alimen-
tos), uma nova forma de produzir foi ganhando força, a agricultura.

Esse movimento foi possível a Revolução Neolítica que pôde acontecer


em dois momentos complementares: “No começo dessa mudança, as primeiras
práticas de agricultura e de criação. De gado, que de agora em diante chamare-
mos protocultura e protocriação de gado, eram aplicadas a populações de plan-
tas e animais que não tinham perdido seus caracteres selvagens” (MAZOYER;
ROUDART, 2010, p. 97, grifos no original).

Posteriormente, a prática da agricultura se desenvolve de maneira intencio-


nal: “Mas, de tanto serem cultivadas e criadas, essas populações adquiriram caracte-
res novos, típicos das espécies domésticas que estão na origem da maior parte das es-
pécies ainda cultivadas e criadas atualmente” (MAZOYER; ROUDART, 2010, p. 100).

Com esse desenvolvimento aflorado da agricultura, os grupos humanos pu-


deram perceber que não dependiam unicamente de condições naturais para a sobre-
vivência; esses povos já podiam produzir seu próprio alimento. Isso proporcionou,
além de aumento das populações, acúmulo de alimentos e até sobras. Pinsky (2001,
p. 32) afirma que “A produção de um excedente agrícola, somado à atividade cria-
dora, serviu para atender às necessidades da comunidade em períodos mais duros”.
Isso promoveu estabilidade aos grupos humanos que puderam voltar suas preocu-
pações para outras situações que não fossem apenas a questão de sobrevivência, mas
também de aprimorar o processo, bem como organizar-se socialmente.

Então, os seres humanos haviam desenvolvido suas sociedades a ponto


de gerar um processo de sedentarização, ou seja, conseguiram fixar moradia e
buscar seu desenvolvimento enquanto grupo.

39
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Heuer (2007, p. 64) cita que:


Pesquisas arqueológicas sugerem que as mulheres podem ter desco-
berto acidentalmente a agricultura. Como as mulheres permaneciam
nos acampamentos enquanto os homens saiam à caça, podem ter ob-
servado a germinação espontânea das plantas. Já que os alimentos
eram jogados em volta dos acampamentos, essa observação pode ter
dado início à descoberta da agricultura.

Seguindo a lógica de Heuer (2007), obviamente, a domesticação de animais


seguiria a mesma ideia, sendo que, conforme os seres humanos desenvolvessem ritos
de alimentação, ou, mais adiante, pastoreio, poderiam manter alimentos por perto
sem precisarem se arriscar em grandes caçadas, que, muitas vezes, eram fatais.

As pinturas rupestres revelam grandes episódios desenvolvidos no perí-


odo anterior ao surgimento da escrita. Na Figura 22, podemos perceber que um
grupo humano marcava seu rebanho nas paredes. Isso era uma espécie primitiva
de matemática, pois cada animal desenhado equivalia a um animal de verdade –
logo, isso só foi possível devido à capacidade criativa única do ser humano.

FIGURA 21 – PINTURAS RUPESTRES MOSTRANDO O COTIDIANO DOS POVOS

FONTE: <https://bit.ly/3wbLrwZ>. Acesso em: 11 maio 2020.

Com mais tempo para realizar outras coisas, além de ficar apenas lutan-
do pela sobrevivência, os grupos humanos foram expandindo suas plantações e
criações, o que gerou aumento populacional e, consequentemente, a necessidade
de uma organização social.

É importante frisar que, nessas épocas, a propriedade, o acesso e o uso da


terra eram considerados algo coletivo, ou seja, não eram posses de um indivíduo em
específico. Contudo, para organizar os grupos, que ficaram mais numerosos, uma
divisão do trabalho precisava ser realizada. Os trabalhos eram distribuídos por sexo
e idade, normalmente, os homens ficavam com serviços mais pesados, como arar a
terra ou, muitas vezes, sair à caça. Já mulheres e crianças dedicavam-se ao cultivo de
alimentos, bem como o cuidado com as criações que eram desenvolvidas.

40
TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS DE VIDA

Muitas comunidades não desenvolveram um sistema sedentarizado des-


de o início, uma espécie de humanos seminômades, que possuíam o domínio da
agricultura, mas, perante a crises climáticas, esgotamento do solo ou até baixas
colheitas, migravam para outros locais e desenvolviam sua agricultura.

NTE
INTERESSA

Atualmente, ainda há povos nômades, logicamente não com as mesmas con-


dições que os povos que viviam antes do surgimento da escrita, mas em situações sociais
bem parecidas. São eles ciganos, Banjara (ciganos da Índia), beduínos e aborígenes austra-
lianos. Esses povos são bem interessantes, vale a pena estudar sobre eles.

4 O SURGIMENTO DAS CIDADES, DA ESCRITA E DO ESTADO


A partir do processo de sedentarização e do crescimento dos agrupamen-
tos humanos, algumas aldeias maiores foram se aglomerando. Conforme mais
pessoas habitavam a aldeia, mais difícil era o processo de mudança e, com isso, a
sedentarização era cada vez mais evidente. No início, as aglomerações possuíam
entre 25 e 35 habitações. Normalmente construídas “[...] sobre palafitas, escava-
das no chão, ou feitas de pedra, madeira e barro” (HEUER, 2007, p. 65), tinham
como característica ficar próximos a rebanhos e plantações.

Heuer (2007) ainda fala que as tribos eram formadas, em geral, por clãs
(organizações familiares) e tinham laços antepassados em comum. Nesse perío-
do, as decisões eram tomadas basicamente por pessoas mais antigas “patriarcas”,
que, após escolhidas pelo grupo, deveriam guiar e tomar as decisões importantes.

Tudo isso evoluiu para formas mais avançadas de organização social, as


chamadas cidades. Segundo historiadores, as primeiras cidades surgiram na região
de Mesopotâmia (atualmente, o Oriente Médio) há aproximadamente 7 mil anos.

41
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

FIGURA 22 – MESOPOTÂMIA

FONTE: <https://bit.ly/3yaazFT>. Acesso em: 11 maio 2020.

As regiões onde existem relatos sobre ocupações mais antigas proporcio-


navam elementos naturais que pudessem “fixar” as pessoas. No caso da Mesopo-
tâmia, os rios Tigre e Eufrates e suas terras férteis, além de peixes, foram essen-
ciais para a fixação dos povos ao seu redor.

Após o desenvolvimento das cidades mesopotâmicas, surgiram as regiões


do vale do Rio Nilo (Egito), Vale do Rio Indo (Paquistão), Grécia, Roma, além do
Vale do Hoang Ho (China). A partir disso, várias cidades foram se constituindo
pelo planeta, incluindo algumas no continente americano, como Teotihuacán (As-
tecas), Machu Picho (Incas) e Tikal (Maias).

Com relação à origem das cidades, é importante considerar que:


se confunde, portanto, com a origem da sociedade de classes, a qual, no
entanto, a precede historicamente. Em certas sociedades rurais, de formas
variadas, se diferencia uma classe que passa a se dedicar totalmente a cer-
tas atividades não produtivas, em geral à guerra e à religião, recebendo
do resto da sociedade o seu sustento material. Esta diferenciação não se
completa, no entanto, enquanto guerreiros e sacerdotes ainda permane-
cem no meio rural, fazendo cultivar seus campos por servos ou escravos.
Somente quando a residência dos guerreiros se transforma em forte e a
dos sacerdotes em templo, agrupando-se ao seu redor as casas de seus
servos especializados, isto é, que igualmente deixaram de ser produtores
diretos, só então a estrutura de classes se consolida e o princípio da dife-
renciação entre campo e cidade se estabelece (SINGER, 1973, p. 13).

Esse aparecimento das cidades foi gradual, conforme os povos se orga-


nizavam. Nas Unidades 2 e 3, serão discutidos os processos que originaram as
primeiras civilizações, sendo que, em grande parte delas, havia alguns itens in-
dispensáveis como a proximidade de água, as terras férteis e a organização social.
42
TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS DE VIDA

5 POVOS ORIGINÁRIOS DA AMÉRICA E SUAS DIVERSAS


ORGANIZAÇÕES

DICAS

Anteriormente, vimos as teorias da migração do ser humano para o continen-


te americano, sendo as mais conhecidas a Teoria de Clóvis, a Teoria Malaio-Polinésia e a
Teoria Australiana. Vamos relembrá-las?

• Teoria de Clóvis: fala que o ser humano chegou a América pelo Estreito de Bering a
mais ou menos 20 mil anos atrás.
• Teoria Malaio-Polinésia ou Teoria da chegada pelo mar: cita que os seres humanos
chegaram a América através de embarcações que vieram pelas ilhas da Polinésia.
• Teoria Australiana ou Teoria das diversas ondas migratórias para a América: une as
duas teorias citadas anteriormente, porém com datas anteriores. O pesquisador brasi-
leiro Walter Neves é um dos grandes defensores dessa teoria.

Esses povos, que chegaram por volta de 20 mil anos atrás, já tinham al-
gumas construções históricas definidas, como uso de algumas ferramentas e de
fogo, e alguns conseguiam manter uma organização social.

Nesse primeiro momento, é importante dividirmos esses povos em quatro


grandes grupos: as sociedades árticas, as sociedades exploradoras de recursos aquá-
ticos, a sociedade de caça especializada e a sociedade de caça e coleta generalizada.

QUADRO 3 – PRIMEIRAS FORMAS DE ORGANIZAÇÕES SOCIAIS NA AMÉRICA

Sociedades Ocuparam as regiões mais frias e caracterizavam-se pela caça e


árticas pesca de animais, como focas, leões marinhos, caribu e urso polar.
Sociedades
Ocuparam as regiões de Estados Unidos, Canadá, Peru e Bra-
exploradoras
sil. Caracterizavam-se pela coleta de moluscos e pesca em áreas
de recursos
fluviais e marítimas. Deram origem aos povos dos sambaquis.
aquáticos
Existiram em regiões do Canadá e Estados Unidos. Especializa-
Sociedade
ram-se na caça de grandes animais, como o tigre dentes-de-sabre
de caça
e preguiças gigantes. Com as mudanças climáticas, esses animais
especializada
entraram em extinção e esse tipo de sociedade se modificou.
Sociedade de Baseava-se na coleta e na caça de recursos variados. Permitia a
caça e coleta exploração durante todas as estações e estabelecia a divisão do
generalizada trabalho por sexo. Desenvolveu-se por toda a América.
FONTE: Adaptado de Heuer (2007, p. 87-88)

43
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Esses povos eram dos mais variados tipos, muito voltados às condições
que lhes eram proporcionadas.
Por volta de 8000 e 6000 a.C., as armas ganharam um acabamento em
forma de pedúnculo, o que permitia maior eficiência na construção
de armas. As populações já se encontravam estabelecidas ao longo de
todo continente americano, buscavam diferentes processos de adapta-
ção. A caça e a coleta eram os principais meios de sobrevivência dessas
comunidades pré-históricas (SOUSA, c2021).

Um dos aspectos mais relevantes desses primeiros povos é em relação ao


grande domínio da agricultura, que aconteceu em tempos mais recentes (entre 5
e 4 mil anos a.C.) na Mesoamérica, mais especificamente no México e na América
Central. Esses povos também chamam a atenção pelo grande avanço em diversas
situações envolvendo a agricultura, os instrumentos utilizados e, principalmente,
o desenvolvimento de grandes civilizações.

TUROS
ESTUDOS FU

Na Unidade 2, abordaremos as grandes sociedades que se desenvolveram na


América, ou seja, os incas, maias e astecas, além dos grandes troncos indígenas brasileiros.

Com relação à pré-história da América, entendemos como essencial fa-


lar dos fósseis de seres humanos mais antigos já encontrados, como o fóssil de
“Eva de Naharon”, datado de aproximadamente 13,6 mil anos, que é considerado
o mais antigo das Américas. Encontrado na região de Yucatán, no México, Eva
acrescentou mais interrogações sobre como os seres humanos chegaram ao conti-
nente americano (Figura 24).

FIGURA 23 – EVA DE NAHARON

FONTE: <https://bit.ly/3w92YFI>. Acesso em: 13 maio 2020.

44
TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS DE VIDA

Esse achado refuta a teoria de que os seres humanos vieram para as Amé-
ricas apenas através do Estreito de Bering, valorizando a Teoria Australiana. A
partir de pesquisas sobre o fóssil de Eva, tem-se que:
O esqueleto dessa mulher, batizada de “Eva de Naharon” – ganhou este
nome porque foi encontrada no cenote de Naharon – estava a 22,6 me-
tros de profundidade. E foi encontrado bem preservado, com 80% da
estrutura original. Uma série de análises foi realizada pela Universidade
Nacional Autônoma do México para estimar dados sobre a mulher. Eva
media 1,41 metro de altura e tinha de 20 a 25 anos quando morreu. En-
tre 2002 e 2008, três laboratórios diferentes fizeram testes de datação. A
idade foi impressionante: com 13,6 mil anos, Eva de Naharon é o mais
antigo fóssil humano encontrado nas Américas (VEIGA, 2018).

Eva era caçadora e coletora, sendo pertencente a tribos nômades que ha-
bitavam a região. Uma curiosidade é que ela foi achada em uma caverna e foi
necessário muito tempo para a retirada de seu fóssil.

Ao abordar os fósseis de seres humanos antigos, é necessário falarmos tam-


bém de “Luzia” (Figura 25), o fóssil mais antigo já encontrado na América do Sul.

FIGURA 24 – RECONSTITUIÇÃO DA FACE DE LUZIA

FONTE: <https://bit.ly/2RUxrJ6>. Acesso em: 13 maio 2020.

Luzia pode ter vivido há 12500 a 13000 anos e, durante um bom tempo, teve
o título de ser humano mais antigo das Américas, tendo sido encontrada no municí-
pio de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais, na gruta da Lapa Vermelha. A equipe que
encontrou o fóssil era chefiada pela arqueóloga francesa Annette Laming-Emperaire.

45
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

UNI

Em 2 de setembro de 2018, o Brasil e o mundo perderam ricos materiais his-


tóricos devido à negligência de alguns órgãos. O Museu Nacional do Rio de Janeiro, um
dos mais antigos do Brasil, pegou fogo, assim como vários elementos da história dos povos
antigos da América, incluindo o fóssil de Luzia. Veja mais sobre as perdas desse fatídico
acontecimento em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-48550660.

FIGURA 25 – CRÂNIO DE LUZIA EXPOSTO NO MUSEU NACIONAL DO RIO DE JANEIRO

FONTE: <https://bit.ly/3br6dQW>. Acesso em: 13 maio 2020.

A região de Lagoa Santa já havia demonstrado alto potencial arqueológi-


co no século XIX, quando “Peter Lund, nos idos de 1840, já atentara para o fato de
que os crânios por ele descobertos em Lagoa Santa apresentavam estreitamento e
faces projetadas para frente, diferenças marcantes em relação ao biótipo mongo-
loide” (TURATTI, 2008, p. 317). Portanto, esses povos tinham traços mongoloides
– traços desenvolvidos por povos da Ásia.

FIGURA 26 – PETER LUND

FONTE: <https://bit.ly/3uNXPTu>. Acesso em: 14 maio 2020.


46
TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS DE VIDA

O fóssil de Luzia, bem como os demais achados em Lagoa Santa, corrobo-


ra as teorias da chegada dos primeiros seres humanos ao continente americano
pelo mar, como afirmam Neves e Piló (2008):
a América pode ter sido colonizada por pelo menos duas levas biológi-
cas distintas e que as etnias indígenas atuais não são necessariamente
descendentes da mais antiga. Pesou muito também o fato de o homem
de Kennewick não demonstrar um formato craniano similar ao dos
ameríndios de hoje (NEVES; PILÓ, 2008, p. 169).

Por isso, podemos perceber as diferenças entre várias descrições de fós-


seis, decorrentes, muito provavelmente, das diversas levas migratórias sofridas
no continente americano em momentos distintos.

Peter Lund já afirmava diferenças entre os fósseis encontrados e os atuais


indígenas:
O trabalho pioneiro de Peter Lund em Lagoa Santa ocorreu entre 1835
e 1844. Das centenas de grutas e abrigos localizados pelo naturalista di-
namarquês com potencial fossilífero, ele explorou aproximadamente 80
deles, localizando mais de 12 mil fósseis. Entretanto, o sítio mais polê-
mico escavado por Lund foi a Gruta do Sumidouro. Nela, Lund encon-
trou restos de megafauna associados a restos humanos. A partir dessa
associação, Lund propôs que a ocupação do continente americano tinha
sido muito anterior ao que se pensava e que o homem e a megafauna
tinham convivido em Lagoa Santa. Todas as missões que sucederam o
trabalho de Lund na região tiveram, em alguma medida, o objetivo de
testar essas propostas (NEVES; DA-GLORIA; HUBBE, 2016, p. 53)

A partir de Lund, vários caminhos iniciais de construção histórica foram


abertos, bem como conclusões:
A questão da morfologia craniana peculiar dos antigos habitantes de
Lagoa Santa também remete a Lund. O naturalista dinamarquês, ob-
servando os crânios do Sumidouro, já sugeria que sua morfologia era
diferente da dos indígenas atuais. Antropólogos do Museu Nacional
do Rio de Janeiro chegaram à mesma conclusão, na década de 1870,
examinando o único crânio de Lagoa Santa que Lund deixou no Bra-
sil. Na primeira metade do século XX, Paul Rivet, célebre antropólogo
francês, também notou que os crânios antigos da América do Sul, aí
incluídos os de Lagoa Santa, apresentavam uma morfologia australo-
-melanésica (NEVES; DA-GLORIA; HUBBE, 2016, p. 55).

Peter Lund era um dinamarquês que pesquisava aspectos ligados à histó-


ria e seus estudos auxiliaram no que diz respeito à chegada dos primeiros seres
humanos à América, promovendo vários avanços.

No entanto, é importante ressaltar que as pesquisas ainda estão em anda-


mento e é possível que, no futuro, tenhamos maior conhecimento sobre a origem
do homem na América, sendo fundamental o investimento em pesquisas científi-
cas para que possamos evoluir em parceria com a ciência.

47
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

LEITURA COMPLEMENTAR

AULA MAGNA – ARQUEOLOGIA COMO TRADUÇÃO DO PASSADO NO


PRESENTE

Fabíola Andréa Silva

A Arqueologia pode traçar sua trajetória intelectual desde os séculos XV e


XVI, no contexto do Antiquarismo e do Classicismo, passando pelo Iluminismo no
século XVIII, para, então, emergir como disciplina científica no século XIX. Para al-
guns historiadores da ciência, a vocação inicial da Arqueologia, no século XIX, era a
construção de uma história da origem e evolução humana no passado ou, em outras
palavras, da pré-história da humanidade, tendo como base os vestígios materiais.

No século XX, a Arqueologia consolidou-se como campo científico e, es-


pecialmente na segunda metade, seu desenvolvimento levou a criação de pa-
radigmas teóricos que expandiram suas abordagem e capacidade explicativa,
sempre na direção da multidisciplinaridade. Se, inicialmente, havia uma ênfase
na história cultural, a etapa seguinte foi marcada pela diversificação temática e
pela compreensão dos processos culturais. Após os anos 1960, a preservação e
o gerenciamento do patrimônio arqueológico ocuparam seu lugar na pauta de
discussões de forma mais sistemática, fazendo a Arqueologia sair dos museus
e universidades, atingindo o poder legislativo, os órgãos públicos, as organiza-
ções não governamentais, a iniciativa privada e as comunidades locais. Mais re-
centemente, especialmente a partir dos anos 1980, a abordagem interpretativa,
contextual e simbólica dos vestígios arqueológicos também entrou na agenda de
pesquisas. Esse desenvolvimento foi marcado por diferentes escolas teóricas que
produziram o que se poderia chamar de uma tensão paradigmática no âmbito da
disciplina – que persiste até hoje. A Arqueologia, que, desde o seu nascimento, já
dialogava com diferentes disciplinas, tornou-se definitivamente pluralista, com
muitos pontos de vista, todos igualmente válidos. Ou, em outras palavras, dife-
rentes teorias e métodos são usados para responder os problemas de pesquisa.
“A Arqueologia começa a parecer menos como uma disciplina bem definida com
claras fronteiras e mais como um tipo fluido de interações negociadas. Menos
como uma coisa e mais como um processo” (Hodder, 1999, p. 19).

No Brasil, a Arqueologia iniciou no período imperial sob a influência do pen-


samento europeu e norte-americano, tanto na prática quanto na estruturação das
instituições (Ferreira, 2010). Ao longo desses séculos, passou por diversas etapas de
produção científica, na maioria das vezes dentro de instituições (museus e institutos
históricos no século XIX, universidades no século XX e as empresas privadas e ONGs
no século XXI). Até a década de 1950, a abordagem arqueológica sempre esteve próxi-
ma da Etnologia Indígena, da História, da Geologia e da Bioantropologia, praticada,
até aquele momento, por poucos indivíduos com diferentes formações acadêmicas.
A ampliação da comunidade dos arqueólogos começa na década de 1950, a partir da
consolidação da perspectiva da proteção do patrimônio arqueológico que ganhou
48
TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS DE VIDA

espaço a partir da década de 1930 e se consolidou em 1961 com a lei de proteção do


patrimônio arqueológico (Lei nº 3294/1961) (Rodrigues, 2006). Nessa etapa, a forma-
ção profissional ocorreu dentro de missões científicas (francesas e norte-americanas)
patrocinadas por órgãos e universidades públicas, com cursos de extensão e espe-
cialização com disciplinas teóricas e práticas, centradas na perspectiva arqueológica,
tangenciada por outras disciplinas como a Antropologia, a História, a Geologia, a
Biologia etc. A partir dos anos 1970, começaram a surgir os primeiros pesquisadores
com doutorado e o primeiro curso de graduação em Arqueologia. Na década seguin-
te, consolidou-se a formação em nível de pós-graduação em Arqueologia, primeira-
mente, vinculada aos Programas de História e Antropologia e, a partir da virada do
milênio, com o estabelecimento de programas específicos de Arqueologia – tendên-
cia que tem se intensificado nos últimos anos.

Ao longo dessa trajetória intelectual – tanto no Brasil como em outros pa-


íses –, a Arqueologia estabeleceu um profícuo diálogo com as diferentes Ciências
Naturais, Ciências da Terra e Ciências Humanas. Nos últimos anos, com a crescente
utilização de um instrumental tecnológico cada vez mais sofisticado, a Arqueologia
também ampliou a sua interação com as Ciências Exatas e Ciências da Computação.

No século XXI, temos o crescimento do número de pesquisadores e dos


dados e problemas arqueológicos, analisados e interpretados de forma cada vez
mais focada e especializada. Em outras palavras, o que vemos é a crescente espe-
cialização dos pesquisadores e da consciência da necessidade de projetos multi-
disciplinares. Isso, inclusive, gera uma diversificação na percepção, por parte dos
pesquisadores, do que seja a episteme da Arqueologia.

Cada vez mais a vocação multidisciplinar confere para a Arqueologia uma


identidade própria – como apontam alguns de seus profissionais (Lyman, 2007).
Isso, porém, não significa que a Arqueologia não tenha uma relação profunda com
a Antropologia (Social e Cultural), pois as histórias intelectuais de ambas se apro-
ximam e, em vários momentos, se confundem. O que se pode assinalar é que a Ar-
queologia trata de algumas problemáticas e pode revelar aspectos não contempla-
dos pela Antropologia. O importante, no entanto, é que apesar das particularidades
do campo arqueológico, o diálogo entre a Arqueologia e a Antropologia é funda-
mental e profícuo para ambas, como vem sendo demonstrado desde o século XIX.

Um dos aspectos, a meu ver, extremamente interessante nesse diálogo, na


atualidade, diz respeito à problemática da preservação e significação do patrimô-
nio arqueológico por parte de diferentes coletivos humanos. Há, hoje, um enorme
interesse na preservação dos bens culturais do passado, e isso tem várias razões:
sociais, econômicas, políticas, identitárias etc. Para alguns pensadores, a pós-mo-
dernidade e a suposta fluidez e instabilidade que ela trouxe, nos diferentes domí-
nios de nossa existência, fazem com que, muitas vezes, os homens busquem, no
passado, uma possível alternativa às inconstâncias do dia a dia (Hodder, 1999).
Povos no mundo todo se valem da Arqueologia para ajudar a manter a particu-
laridade de seus passados em face à globalização e a dominação ocidental, como
uma estratégia para driblar a monotonia cultural.

49
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Nesse contexto, os arqueólogos são chamados para fora dos seus laborató-
rios, gabinetes, salas de aula e escavações. Eles são peças-chave nos debates sobre
gerenciamento dos bens culturais, preservação do meio ambiente, identificação de
territórios imemoriais. Enfim, são chamados a opinar na definição de diferentes polí-
ticas públicas. Assim, o arqueólogo se torna – como escreveu Hodder (1992) – um in-
térprete entre o passado e o presente e entre diferentes perspectivas sobre o passado.

Recentemente, vivenciei mais uma experiência interessante junto à popula-


ção Asurini do Xingu, com quem convivo desde 1996 e que me levou a refletir sobre
esse novo contexto da pesquisa arqueológica e da importância de expandir suas fron-
teiras teóricas, metodológicas e temáticas. Não apenas em termos do diálogo com
outras disciplinas científicas, mas também com outros coletivos e modos de saber.

Os Asurini do Xingu, um grupo indígena Tupi, falante de uma língua per-


tencente à família linguística Tupi Guarani, ocupa uma Terra Indígena localizada
no estado do Pará, delimitada pelos municípios de Altamira e Senador José Por-
fírio. Sua aldeia está localizada à margem direita do rio Xingu, junto ao P.I. Kua-
tinemu, que é auxiliado pela unidade da FUNAI localizada em Altamira, Pará.
Trata-se de uma população agricultora com uma dieta bastante diversificada que
combina os recursos da roça (p. ex., milho, mandioca, batata, feijão, banana etc.)
com os produtos da pesca, caça e coleta. Em termos sociais, eles têm, no grupo
doméstico, a sua unidade social mais importante que tem, também, importân-
cia política e econômica. A sua vida ritual é dividida em dois complexos rituais
fundamentais: o maraka – complexo ritual terapêutico e propiciatório – e o turé
– complexo ritual em que se realizam os ritos associados à guerra, morte e inicia-
ção dos jovens. Com relação à produção da cultura material, na qual homens e
mulheres dedicam grande parte do seu tempo, os Asurini são reconhecidos pela
maestria artesanal e por um apurado senso estético.

Essa população indígena foi contatada em 1971 pelo Pe. Anton Luckesh e, em
1972, pela FUNAI. No período do contato, os Asurini estavam distribuídos em peque-
nos acampamentos, próximos às margens do Igarapé Ipiaçava e na aldeia Taiuviaka.
Após o contato, essa aldeia e acampamentos foram aos poucos abandonados e eles
instalaram novas aldeias (Akapepungui e Kuatinemu). Em 1982, eles foram transfe-
ridos para a aldeia atual, na margem direita do rio Xingu, também chamada de Kua-
tinemu. Segundo os Asurini, o contato com os brancos (FUNAI) foi uma necessidade
de sobrevivência, diante do que eles acreditavam ser o fim eminente de seu povo. Esse
motivado pelos ataques que eles sofriam há anos de outros indígenas (p. ex., Kayapó
e Araweté) e pelas doenças transmitidas pelos brancos (p. ex., gateiros, castanheiros
etc.) invasores de seu território. A história dos Asurini é repleta de belicosidade, baixas
populacionais e de deslocamentos e perdas territoriais. Mesmo depois do contato, eles
continuaram a sofrer com as doenças transmitidas pelos brancos. Isso gerou um dese-
quilíbrio na sua pirâmide etária, com graves consequências culturais.

Em maio de 2010, realizei mais uma pesquisa arqueológica e etnoarque-


ológica na T.I. Kuatinemu, como parte das atividades do projeto intitulado Ter-
ritório e História dos Asurini do Xingu: um estudo bibliográfico, documental,

50
TÓPICO 3 — AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS E SEUS MODOS DE VIDA

arqueológico e etnoarqueológico sobre a trajetória histórica dos Asurini do Xingu


(século XIX até os dias atuais), coordenado por mim e financiado pela Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Este projeto foi elabo-
rado com o objetivo de contar uma parte desta história e contribuir para a preser-
vação da memória Asurini e sobre sua trajetória, como legado às novas gerações.

O projeto de pesquisa foi desenvolvido contemplando vários aspectos e es-


tratégias metodológicas da arqueologia colaborativa: 1) os Asurini participaram na
elaboração da proposta e na definição da logística do projeto; 2) foram os guias na
expedição pelo igarapé Ipiaçava, definindo os locais de acampamento e indicando
a localização dos sítios a serem pesquisados; 3) foram contratados como auxiliares
no levantamento do potencial arqueológico da área e na logística da expedição pelo
Ipiaçava; 4) foram responsáveis pela elaboração de parte do material audiovisual.
Foram doze dias intensos de viagem pelo Ipiaçava durante os quais localizamos três
antigos assentamentos Asurini, todos sobre antigos sítios arqueológicos. Um total
de 55 pessoas (homens, mulheres e crianças) seguiram nesta jornada (re)visitando
locais abandonados pelos Asurini há pelo menos quarenta anos. Um verdadeiro
retorno ao passado e uma experiência sobre a memória e significado dos lugares.
Eu e Tukura ficamos sentados na capoeira próxima da aldeia Taiuviaka
e ficamos conversando sobre como teria sido a vida dos velhos ali na-
quele lugar, o que eles teriam passado, como deve ter sido difícil para
eles ficar fugindo dos outros índios … quase dava para a gente sentir o
que eles tinham passado ali (Depoimento de Ajé Asurini, um dos jovens
líderes Asurini e presidente da Associação Indígena Awaeté).

No que se refere à pesquisa arqueológica, o aprendizado em campo foi


imenso, pois a articulação do ponto de vista ocidental com o ponto de vista indí-
gena sobre a arqueologia da área me fez refletir sobre a minha prática como cien-
tista e, especialmente, sobre o meu trabalho de 14 anos com os Asurini do Xingu.

Durante todo o trabalho, debati com os meus colaboradores índios sobre temas
como a origem e expansão dos povos Tupi, o surgimento dos Asurini do Xingu como po-
pulação indígena, a natureza e a autoria dos vestígios arqueológicos. Todas as reflexões
Asurini foram pautadas em sua filosofia ameríndia sobre a relação entre os humanos, a
natureza e a sobrenatureza. Os mitos de Ajaré, Tauvuma, Maíra foram o substrato para as
explicações Asurini sobre a sua trajetória e de seus antepassados (Silva, 2002).

Numa noite antes da viagem ao Igarapé Ipiaçava e depois de uma longa con-
versa com alguns jovens sobre estes temas e de explanar com relativo detalhe as ex-
plicações linguísticas, antropológicas e arqueológicas que situam a origem dos povos
Tupi no sudoeste da Amazônia tive minha explicação questionada por um Asurini:
Sabe Fabíola, esta explicação pode estar certa para os outros índios,
mas não para os Asurini. Eu confio na nossa explicação. Eu acredito
que nós nascemos de Uirá e Ajaré... e as panelas que a gente encontra
são de Anumai. Eu acredito nesta história porque ela vem de muito
tempo... contada de pai para filho... não se perde... não se esquece...
por isso que ela é a mais certa prá mim (Kwain Asurini, jovem lideran-
ça indígena, vice-presidente da Associação Indígena Awaeté).

51
UNIDADE 1 — SOCIEDADES ÁGRAFAS

Quando retornamos à aldeia, na noite anterior à minha volta para Altami-


ra, Kwain me disse que talvez eu estivesse parcialmente certa e que nem todo o
material cerâmico encontrado fosse de Anumai... Talvez, os que estivessem abai-
xo fossem de outros índios.

Diante dessa experiência e da interlocução com os Asurini, eu me fiz uma


pergunta: qual é o papel do arqueólogo? Produzir e disseminar o conhecimento
arqueológico sobre o passado? Facilitar o envolvimento do passado em um pre-
sente multicultural?

Particularmente, como profissional da arqueologia, acredito que nossa


prática e interpretação sobre o passado devam levar em consideração as múlti-
plas vozes interpretativas sobre a trajetória humana no passado. Nós não somos
os donos do passado, mas, talvez, sejamos um profissional cuja responsabilidade
está em possibilitar esta tradução multivocal do passado no presente. É preciso
descolonizar a construção do conhecimento arqueológico.

Esse movimento de “descolonização” da arqueologia, no entanto, não é


uma tarefa fácil, tanto pelas populações indígenas como a comunidade científica
e demais agentes envolvidos com demandas em territórios indígenas. Inúmeras
reflexões têm sido feitas sobre os problemas e as possibilidades de se trabalhar
com essa perspectiva alternativa, dialógica e reflexiva de produção do conheci-
mento arqueológico sobre esses povos.

Alguns dos aspectos mais relevantes e, também, mais difíceis de serem


levados a cabo nesse movimento pela descolonização da prática arqueológica em
territórios indígenas dizem respeito à interpretação e construção do conhecimen-
to sobre o patrimônio arqueológico e a sua divulgação e disseminação a partir
de uma perspectiva intercultural. Normalmente, os arqueólogos não estabelecem
parcerias com os povos indígenas para a interpretação ou divulgação dos dados
pesquisados. Isso acontece, principalmente, porque os modos de conhecer dos
arqueólogos e indígenas não são os mesmos e isso dificulta uma compreensão
consensual sobre os fenômenos observados. Nesse sentido, a construção inter-
cultural do conhecimento e a parceria no processo de divulgação deste conheci-
mento só podem ser realizadas a partir de uma perspectiva multivocal (Isaacson
& Ford, 2005). Por fim, resta concordar com Jackson e Smith (2005, p. 346): “A
descolonização da arqueologia indígena na prática envolve uma redefinição dos
papéis, direitos e responsabilidades tanto dos arqueólogos como dos povos indí-
genas... tem de envolver uma mudança nas relações de poder”.
FONTE: Adaptado de SILVA, F. A. Aula Magna – Arqueologia Como Tradução do Passado no Presente.
Amazônica, v. 3, n. 2, p. 260-267, 2011. Disponível em: https://bit.ly/3w6fPIZ. Acesso em: 26 abr. 2021.

52
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os primeiros seres humanos eram caçadores e coletores, e viviam de maneira


nômade, enfrentando muitas dificuldades para sobreviver.

• O conceito principal de nomadismo está relacionado com os povos que não


possuem moradia fixa, enquanto o sedentarismo é associado aos povos que
possuem moradias fixas.

• Os povos começaram um processo de sedentarização devido ao desenvol-


vimento da agricultura e da pecuária. Esse processo fez as comunidades au-
mentarem suas populações e, consequentemente, a necessidade de criar uma
organização maior.

• As primeiras grandes aglomerações ocorreram perto de rios, como os rios


Tigre e Eufrates.

• Havia quatro principais divisões dos primeiros povos no continente america-


no: sociedades árticas, sociedades exploradoras de recursos aquáticos, socie-
dade de caça especializada e sociedade de caça e coleta generalizada.

• As sociedades árticas habitavam as regiões mais frias, sobrevivendo por meio


da caça de animais como focas e ursos polares.

• As sociedades exploradoras de recursos aquáticos viviam, principalmente, da


coleta de moluscos e da pesca. Os sambaquis encontrados no Brasil são restos
dessas sociedades.

• As sociedades de caça especializada conseguiam caçar animais de grande


porte, como o temido tigre dentes-de-sabre e preguiças gigantes.

• As sociedades de caça e coleta generalizada desenvolveram-se por toda a


América, tendo divisões de trabalho definidas por sexo.

CHAMADA

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AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

53
AUTOATIVIDADE

1 De acordo com a história do período anterior ao surgimento da escrita, po-


demos perceber que as divisões têm algumas especificidades. Classifique V
para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) O período paleolítico é quando em que o ser humano iniciou o seu desen-


volvimento como espécie homo.
( ) A Idade dos Metais tem esse nome em virtude de os seres humanos te-
rem desenvolvido técnicas para utilizar itens de metais.
( ) O termo sociedades ágrafas é atribuído às sociedades que surgiram após
a criação da escrita.
( ) O período neolítico também é conhecido como período da pedra polida.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – V – F – V.
b) ( ) F – V – V – F.
c) ( ) V – F – F – F.
d) ( ) F – F – V – F.

2 A síndrome de “europeizar” a história e, muitas vezes, de não reconhecer


os povos que não desenvolveram a escrita ou organizaram sociedades no
mesmo período foi muito comum em algumas correntes históricas. Expres-
se sua opinião sobre essa europeização da história.

3 Ao abordar os fósseis de seres humanos antigos, é necessário falar também do


fóssil “Luzia”, encontrado na América do Sul. Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Foi achado no sítio arqueológico de Lagoa Santa pela historiadora Niè-


de Guidon.
b) ( ) Atualmente, é um dos fósseis mais antigos das Américas.
c) ( ) Ele corrobora as teorias da chegada dos primeiros seres humanos ao
continente americano pelo mar.
d) ( ) Nenhuma das alternativas anteriores está correta.

54
REFERÊNCIAS
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56
UNIDADE 2 —

POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA


E NO ORIENTE MÉDIO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer os povos da África, como o povo egípcio e as transformações pro-


movidas a partir de suas contribuições enquanto civilização;

• conhecer os povos da Mesopotâmia, como sumérios, babilônios, assírios


e outros, além dos importantes avanços que eles desenvolveram para a
humanidade, como escrita, código de leis;

• conhecer as três civilizações que habitaram o atual Oriente Médio e se


desenvolveram em épocas parecidas e com grandes contribuições para a
atualidade: o povo hebreu, os fenícios e o império persa;

• conhecer as primeiras grandes civilizações que habitaram o continente


americano: os astecas, os maias, os incas e os povos indígenas.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da
unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o
conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – POVOS DA ÁFRICA

TÓPICO 2 – POVOS MESOPOTÂMICOS

TÓPICO 3 – POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO

TÓPICO 4 – POVOS DA AMÉRICA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

57
58
TÓPICO 1 —
UNIDADE 2

POVOS DA ÁFRICA

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, abordaremos, de maneira mais específica, o povo egípcio e


as transformações promovidas a partir de suas contribuições enquanto civilização.
Conhecidos, na atualidade, pelas grandes pirâmides, possuíram uma cultura muito
avançada, tendo estudos reconhecidos em muitas áreas, principalmente na medicina.

Auxiliados pelo rio Nilo e suas cheias, a civilização egípcia conseguiu usar
esse fenômeno natural para criar sistemas de irrigação e realizar plantações que
conseguiram garantir a sobrevivência da população e manter a sociedade ativa.

Além disso, os egípcios se destacaram por sua religiosidade. A sociedade


egípcia era organizada sob o comando dos faraós, que eram considerados deuses
na Terra. As pessoas que habitaram o Egito Antigo encontraram, em meio a um
deserto, um local próspero e capaz de abrigar uma das mais antigas civilizações
conhecidas pela humanidade.

2 OS EGÍPCIOS E SUA ORGANIZAÇÃO


Os primeiros registros de uma civilização que se desenvolveu ao nordeste
da África, ao lado do deserto do Saara e com fronteira no rio Nilo, aconteceu a
aproximadamente 6 mil anos atrás. O Egito era banhado pelo mar Mediterrâneo
(ao norte), o deserto da Líbia (oeste), o Mar Vermelho (sul) e o deserto Oriental
Africano (leste). Consistia em uma região desértica, mas com o rio Nilo trazendo
fertilidade, água e alimentos ao longo de suas margens.

Como proferiu Heródoto, ainda no século V a.C., “Egito, uma dádiva do Nilo”
e, por muitos estudiosos assim também definido, em determinada época do ano, o rio
Nilo inundava as terras localizadas em suas margens ao longo de toda a sua extensão.

59
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

NTE
INTERESSA

Heródoto é conhecido como o “pai da História”, viveu na Grécia e foi o primeiro a


ter buscado fazer pesquisas históricas. Heródoto viajou para o Egito e as cidades em torno do
Mar Mediterrâneo, e, como as fontes sugerem, faleceu nas terras do antigo Império Romano.
Uma curiosidade interessante é que a Itália é uma denominação moderna para, na época
de Heródoto, o Império Romano.

FIGURA 1 – AS TERRAS DO EGITO ANTIGO E SUA EXTENSÃO

FONTE: <https://bit.ly/3eLS0Av>. Acesso em: 25 maio 2020.

As primeiras formas de organização social do Egito Antigo apareceram


ao longo da extensão do rio Nilo devido às cheias que ocorriam periodicamente
e inundavam as terras ao redor do rio, tornando-as férteis. Em meio ao deserto,
apenas uma civilização habitava.

Na região conhecida como crescente fértil, além dos egípcios, outras civi-
lizações se desenvolveram, como os povos mesopotâmicos. Na Figura 2, pode-
mos observar as regiões egípcias e mesopotâmicas próximas.

60
TÓPICO 1 — POVOS DA ÁFRICA

FIGURA 2 – CRESCENTE FÉRTIL

FONTE: <https://bit.ly/3hr9Lqs>. Acesso em: 26 maio 2020.

Em formato de “C”, a região envolvia, além do rio Nilo, os rios Tigre,


Eufrates e Jordão, responsáveis por fornecer terras úmidas e férteis em meio ao
deserto e proporcionar condições para o desenvolvimento de civilizações.

3 PERÍODOS QUE CONTEMPLAM O EGITO ANTIGO


O Egito Antigo teve sua história dividida em três momentos: o Antigo Império
(3200-2100 a.C.), o Médio Império (2100-1750 a.C.) e o Novo Império (1580-525 a.C.).

O Antigo Império é marcado pelas grandes obras de irrigação e drenagem,


que auxiliaram muito no desenvolvimento da agricultura na região. Além disso, fo-
ram construídas as grandiosas pirâmides de Gizé, Quéops, Quéfren e Miquerinos.

DICAS

Um dos principais marcos da civilização egipciana na atualidade são as pirâ-


mides, que resultam de todo seu esplendor. O canal Discovery Civilization elaborou um
documentário muito interessante, sobre os “Legados do Egito: As pirâmides”, disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=xEip1ZmdbUY. Vale a pena assistir!

61
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

O Antigo Império encerrou-se com várias disputas pelo poder, devido ao


acúmulo de funções, sendo o faraó uma figura muito forte dentro da organização
social criada por eles.

ATENCAO

Mais adiante, falaremos sobre as funções específicas do líder do Egito Antigo –


o faraó. Por enquanto, cabe antecipar que ele era tratado como um deus para os egípcios,
tendo poderes políticos, religiosos, militares e econômicos.

A figura do faraó foi muito necessária devido à toda estrutura territorial


alcançada. Lima (2016, p. 38) destaca que: “O Egito faraônico é reconhecido como
o primeiro grande Estado territorial da história humana, com a emergência há
cerca de cinco milênios de uma estrutura política que unificou um território con-
sideravelmente extenso sobre o poder de um monarca”.

O fato de o Faraó concentrar tantos poderes deixou várias pessoas des-


contentes, como era o caso dos nomos (clãs), que tinham domínio sobre as terras
cultiváveis, quando o Egito era dividido em 42 partes ou “nomos”.

A partir de, aproximadamente, 2100 a.C., esse descontentamento foi con-


trolado, dando início ao que os historiadores chamam de Médio Império. Com
poderes reestabelecidos e a mudança da capital de Mênfis para Tebas, o Egito
Antigo voltou a prosperar.

Nesse momento, há uma divisão maior de poderes com os camponeses, os quais


puderam ocupar cargos administrativos (antes destinados apenas a uma elite); além dis-
so, houve uma diminuição de impostos e a concessão de terras aos camponeses.

Foi um período marcado por expansão, cuja pequena ascensão econômica


logo foi freada por desgastes internos. Por volta de 1750 a.C., os Hicsos (povo
nômade de origem asiática) assumiram o controle das terras egípcias até aproxi-
madamente 1580 a.C.

Após esse momento, os egípcios conseguiram se reestruturar e expulsaram os


hicsos de suas terras, iniciando o período conhecido como “Novo Império”, marcado
principalmente por muitas expansões territoriais até o Rio Eufrates (Mesopotâmia).

Além de grandes conquistas, o clima interno do Egito estava um pouco


caótico e, segundo Tomelim (2007, p. 26):

62
TÓPICO 1 — POVOS DA ÁFRICA

Amenófis IV, casado com Nefertite, reorganizou a política e a religião,


substituindo os deuses tradicionais por Aton (simbolizando o disco so-
lar), e com isso diminuiu o poder dos sacerdotes, que acabaram, por
fim, expulsos. Esse imperador passou a se chamar Aquenaton que sig-
nifica supremo sacerdote do novo deus. Tutancâmon, sucessor de Aque-
naton, restaurou o culto aos deuses tradicionais e pôs fim a revolução.

Contudo, o período sem guerras não durou muito. Primeiro os hititas,


depois assírios e, ainda, gregos e romanos puseram fim ao império egípcio.

4 RIO NILO E SUA IMPORTÂNCIA


Conforme visto anteriormente, o rio Nilo foi responsável, em grande
parte, pelo desenvolvimento da civilização egípcia, ao proporcionar terras férteis
em seu percurso, devido às cheias constantes, além de ser fonte de alimento e
água para plantações e criações.

Em latim, Nilus significa “negro”, assim denominado por sua cor escura,
o rio Nilo carrega muitos dejetos oriundos da última glaciação, bem como massa
orgânica composta por vegetais e animais que estão depositados em suas margens.
Isso faz sua coloração ser mais escura que o normal. Atualmente, em questão de
extensão, é o maior rio do mundo, possuindo 882 km de comprimento.

FIGURA 3 – RIO NILO

FONTE: <https://bit.ly/3fjRJn7>. Acesso em: 28 maio 2020.

O desenvolvimento de povos ao seu redor só foi possível devido às mar-


gens estendidas, às cheias constantes e ao grande material orgânico depositado em
suas margens. Tudo isso fez com que vários povos iniciassem um desenvolvimen-
to, unindo-se e tornando-se a grande civilização egípcia como conhecemos hoje.

63
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

Muitos historiadores citam essa passagem como a hipótese causal hidráulica,


a qual considera os grandes recursos naturais existentes ao redor dos rios e o apare-
cimento das grandes civilizações. Entretanto, não é consenso, devido ao fato de as
civilizações terem surgido em função de vários quesitos, e não somente pelos rios.

DICAS

Para conhecer mais sobre a hipótese causal hidráulica, sugerimos a leitura do texto
clássico do escritor Ciro Flamarion Cardoso, que também cita o modo de produção asiático:

CARDOSO, C. F. Sociedades do Antigo Oriente Próximo: Palácios, templos e aldeias: o


“modo de produção asiático”. São Paulo: Ática Didático, 1995.

5 O FARAÓ E SUA DUPLA FUNÇÃO: REI E DEUS


No Egito Antigo, o faraó (em hebraico, significa “casa elevada”) era o tí-
tulo de maior poder da sociedade, criado a partir da união entre os povos do sul
e do norte, por volta de 3200 a.C., quando Menés passou a ter o título de faraó.

Com grandes poderes, era responsável pelo controle do exército e da justi-


ça, da fiscalização de obras públicas e sacerdote supremo. Com base na mitologia
egípcia, o faraó era descendente direto do deus Hórus – segundo a crença, o seu
sangue tinha traços do deus –, sendo o seu representante na Terra.

FIGURA 4 – BUSTO DO FARAÓ MENÉS

FONTE: <https://bit.ly/2SSw8L9>. Acesso em: 8 jun. 2020.

64
TÓPICO 1 — POVOS DA ÁFRICA

NTE
INTERESSA

Mais adiante, falaremos sobre os deuses do Egito Antigo, porém, para contex-
tualizar, o deus Hórus era conhecido como deus dos céus e dos vivos, possuindo olhos que
representavam o sol e a lua e cabeça de falcão.

Esses “poderes” divinos não são resultado apenas de dizeres. Podem ser
considerados vários aspectos muito importantes na vida cotidiana da população:
No caso faraônico, o fetichismo de Estado aprofunda-se ao se mesclar
com o fetichismo religioso, já que o monarca é, também, um represen-
tante do mundo sobrenatural dos deuses. Estes deuses são responsáveis
não apenas pela vida de todos os seres humanos, como também pelo
funcionamento da natureza e, consequentemente, da produção. Isto faz
com que, como visto, o fruto do esforço produtivo dos homens não lhes
apareça como próprio, já que, por exemplo, a agricultura não depende
unicamente do trabalho humano, mas, principalmente, da dádiva da
providência divina. No fim, isto acaba por justificar o pagamento – que
recai sobre o trabalho da parcela produtiva da comunidade – de tributos
voltados, nas palavras de Marx acerca das “formações orientais”, em
parte para o déspota real, em parte para o deus (LIMA, 2016, p. 100).

Isso demonstra que a hierarquia egípcia se “aproveitava” das crenças


divinas para, de certa maneira, manter e ampliar cada vez mais seu poder. Assim,
além do faraó, havia outros grupos privilegiados dentro do Egito Antigo.

A pirâmide social egípcia tinha o faraó no topo da estrutura e os escravos


em sua base, vivendo em uma monarquia teocrática, ou seja, as ações do governo
eram baseadas em crenças religiosas. Apesar de concentrar vários poderes no
faraó, a sociedade egípcia possuía alguma mobilidade social, ou seja, as pessoas
podiam alcançar avanços em relação à mobilidade social.

Podemos compreender a pirâmide social no Egito Antigo (Figura 5) e o


papel de cada classe na sociedade como:

65
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

FIGURA 5 – PIRÂMIDE SOCIAL DO EGITO ANTIGO

FONTE: <https://conhecimentocientifico.r7.com/egito-antigo/>. Acesso em: 15 jun. 2020.

• faraó: possuía o poder absoluto, incumbido de manter a ordem e a justiça na


sociedade. Caso não conseguisse realizar, ele era punido com a morte;
• nobreza: composta por sacerdotes, Viziers (pessoas da família do faraó) e
oficiais do exército. Deles eram escolhidas as rainhas, normalmente parentes
diretos, para “perpetuar” o sangue divino do faraó;
• escribas: eram muito importantes no Egito, tendo o papel de registrar os
acontecimentos, além de poderem ingressar no serviço público e fazer a fun-
ção de administradores;
• soldados: função de garantir a segurança das fronteiras, escoltar missões para
outros territórios;
• artesãos: eram pessoas que viviam do artesanato e suas habilidades. Algumas
viviam em aldeias, vendendo seus produtos no comércio e os mais habilido-
sos podiam ser convocados para trabalhar exclusivamente para o Faraó ou
para os nobres;
• camponeses: pessoas que trabalhavam nas terras, normalmente ficavam com
pouca renda, pois trabalhavam em terras da nobreza.
• escravos: normalmente, eram os prisioneiros de guerra, servindo basicamen-
te para trabalhar em obras públicas (mão de obra pesada).

Com isso, podemos perceber que a sociedade egípcia possuía uma estru-
tura muito parecida com as demais civilizações. Contudo, a questão teocrática
destoava das demais e mostrava a grande força da religião sobre as pessoas.

6 A VIDA DAS MULHERES NO EGITO ANTIGO


Com relação à importância da vida das mulheres no Egito Antigo na so-
ciedade, como elas possuíam os mesmos direitos que os homens, podiam exercer
quaisquer funções. Podemos dar o exemplo de Hatshepsut que foi, por muitos,
considerada a faraó mais popular do Egito Antigo, sendo muito mencionada em
filmes, documentários e reportagens que falam sobre o Egito.

66
TÓPICO 1 — POVOS DA ÁFRICA

DICAS

Para conhecer um pouco mais sobre a faraó Hatshepsut, a BBC organizou uma re-
portagem que traz vários elementos importantes sobre seu reinado. Acesse: https://bbc.in/3bqXFty.

A sociedade egípcia tinha uma visão que conferia determinados direitos


em relação às mulheres.

FIGURA 6 – POSIÇÕES IGUALITÁRIAS MULHERES E HOMENS EGÍPCIOS

FONTE: <https://bit.ly/3tLTdMl>. Acesso em: 15 jun. 2020.

A Figura 6 evidencia os papéis igualitários ao mostrar a mulher do mesmo ta-


manho do homem, embora fosse comum elas serem representadas, na arte, em tamanho
inferior. No Egito Antigo, as pinturas humanas tinham proporções aumentadas, devido
a sua importância para a sociedade. Assim, ao representar homens e mulheres do mesmo
tamanho, teoricamente, demonstra que ambos teriam a mesma importância.

Essa valorização das mulheres se deu principalmente a partir do século V


a.C. e, segundo Morley e Salariya (1999, p. 34):
As mulheres eram bem tratadas no Egito Antigo. Elas podiam receber
uma remuneração e ter propriedades. A lei egípcia reconhecia seus
direitos e elas podiam ir aos tribunais reclamá-los, se sentissem que
estavam sendo tratadas de forma injusta. Era esperado que os maridos
permitissem as suas esposas irem aonde quisessem e fazer o que dese-
jassem. As mulheres nas famílias mais pobres tinham de trabalhar em
casa, nos campos, ou ajudando no ofício de seus maridos. A função de
uma sacerdotisa era considerada uma honra e não um trabalho. Uma
mulher poderia se tornar faraó mais isso era extremamente raro.

67
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

É muito importante destacar que, em grande parte das demais civiliza-


ções, as mulheres não tinham muitos direitos, sujeitando-se a serem apenas “do-
nas de casa”. Embora no Egito Antigo essa concepção tenha sofrido uma varia-
ção, mesmo assim, ainda havia muitos direitos a serem conquistados. Baines e
Malik (2008, p. 205) chamam atenção para esse movimento:
As mulheres não possuíram nenhum título importante, sem contar al-
guns relacionados ao sacerdócio, e, fora alguns membros da família
real e as soberanas reinantes, tiveram pouco poder político. Seu título
mais comum era, “senhora da casa”, é um título de respeito que signi-
fica apenas algo mais que “Senhora”.

Como era uma monarquia teocrática, os egípcios acreditavam que a família


do faraó tinha sangue divino, o qual deveria permanecer entre a família, não poden-
do ser passado a outras pessoas. Tais concepções foram responsáveis por caracterizar
relações matrimoniais de endogamia (casamento entre pessoas da mesma família).

7 SISTEMA DE ESCRITA: HIERÓGLIFOS, DEMÓTICO E


HIERÁTICO
Por volta de 3200 a.C., os egípcios desenvolveram um sistema de escrita com
sinais ou caracteres pictóricos conhecidos como hieróglifos. A palavra hieróglifo
vem de grego e significa “escrita sagrada”, o que demonstra que não era para qual-
quer um utilizá-la. Esse sistema de escrita começou a ser utilizado pelos egípcios para
descrever rituais, oferendas, coisas do faraó e situações importantes do Egito Antigo.

NTE
INTERESSA

O sistema de escrita egípcio e a escrita cuneiforme dos sumérios são alguns


dos sistemas mais antigos do mundo.

Nessa escrita, cada sinal tinha a função de representar um objeto, uma


parte do corpo, os animais, entre outras formas de representação. Era uma escrita
um tanto quanto complexa, chegando a conter aproximadamente 6.900 sinais.

68
TÓPICO 1 — POVOS DA ÁFRICA

FIGURA 7 – FONEMAS BÁSICOS DO ALFABETO EGÍPCIO E SUA TRANSLITERAÇÃO PARA A


LÍNGUA PORTUGUESA

FONTE: <https://bit.ly/2SHrTSq>. Acesso em: 24 ago. 2020.

Dominada basicamente pelos “escribas”, o sistema de escrita egípcio não


era acessado por grande parte da população. “O escriba não era, pois, prestigiado
por saber escrever e contar, mas sim pelo fato de essas atividades estarem a servi-
ço do faraó, do poder central, fonte da autoridade e do poder” (PINSKY, 2007, p.
76). Os escribas faziam a escrita em um papel chamado “papiro”, fabricado com
o talo de uma planta, além de usarem pincéis e tinteiros.

Era um processo complexo e muito importante para registrar o cotidiano


desse povo, que foram conservadas até os dias de hoje. Isso só foi possível gra-
ças aos trabalhos de decifração realizados pelo egiptólogo francês Jean-François
Champollion (o primeiro a decifrar os hieróglifos egípcios no século XIX).

NTE
INTERESSA

Jean-François Champollion é considerado o fundador da egiptologia, além


de ter trabalhos muito importantes no quesito de decifrar escritas antigas. A partir de seus
estudos, outras escritas puderam ser decifradas, como a dos hititas e dos micênicos.

8 RELIGIÃO E O PROCESSO DE MUMIFICAÇÃO


A religião no Egito Antigo era importantíssima, pois grande parte da vida
social era regulada pelas crenças. Eles viviam uma monarquia teocrática, o que já
sinaliza toda a importância que esse povo dava aos seus deuses.

69
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

Conforme visto, eles acreditavam em vários deuses, portanto, eram po-


liteístas. Seus deuses tinham uma fusão de animais com humanos, o que é cha-
mado de antropozoomorfismo. Muitos animais foram encontrados mumificados,
devido à crença que os egípcios tinham na encarnação desses deuses em animais.

FIGURA 8 – PRINCIPAIS DEUSES EGÍPCIOS

FONTE: <https://bit.ly/2SSR7gT>. Acesso em: 17 jun. 2020.

Normalmente, os deuses eram ligados a alguma força da natureza tipo o sol, a


lua, bem como os animais que habitavam e usufruíam do rio Nilo, como aves e répteis.
Na sociedade, quem representava o símbolo máximo da religião era o faraó que:
era responsável pelo bem-estar do seu povo, assumindo suas preocupa-
ções como o “bom pastor” do antigo testamento, uma fórmula conhecida
também no Egito. Os faraós procuravam também realçar seu status dian-
te do povo, identificando-se com os deuses ou, em certos casos, identi-
ficando-se com eles e, assim, até podiam aparecer em seu porte normal
fazendo oferendas a seu alter ego, como consta no que diz respeito aos
faraós Amenhotep III e Ramsés II (BAINES; MALIK, 2008, p. 210).

Abaixo do Faraó, quem realizava os cultos nos mais diversos templos


eram os sacerdotes. Um dos aspectos mais fortes da religião egípcia era a crença
na vida após a morte, eles falavam que o ser humano possuía dois espíritos: o
“Ba”, que correspondia à alma, no que diz respeito à personalidade, e o “Ka”,
que seria a alma, mas no formato de força vital – juntos Ba e Ka davam vida e
personalidade aos seres humanos.

Em relação à crença de vida após a morte, não é novidade que os egípcios


mumificavam seus mortos (Figura 9), para preservar o corpo das pessoas e dos
animais, devido à crença da vida após a morte.

70
TÓPICO 1 — POVOS DA ÁFRICA

FIGURA 9 – MÚMIA EGÍPCIA EXPOSTA NO MUSEU DO LOUVRE

FONTE: <https://bit.ly/3fihMeC>. Acesso em: 17 jun. 2020.

A partir dessa prática, muito do que sabemos sobre a cultura egípcia pôde
chegar até os dias atuais. Arqueólogos descobriram várias múmias nas pirâmides,
que continham vários objetos que eram enterrados para que as pessoas pudessem
usufruir durante a sua vida após a morte.

DICAS

Em Curitiba, Paraná, há o Museu Egípcio Rosa Cruz, que conta com espaços
temáticos e homenagens aos faraós, além de réplicas e peças originais. Acesse: https://bit.
ly/3okFZoO. Se possível, uma visita ao museu vale a pena!

Desse modo, podemos conhecer diversos aspectos relacionados à civiliza-


ção egípcia, que tinha um grande suporte advindo das cheias do rio Nilo, o qual
tornava viável a produção de alimentos, mas, além disso, apresentava alguns se-
tores muito avançados, como a medicina e os direitos conquistados pelas mulhe-
res. Portanto, percebemos que o legado deixado por esse povo foi de suma im-
portância para o desenvolvimento do mundo como conhecemos na atualidade.

71
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• O Egito Antigo se desenvolveu às margens do rio Nilo, há aproximadamente


6 mil anos a.C.

• A história do Egito é dividida em três momentos: o Antigo Império (3200-2100


a.C.), o Médio Império (2100-1750 a.C.) e o Novo Império (1580-525 a.C.).

• Os egípcios eram governados pelo Faraó, que tinha poderes religiosos, admi-
nistrativos e militares.

• O sistema de escrita do Egito Antigo era o hieróglifo, que ajudou no desen-


volvimento do comércio e auxiliou os historiadores a entenderem um pouco
sobre como era seu estilo de vida e tradições.

• A tradição religiosa do Egito Antigo previa a vida após a morte, por isso os
egípcios desenvolveram um processo de mumificação.

• O fim da civilização egípcia se deu através dos hititas, depois os assírios e


ainda os gregos e os romanos.

• A cultura egípcia tem grande relevância na história, pois realmente os egípcios


tiveram uma das maiores e mais desenvolvidas civilizações da antiguidade.

72
AUTOATIVIDADE

1 Preencha quadro a seguir com as principais características do Antigo Impé-


rio, do Médio Império e do Novo Império do Egito. Busque mais curiosida-
des e acrescente informações sobre cada um desses períodos.

Antigo Império Médio Império Novo Império

FONTE: O autor

2 Realize uma pesquisa sobre o faraó Tutancâmon, que reinou sobre o Egito
Antigo e descreva de forma mais aprofundada sobre as principais mudan-
ças exercidas socialmente.

3 A escrita egípcia era um destaque da civilização, pois, a partir dela, os egípcios se


organizavam. Além disso, são muito importantes porque é utilizada como mate-
rial de estudo. Classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Os hieróglifos eram utilizados por todos os egípcios, sendo muito popular


e útil para eles.
( ) Hieróglifo vem de grego e significa “escrita sagrada”.
( ) Os escribas faziam a escrita em um papel chamado papiro, fabricado com
o talo de uma planta, além de serem usados pincéis e tinteiros.
( ) O primeiro ser humano a decifrar os hieróglifos egípcios foi o egiptólogo
francês Jean-François Champollion.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) F – V – V – V.
b) ( ) V – F – V – V.
c) ( ) F – V – F – V.
d) ( ) V – V – F – F.

73
74
TÓPICO 2 —
UNIDADE 2

POVOS MESOPOTÂMICOS

1 INTRODUÇÃO

A região da Mesopotâmia foi um local muito procurado pelos povos que


buscavam terras férteis para se estabelecerem de maneira sedentária. Era situada
entre os rios Tigre e Eufrates, abrigando diversas civilizações.

Durante muito tempo, essa terra foi muito disputada por diversos povos. Su-
mérios, babilônios, assírios e muitos outros passaram por esse território e, além disso,
desenvolveram grandes civilizações com importantes avanços para a humanidade,
como escrita, código de leis, entre outros, que auxiliaram o nosso desenvolvimento.

UNI

Prezado acadêmico, nesta unidade, conheceremos um pouco da história das


civilizações que se estabeleceram na Mesopotâmia.

2 A MESOPOTÂMIA E SEUS POVOS


Anteriormente, mencionamos o Egito Antigo e como foi possível o desenvol-
vimento de uma civilização em meio a um deserto, bem como a importância do rio
Nilo para que isso pudesse acontecer. A região da Mesopotâmia não é muito diferen-
te da região de onde os egípcios habitavam. É nessa região que, possivelmente, as pri-
meiras civilizações que conhecemos se desenvolveram. Entretanto, há uma diferença
essencial da Mesopotâmia para o Egito: “A comparação do Egito com a Mesopotâmia
levará, porém, a constatar certo atraso do primeiro em relação à segunda: o nível
técnico geral era mais baixo no Egito, e os egípcios demoraram mais a adotar certas
inovações há muito introduzidas na Mesopotâmia” (CARDOSO, 1994, p. 20).

Isso proporcionou uma evolução significativa nos povos que habitavam a


região, mas, ao mesmo tempo, foi uma região visada por vários povos e tomada
de buscas constantes pelo poder.

75
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

Localizada nas terras onde atualmente é o Oriente Médio, a Mesopotâmia pos-


sui esse nome devido a sua tradução do grego “terra entre rios”, por estar localizada
entre os rios Tigre e Eufrates, cujo desenvolvimento ocorreu devido às cheias periódi-
cas dos rios que deixavam a terra fértil, ou seja, propensa a desenvolver a agricultura.

FIGURA 10 – MAPA DAS TERRAS MESOPOTÂMICAS

FONTE: <https://bit.ly/2RTQRh4>. Acesso em: 18 jun. 2020.

Na Figura 10, podemos perceber como os rios circundam o território


mesopotâmico, além das cidades dessa região que foi o berço de algumas civili-
zações, como os sumérios, babilônios e assírios – como veremos mais adiante.
Conforme vimos no tópico anterior, muitos historiadores citam essa passagem
como a hipótese causal hidráulica.

3 A REGIÃO ENTRE OS RIOS TIGRE E EUFRATES


Primeiramente, é importante caracterizarmos a área, isto é, a localização
entre os rios Tigre e Eufrates. Em meio a terras áridas, uma civilização só foi pos-
sível devido ao aproveitamento das águas dos rios que a cercavam, bem como
das terras férteis que aconteciam devido aos períodos de cheia constantes.

Conhecida por muitos historiadores como uma civilização “hidráulica”, a


Mesopotâmia abrigou vários povos que se instalaram na extensão de seu território.
Tomelin (2007, p. 15) afirma que “sua localização favoreceu para se transformar numa
passagem de caravanas e de mercadorias da Ásia e do Mediterrâneo”. Com isso, vá-
rios povos se instalaram na região e, aos poucos, construíram suas civilizações.

Tomelin (2007, p. 16) auxilia também na compreensão dos aspectos polí-


ticos envolvidos:

76
TÓPICO 2 — POVOS MESOPOTÂMICOS

De forma geral, é uma civilização que se organizou em cidades-estado


autônomas e com impérios independentes. Tem uma história turbulenta,
cheia de episódios de invasões e explorações, que está associada à vulne-
rabilidade do território. Civilização que é também lembrada pela insta-
bilidade política, pela sociedade dividida em castas e religião politeísta.

A Mesopotâmia situava-se em uma região geográfica privilegiada, o que


favorecia a circulação de diferentes povos e pessoas. Como servia de passagem
para mercadores e possuía terras muito férteis, era muito conhecida e visada por
vários povos. Na Figura 11, destacamos um mapa mental com vários povos que
habitaram as terras mesopotâmicas.

FIGURA 11 – MAPA CONCEITUAL SOBRE OS POVOS QUE HABITARAM A REGIÃO DA MESOPOTÂMIA

FONTE: O autor

Nesse sentido, escolhemos três civilizações que habitaram o território mesopotâ-


mico para abordar mais profundamente: os sumérios, depois os babilônios e, por último,
os assírios. Cada povo apresentou características específicas, como veremos a seguir.

4 OS SUMÉRIOS
Um dos primeiros povos a se fixar na Mesopotâmia foram os sumérios.
Ali, surgiram as primeiras cidades conhecidas: Ur, Uruk, Lagash e Nippur. Na
região da Suméria, havia cheias violentas e, para contorná-las, os sumérios cons-
truíram barragens, diques, reservatórios e canais de irrigação, a fim de levar água
para regiões mais secas.

77
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

É importante citar que, a partir do processo de sedentarização, muitas


inovações foram criadas. O ser humano não precisava mais se preocupar com a
caça para garantir a sua sobrevivência, por isso ele contava com as plantações e
o pastoreio, tendo mais tempo para discutirem ideias e aprimorarem suas ferra-
mentas e técnicas para plantio, criação de animais e utensílios para o dia a dia.

FIGURA 12 – LOCALIZAÇÃO DA SUMÉRIA

FONTE: <https://bit.ly/3fmkOhI>. Acesso em: 22 jun. 2020.

Na Figura 12, podemos conhecer onde as primeiras cidades se desenvol-


veram, em grande parte, localizadas em terras alagáveis, sendo imprescindível o
uso de canais ou diques para irrigação. Havia também um problema grave, que
eram as inundações constantes, pois várias vezes os rios inundavam as planícies
ao seu redor, principalmente perto da foz que desembocava no Golfo Pérsico.

Telles e Toledo (2020, p. 138) destacam que:


Os sumérios não possuíam uma uniformidade política, ou seja, não
existia um estado centralizado. Eles se organizavam em Cidades-Es-
tados com governos autônomos, onde cada uma possuía seu próprio
soberano. A primeira vez que a Suméria foi unificada sobre um mesmo
dirigente foi durante o período pré-dinástico, com Urukagina. Essa falta
de coesão política forte sujeitou não só os sumérios, mas o território da
Mesopotâmia como um todo, a diversas invasões e impérios diferentes.

Isso foi preponderante para o estilo de civilizações encontradas naquela re-


gião. Com relação à Suméria, o professor Tomelin organizou um quadro com alguns
marcos, em que podemos perceber alguns pontos importantes do povo sumério.
• A média populacional era de 10 mil a 50 mil habitantes.
• O templo era o centro político, religioso e econômico da cidade.
• Cada templo era dedicado a um Deus que protegeria a cidade.

78
TÓPICO 2 — POVOS MESOPOTÂMICOS

• O chefe do templo era também o chefe da cidade e se chamava


patesi (Vigário de Deus).
• Os patésis eram chefes militares absolutos.
• Junto aos templos eram construídos os zigurates, pirâmides
utilizadas para o armazenamento de sementes.
• Os sumérios cultivavam cevada, grão-de-bico, lentilha, milhete,
trigo, nabo, tâmara, cebola, alho, alface, mostarda e outros.
• As edificações sumérias possuíam uma arquitetura plano convexa,
feita de tijolos de barro (TOMELIN, 2007, p. 17-18).

A partir da sistematização apresentada, podemos destacar o patési, que


era considerado o “vigário de Deus” e, com isso, concentrava os poderes políti-
cos, econômicos e religiosos. Para auxiliar no seu governo, ele contava com sacer-
dotes e altos funcionários.

Outro aspecto relevante dos sumérios é a criação de zigurates, quem eram


construções feitas de tijolos queimados, com sobreposições e escadarias ao redor.
O termo zigurate (subir ao céu) descreve o que se entende, na atualidade, como a
função dessas obras, isto é, uma espécie de templo. Os sumérios acreditavam que
essas obras os aproximariam de suas divindades.

FIGURA 13 – RECONSTRUÇÃO DO ZIGURATE DE UR

FONTE: <https://bit.ly/3uQuSWV>. Acesso em: 23 jun. 2020.

Além da questão religiosa, sabe-se que os zigurates eram locais para de-
pósito de cereais, moradia para governantes, local para contemplação das estre-
las, de questões meteorológicas e para armazenar livros (biblioteca).

79
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

Nas cidades mesopotâmicas, as construções mais importantes eram


as ligadas às grandes instituições, ao templo e ao rei. Sendo a mora-
dia da divindade tutelar da cidade, o templo era o símbolo central do
bem-estar local e, em geral, a estrutura mais alta. Os reis reformavam
e reconstruíam os templos dos centros religiosos importantes como
sinal da aprovação divina (RATHBONE, 2011, p. 118).

Assim, percebe-se a importância que a religião tinha para esses povos – suas
ações, seu sistema de governo, entre outros, estavam fortemente ligados a religião.

NTE
INTERESSA

A religião suméria tinha como base quatro deuses, Na (deus do céu), Ki (deusa da terra), Enlil
(deus do ar) e Enki (deus da água), ou seja, os quatro elementos essenciais para a vida na Terra.
Para aprofundar os conhecimentos a respeito dos sumérios, sugerimos a leitura do livro
No começo eram os deuses, de Jean Bottéro, que faz uma sistematização de como era a
vida na Mesopotâmia. Vale a pena a leitura!
BOTTÉRO, J. No começo eram os deuses. Tradução: Marcelo Jacques de Morais. Rio de
Janeiro: Covilização Brasileira, 2011.

5 A ESCRITA CUNEIFORME
Entre algumas inovações, é atribuída aos sumérios a invenção da escrita.
Por volta de 3500 a.C. na Suméria, surgiu o que conhecemos hoje como “escrita
cuneiforme”, na qual os objetos eram representados por uma ideia, o que dificultava
a representação de ações, sentimentos ou ideias abstratas. Os registros, normalmente,
eram feitos em placas de argila e escritos com um estilete que possuía formato de
cunha – a partir disso, chegou-se ao nome “cuneiforme” (BBC Brasil, 2010).

FIGURA 14 – TÁBUA COM ESCRITA CUNEIFORME

FONTE: <https://bit.ly/3uICXNn>. Acesso em: 23 jun. 2020.

80
TÓPICO 2 — POVOS MESOPOTÂMICOS

É a partir desse tipo de registro que sabemos diversas situações da Suméria,


pois constituem o material de trabalho de historiadores e são fundamentais para
conhecermos o passado com melhor clareza.

6 OS BABILÔNIOS
Por volta de 2500 a.C., um povo conhecido como amoritas se aproveitou
do enfraquecimento das cidades sumérias (devido a conflitos internos) e domi-
nou grande parte do território da Mesopotâmia. Partindo do atual território onde
fica localizada a Síria, esse povo conquistou, primeiramente, uma cidade conhe-
cida como Babilônia e, por isso, ficou conhecido como babilônio.

O império babilônico teve grande ascensão a partir reinado de Hamurábi.


Hoje, muito conhecido pelo seu código de leis, que tinha como principal lema a
lei do talião, ou seja, “olho por olho, dente por dente”, Hamurábi definiu várias
situações burocráticas, criando uma tributação interna e centralizando o governo.
Com uma organização interna e sob o comando de Hamurábi, o exército da Ba-
bilônia acompanhou e teve um bom direcionamento e disciplinamento, conquis-
tando vários territórios e proporcionando um período de estabilidade.

Os babilônios ficaram conhecidos pela elaboração de um calendário, que


tinha como principal objetivo saber quando aconteceria o período de cheias do
rio Eufrates. A elaboração do calendário só foi possível porque eles tinham um
bom conhecimento em astronomia, o que levou também à elaboração de um reló-
gio do sol e a melhores formas para localização.

Ainda com relação às contribuições do povo babilônico, não foi só Hamu-


rábi que se destacou; Nabucodonosor foi responsável pela realização dos jardins
suspensos e da Torre de Babel.

Após a morte de Hamurábi, o império começou a desmoronar e várias


revoltas internas dificultaram o governo, abrindo caminho para que, por volta de
1300 a.C., os assírios conquistassem o território.

6.1 O CÓDIGO DE HAMURÁBI


Uma das principais características da Babilônia sob o reinado de Hamurábi
foi a criação do código que reúne 282 leis, representando uma espécie de origem
do Direito. É a legislação mais antiga descoberta até hoje, sendo muito conhecida
por conta da Lei do Talião (um sinônimo de retaliação).

81
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

ATENCAO

Conhecida pelo dito “olho por olho, dente por dente”, a lei do talião visava a
punir as pessoas de acordo com o crime que cometessem. Um exemplo disso pode ser
encontrado na seção 230: “Se uma casa mal construída causa a morte de um filho do dono
da casa, então o filho do construtor será condenado à morte”. Nesse sentido, essa lei fazia
traços gerais para tornar a sociedade igual.

Talhado em uma rocha de diorito e escrito a partir de letras cuneiformes, o


código é resultado de uma construção anterior, passada de forma oral pelas gera-
ções. Visando a um melhor controle da população e a tratar todos de forma justa,
Hamurábi colocou a legislação em pedras e a distribuiu pela Babilônia. Contudo,
o código já vinha de povos anteriores aos babilônicos:
A lei e a justiça eram conceitos fundamentais da antiga suméria, que
impregnavam a vida social e econômica sumeriana tanto na teoria como
na prática. Do decurso do século passado (século XIX d.C.), os arqueó-
logos revelaram a luz do dia, milhares de tabuinhas de argila represen-
tando toda a espécie de documentos de ordem jurídica: contratos, atos,
testamentos, notas promissórias, recibos, acórdãos dos tribunais. Entre
os sumérios, o estudante mais adiantado consagrava uma grande parte
do seu tempo ao estudo das leis e exercitava-se regularmente na prática
de uma terminologia altamente especializada, bem como na transcrição
dos códigos legais e dos julgamentos que tinham formado jurisprudên-
cia (KRAEMER apud GIORDANI, 2001, p. 138).

Hamurábi tratou de impor um código sobre a justiça que, até antes, era
função religiosa. Segundo Giordani (2001, p. 155):
Hammurabi conferiu à justiça real supremacia sobre a justiça sacerdo-
tal; deu-lhe uniformidade de organização e regulamentou cuidadosa-
mente o processo das ações, compreendendo nessa regulamentação a
propositura, ou recebimento ou não pelo juiz, a instrução completada
pelo depoimento de testemunhas e diligências “in-loco” e, finalmente,
a sentença. Foi estabelecida então uma organização judiciária que in-
cluía até o ministério público e um direito processual.

Podemos perceber que o código abrangia um leque grande, por isso, atu-
almente, ainda serve como aporte histórico para muitas legislações.

82
TÓPICO 2 — POVOS MESOPOTÂMICOS

NTE
INTERESSA

O Código de Hamurábi tem muita importância para a história. O canal “Foca


na História” traz um estudo mais detalhado desse marco, com imagens e algumas curiosi-
dades, no vídeo “O Código de Hamurabi – O Surgimento das Leis – A História da Civiliza-
ção”, que pode ser acessado em: https://www.youtube.com/watch?v=bEOPkwJIVzs.

7 OS ASSÍRIOS
Temidos pelos adversários, os assírios tinham fama de serem grandes guerrei-
ros e terem um exército muito poderoso. Vindos da região norte da Babilônia (onde,
atualmente, está localizado o Iraque), por volta de 2.400 a.C., fundaram a cidade de
Assur. No entanto, somente próximo a 1.300 a.C. conseguiram consolidar o império.

Partindo da cidade-Estado de Assur, onde viviam, os assírios começa-


ram a expandir os seus domínios por toda a Mesopotâmia. Os carros
de combate e a cavalaria eram elementos ofensivos do exército Assírio.
A defesa ficava a cargo da infantaria, formada por arqueiros e lancei-
ros bem treinados. As campanhas militares assírias ficaram conheci-
das pela grande violência empregada contra inimigos e pela pilhagem
de suas cidades e riquezas (APOLINÁRIO, 2014, p. 82).

Assim como muitos povos da antiguidade, a sociedade dos assírios era


formada por guerreiros e camponeses, e governada por um rei que detinha pode-
res absolutos: econômicos, políticos, religiosos e militares – para eles, o rei era um
enviado dos deuses na Terra.

A partir da Figura 15, podemos perceber como o império assírio conseguiu


evoluir pelas terras que, antes, eram da Babilônia. Sua capital se chamava Nínive.

83
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

FIGURA 15 – EXTENSÃO DO IMPÉRIO ASSÍRIO NO SÉCULO IX A.C.

FONTE: <https://bit.ly/3hq40sY>. Acesso em: 29 jun. 2020.

DICAS

A cidade de Nínive chama a atenção por sua biblioteca, descoberta pelos in-
gleses no século XIX, na qual foram achados mais de 25 mil tabletes de argila com escritas
cuneiformes. Além da biblioteca, a cidade era templo de adoração da deusa Ishtar.
Sugerimos a leitura do texto “A história da cidade Assíria de Nínive”, disponível em:
https://bit.ly/3uPxgNM.

Um dos principais reis assírios foi Assurbanípal, que governou durante os


anos de 668 a 627 a.C. e fundou a biblioteca de Nínive, além de promover uma grande
organização no Império, fazendo-o ser governável mesmo que com grandes extensões.

Tendo o código de Hamurábi como código penal, os assírios organizavam


sua sociedade em linhas rígidas. Por isso, veremos alguns momentos que podem
demonstrar um pouco da crueldade do povo assírio, como no reinado de Salma-
naser I (1274-1245 a.C.), que, após uma conquista, cerca de 14 mil escravos foram
cegados para garantir que eles seriam dóceis. Realmente, a fama dos assírios ti-
nha relação, muitas vezes, com as suas ações.
84
TÓPICO 2 — POVOS MESOPOTÂMICOS

Todavia, de maneira interessante, ao mesmo tempo em que possuíam


conquistas militares de grande escala, os assírios também tinham um lado cul-
tural bem ativo. Além da biblioteca de Nínive, eles desenvolveram importantes
estudos na Matemática, como a divisão do círculo em 360 graus e, possivelmente,
a invenção da latitude e da longitude para auxiliar na navegação.

O fim do reinado assírio ocorreu após a morte de Assurbanípal, quando


houve a perda do controle de algumas regiões, tendo os babilônios ocupado a ci-
dade de Nínive e, aos poucos, junto aos persas, adentrado todo o território assírio.

85
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• O nome Mesopotâmia vem do grego e significa “terra entre rios”, recebendo


esse nome por estar localizada entre os rios Tigre e Eufrates.

• Como a Mesopotâmia era um território muito conhecido pelas rotas comer-


ciais, também era alvo interessante para dominações.

• O primeiro povo a se estabelecer nas terras que viriam a ser a Mesopotâmia foram
os sumérios, conhecidos como os inventores da escrita. Também passaram pela
Mesopotâmia os babilônios, conhecidos por seu imperador Hamurábi, a quem é
atribuída a criação de um código de leis chamado de Código de Hamurábi.

• Outro povo que pode ser mencionado na formação da Mesopotâmia são os


assírios, conhecidos pela sua brutalidade com demais povos e que deixou
como legado, para a humanidade, a biblioteca de Nínive.

86
AUTOATIVIDADE

1 A partir dos estudos realizados sobre os povos da Mesopotâmia, percebe-se


que alguns povos se destacaram. Sumérios, Babilônios e Assírios consegui-
ram erguer grandes civilizações no território mesopotâmico. Elabore um
mapa conceitual colocando as principais características desses três povos.

2 A biblioteca de Nínive foi um grande marco para a história da Mesopotâ-


mia. Realize uma pesquisa para descobrir como era o processo de escrita
desses povos e conhecer os documentos arquivados naquela época.

3 Vários povos passaram pelo território mesopotâmico, sendo os assírios um


dos que trouxeram avanços. Cite três características do povo assírio.

87
88
TÓPICO 3 —
UNIDADE 2

POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, estudaremos a história de três civilizações que se desenvol-


veram em épocas parecidas e com grandes contribuições para a atualidade.

Conheceremos o povo hebreu, que era monoteísta e teve sua história vol-
tada a questões religiosas. Em busca da “terra prometida”, esse povo se estabele-
ceu na região da palestina e realizou seu processo de desenvolvimento em meio
a lutas constantes.

Outro povo que será abordado são os fenícios. Com um desenvolvimento


marítimo muito aprimorado, eles elaboraram entrepostos comerciais por todo o Mar
Mediterrâneo, além de terem um sistema de cidades-estados independentes entre si.

Também veremos o império persa, um dos maiores da antiguidade, capaz


de dominar um território gigantesco para a época, o qual só era possível governar
a partir do sistema de satáprias (porções de terras governadas por sátrapras).

2 HEBREUS
Os povos que estudamos até aqui têm um ponto em comum: eram poli-
teístas, ou seja, acreditavam em vários deuses. Entretanto, os hebreus destoavam
por terem consolidado um novo tipo de crença, o monoteísmo ou, em outras pa-
lavras, a crença em um único Deus. Grande parte dos conhecimentos que temos
atualmente sobre esses povos advém da Bíblia cristã, mais especificamente dos
cinco primeiros livros do Antigo Testamento: Gêneses, Êxodo, Levítico, Números
e Deuteronômio – ou, como os cristãos chamam, Pentateuco, enquanto, para os
judeus, chama-se Torá.

Também é importante discutirmos conhecimentos comprovados por his-


toriadores e articulações com as informações contidas no Pentateuco ou Torá;
além disso, mais adiante, veremos que, no ensino superior e na educação básica
hebraicos, eram ensinados conhecimentos científicos, sendo reafirmada a impor-
tância da laicidade em que o ensino é exposto.

89
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

NOTA

Laicidade é o ato de excluir igrejas de dentro dos contextos público, políti-


co e administrativo, porém não no sentido de eliminar o aprendizado sobre as diversas
religiões existentes na sociedade, mas apenas contra o uso de rituais religiosos, excluindo
aqueles que não estão vinculados.

De acordo com Azevedo (2015, p. 106):


Segundo evidências linguísticas, os hebreus eram originários da Me-
sopotâmia. Essa é também a versão narrada no Velho Testamento, à
primeira parte da Bíblia que aborda a história dos hebreus, entre ou-
tros temas. Segundo a Bíblia, em certo momento os hebreus teriam
saído da cidade de Ur, no sul da Mesopotâmia e partido para a Palesti-
na – região o Oriente Médio hoje ocupada pelo estado de Israel. Nessa
migração, eles teriam sido conduzidos pelo patriarca Abraão.

Quando os hebreus chegaram à Palestina, alguns povos já habitavam a


região, como cananeus, edomitas, filisteus, arameus e muabitas. Foi por meio de
Jacó que a ocupação desse território aconteceu.

Na Palestina, eles viviam basicamente do pastoreio e da agricultura, sen-


do liderados por chefes de famílias conhecidos como patriarcas e que tinham fun-
ção religiosa, militar e política. Assim, o primeiro momento de organização dos
hebreus é o período dos patriarcas, no qual se organizavam em clãs e acreditavam
em um ancestral comum.

Desse modo, ficaram na região da Palestina até por volta do século XVIII
a.C., quando, em um período de seca, houve uma grande onda de fome, obrigan-
do-os a migrar para o Egito. Nessa época, os egípcios estavam sob o domínio dos
hicsos, que acolheram o povo hebreu, deixando-os viver livremente.

Contudo, esse período de calmaria não duraria muito, pois, por volta de 1580
a.C., os hicsos foram expulsos do Egito e os hebreus foram acusados de terem cola-
borado com eles, o que levou a sua escravização até por volta de 1250 a.C., quando:
Sob a liderança de Moisés, os hebreus iniciaram sua fuga do Egito em
direção a Palestina. Esse episódio é conhecido como Êxodo e durou
40 anos. Essa peregrinação é marcada pela travessia do Mar Verme-
lho, passando pela península do Sinai e o deserto. Durante a travessia,
houve um grande processo de unificação e reorganização religiosa do
povo hebreu. Nesse período, Moisés apresentou as Tábuas das leis
(dez mandamentos) e pregou o monoteísmo (TOMELIN, 2007, p. 51).

Chegando novamente à Palestina, os hebreus se depararam com outros


povos e, para recuperar o território, decidiram expulsá-los. Conforme Rosolia
(1944, p. 90), “[...] não foi rápida nem fácil a conquista dessa terra que os cananeus
90
TÓPICO 3 — POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO

defendiam. Os hebreus foram obrigados a viver longamente no deserto e ora por


alianças ora por combates felizes, conseguiram, aos poucos, infiltrar-se pela mar-
gem direita do Jordão”. Para uma melhor organização, os hebreus estavam divi-
didos em doze tribos, lideradas por chefes políticos e militares (Figura 16).

FIGURA 16 – AS DOZE TRIBOS DE ISRAEL

FONTE: <https://bit.ly/3ojuVrH>. Acesso em: 9 jul. 2020.

Essa divisão em tribos foi uma forma de manter o controle sobre o povo
hebreu, bem como ampliar a zona de efetividade. Quando havia problemas, as
tribos uniam-se e escolhiam um líder para exercer a autoridade, o qual era cha-
mado de juiz. Esse período ficou conhecido como o período dos juízes.

91
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

Buscando uma maior organização política e um governo com maior for-


ça, os hebreus decidiram iniciar uma monarquia. Saul foi eleito o primeiro rei e
comandou um embate contra os filisteus (povo que habitava a região e buscava o
domínio das terras). A partir disso, segundo Apolinário (2014, p. 132):
Com a morte de Saul, Davi subiu ao trono e reinou de 1000 a 965 a.C.
O novo rei derrotou os filisteus, conquistou a cidade de Jerusalém e a
transformou na capital do reino. Na nova capital, Davi centralizou o
culto ao Deus único Yahweh (Javé ou Jeová), convertendo o monoteís-
mo hebraico em religião do Estado.

No reinado de Davi, a consolidação do monoteísmo uniu o povo e proporcio-


nou um momento de estabilidade política. O filho de Davi, Salomão, foi o seu suces-
sor e seu governo foi de grande crescimento e prosperidade, ampliando o comércio
com os povos da África e da Arábia e realizando obras grandiosas, como o Templo
de Jerusalém. Ao mesmo tempo que o governo realizava as obras, havia um:
enrijecimento da burocracia, um aumento de trabalho público, cons-
trução de um novo templo (de Javé), que resultou no aumento dos
impostos que, por consequência, empobreceram os trabalhadores he-
breus. Não demorou muito para se instalar um clima de insatisfação
entre o povo hebreu (TOMELIN, 2007, p. 52).

Salomão morreu em 926 a.C. e seu filho, Roboão, assumiu o governo com
uma política de altos impostos, o que gerou uma revolta interna e causou o gran-
de Cisma, que dividiu o reino em dois: o Reino de Israel, com capital em Sama-
ria, e o Reino de Judá, com capital em Jerusalém.

Divididos e enfraquecidos, não demorou muito para que povos vizinhos


invadissem o território. Primeiramente, o Reino de Israel, em 723 a.C., foi tomado
pelos assírios, sob o comando do rei Sargão II; em 586 a.C., foi a vez do reino de
Judá ser dominado pelos caldeus e por seu temido rei Nabucodonosor.

Além de dominar, Nabucodonosor destruiu o Templo de Jerusalém e le-


vou os hebreus como prisioneiros para a Babilônia, fato que ficou conhecido como
Cativeiro da Babilônia. No entanto, esse período do cativeiro não durou muito.
Em 539 a.C., os persas conquistaram a Babilônia e, de acordo com a política persa,
os hebreus puderam voltar a sua terra e reconstruir o Templo de Jerusalém.

NTE
INTERESSA

Como uma forma de conter os povos dominados e continuar a expansão de


seu enorme império, os persas tinham uma política de certa liberdade para o desenvolvi-
mento de sua cultura. Todavia, em contraponto, cobravam pesados impostos e obrigavam
os homens a servirem seu exército, caso fossem convocados.

92
TÓPICO 3 — POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO

Contudo, isso não durou muito e os hebreus novamente ficaram à mercê


de povos estrangeiros – primeiro com Alexandre da Macedônia (século III a.C.) e,
depois, pelos romanos (século I a.C.), enfraquecendo cada vez mais o povo hebreu.
Os judeus resistiram ao domínio de Roma. No ano de 70 d.C., os roma-
nos aniquilaram uma grande revolta judaica, saquearam e destruíram
o Templo de Jerusalém e expulsaram os judeus da região. A maior
parte deles espalhou-se então por vários domínios romanos. Esse mo-
vimento de dispersão geográfica ficou conhecido como Diáspora (ou a
Grande Diáspora) (APOLINÁRIO, 2014, p. 133).

Com isso, a história dos hebreus como povo unificado teve fim, o que iniciou sua
saga pelo mundo visando a encontrar um lugar para fixar território, em busca de paz.

3 FENÍCIOS
Os fenícios estabeleceram-se onde, hoje, se situa o Líbano, em uma pequena
parte da Síria, entre as montanhas e o mar Mediterrâneo. Essa faixa de terra tem
aproximadamente 30 quilômetros de largura e 200 quilômetros de extensão e, por ser
cercado por montanhas, foi possível criar um escudo natural contra invasores, o que:
[contribuiu] para a formação de núcleos urbanos isolados uns dos ou-
tros. Esse isolamento geográfico ajuda a explicar por que os fenícios
não formaram um Estado centralizado. Grandes cidades se desenvol-
veram de forma independente. Apesar de compartilharem a mesma
origem, a mesma língua e a mesma cultura, as cidades fenícias eram
política e economicamente autônomas, por isso são chamadas de cida-
des-Estado (APOLINÁRIO, 2014, p. 137, grifo no original).

Cortada por vários rios, a agricultura (estimulada por trigo e videiras) conse-
guiu se desenvolver, bem como a criação de gado e a exploração do cedro, o qual ser-
via como matéria-prima para a construção de navios. Entretanto, o território não era
propenso ao desenvolvimento agrícola, o que forçou os povos a se lançarem ao mar.

NOTA

O termo fenício deriva do grego phoiníkios, que, quando traduzido, significa


púrpura (ou até vermelho-escuro). O povo fenício recebeu este nome devido ao uso de te-
cidos tingidos por essa cor, a partir de tinta extraída do molusco chamado múrex, conside-
rado uma grande marca desse povo, sendo esses tecidos cobiçados pelo mundo inteiro.

Além da agricultura, a região contava com bons portos naturais e, por


isso, o comércio marítimo passou a ser uma boa forma de ganhar lucros. Segundo
Boulos Júnior (2009, p. 149):

93
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

os fenícios se especializaram na navegação marítima e foram intensifi-


cando seu comércio com outros povos. Eles comerciavam tanto aquilo
que produziam, como toras de cedro, joias e tecidos de algodão, como
produtos de outros povos, como o papiro comprado dos egípcios e
vendido para os gregos.

Aos poucos, os fenícios foram dominando o mar Mediterrâneo, tendo ro-


tas por toda a extensão até chegar ao oceano Atlântico, onde fundaram algumas
colônias no norte da África, na costa da Espanha, na Sicília e na Sardenha.

Entretanto, é importante destacar que o desenvolvimento das cidades-es-


tados se deu de forma independente, pois seus governos não eram unificados e
cada um tinha seu sistema próprio. Em grande parte, possuíam uma monarquia
auxiliada por um conselho de anciãos. Tomelin (2007, p. 60) afirma que:
Cada cidade possuía uma ação política individualizada e, muitas ve-
zes, rivalizava com as cidades vizinhas, de tal forma que se uma fosse
atacada, a outra poderia até ajudar os invasores ou se aproveitar da
fragilidade causada por um conflito para tomar vantagens comerciais.

As cidades-estados que mais se destacaram foram Arado, Beirute, Tiro,


Sidon, Biblos e Ugarit. Essas cidades, além do núcleo principal, possuíam vilas
menores, áreas de cultivo e oficinas localizadas próximas aos portos, onde era
possível a venda de mercadorias (APOLINÁRIO, 2014).

Lançando-se ao mar, foi possível fazer grades rotas de comércio, bem


como uma expansão territorial. Rosolia (1944, p. 101) descreve que a partir de:
Sucessivas partidas de Sidon e Tiro estenderam os limites dessa nave-
gação. Fez-se inicialmente entre Egito e Fenícia e, com isso, se instalou
o domínio fenício sobre Chipre, rica por suas minas de cobre. Alcan-
çou-se a seguir a ilha de Creta e se estendeu a navegação pelas Espora-
das e Cícladas, onde a disposição do arquipélago constituía uma rota
fácil e segura entre a Ásia e a Grécia. Assim, conseguiram os sidônios
atingir a um tempo os litorais da Ásia Menor e da Grécia.

Desse modo, é possível perceber o quão desenvolvidos eram os trâmi-


tes pelos quais os fenícios exploravam o comércio. Para manter tudo isso, eles
necessitavam de comerciantes instruídos e informações. Na Figura 17, podemos
verificar as principais rotas comerciais dos fenícios.

94
TÓPICO 3 — POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO

FIGURA 17 – ROTAS DE NAVEGAÇÃO DOS FENÍCIOS PELO MEDITERRÂNEO E NO OCEANO


ATLÂNTICO

FONTE: <https://bit.ly/33H4keH>. Acesso em: 6 jul. 2020.

Assim, os fenícios desenvolveram o que conhecemos, hoje, como o alfa-


beto, uma vez que eles precisavam de método ágil para facilitar o processo de
comunicação e, consequentemente, das negociações. Se fôssemos contar com a
escrita cuneiforme, que tinha, aproximadamente, 2.000 símbolos, ou os hierógli-
fos egípcios, que possuíam cerca de 1.000 símbolos, o comércio continuaria de-
pendendo de algumas pessoas, sendo de difícil acesso à população. A Figura 18
apresenta uma transição entre os alfabetos fenício, grego e latino.

FIGURA 18 – ALFABETO FENÍCIO

FONTE: <https://bit.ly/3wa6dg7>. Acesso em: 6 jul. 2020.

Os fenícios simplificaram ao criarem um alfabeto com 22 sinais (hoje, trans-


critos como as consoantes do nosso alfabeto), que eram alinhados da direita para a
esquerda, facilitando o processo de ler e escrever que, antes, pertencia apenas aos
escribas – com o alfabeto fenício, foi possível facilitar o acesso a mais pessoas.
Ao chegar a Grécia, foi ampliado com a adição das vogais. Mais tarde,
a combinação do alfabeto fenício com o grego e o etrusco foi adapta-
da pelos romanos para desenvolver o alfabeto latino. Modificado ao

95
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

longo de vários séculos, é esse alfabeto utilizado hoje para escrever a


língua portuguesa e a maior parte das línguas ocidentais (APOLINÁ-
RIO, 2014, p. 138, grifos no original).

Por fim, é importante falar que os fenícios eram politeístas, embora, como
citado, cada cidade tinha suas particularidades – e a religião acompanhava esse
raciocínio. Eles tinham a prática de sacrifícios para agradar aos deuses, geralmen-
te usavam animais, porém há relatos de crianças mortas para essa finalidade.

Normalmente, seus rituais aconteciam ao ar livre, em regiões mais eleva-


das nas cidades. Alguns templos podiam ser utilizados também.

ATENCAO

Para aplacar a ira dos deuses, sacrificavam-se animais e, às vezes, realizavam-


-se terríveis sacrifícios humanos, como a queima, inclusive, dos próprios filhos. Em algumas
ocasiões, 200 recém-nascidos foram lançados, ao mesmo tempo, no fogo – enquanto as
mães assistiam, impassíveis, ao sacrifício.
FONTE: <https://bit.ly/3w0t79M>. Acesso em: 20 abr. 2021.

O fim do império ocorreu após sucessivas invasões de povos como egíp-


cios, persas e macedônios (liderados por Alexandre Magno), que os derrotaram
definitivamente por volta de 332 a.C.

4 PERSAS
Um dos maiores impérios de toda a antiguidade, o império persa era
situado onde atualmente é o Irã, cujos primeiros agrupamentos têm registro de
2 mil anos a.C. nas terras férteis e montanhosas entre a Mesopotâmia, a Índia e o
Golfo Pérsico (Figura 19).

96
TÓPICO 3 — POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO

FIGURA 19 – IMPÉRIO PERSA

FONTE: <https://bit.ly/3bsbHuW>. Acesso em: 13 jul. 2020.

Os agrupamentos deram origem a dois povos principais, os medos e os persas.


Os medos se fixaram próximo aos Montes Zagros, no norte do Planalto
do Irã. Eles viviam da agricultura e do pastoreio e dominavam a me-
talurgia do cobre, do bronze e do ouro. Os persas, por sua vez, ocupa-
ram territórios menos férteis ao sul e desenvolveram principalmente
atividades comerciais (APOLINÁRIO, 2014, p. 140).

Durante muito tempo, os medos dominaram muitos territórios e povos da


região (entre eles, os próprios persas), até que, por volta de 550 a.C., um príncipe
persa, chamado Ciro, liderou uma revolta vitoriosa contra os medos e tornou-se
o imperador de toda a região.
Com objetivo de aumentar suas riquezas e resolver problemas causados
pela baixa produção agrícola, os persas passaram a conquistar terras e
povos sob o comando do imperador Ciro. Seus sucessores, Cambisses e
Dario I, comandaram novas conquistas e, assim, o Império Persa passou
a abranger uma área gigantesca, que ia do vale do rio Nilo, no Egito, até
o vale do Rio Indo, na Índia (BOULOS JÚNIOR, 2009, p. 152).

97
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

ATENCAO

Com a morte do imperador Ciro, em 528 a.C., seu filho Cambisses, temendo
perder o trono para seu irmão Esmérdis, matou-o – uma demonstração de insanidade,
segundo o historiador Heródoto).

Durante o governo de Dario I, o império persa atingiu sua maior extensão


e, como naquela época, os sistemas de comunicação não eram eficientes como
os da atualidade, foram necessárias algumas medidas administrativas para um
melhor controle desse imenso território.

FIGURA 20 – LINHA DO TEMPO DO IMPÉRIO PERSA

FONTE: <https://bit.ly/3tRYaDg>. Acesso em: 31 ago. 2020.

Dario I dividiu o império em vinte regiões administrativas, chamadas de


satáprias, que eram controladas por um satápra – uma espécie de governador
com vários poderes sobre suas terras e que era controlado apenas por fiscais,
espécies de braços direitos, conhecidos como “olhos e ouvidos do rei”. Uma ca-
racterística bem marcante dos persas era a liberdade que eles davam aos povos
conquistados para continuarem praticando seus costumes, cultos e línguas. En-
tretanto, em troca, era necessário que servissem ao exército persa quando convo-
cados, além de terem que pagar altos impostos.

Com a intensão de facilitar a comunicação, os persas criaram enormes redes


de estradas (a maior delas ligava as cidades de Susa a Sardes e tinha cerca de 2.400
quilômetros de extensão), além de um sistema de correios rápido e eficiente. Como
o território era longo e a comunicação necessária, eles organizaram entrepostos a

98
TÓPICO 3 — POVOS DO ATUAL ORIENTE MÉDIO

cada 25 quilômetros, além de hospedarias e passagens de balsas para atravessar


rios. Enfim, para ter um território com tamanha extensão, naquela época, era ne-
cessário haver um sistema que cuidasse de informar e monitorar as ações de todos.

Dario I ainda precisou criar uma moeda única, devido à necessidade de co-
branças de impostos e de uma organização maior do comércio do reino. O dárico facili-
tou o comércio, além de impedir que os sátrapas fizessem moedas próprias (Figura 21).

FIGURA 21 – DÁRICO

FONTE: <https://bit.ly/3tM2XWP>. Acesso em: 13 jul. 2020.

A partir dessas medidas adotadas por Dario I, o império conseguia se or-


ganizar melhor, bem como facilitar a administração e a circulação de produtos e
informações entre as diversas províncias (APOLINÁRIO, 2014).

A sociedade persa, basicamente, era dividida em nobres, que administra-


vam as terras e o sistema de governo, sacerdotes, que possuíam grande riqueza e
sabedoria, e camponeses.

A principal atividade econômica era o comércio, baseado especialmente


em armas, joias, objetos esmaltados e tecidos. Além disso, havia a agricultura, a
pecuária, o artesanato, a mineração de metais e pedras preciosas, e a metalurgia.

Um dos aspectos mais interessantes dos persas foi a sua religião. A partir
das pregações de Zoroastro (Zaratustra), surgiu o zoroastrismo.

NTE
INTERESSA

Zoroastro foi um profeta persa, que, segundo crenças desse povo, havia nasci-
do de uma planta e de um anjo, o que era capaz de fazer as energias negativas serem afu-
gentadas. Evidentemente, os escritos contam que, desde jovem, Zoroastro, ou Zaratustra,
tinha grande sabedoria, realizando obras de caridade e ajudando as pessoas.

99
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

A partir do zoroastrismo, os persas acreditavam que “[...] o Universo é


palco de uma luta permanente entre o bem e o mal, verdade e mentira” (BOULOS
JÚNIOR, 2004, p. 155). Eles transferiam esses sentimentos para Ahura-Mazda (o
Deus do bem) e Arimã (o Deus do mal), sendo que ambos estavam sempre em
conflito, cabendo aos fiéis fazer boas ações para o bem vencer o mal.

Conforme Tomelin (2007, p. 42) aborda:


eles não realizavam cultos em templos, por acreditarem que Ahura-
Mazda se manifestava em forma de chama, o que os levava a erguer
altares de pedra ao ar livre sobre os quais mantinham uma chama acesa.
Para eles, o fogo era símbolo de pureza, porque reduzia tudo a cinzas.

O zoroastrismo é considerado, por muitos historiadores, a primeira reli-


gião do mundo a traçar aos seus seguidores uma conduta moral.

O império persa teve seu declínio a partir de várias revoltas internas, de-
sencadeadas a partir da derrota para Atenas. Isso enfraqueceu o seu domínio,
fazendo com que, em 332 a.C., Alexandre Magno, da Macedônia, pudesse con-
quistar definitivamente a Pérsia, colocando um fim ao seu império.

100
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os hebreus tiveram três principais tipos de governo: patriarcas, juízes e monarquia.

• Sua religião era monoteísta, destoando dos demais povos daquela época.

• A região dos fenícios possuía uma extensão de terras muito pequena, mas
bons portos, fazendo, assim, com que eles se desenvolvessem maritimamente.

• Os povos fenícios estavam divididos em cidades-estados independentes.

• Os povos fenícios conseguiram sistematizar o processo de escrita em um alfabeto.

• Os persas formaram um dos maiores impérios da antiguidade, em relação a


sua extensão.

• Os povos conquistados pelos persas podiam manter seus costumes, sua reli-
gião e suas particularidades em troca de servirem ao exército quando convo-
cados e de pagarem altos impostos.

• Os povos persas possuíam sistemas de estradas que cortavam o império, além


de um ágil sistema de comunicações.

• A religião do povo persa era baseada no dualismo entre o bem e o mal, cha-
mada de zoroastrismo.

101
AUTOATIVIDADE

1 A história do povo Hebreu foi marcada por diversos momentos de idas e


vindas. A partir dos estudos realizados, faça uma linha do tempo citando a
história dos hebreus, desde os seus primórdios até a diáspora causada pela
dominação romana em 70 d.C.

2 Os fenícios ficaram marcados na história pela construção do alfabeto. Rea-


lize uma pesquisa verificando outros tipos de escrita que existem na Terra e
escreva, pelo menos, três tipos diferentes, citando suas particularidades.

3 O império persa possuía uma extensão muito grande, sendo de difícil contro-
le para aquele período. Explique como os reis persas conseguiam ter controle
sobre todas as terras, mesmo sem ter tecnologias avançadas como as atuais.

102
TÓPICO 4 —
UNIDADE 2

POVOS DA AMÉRICA

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, veremos um pouco sobre a história das primeiras grandes ci-
vilizações que habitaram o continente americano: os astecas, os maias, os incas e os
povos indígenas. Sob um viés de muitos mistérios, será possível perceber que essas
civilizações possuem muitas semelhanças com os povos estudados anteriormente.

Os astecas, que habitaram a região onde fica o atual México, desenvolve-


ram uma grande civilização, tendo como principal característica a agricultura. Já
os maias, povo que habitou a região ao sul do México, fizeram grandes avanços na
área da Matemática e da astronomia. Os incas formaram um dos maiores povos em
relação à ocupação territorial da América, com mais de 3.000 quilômetros. Por fim,
falaremos brevemente sobre os povos indígenas que habitaram as terras brasileiras.

2 CIVILIZAÇÃO ASTECA
A civilização asteca é conhecida como pré-colombiana e se desenvolveu
na região onde atualmente é localizado o México. Seu mito de origem pode ser
encontrado em Boulos Júnior (2009, p. 185):
Eles viviam no norte da América e, certo dia, por serem um povo an-
darilho, decidiram deixar Astlán, sua terra natal, e caminhar em dire-
ção ao sul. Depois de muito caminhar, avistaram uma águia empolei-
rada num cacto, que trazia uma cobra presa ao bico e a uma das suas
patas. Os sacerdotes astecas consideraram aquela águia um sinal dado
por seu deus, Uitzilopochtli, de que era ali que eles deviam se fixar e
recomeçar a vida. E foi assim que fizeram.

Lá, viviam os tepanecas, que, no início, exerceram domínio sobre os as-


tecas. Entretanto, aos poucos, os astecas foram se desenvolvendo, construindo,
ao longo do lago Texcoco, ilhas artificiais chamadas de chinampas (Figura 22) e
criando práticas de agricultura. Os astecas foram ganhando força e conseguiram
se rebelar, tomando o controle da região.

103
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

FIGURA 22 – CHINAMPAS

FONTE: <https://bit.ly/33LhGqC>. Acesso em: 13 jul. 2020.

NTE
INTERESSA

As chinampas eram espécies de ilhas artificiais que serviam para potencializar


a agricultura e explorar ainda mais o lago Texcoco.

Na Figura 23, podemos ver como o império asteca era organizado até o
ano de 1519.

FIGURA 23 – IMPÉRIO ASTECA ATÉ 1519

FONTE: <https://bit.ly/3v1h789>. Acesso em: 9 jul. 2020.


104
TÓPICO 4 — POVOS DA AMÉRICA

Com a capital em Tenochtitlán, eles começaram a ampliar seus domínios.


Quando os espanhóis chegaram à América, a cidade possuía cerca de 200 mil ha-
bitantes. Para controlar o império, havia um imperador que, como muitos povos,
era considerado um deus. Após o imperador, vinham os nobres (sacerdotes, altos
funcionários do imperador e militares), os militares, os comerciantes, os artesãos,
os agricultores, os soldados e, por fim, os escravos.

Os astecas construíram grandes pirâmides, que podiam ser utilizadas


como templos religiosos ou sacrifícios humanos, pois eles acreditavam que, se o
sangue humano fosse derramado nas cerimônias, a engrenagem do mundo con-
tinuaria funcionando. Eram politeístas, tendo o deus Quetzalcóatl como o mais
venerado. No seu auge, chegaram a ter 11 milhões de habitantes. Além disso, o
império asteca impunha várias condições aos povos conquistados, como impos-
tos pesados ou até pessoas para sacrifícios.

O fim da civilização asteca ocorreu com a chegada dos espanhóis e do


conquistador Hernán Cortéz, que, em 1521, se uniu a povos inimigos e pôs fim à
cidade de Tenochtitlán.

3 CIVILIZAÇÃO MAIA
O povo maia habitou a parte mais ao sul do México, bem como um trecho da
América Central, conhecido como Mesoamérica. Historiadores divergem sobre como
se deu a formação dos povoados, prevendo uma ocupação organizada em, aproxima-
damente, 1800 a.C. A Figura 24 mostra um mapa da organização da civilização maia.

105
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

FIGURA 24 – OS MAIAS

FONTE: <https://bit.ly/3tNeDsk>. Acesso em: 11 jul. 2020.

O termo maia é uma designação que incluía vários povos habitantes dessa
região, que tinham uma sociedade bem organizada e hierarquizada, constituída
por: imperador (considerado um representante de deus na Terra, o qual era cha-
mado de Ajaw), nobres (família real), sacerdotes, militares, administradores do
império e, por fim, camponeses, que, além de serem os menos privilegiados, eram
obrigados a pagar pesados impostos.

Como já visto, o rei era uma figura idolatrada, pois representava deus na
Terra. Seu cargo era repassado de geração em geração, constituindo uma prática
chamada de patrilinear. Um fato interessante é que o poder poderia ser assumido
por mulheres em algumas situações específicas, como no caso de o rei estar em
campo de batalha ou se não tivesse idade suficiente para assumir o trono.

Por possuir um sistema de cidades-estados independentes, muitas vezes,


elas travavam guerras em busca de mais poder. No decorrer da história, algumas
cidades conseguiram se impor sobre outras, podendo-se citar as cidades de Pa-
lenque, Tikal e Calakmul.

106
TÓPICO 4 — POVOS DA AMÉRICA

Os maias possuíam uma economia baseada principalmente em tubércu-


los, milho, algodão, tomate, cacau, batatas e feijão, além de frutas. Tinham siste-
mas de irrigação que auxiliavam no desenvolvimento das plantações e, muitas
vezes, plantavam a partir do sistema de terraços, para conter a erosão.

NTE
INTERESSA

O plantio com auxílio de terraços é uma prática utilizada até hoje, que consis-
te, basicamente, em realizar contenções em terrenos com declive, para minimizar a erosão
causada pela água.
No site da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), podemos conferir um
pouco mais sobre essa prática: https://bit.ly/33KcR0M.

FIGURA 25 – TERRACEAMENTO

FONTE: <https://bit.ly/3fkGfQh>. Acesso em: 10 nov. 2020.

Os maias também domesticaram o peru e a abelha como forma de conse-


guirem estabelecer refeições, além de praticarem a caça e a pesca.

Havia um sistema de comércio com os povos vizinhos e algumas regiões


que ficavam no império. Para fazer o comércio, eles utilizavam sementes de ca-
cau, cobre, ouro, prata, entre outros.

Uma curiosidade era que os camponeses acreditavam que, para conseguirem


ter boas colheitas, era necessário pagar impostos em dia, de acordo com o que o go-
verno (que, para eles, era sagrado) delimitasse. Esses impostos eram pagos através
de parte da colheita ou de trabalhos realizados de forma gratuita para o imperador.

107
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

Como visto, cada estado era independente, tendo governos, leis e costumes
próprios. Eles possuíam um hábito de construir templos em forma de pirâmide
com até 10 metros de altura, que eram uma forma de elevar os templos religiosos
para, assim, ficarem mais perto dos céus, ou melhor, mais perto dos deuses.

Sua religião era politeísta e ainda acreditavam que os acontecimentos na


Terra eram diretamente afetados por poderes divinos.

Além disso, uma prática recorrente eram os sacrifícios humanos, devido


a uma crença em que os deuses se acalmavam com esses rituais. Normalmente,
eram sacrificados prisioneiros de guerra ou pessoas que se voluntariavam para
morrer em prol de calmaria e fartura para a sociedade.

Os maias possuíam conhecimentos bem desenvolvidos em relação à as-


tronomia, com calendários elaborados calculando a precisão do ano solar (quase
como hoje em dia). Eles também conseguiam prever eclipses e reconhecer plane-
tas, o que era realmente bem evoluído pelas tecnologias que dispunham.

Além da astrologia, eles desenvolveram um sistema de escrita muito pa-


recido com o egípcio, utilizando símbolos e desenhos para descrever dados im-
portantes, colheitas e aspectos da vida cotidiana. Tiveram também avanços na
matemática, conseguindo explorar números com casas decimais e o valor 0 (zero).

Após o ano 900 d.C., a civilização Maia viveu uma espécie de decadência, por
motivos ainda incertos entre os historiadores – embora evidências apontem que, du-
rante vários anos, houve colheitas pobres (devido ao esgotamento da terra), além de
um aumento da população e constantes guerras que fizeram com que os povos se dis-
persassem em busca de melhores condições de vida em outros locais da Mesoamérica.

4 CIVILIZAÇÃO INCA
Os incas, ou filhos do sol, como eram chamados, eram povos que viviam do
pastoreio e da agricultura na região onde ficam as montanhas dos Andes. Sua origem
se dá por meio dos personagens Manco Cápac e sua esposa (e irmã) Mama Ocilla.

NTE
INTERESSA

A origem de Manco Cápac está rodeada de mitos; uns dizem que é conhe-
cido como filho de Inti (deus do Sol), outros que nasceu em Tampotuco. Já Mama Ocilla
é conhecida como a deusa da fertilidade e, em um mito, aparece como irmã e esposa de
Manco Cápac. É uma história muito legal, vale a pena se aprofundar!

108
TÓPICO 4 — POVOS DA AMÉRICA

“Os incas expandiram sua cultura a partir do Andes peruanos. No


século XII, os incas deslocaram-se para o vale do Cuzco, no Peru, e, após várias
conquistas militares, formaram um império com mais de 1 milhão de quilômetros
quadrados” (AZEVEDO, 2015, p. 136).

A Figura 26 mostra um mapa com toda a extensão do Império Inca.

FIGURA 26 – IMPÉRIO INCA

FONTE: <https://bit.ly/3w7TcE8>. Acesso em: 13 jul. 2020.

O império era extremamente centralizado e militarizado, comandados


pelo imperador inca (também conhecido como Sapa Inca) considerado uma espé-
cie de deus na Terra. Suas principais cidades eram Cuzco e Machu Pichu.

109
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

A agricultura era desenvolvida pelo plantio de feijão, milho e batata-doce,


além de criarem lhamas e alpacas. As plantações aconteciam por meio de siste-
mas de terraços, devido ao território ser montanhoso, e eram realizadas, em gran-
de parte, por aldeias unidas pelos laços de parentesco, conhecidas pelo nome de
ayllu e lideradas por um chefe chamado kuraqa.

Além disso, havia algumas complicações em seu serviço. Suas terras eram
divididas em três partes: uma para o imperador, outra para os deuses (sacerdo-
tes) e outra para o povo Inca. Esses povos ainda podiam ser explorados em rela-
ção à prestação de serviços ao estado (de forma gratuita), denominado de mita.

Um dos aspetos que mais chama a atenção no império Inca é sua religião,
que era dualista, ou seja, dividida entre as forças do bem e do mal. O bem era
representado pelas coisas que auxiliavam o ser humano, como o sol e a chuva, e
o mal pela seca, pela guerra, enfim, pelas coisas do cotidiano.

Eles construíram vários templos, como templo de Vilkike, no Aconcágua,


e templo do sol, no lago Titicaca, com construções realmente grandiosas, para
deixar os deuses sempre felizes.

Como outros povos, eles tinham a prática de realizar sacrifícios aos deuses. Isso
envolvia animais e, muitas vezes, humanos. Há relatos de um sacrifício de 200 crianças.

NTE
INTERESSA

Oscar Calavia Sáez publicou um artigo denominado O Inca pano: mito, história e
modelos etnológicos, em que podemos encontrar diversas histórias sobre o povo Inca e, con-
sequentemente, conhecer um pouco mais sobre como viviam. Acesse: https://bit.ly/3hqkEIY.

Realmente, é uma história marcada por essa prática, vista, na atualidade,


como inadmissível, mas que, ao olhar dos incas, era necessária para a sobrevivência
e a continuidade de seu povo.

DICAS

O caminho do Peabiru ainda é cheio de mistérios e, provavelmente, fazia a ligação


do povo Inca com os povos que habitavam o Brasil, supostamente, utilizado como rota comercial.
Leia o artigo Conheça o antigo caminho do Peabiru, disponível em: https://bit.ly/3brcQDc.

110
TÓPICO 4 — POVOS DA AMÉRICA

5 POVOS INDÍGENAS ORIGINÁRIOS BRASILEIROS


Veremos, brevemente, os povos que habitaram o território que, hoje, per-
tence ao Brasil. Acredita-se que, antes da chegada dos europeus em território
americano, cerca de 100 milhões de indígenas habitavam as terras da América,
sendo 5 milhões em terras brasileiras.

A Figura 27 apresenta como os povos indígenas estavam dispostos no


território brasileiro na época em que os portugueses chegaram no Brasil.

FIGURA 27 – POVOS INDÍGENAS DO BRASIL NA ÉPOCA DO “DESCOBRIMENTO”

FONTE: <https://bit.ly/3eK5We2>. Acesso em: 13 jul. 2020.

Entretanto, esses povos não criaram civilizações como as citadas anterior-


mente, pois, em grande parte, eram nômades e com tecnologias primitivas de
organização. A principal organização era realizada por troncos linguísticos, de
acordo com as principais características de cada povo:

• Tupi: basicamente, na região litorânea, viviam da caça, pesca e coleta de frutos.


• Jê: no planalto central, viviam normalmente perto de rios, sobrevivendo de
caça, coleta de raízes e coleta de frutos.
• Karib: na região chamada de baixo Amazonas, esta tribo era muito agressiva
e praticava uma espécie de canibalismo com outros povos que derrotavam.
• Aruak: na região Amazônica, mais precisamente perto da ilha de Marajó, ti-
nham como grande característica o artesanato cerâmico.

111
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

Dentro do território brasileiro, o tronco mais famoso, com certeza, é o dos


Tupi. Em grande parte, eram povos nômades, mas que se originaram no território
dos vales do rio Madeira e Xingu. Esse povo tinha hábitos nômades e, por isso,
espalhou-se por praticamente todo o território brasileiro. Corraini (2017, p. 24)
afirma que “Os povos chamados por Tupi habitavam a parte média e inferior da
bacia do Amazonas e dos principais afluentes da margem direita, abarcando uma
grande extensão do litoral atlântico [...]”.

O tronco linguístico mais conhecido é o Tupi Guarani, que é resultado do


encontro da tribo Tupi com os Guaranis que viviam no litoral. Com isso, a área de
influência chegou até outros países como Paraguai, Argentina e Uruguai. Trata-
se de uma tribo com grande influência no cotidiano dos brasileiros, pois muitas
palavras advêm do Tupi, como pipoca, mingau, mandioca, entre outras.

FIGURA 28 – A PRÁTICA DA CAÇA ERA PRESENTE NO DIA A DIA DESSE POVO

FONTE: <https://bit.ly/33Jdjfz>. Acesso em: 9 jan. 2021.

UNI

É importante destacar que, na atualidade, é comum pensar que os povos in-


dígenas vivem em ocas, sobrevivem da caça e da pesca, usam cocar, entre outros este-
reótipos. Contudo, antes de falar, precisamos conhecer cada vez mais esses povos, como
os elementos sagrados para os indígenas, que tiveram – muitos ainda têm – uma história,
muitas vezes, sofrida em meio a sociedade.

112
TÓPICO 4 — POVOS DA AMÉRICA

LEITURA COMPLEMENTAR

REINHARD MAACK E O CAMINHO DO PEABIRU NO PARANÁ

Secretaria da Educação do Paraná

O Professor Reinhard Maack (1892-1969), naturalista alemão e explorador do


território paranaense, elaborou um mapa em 1952, mostrando o Caminho do Peabiru.
O mapa foi confeccionado com base nos manuscritos de um alemão, Ulrich Schimi-
del. A área abrangida no mapa representa o território paranaense, parte de São Pau-
lo, Santa Catarina, Paraguai, Argentina e Bolívia, não apresentando limites políticos
pré-estabelecidos e projeção cartográfica. Schmidel possui grande relevância nos es-
tudos relacionados com o Caminho de Peabiru, pois ele o percorreu saindo de Nossa
Senhora de Assunção (atual Assunção, capital do Paraguai), indo até São Vicente em
São Paulo, e ainda, segundo ele, a travessia durou quase seis meses. Ulrich Schmidel
não foi o primeiro europeu a percorrer o caminho de Peabiru, antes dele dois grandes
nomes ficaram marcados por esta travessia: Aleixo Garcia e Don Álvar Nunez Cabeza
de Vaca. No entanto, foi Schmidel quem o descreveu com maiores detalhes.

O Caminho hoje está em sua maior parte descaracterizada pela atividade


agrícola, como declara o Professor Igor Chmyz da Universidade Federal do Para-
ná (2007). Com a colonização do estado, já no decorrer do século XX, houve um
intenso processo de desmatamento, exploração da madeira, da terra e de outros
recursos naturais. Além disso, a construção de estradas, rodovias, cidades, entre
outras coisas, acabaram colaborando para a desfiguração do caminho de Peabiru.

Um artigo sobre o “Geoprocessamento aplicado a estudos do Caminho de


Peabiru”, de Ana Paula Colavite e de Mirian Vizintim Fernandes Barros, reuniu o
mapa de Maack sobre o caminho e a base do mapa político do estado do Paraná
atualizada. Observando o mapa, a linha mais espessa representa, segundo Maack
(1959), o ramal principal do caminho de Peabiru e as linhas de espessura mais
fina representam os ramais secundários do caminho de Peabiru.

Mapa Político do Paraná com o Caminho de Peabiru. Adaptado de DNIT


(2002) e Maack (2002). Organizado por Ana Paula Colavite

A rota principal desse caminho atravessa o Estado do Paraná no sentido les-


te-oeste, vindo de São Paulo, passando nos municípios de: Adrianópolis, Tunas do
Paraná, Cerro Azul, Doutor Ulisses, Castro, Tibagi, Reserva, Cândido Abreu, Pitan-
ga, Nova Tebas, Mato Rico, Roncador, Nova Cantu, Altamira do Paraná, Guaraniaçu,
Campo Bonito, Braganey, Iguatu, Corbélia, Anahy, Aurora, Iracema do Oeste, Jesuí-
tas, Assis Chateaubriand, Palotina e Terra Roxa, chegando às margens do Rio Paraná.

Além da rota principal, o caminho contava com rotas secundárias que atra-
vessavam o estado no sentido norte-sul. Uma das rotas secundárias vinha de São
Paulo, adentrando o Paraná, passando pelos municípios de: Salto do Itararé, Siquei-
113
UNIDADE 2 — POVOS DA ANTIGUIDADE NA ÁFRICA E NO ORIENTE MÉDIO

ra Campos, Venceslau Braz, Arapoti, Jaguariaiva, Piraí do Sul, Castro, Carambeí,


Ponta Grossa, Palmeiras, Porto Amazonas, Balsa Nova, Campo Largo, Araucária,
Curitiba, São José dos Pinhais, Morretes, Paranaguá, chegando ao oceano Atlântico.
Próximo ao município de Castro, o ramal secundário atravessava o ramal principal.

Em Curitiba, outro ramal seguia sentido nordeste, passando por Colombo,


Bocaiúva do Sul, Campina Grande do Sul, onde se dividia, um ramal seguia para São
Paulo e outro para o litoral, passando por Antonina, chegando ao Oceano Atlântico.

Em Araucária, um ramal secundário segue sentido Santa Catarina, pas-


sando pelos municípios de Contenda, Mandirituba, Tijucas do Sul e Agudos do
Sul, adentrando o estado de Santa Catarina.

Outro ramal secundário tem início em São Paulo e atravessa o estado do


Paraná, passando pelos municípios de Jardim Olinda, Paranapoema, Paranacity,
Cruzeiro do Sul, Uniflor, Atalaia, Mandaguaçu, Maringá, Floresta, Itambé, Enge-
nheiro Beltrão, Peabiru, Campo Mourão, Mamborê, Juranda, Boa Esperança, Ran-
cho Alegre do Oeste, IV Centenário, Formosa do Oeste, Jesuítas, Assis Chateau-
briand, Tupãssi, Toledo, Ouro Verde, São Pedro do Iguaçu, Vera Cruz do Oeste,
Diamante do Oeste, Ramilândia, Matelândia, Medianeira, Jardinópolis, Capane-
ma, Planalto, Pérola do Oeste, Pranchita, Santo Antônio do Sudoeste, Bom Jesus
do Sul, Barracão e Flor da Serra do Sul, de onde segue sentido Santa Catarina.

Essa rota secundária atravessa o ramal principal no município de Jesuítas.


No município de Braganey, iniciava um outro ramal secundário e seguia sentido sul,
passando pelos municípios de Cascavel, Boa Vista da Aparecida, Capitão Leônidas
Marques, Realeza, Santa Isabel do Oeste, Ampére e Francisco Beltrão, onde termina.

Essa distribuição espacial do caminho permitia o deslocamento dos ín-


dios e dos primeiros desbravadores para vários pontos desta extensa área.
FONTE: Adaptado de SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO PARANÁ. Reinhard Maack e o Caminho
do Peabiru no Paraná. Disponível em: https://bit.ly/3og6NGs. Acesso em: 26 abr. 2021.

114
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você aprendeu que:

• O povo asteca desenvolveu-se onde hoje é o atual México.

• A principal cidade asteca era Tenochtitlán.

• A agricultura asteca foi desenvolvida através de chinampas, que eram ilhas


flutuantes no lago Texcoco.

• O povo Maia desenvolveu-se mais o sul do México e possuía um sistema de


cidades-estados independentes.

• O povo Maia apresentou grandes avanços na matemática, conseguindo ex-


plorar números com casas decimais e o valor 0 (zero).

• Os incas formaram uma das maiores civilizações, em termos de extensão, de


todos os tempos.

• O povo Inca possuía uma religião dualista, com práticas de sacrifícios huma-
nos constantes.

• Antes da chegada dos europeus, havia cerca de 200 milhões de habitantes na


América, sendo que 5 milhões no território brasileiro.

• Os indígenas que habitavam nas terras brasileiras eram divididos em troncos


linguísticos, ou seja, a partir de sua língua materna, tinham divisões territoriais.

CHAMADA

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pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

115
AUTOATIVIDADE

1 Complete o quadro comparativo a seguir com as três maiores civilizações


que habitaram o continente americano: incas, maias e astecas. Preencha com
aspectos como religião, comércio, formas de governabilidade e agricultura.

Povo Incas Maias Astecas


Local
Religião
Governo
Agricultura
FONTE: O autor.

2 O povo Guarani habitava (e habita) o território brasileiro e possui uma cul-


tura muito interessante, porém, hoje, já existem muitas influências na vida
dos Guaranis. Indique algumas características dos primeiros povos que ha-
bitaram o território brasileiro.

3 A partir dos estudos sobre a história das primeiras grandes civilizações que
habitaram o continente americano (astecas, maias, incas e povos indígenas),
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Os incas foram os inventores do número 0 (zero).


( ) As chinampas eram ilhas artificiais utilizadas pelos astecas para realizar plantio.
( ) O território inca era o mais extenso de todas as sociedades Ameríndias.
( ) O caminho do Peabiru estende-se até o território brasileiro.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – V – F – V.
b) ( ) F – V – V – V.
c) ( ) V – F – F – F.
d) ( ) F – F – V – F.

116
REFERÊNCIAS
APOLINÁRIO, M. R. Projeto Araribá: História (6º ao 9º ano). 4. ed. São Paulo:
Editora Moderna, 2014.

AZEVEDO, G.; SERIACOPI, R. História: projeto teláris (6º ao 9º ano). São Paulo:
Ática, 2015.

BAINES, J.; MALIK, J. Cultural Atlas of Ancient Egypt. London: Andromeda Ox-
ford Limited, 2008.

BBC Brasil. Arqueólogos encontram o documento escrito mais antigo de Jerusa-


lém. 14 jul. 2010. Disponível em: https://bbc.in/3hrQfdu. Acesso em: 26 abr. 2021.

BOULOS JÚNIOR, A. História: sociedade e cidadania. Nova edição: FTD; 2009.

CARDOSO, C. F. Sociedades do Antigo Oriente Próximo. São Paulo: Ática, 1994.

CORRAINI, S. R. A construção política e social Tupi Guarani: Uma visão sobre


os povos Tupi Guarani ao longo da História, seus enredos cosmológicos, diferen-
ças e posições entre os subgrupos. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) –
da Faculdade de Ciências e Letras, UNESP, Araraquara, 2017.

GIORDANI, M. C. História da Antiguidade Oriental. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2001.

LIMA, F. A. F. M. Estado, Império e Exploração Econômica no Egito do Reino


Novo. 2016, 401f. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal Flumi-
nense, Niterói, 2016.

MORLEY, J.; SALARIYA, D. How Would You Survive As an Ancient Egyptian?


London: Orchard/Watts Group, 1999.

PINSKY, J. As primeiras civilizações. São Paulo: Contexto, 2007.

RATHBONE, D. História ilustrada do mundo antigo: Um estudo das civilizações


da Antiguidade, do Egito dos faraós ao Império Romano, passando por povos
das Américas, da África e da Ásia. trad. Clara Allain. São Paulo: Publifolha, 2011.

ROSOLIA, O. História Antiga. São Paulo: Livraria Francisco Alves, 1944.

TELLES, L. A.; TOLEDO, T. F. B. A Espiritualidade Suméria Como Agente do Plu-


ralismo Religioso Mesopotâmico. NEARCO: Revista Eletrônica de Antiguidade,
Rio de Janeiro, v. XII, n. I, p. 133-154, 2020.

TOMELIN, J. F. Caderno de Estudos: História Antiga. Indaial: UNIASSELVI, 2007.

117
118
UNIDADE 3 —

GRÉCIA E ROMA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender a formação histórica, o desenvolvimento e a expansão,


bem como os aspectos sociais, culturais e econômicos das civilizações
grega e romana;

• entender o processo histórico do Ocidente e a história dos povos, em


vastas regiões da Ásia e da África.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

TÓPICO 2 – INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

TÓPICO 3 – LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

119
120
TÓPICO 1 —
UNIDADE 3

CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA


INTRODUÇÃO

1 INTRODUÇÃO

Há cerca de 2.500 anos, os gregos se chamavam helenos e habitavam a Hé-


lade. O nome “grego” foi dado a esse povo mais tarde pelos romanos. Eles viviam
na Grécia continental e nas ilhas gregas, além das colônias espalhadas pelo Mar
Mediterrâneo em regiões correspondentes, na atualidade, à Itália, à Turquia, ao
oeste da França e ao norte do continente africano.

A Grécia Antiga é considerada o berço da Filosofia ocidental (Sócrates,


Platão e Aristóteles), da Literatura (Homero e Hesíodo), da Matemática (Pitágo-
ras e Euclides), da História (Heródoto), do drama (Sófocles, Eurípides e Aristófa-
nes), dos Jogos Olímpicos e da Democracia. O conceito de um universo atômico
foi postulado, pela primeira vez, na Grécia no trabalho de Demócrito e Leucipo.
O processo do método científico conhecido hoje surgiu no trabalho de Thales de
Mileto e de seus seguidores. O alfabeto latino também foi criado na Grécia Antiga
durante a colonização fenícia, no século VIII a.C., assim como os primeiros traba-
lhos em Física e Engenharia, realizados por Arquimedes.

A Grécia continental é uma grande península cercada em três lados pelo


mar Mediterrâneo (que se ramifica no mar Jônico a oeste e no mar Egeu a leste), que
também compreende as ilhas conhecidas como Cíclades e Dodecaneso (incluindo
Rodes), Corcyra e de Creta e a península do sul conhecida como Peloponeso. A
geografia da Grécia influenciou bastante a sua cultura, pois, com poucos recursos
naturais e cercada por água, as pessoas acabaram levando o mar para seu sustento.
As montanhas cobrem 80% do território grego e apenas pequenos rios atravessam
uma paisagem rochosa que, na maioria das vezes, oferece pouco incentivo à agri-
cultura. Consequentemente, os primeiros gregos antigos colonizaram ilhas vizi-
nhas e fundaram assentamentos ao longo da costa da Anatólia (também conhecida
como Ásia Menor, atual Turquia). Os gregos tornaram-se comerciantes marítimos
habilidosos, além de, possuindo uma abundância de matérias-primas para a cons-
trução em pedra e grande habilidade, terem construído algumas das estruturas
mais impressionantes da Antiguidade (BOYS-STONES, 2012).

121
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 1 – A GRÉCIA ANTIGA OU HÉLADE

FONTE: <https://tinyurl.com/yy7lnzzg>. Acesso em: 22 jul. 2020.

O mapa indica a configuração geográfica central da Grécia Antiga (ou Hé-


lade). O mundo grego, na antiguidade, era formado por regiões continentais no
sul da Europa e da Ásia (litoral mediterrâneo da Anatólia, atual Turquia) e por
uma parte insular, notadamente, no Mar Mediterrâneo.

2 HISTÓRIA DA GRÉCIA ANTIGA


A história da Grécia Antiga é mais facilmente compreendida quando divi-
dida em períodos. Na era paleolítica (2,5 milhões de anos a 10000 a.C.), a agricul-
tura era praticada como evidenciado pelos achados nas cavernas de Petralona e
Franchthi (duas das mais antigas habitações humanas do mundo). A era neolítica
(6000-2900 a.C.) caracterizou-se por assentamentos permanentes (principalmente
no norte da Grécia), domesticação de animais e desenvolvimento da agricultura.
No entanto, achados arqueológicos no norte da Grécia (Tessália, Macedônia e
Sesklo, entre outros) sugerem uma migração para essas regiões, de povos da Ana-
tólia (atual Turquia). Assim, copos, tigelas e figuras de cerâmica encontrados nos
sítios arqueológicos na Grécia continental possuem características de artefatos
identificados na Anatólia e, portanto, distintas de achados neolíticos na Tessália,
Macedônia e Sesklo. Esses colonos, geralmente, eram agricultores, já que o norte
da Grécia era mais propício à agricultura do que em outras regiões gregas, e vi-
viam em casas de pedra de um cômodo com telhado de madeira e argila.

A civilização das Cíclades (3200-1100 a.C.) floresceu nas ilhas do mar


Egeu (incluindo Delos, Naxos e Paros) e forneceu as primeiras evidências de ha-
bitação humana contínua naquela região. Durante esse período, casas e templos
foram construídos em pedra e os habitantes viviam da pesca e do comércio. Essa

122
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

época geralmente é dividida em três fases: “Cíclades Iniciais”, “Cíclades Médias”


e “Cíclades Tardias”, que se caracterizam pelo desenvolvimento da arte e da ar-
quitetura. As duas últimas fases se sobrepõem e, finalmente, se fundem com a
civilização minoica (BOYS-STONES, 2012).

A Figura 2 mostra uma escultura de uma mulher grávida (como sugerido


pelos riscos verticais), que sugere a existência de cultos associados à fertilidade
no Período das Cíclades.

FIGURA 2 – ESCULTURA FEMININA DO PERÍODO DAS CÍCLADES (2400 A.C.)

FONTE: <https://tinyurl.com/yd5verm8>. Acesso em: 22 jul. 2020.

A civilização minoica (2700-1500 a.C.) desenvolveu-se na ilha de Creta e,


rapidamente, se tornou o poder marítimo dominante na região. O termo “minoi-
co” foi cunhado pelo arqueólogo britânico, Sir Arthur Evans, que descobriu, em
1900, um palácio em Knossos, porém o nome pelo qual as pessoas dessa cultura,
na época, se conheciam não é sabido. Provavelmente, a civilização minoica já
prosperava, antes de 6000 a.C., portanto, antes das datas aceitas por estudiosos.

A acrobacia com touros, e os touros em geral, era uma parte importante


da cultura minoica. As escavações em Knossos revelaram vários afrescos repre-
sentando os saltos nos touros (Figura 3). Os touros podiam ter significado religio-
so para os minoicos, como sugere o tamanho exagerado do touro em comparação
aos humanos, o que evidencia a reverência dos minoicos ao poder dos animais.

123
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 3 – TOURO MINOICO: ACROBATAS SALTANDO NO TOURO

FONTE: <https://bit.ly/2RjsARI>. Acesso em: 22 jul. 2020.

Os minoicos desenvolveram um sistema de escrita conhecido como “Li-


near A” (que ainda não foi decifrado) e fizeram avanços na construção naval, na
arquitetura, na cerâmica, nas artes e nas ciências. O rei Minos foi tido, pelos histo-
riadores antigos (Tucídides, entre eles), como o primeiro governante a estabelecer
uma marinha com o objetivo de fundar colônias.

Evidências arqueológicas e geológicas em Creta sugerem que os minoi-


cos entraram em declínio devido ao desmatamento e a consequente exaustão do
solo pelo uso intensivo. Por fim, a erupção do vulcão, na ilha vizinha de Thera
(Santorini atual), entre 1650 e 1550 a.C., e o tsunami teriam selado o declínio dos
minoicos. A ilha de Creta, segundo essa hipótese, foi inundada e as cidades des-
truídas. Esse evento é mencionado como a inspiração de Platão para criar o “Mito
da Atlântida” em seus diálogos de “Críticas e Timeu” (KINZL, 2010).

DICAS

Para saber mais sobre o Mito da Atlântida, acesse: https://bit.ly/3boee9q.

2.1 OS MICÊNICOS E SEUS DEUSES


A civilização micênica (1900-1100 a.C.) é comumente reconhecida como o
início da cultura grega, embora se saiba muito pouco sobre ela, exceto pelos acha-
dos arqueológicos e pelo relato de Homero na “Ilíada”. Aos micênicos, são cre-
ditados os avanços arquitetônicos, o desenvolvimento de um sistema de escrita
chamado Linear B e o aprimoramento de ritos religiosos. Os micênicos parecem
ter sido influenciados pelos minoicos, de Creta, em sua adoração a deusas da ter-
ra e deuses do céu, que, com o tempo, viriam a compor o panteão grego clássico.
124
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

A Máscara de “Agamemnon” é um artefato funerário de ouro (Figura 4),


usado para cobrir o rosto de um corpo, que foi descoberto em Micenas, na Gré-
cia, em 1876, por Heinrich Schliemann, que acreditou ter descoberto o corpo do
lendário líder grego Agamemnon, daí o nome. Contudo, pesquisas arqueológicas
recentes sugerem que a máscara é de 1500 a 1550 a.C., ou seja, uma época bem
anterior à de Agamemnon. Apesar disso, o nome da máscara permaneceu, e o
artefato pode ser visto no Museu Arqueológico Nacional de Atenas, em Atenas.

FIGURA 4 – MÁSCARA MORTUÁRIA DE AGAMEMNON

FONTE: <https://tinyurl.com/y32lpvuo>. Acesso em: 22 jul. 2020.

A mitologia grega fornece um paradigma sólido sobre a criação do uni-


verso, do mundo e dos seres humanos. Um mito antigo relata como, no começo,
não havia nada além de caos, na forma de águas sem fim. Do caos, surgiu a deusa
Eurínome, que separou a água do ar e iniciou sua dança da criação com a serpente
Ofíon. Dessa dança, toda a criação surgiu e Eurínome era, originalmente, a Grande
Deusa Mãe e Criadora de Todas as Coisas. No momento em que Hesíodo e Ho-
mero escreveram essa história (VIII a.C.), ela já havia se transformado no mito da
guerra de Zeus com os Titãs e do nascimento dos deuses do Olimpo (KINZL, 2010).

Essa mudança indica a transição de uma religião matriarcal para uma


patriarcal. No entanto, qualquer que fosse o modelo seguido, os deuses intera-
giam regularmente com os humanos que os adoravam. Por volta de 1100 a.C., as
grandes cidades micênicas do sudoeste da Grécia foram abandonadas e alguns
afirmam que sua civilização foi destruída por uma invasão dos gregos dóricos. As
evidências arqueológicas são inconclusivas quanto ao que teria causado a queda
dos micênicos – como nenhum registro escrito desse período sobreviveu, existem
apenas especulações sobre as possíveis causas.

Os fragmentos de “Linear B” encontrados até agora contêm apenas lis-


tas de mercadorias comercializadas ou mantidas em estoque. No entanto, parece
claro que, depois da “Idade das Trevas” grega (aproximadamente 1100-800 a.C.,
assim chamada por causa da falta de documentação escrita), a colonização em an-
damento na Ásia Menor e nas ilhas ao redor da Grécia continental começa a fazer

125
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

avanços culturais significativos. Por volta de 585 a.C., o primeiro filósofo grego,
Tales de Mileto, estava envolvido no que, hoje, seria reconhecido como investi-
gação científica na costa da Ásia Menor, e essas colônias jônicas fariam avanços
significativos na Filosofia e na Matemática (BURN, 1985).

DICAS

A Linear A é um dos dois sistemas de escrita da Creta minoica, que foi usado
antes de a Linear B micênica ser utilizada, posteriormente, para grafar a língua helênica dos
invasores oriundos do continente (1450 a.C.). A Linear A é um sistema ideo-silábico, isto
é, contém silabogramas e ideogramas. Entretanto, ao contrário da Linear B decifrada por
Michael Ventris, em 1952, a escrita minoica Linear A permanece desconhecida. A aplicação
dos valores dos signos da Linear B permite apenas um vislumbre parcial do seu conteúdo
(ideogramas, alguns topônimos e antropônimos e um punhado de termos administrativos)
e a sua língua, designada de “minoico”, não parece estar ligada a nenhuma língua conhecida.

FONTE: <https://tinyurl.com/ycnhs7o9>. Acesso em: 17 dez. 2020.

2.2 GRÉCIA ANTIGA: DO PERÍODO ARCAICO AO CLÁSSICO


O período arcaico (800-500 a.C.) caracterizou-se pela adoção do regime
republicano organizado em uma única cidade-estado ou polis e pela instituição
de leis, como as reformas de Draco, em Atenas. Além disso, o Grande Festival
Panatenaico foi estabelecido, sendo criados estilos de cerâmicas e esculturas e as
primeiras moedas cunhadas no reino insular de Egina. Essas manifestações são o
início do florescimento grego do período clássico, entre 500 e 400 a.C. – ou, mais
precisamente, entre 480 e 323 a.C., a partir da vitória grega na Batalha de Salami-
na até a morte de Alexandre, o Grande.

O período clássico inclui também a chamada “Era de Ouro” de Atenas


(480-404 a.C.) durante a qual Péricles iniciou a construção da Acrópole e proferiu
seu famoso elogio aos que morreram, em 490 a.C., na Batalha de Maratona contra
os persas. Nesse período, os gregos se destacaram em quase todas as áreas do
conhecimento humano, graças às contribuições de grandes pensadores e artistas.
Dessa maneira, os filósofos pré-socráticos, seguindo o exemplo de Tales de Mi-
leto (624-548 a.C.), começam a utilizar o que se tornaria o método científico para
explicar os fenômenos naturais. Assim, sábios como Anaximandro, Anaxímenes,
Pitágoras, Demócrito, Xenófones e Heráclito abandonaram o modelo teísta do
universo e se dedicaram a descobrir a “primeira causa” que dá origem a vida e
ao universo. Posteriormente, Euclides e Arquimedes avançaram na Ciência e na
Filosofia, estabelecendo, de forma definitiva, a Matemática como disciplina. Ou-
trossim, o exemplo de Sócrates e as obras de Platão e de Aristóteles se tornaram
legados inestimáveis para a humanidade.

126
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

No período clássico, a arquitetura e a arte produziram obras famosas, como


o Partenon (Figura 5) e o Discóbolo (Figura 6), que resumem o interesse dos artistas
em descrever emoções, beleza e realizações humanas de forma realista, mesmo que
essas qualidades sejam apresentadas em obras com imortais (BURN, 1985).

FIGURA 5 – PARTENON (IV SÉCULO A.C.), EM ATENAS

FONTE: <https://bit.ly/3y6aQdb>. Acesso em: 22 jul. 2020.

Produto mais notável das obras públicas promovidas por Péricles, o magní-
fico Partenon foi construído em homenagem à deusa Atena, padroeira da cidade. Os
arquitetos Iktinos e Kallikrates e o escultor Fídias começaram a construir o templo em
meados do século V a.C. O Partenon foi construído no topo da Acrópole, um pedestal
natural feito de rocha que foi o local dos primeiros assentamentos em Atenas.

FIGURA 6 – O “DISCÓBOLO” (LANÇADOR DE DISCO)

FONTE: <https://tinyurl.com/ydg984oe>. Acesso em: 17 dez. 2020.

127
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

O “Discóbolo de Myron” é uma escultura grega que representa um jovem


atleta grego lançando um disco. O bronze grego original, de cerca de 460-450
a.C., se perdeu, mas o trabalho é conhecido por meio de várias cópias romanas.
O escultor grego, conhecido como Myron, é considerado o primeiro escultor a
dominar esse estilo. Myron foi um dos primeiros a aperfeiçoar a representação do
corpo humano girando em seu eixo vertical. O “Discóbolo” incorpora o conceito
grego de “simetria”, em que estátuas de jovens atletas são equilibradas, rítmicas
e finamente detalhadas. É um uso mais livre do contraposto, que ajudou a libertar
a escultura grega de sua tradição de poses rígidas.

É também no período clássico que a “democracia” (Demos: povo; e Kratos:


poder ou governo do povo) se firma como sistema político em Atenas, permitindo
a todos os “cidadãos” do sexo masculino e com idade superior a 20 anos partici-
par das decisões políticas.

E
IMPORTANT

O termo “democracia” apareceu pela primeira vez no pensamento político e


filosófico grego, na cidade-estado de Atenas, durante a Antiguidade clássica. Liderados por
Clístenes, os atenienses estabeleceram, em 508-507 a.C., o que é geralmente considerada
a primeira experiência democrática. Clístenes ficou conhecido como “o pai da democra-
cia ateniense”, que tomou a forma de uma democracia direta e tinha duas características
distintas: a seleção aleatória de cidadãos comuns para preencher os poucos cargos ad-
ministrativos e judiciais existentes no governo e uma assembleia legislativa composta por
todos os cidadãos atenienses. Todos os cidadãos elegíveis eram autorizados a falar e votar
na assembleia, que estabelecia as leis da cidade-estado. No entanto, a cidadania ateniense
excluía mulheres, escravos, estrangeiros (metoikoi), os que não eram proprietários de ter-
ras e os homens com menos de 20 anos de idade. Dos cerca de 200 a 400 mil habitantes
de Atenas na época, havia entre 30 mil e 60 mil cidadãos. A exclusão de grande parte da
população a partir do que era considerada cidadania está intimamente relacionada com
o conceito do termo na época, pois, durante a maior parte da Antiguidade, o benefício da
cidadania era associado à obrigação de lutar em guerras.

FONTE: <https://tinyurl.com/yb77w2um>. Acesso em: 17 dez. 2020.

Todas as realizações na área cultural foram possíveis pela ascensão de Atenas,


após a vitória sobre os persas em 480 a.C. A paz e a prosperidade se mantiveram após
a derrota persa e fortaleceram a economia, que proporcionou estabilidade para a cultu-
ra florescer. Atenas tornou-se uma potência, com uma marinha poderosa, que consegue
cobrar tributo de outras cidades-estados e subjugá-las. Atenas forma e lidera “Liga de
Delfos”, uma aliança defensiva, cujo objetivo declarado era deter o expansionismo persa.

No entanto, a cidade-estado de Esparta, desconfiando da sinceridade ate-


niense, formou sua própria aliança contra seus inimigos, a Liga do Peloponeso
(assim denominada por conta da região do Peloponeso, onde Esparta e outras

128
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

cidades-estados estavam localizadas). As cidades-estados, que tomaram o parti-


do de Esparta, consideravam Atenas uma cidade de tiranos, enquanto as cidades
que tomavam o partido de Atenas viam Esparta e seus aliados com desconfiança.
A tensão entre esses dois partidos acabou por explodir no que ficou conhecido
como Guerra do Peloponeso. O primeiro conflito (460-445 a.C.) terminou em tré-
gua e prosperidade para ambas as partes, mas o segundo (431-404 a.C.) deixou
Atenas em ruínas, enquanto Esparta, a vencedora, também entrou em declínio
após sua prolongada guerra com Tebas.

Geralmente, esse período é chamado de período clássico tardio (400-330


a.C.). O vácuo de poder deixado pela queda dessas duas cidades foi preenchido
por Filipe II da Macedônia (382-336 a.C.), após sua vitória, em 338 a.C., sobre as
forças atenienses e seus aliados na Batalha de Queroneia. Filipe II uniu as cida-
des-estados gregas, sob o domínio macedônio, e, após seu assassinato, em 336
a.C., seu filho Alexandre assumiu o trono (FERGUSON, 1978).

2.3 ALEXANDRE, O GRANDE E O DOMÍNIO DE ROMA


Alexandre, o Grande (356-323 a.C.), continuou os planos de seu pai de
uma invasão em larga escala da Pérsia, em retaliação pela invasão da Grécia em
480 a.C. Como ele tinha quase toda a Grécia sob seu comando, um exército per-
manente de tamanho considerável, entre outros recursos, não precisava se pre-
ocupar com aliados nem consultar ninguém sobre seus planos. Dessa maneira,
levou seu exército ao Egito, à Pérsia e, finalmente, à Índia. Discípulo, em sua
juventude, de Aristóteles, Alexandre espalhou os ideais da civilização grega, por
meio de suas conquistas e, ao fazer isso, transmitiu arte, filosofia, cultura e idioma
gregos para todas as regiões conquistadas.

FIGURA 7 – ALEXANDRE, O GRANDE (356-323 A.C.)

FONTE: <https://bit.ly/2SMK3SR>. Acesso em: 22 jul. 2020.


129
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

Em 323 a.C., Alexandre morreu e seu vasto império foi dividido entre quatro
de seus generais. Sua morte iniciou o que passou a ser conhecido pelos historiadores
como o período helenístico (323-31 a.C.), durante o qual o pensamento e a cultura
gregos se tornaram dominantes nas várias regiões sob a influência desses generais.
Após as guerras entre os sucessores de Alexandre, Antígono I estabeleceu a dinastia
Antigônida, na Macedônia, e passou a governar as cidades-estados gregas.

A república romana torna-se cada vez mais envolvida na política dos gre-
gos e, em 168 a.C., derrota a Macedônia na Batalha de Pydna. Após essa data, a
Grécia ficou sob a influência de Roma e, em 146 a.C., foi transformada em prote-
torado, iniciando uma tendência, entre os romanos, de imitar a moda, a Filosofia
e, até certo ponto, as sensibilidades gregas. Em 31 a.C., Otaviano César se anexa
à Grécia como província romana, após sua vitória, sobre Marco Antônio e Cleó-
patra, na Batalha de Áccio. Otaviano torna-se Augusto César e a Grécia parte do
Império Romano (FERGUSON, 1978).

2.4 SOCIEDADE GREGA


A sociedade grega, na Antiguidade, era dominada por indivíduos do sexo
masculino, com o status legal de cidadão, direito a voto, cargo público e proprie-
dade privada, porém os grupos sociais que compunham a população de uma
cidade-estado ou polis típica da Grécia eram bem diversos. Mulheres, crianças,
imigrantes (gregos e estrangeiros), trabalhadores e escravos, todos, tinham pa-
péis definidos. Não obstante, era possível, para os filhos de segunda geração de
pais de diferentes grupos sociais, ascender na rígida hierarquia social romana,
principalmente em momentos de crise e guerras.

A sociedade da Grécia Antiga era composta pelos seguintes grupos:

• cidadãos do sexo masculino – três grupos: aristocratas (aristoi), agricultores mais


pobres (periokoi) e um segmento social intermediário (artesãos e comerciantes);
• trabalhadores semilivres (por exemplo, os helots de Esparta);
• mulheres – pertencentes a todos os grupos masculinos citados, mas sem di-
reitos dos cidadãos;
• crianças – categorizadas como a faixa etária inferior a 18 anos em geral;
• escravos – os douloi que tinham deveres civis ou militares;
• estrangeiros – não residentes (xenoi) ou estrangeiros (metoikoi) que estavam
abaixo dos cidadãos do sexo masculino.

Embora o cidadão do sexo masculino tivesse, de longe, a melhor posição


na sociedade grega, havia outros segmentos privilegiados nas cidades gregas. No
topo da pirâmide social, estavam as “melhores pessoas”: os aristoi (aristocratas).
Possuindo mais recursos, os aristoi podiam dispor de armaduras, armas e cavalos
quando em campanha militar. Os aristocratas dividiam-se em clãs familiares, que
controlavam todas as importantes posições políticas da polis. Sua riqueza vinha
da posse de propriedades e, mais importante, da melhor terra, ou seja, a mais
fértil e mais próxima da proteção oferecida pelas muralhas da cidade.
130
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

Depois dos aristocratas, vinha uma segunda classe de não cidadãos, homens
que possuíam terras menos produtivas situadas mais longe da cidade, o que as tor-
nava menos protegidas do que a terra dos nobres próximas da cidade. Em alguns
casos, a terra podia estar tão longe da cidade que os proprietários precisavam morar
nelas, e não nas cidades. Esses cidadãos eram chamados de perioikoi ou “periecos”
em Esparta (moradores da região, em Esparta não era permitido a residência de es-
trangeiros). Em Atenas, essa segunda classe, chamada de métoikos, eram estrangeiros
que residiam, comerciavam e enriqueciam, mas não desfrutavam de poder político.

Os aristoi guardavam zelosamente seus privilégios e o monopólio na po-


lítica com o objetivo de garantir que apenas os proprietários de terras pudessem
ocupar posições de poder. No entanto, se alguns conseguiam, através da acu-
mulação de riqueza e influência, contornar os limites impostos pela hierarquia
social, outros podiam decair de status pela perda de riqueza (o que podia levar a
uma perda de cidadania ou mesmo a ser escravizado). Assim como problemas de
saúde, perda de herança, convulsões políticas ou guerra também podiam resultar
em decadência na ordem social (HORNBLOWER, 2012).

2.4.1 Mulheres
As mulheres tinham poucos direitos, em comparação aos cidadãos do
sexo masculino. Impedidas de votar, possuir terras ou herdar, o lugar de uma
mulher se limitava à esfera doméstica com o objetivo de procriar e criar os filhos.
O contato com homens, fora do círculo familiar, era desencorajado e as mulheres
ocupavam seu tempo com tecelagem e outras atividades domésticas. No entan-
to, as mulheres espartanas foram tratadas de maneira um pouco diferente, por
exemplo, elas podiam fazer treinamento físico como os homens, tinham direito
de possuir terras e podiam beber vinho.

FIGURA 8 – VESTIDO (PLEPOS) DE MULHER GRÉCIA (500 A.C.)

FONTE: <https://bit.ly/3tJ8GfX>. Acesso em: 26 jun. 2020.

131
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

As mulheres tinham que casar virgens, com o casamento sendo, geralmente,


organizado pelo pai, que escolhia o marido e recebia um dote. Se uma mulher não
tinha pai, seus interesses (perspectivas de casamento e administração de proprieda-
des) eram atendidos por um guardião (kurios), como um tio ou outro parente do sexo
masculino. As mulheres casavam-se, em média, com 13 ou 14 anos e o amor (eros)
não era levado em consideração na relação marido e mulher, mas, é claro, poderia até
surgir, sendo o melhor que se poderia esperar era philia, um sentimento de amizade.

Os casamentos podem terminar por três motivos. O primeiro e mais co-


mum era o repúdio pelo marido (apopempsia ou ekpempsis). Nenhuma justificativa
era necessária, apenas a devolução do dote. A segunda causa seria se a mulher dei-
xasse a casa do marido (apoleipsis). Nesse caso, o novo tutor da mulher era obrigado
a atuar como seu representante legal. No entanto, era uma ocorrência rara, pois a
reputação da mulher ficava seriamente prejudicada. O terceiro motivo era quando
o pai da noiva pedia a volta da filha (afirese), provavelmente para oferecê-la a outro
homem por um dote mais atraente, o que só era possível se a esposa não tivesse
tido filhos. Se uma mulher era deixada viúva, ela era obrigada a se casar com um
parente masculino próximo, para garantir que os bens permanecessem na família.

As mulheres, é claro, também estavam presentes em outros estratos sociais


de não cidadãos. O grupo que se tem mais informações são as prostitutas, que, por
sua vez, estavam divididas em duas categorias. A primeira, e talvez mais comum, era
a prostituta de bordel. A segunda era a prostituta de luxo (hetaira), que eram mulhe-
res de educação refinada, e não raro, mantinham relacionamentos duradouros com
homens casados. As hetairas também entretinham homens nos célebres simpósios (a
segunda parte de um banquete ou festim, durante os quais os convidados bebiam,
conversavam, ouviam música e se entregavam a outros divertimentos).

FIGURA – 9 CORTESÃ TOCANDO FLAUTA DURANTE UM BANQUETE (490 A.C.)

FONTE: <https://tinyurl.com/y88ptlsy>. Acesso em: 17 dez. 2020.

132
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

2.4.2 Crianças e adolescentes


Filhos de cidadãos frequentavam escolas em que o currículo abrangia lei-
tura, escrita e matemática. Após dominar essas disciplinas básicas, os estudos se
voltavam para literatura (por exemplo, Homero), poesia e música (especialmente
a lira). O atletismo também foi um elemento essencial na educação dos jovens.
Em Esparta, meninos de sete anos de idade eram agrupados, sob a supervisão de
um jovem mais velho, para iniciarem um treinamento físico intenso. Em Atenas,
jovens adultos (de 18 a 20 anos) prestavam serviço civil e militar e a educação
continuava com lições de política, retórica e cultura. As meninas também eram
educadas de maneira semelhante aos meninos, mas com maior ênfase em dança,
ginástica e realização musical, que eram apresentadas em competições musicais,
festivais e cerimônias religiosas. O objetivo final da educação de uma menina era
prepará-la para seu papel na criação de uma família.

FIGURA 10 – GAROTO E SEU IOIÔ (SÉCULO V A.C.)

FONTE: <https://bit.ly/3eNqCBV>. Acesso em: 22 jul. 2020.

2.4.3 Servos
A sociedade grega possuía um número maior de servos que escravos. Os
servos eram totalmente dependentes do dono da terra e o exemplo mais conhe-
cido eram os helots de Esparta, que não eram propriedade de um cidadão, em
particular, e não podiam ser vendidos como escravos. Geralmente, faziam acor-
dos com o dono da terra, como dar uma quantidade de seus produtos e guardar
o restante para si, como no sistema de colonato. Apesar de contar com a proteção
dos proprietários de terras, os helots nunca estavam realmente seguros, pois não
desfrutavam de um status legal sólido e eram duramente tratados. Em certos pe-
ríodos, como a guerra, eram obrigados a lutar. Caso se saíssem bem, podiam se
juntar aos grupos sociais intermediários que existiam abaixo do nível de cidadão,
em uma relação de dependência um pouco melhor.

133
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

2.4.4 Escravos
Na sociedade grega, os escravos eram adquiridos por meio de guerras, se-
questros e tráfico de cativos. Havia até argumentos intelectuais de filósofos como
Aristóteles, que afirmavam que os escravos eram inferiores e, portanto, a escravi-
dão era entendida como algo natural na percepção dos gregos antigos. É impos-
sível dizer, com precisão, o número e o percentual de escravos (douloi) entre os
gregos. Contudo, é improvável que, devido aos custos, todos pudessem obtê-los.
As estimativas da população escrava no mundo grego variam entre 15 e 40% da
população do total. No entanto, se nem todos os cidadãos tinham escravos, eles
certamente os desejavam, pois ser proprietário de escravos era considerada uma
questão de status. Os escravos não eram de propriedade apenas de particulares,
mas também do Estado, que os usava em obras e até como força policial.

A relação entre escravos e proprietários parece ter sido semelhante a ou-


tras sociedades escravistas e envolvia uma mistura de desprezo, desconfiança e
abuso, por parte dos proprietários, e roubo e sabotagem, por parte dos escravi-
zados. As fontes que informam sobre a situação dos escravos refletem o ponto de
vista dos proprietários, mas há referências, na literatura, e, particularmente na
comédia grega, da amizade e da lealdade, em pelo menos alguns relacionamen-
tos, entre proprietários e escravos. Embora o açoitamento dos escravos seja co-
mumente representado nas peças gregas, também é possível encontrar menções
sobre o tratamento mais humano.

Os escravos trabalhavam em todas as esferas e mais de duzentas ocupa-


ções foram identificadas na Grécia Antiga: em trabalho doméstico, agricultura,
oficinas de artesanato, minas, transporte, comércio, entretenimento, forças arma-
das e como remadores em navios, entre tantas outras ocupações. Para alguns es-
cravos, pelo menos, havia a possibilidade de alcançar a liberdade, como os que
eram alugados para trabalhar para terceiros e conseguiam economizar o suficien-
te para comprar a própria liberdade ou os que estavam no exército e conseguiam
se libertar por algum feito excepcional.

FIGURA 11 – ESCRAVOS TRABALHANDO NAS MINAS DE PRATA (SÉCULO V A.C.)

FONTE: <https://tinyurl.com/y6pt3s2b>. Acesso em: 29 jul. 2020.

134
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

E
IMPORTANT

Escravidão na Grécia Antiga

Enquanto a prática da escravidão é encarada com abominação na sociedade moderna, isso


não era como pensavam os gregos antigos. A escravidão era aceita como norma social e
justificada em vários níveis. Até Aristóteles, o grande defensor da democracia e da liberdade
política, acreditava que o objetivo de um homem civilizado era alcançar uma vida de lazer para
que fosse livre para buscar as coisas mais elevadas da vida. Como era alcançada essa vida de
lazer? Com escravos, é claro. Aristóteles também acreditava que as leis da natureza ditavam
que homens livres deveriam governar e dominar escravos e mulheres. Não há números con-
fiáveis, mas estima-se que, em Atenas, nos séculos VI e V a.C., a população escrava chegava a
80.000 indivíduos com famílias mantendo, em média, três ou quatro escravos, exceto famílias
pobres. A população de escravos variava, de forma significativa, em diferentes regiões da Gré-
cia. Estimativas contemporâneas sugerem que na Ática (Atenas e arredores), entre 450 a 320
a.C., havia cerca de 100.000 escravos. A população total da região seria de cerca de 250.000,
o que daria uma proporção de escravos/livres de cerca de 2:5. Outras estimativas mais gerais
afirmam que entre 15 e 40% da população da Grécia Antiga era composta por escravos, em
várias regiões e momentos diferentes. Os escravos estavam presentes durante a civilização
micênica (1600-1100 a.C.), como indicado em numerosas tábuas desenterradas em Pylos.
Havia dois tipos principais: “escravos” e “escravos do deus” (provavelmente, o deus Poseidon).
Os “escravos do deus” eram autorizados a possuir sua própria terra e seu status legal era próxi-
mo ao de um homem-livre. Os escravos, inclusive, são mencionados nos épicos de Homero.
Na Ilíada, eles são, principalmente, mulheres tomadas como espólio de guerra, enquanto os
homens eram resgatados ou mortos no campo de batalha.
Na Odisseia, os escravos também parecem ser, na maioria, servas e, às vezes, concubinas. Um
livro excelente sobre escravidão no mundo antigo é Escravidão antiga e ideologia moderna,
de Moses Finley, que faz uma conexão entre uma postura política moderna e a História Antiga.
Finley foi um dos primeiros a olhar a escravidão no Mundo Antigo como algo, inquestionavel-
mente, negativo. Até então, a escravidão, em estudos sobre a Grécia Antiga, era apenas um
detalhe constrangedor, uma mancha na paisagem idílica da Hélade. Afinal, as realizações da ci-
vilização gregas eram espantosas e, mesmo que a escravidão fosse um “pouco” problemática,
não era algo considerado importante por ser como qualquer outra relação entre dominadores
e subalternos. Entretanto, Finley, ao contrário da maioria, afirmava que era preciso assumir
uma postura moral e ética diante da exploração e da injustiça em qualquer época e lugar.

FONTE: <https://bit.ly/3eL4Bnd>. Acesso em: 26 jul. 2020.

2.4.5 Estrangeiros
Além dos escravos, a maioria das cidades gregas abrigava muitos estran-
geiros livres (xenoi), os quais trabalhavam com cerâmica e metalurgia. Eles ge-
ralmente tinham que registrar sua residência e, assim, tornavam-se uma classe
reconhecida (com status inferior ao dos cidadãos plenos), chamada de “metecos”
(metoikoi). Em troca dos benefícios desse status, precisavam encontrar um patro-
no local, pagar impostos e, às vezes, pagar impostos adicionais, contribuir com
os custos de pequenos festivais e, até mesmo, participar de campanhas militares,
quando necessário. Apesar das suspeitas e dos preconceitos contra os “bárbaros”
estrangeiros, que, muitas vezes, surgem em fontes literárias, em alguns casos, os
135
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

metoikoi conseguiram se tornar cidadãos plenos, após uma demonstração ade-


quada de lealdade e contribuição para o bem do estado anfitrião. Eles, então,
receberam status fiscal igual e o direito de possuir propriedades e terrenos. Seus
filhos também podiam se tornar cidadãos. No entanto, algumas cidades, prin-
cipalmente Esparta, desencorajavam a imigração ou até expulsavam os xenoi. A
relação entre estrangeiros e cidadãos locais parece ter sido tensa, principalmente
em tempos de guerra e dificuldades econômicas.

NOTA

Xénos significa “estranho” ou “estrangeiro”, romanizado, e phóbos é o medo


ou o ódio daquilo que é percebido como estranho ou estranho. De acordo com a defi-
nição utilizada pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR),
xenofobia é: “Atitudes, preconceitos e comportamentos que rejeitam, excluem e frequen-
temente difamam pessoas, com base na percepção de que eles são estranhos ou estran-
geiros à comunidade, sociedade ou identidade nacional”.

FONTE: <https://www.politize.com.br/xenofobia-o-que-e/>. Acesso em: 27 jul. 2020.

2.5 COLONIZAÇÃO GREGA


Na primeira metade do primeiro milênio a.C. (1000 a 500 a.C.), as cidades-
-estados gregas, cuja maioria era considerada potência marítima, começaram a
procurar terras e recursos além da Grécia continental, fundando, assim, colônias
espalhadas pelos mares Mediterrâneo e Negro. Os contatos comerciais eram, ge-
ralmente, os primeiros passos no processo de colonização e, em seguida, as popu-
lações locais eram subjugadas e a colônia era estabelecida. Os laços das colônias
com as cidades-estados na Grécia variavam, sedo que a maioria se tornou inde-
pendente e, culturalmente, era uma síntese do mundo grego com os povos locais.

Como consequência da colonização, a circulação de mercadorias, pesso-


as e cultura disseminou o modo de vida grego em regiões das atuais Espanha,
França, Itália, assim como nas regiões costeiras do Mar Adriático, Mar Negro e
norte da África. No total, os gregos estabeleceram cerca de quinhentas colônias
nas quais habitavam cerca de 60 mil gregos. Por volta de 500 a.C., esse número
representava 40% de todos os gregos do mundo helênico.

136
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

2.5.1 Comércio e colonização


Os gregos eram grandes navegadores e, viajando pelo Mediterrâneo, procu-
ravam novas terras e novas oportunidades. Até a mitologia grega incluía histórias de
exploração, como Jasão e sua busca pelo “Tosão de Ouro” e pelo maior dos heróis
viajantes: Odisseu. Inicialmente, as ilhas ao redor da Grécia foram colonizadas, mas
depois os exploradores gregos começaram a ir mais longe. Os primeiros colonos, em
geral, eram comerciantes e pequenos grupos de indivíduos que procuravam aprovei-
tar oportunidades de começar uma nova vida longe das cidades gregas mais compe-
titivas e densamente habitadas. Os postos comerciais e empórios foram os precurso-
res das colônias propriamente ditas. Então, de meados do século VIII até o século VI
a.C., as atividades comerciais se transformam em uma empreitada de colonização.

Em algumas áreas do Mediterrâneo, surgiram polis (cidades) habitadas por


gregos, enquanto, em outras áreas, havia apenas postos comerciais compostos por
residentes temporários, como comerciantes e marinheiros. O próprio termo “colo-
nização” infere a dominação dos povos indígenas e um sentimento de superiorida-
de cultural dos colonizadores, em um processo dirigido por um Estado ou governo.
Entretanto, esse não era necessariamente o caso no mundo grego antigo e, portanto,
nesse sentido, a colonização grega era um processo muito diferente, por exemplo,
das políticas de certas potências europeias nos séculos XIX e XX. Talvez esse pro-
cesso seja, então, melhor descrito como “contato cultural” (BOYS-STONES, 2012).

FIGURA 12 – COLONIZAÇÃO GREGA (DESTAQUES EM VERMELHO) E FENÍCIA (DESTAQUES EM


AMARELO) NO SÉCULO VI A.C.

FONTE: <https://tinyurl.com/y2nk35mt>. Acesso em: 22 jul. 2020.

137
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

O estabelecimento de colônias no Mediterrâneo permitiu a exportação de


bens de luxo, como cerâmica, vinho, azeite, metalurgia e têxteis e a importação de
madeira, metais, grãos, peixes secos, couro e escravos. Uma cidade-estado podia
criar uma colônia para estabelecer presença militar em uma região específica e,
assim, proteger rotas marítimas lucrativas. Além disso, as colônias podiam forne-
cer uma ponte vital para as oportunidades de comércio interno, sendo que algu-
mas até conseguiram rivalizar com as cidades fundadoras. Siracusa, por exemplo,
acabou se tornando a maior polis de todo o mundo grego. Também é importante
notar que os gregos não eram os únicos que buscavam ampliar sua esfera de in-
fluência; povos rivais, como os etruscos e os fenícios, também fundavam colônias,
o que, inevitavelmente, provocava conflitos armados entre os rivais.

2.5.2 Magna Grécia


Os gregos foram atraídos por terras férteis, recursos naturais e bons portos
de um “novo mundo”, além de suas cidades-estados e regiões circunvizinhas,
na Península Itálica (continental e insular). Os colonos gregos dominaram
a população local nessas áreas, passando a chamá-las de “Grande Grécia” ou
Megále Hellás (Magna Grécia). Algumas das colônias gregas mais importantes na
Península Itálica (continental) foram:

• Cumas (740 a.C.).


• Naxos (734 a.C.).
• Sybaris (720 a.C.).
• Crotone (710 a.C.).
• Taranto (706 a.C.).
• Régio da Calábria (720 a. C).
• Eleia (540 a.C.).
• Turre (443 a.C.).
• Heracleia (433 a.C.).

Na Sicília, região insular separada do resto da Península, as principais


colônias foram:

• Siracusa (733 a.C.).


• Gela (688 a.C.).
• Selinoso (630 a.C.).
• Hímera (630 a.C.).
• Akragas (580 a.C.).

A localização geográfica das novas colônias, no centro do Mediterrâneo,


propiciava, aos gregos, condições de prosperar como centros comerciais e desfru-
tar de uma posição privilegiada na encruzilhada das principais culturas da épo-
ca: as civilizações grega, etrusca e fenícia. As colônias disseminaram a influência
grega ainda mais distante, como no norte da África. Na costa mediterrânea do

138
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

continente africano, os lacedemônios (espartanos), vindos da ilha de Thera, fun-


daram, em 630 a.C., a colônia de Cirene, na costa da atual Líbia, o que evidencia
a expansão grega para muito além da Magna Grécia.

A partir do século III a.C., os gregos fundaram assentamentos ao longo


da costa da Iônia (Ásia Menor, atual Turquia). Colônias importantes incluíam
Mileto, Éfeso, Esmirna e Halicarnasso. A área tornou-se foco de florescimento
cultural, especialmente, em Ciências, Matemática e Filosofia, produzindo algu-
mas das mentes mais brilhantes da Grécia Antiga. Simultaneamente, arte e estilos
arquitetônicos, assimilados do Oriente, começaram a influenciar os gregos, como
capitéis de colunas, esfinges e desenhos expressivos de cerâmica, que inspiram
arquitetos e artistas gregos a explorarem novas empreitadas artísticas.

2.5.3 Colônias gregas nas regiões correspondentes


atualmente à França e à Espanha
Foceia foi a principal polis, fundada no sul da atual França, por volta de
600 a.C., em conjunto com as colônias de Alalia e Massalia (Marselha). A cidade
de Foceia, por sua vez, fundou outras colônias e redes comerciais, no sul da atual
Espanha, em Emporion (Ampúrias) e Rhode (Rosas). As colônias, na atual Espa-
nha, eram menos gregas em cultura do que outras áreas do Mediterrâneo, pois
a competição econômica e cultural com os fenícios era acirrada e aquelas regiões
eram consideradas terras remotas para os gregos da Hélade.

2.5.4 Colônias gregas no Ponto Euxino (Mar Negro)


O Mar Negro (Ponto Euxino, para os gregos) foi a última fronteira da ex-
pansão colonial grega, sendo a região onde as colônias jônicas exploravam os ri-
cos pesqueiros e as terras férteis ao redor do Helesponto (Estreito de Dardanelos).
Eventualmente, as colônias gregas se espalharam por toda a costa do Mar Negro.
No final do século VI a.C., essas colônias pagavam tributo ao Império Persa em
troca de proteção, mas, após a invasão fracassada de Xerxes na Grécia (480-479
a.C.), os persas se retiraram, o que permitiu que as colônias gregas expandissem
sua esfera de influência naquelas regiões.

2.5.5 A relação das colônias com a “pátria” grega


A maioria das colônias foi criada com base no modelo político da polis gre-
ga e, portanto, seus tipos de governo eram os mesmos vigentes em toda a Grécia:
oligarquia, tirania e até democracia. Entretanto, também podiam ser diferentes
do sistema político das matrizes gregas. Consequentemente, criou-se uma forte
identidade cultural pela adoção de mitos fundadores e de características do coti-
diano grego, como idioma, culinária, educação, religião, esporte, teatro (com suas
tragédias e peças de comédia), arte, arquitetura, filosofia e ciência. O comércio

139
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

também contribuiu, sobremaneira, para a adoção e a consolidação de um modo


de vida “grego”. Dessa maneira, produtos como vinho, azeitonas, madeira e ce-
râmica foram comercializados entre as cidades e artistas e arquitetos gregos, que
emigraram e ajudaram a reproduzir em colônias, templos, esculturas e cerâmicas
gregos por todo o Mediterrâneo e além.

No entanto, apesar da onipresente influência grega, as colônias estabele-


ceram suas próprias identidades regionais que incluíam os costumes dos povos
locais. Além disso, as mudanças, que facilitavam a possibilidade de se tornar ci-
dadão, e o reassentamento forçado de outros povos tornavam as colônias cultu-
ralmente diversificadas e politicamente instáveis. Não obstante, em alguns casos,
as colônias chegaram a superar suas cidades-matrizes na Grécia.

As colônias gregas, apesar de independentes, participavam ativamente


dos eventos no mundo grego. Esse relacionamento manifestava-se no suprimento
de soldados, navios e dinheiro, em caso de guerra, como ocorreu contra os persas
ou na Guerra do Peloponeso. Outras formas de relacionamento mais pacíficas
incluíam o envio de atletas para os grandes jogos esportivos e a ajuda às colônias,
em tempos difíceis, que recorriam as suas respectivas polis fundadoras. Portanto,
a influência da cultura grega em suas colônias, a despeito das diferenças de inten-
sidade em cada caso, foi suficiente para imprimir um caráter “grego” duradouro,
que ainda sobrevive nas regiões do entorno do Mar Mediterrâneo.

2.6 RELIGIÃO DA GRÉCIA ANTIGA


No mundo grego, na Antiguidade, a religião era pessoal, direta e presente em
todas as esferas do cotidiano, pública e privada, com rituais formais que incluíam sacri-
fícios de animais e mitos para explicar as origens da humanidade e para dar aos deuses
um rosto humano. Dessa maneira, a religião estava presente na vida dos gregos anti-
gos nos templos, que dominavam a paisagem urbana, nos festivais e nas competições
esportivas e artísticas. Não obstante o grau de crença religiosa variasse de indivíduo
para indivíduo, certos conceitos eram enraizados o suficiente para que o estado e a
sociedade se fundamentassem nos pressupostos de que os deuses existiam, podiam
influenciar a humanidade e respondiam aos atos de piedade e adoração.

E
IMPORTANT

Os gregos praticavam três tipos de culto: o público, o cívico e o privado.

• O culto privado ou doméstico caracterizava-se por ser um culto em honra dos deuses
protetores do lar. Era celebrado em casa, em família, junto a um pequeno altar e pre-
sidido pelo chefe de família com preces, oferendas de vinho, frutos e mel. Para honrar
os mortos, essa celebração era realizada nos cemitérios.

140
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

• O culto cívico era celebrado em público, nos templos e altares ou em festivais, sendo
presidido por sacerdotes e magistrados. Era dedicado aos deuses protetores das cida-
des. Eram realizadas orações, sacrifícios, procissões, banquetes e competições teatrais.
• O culto público ou pan-helênico era realizado em santuários e aberto a todos os ha-
bitantes da Grécia Antiga. Com destaque para o culto que honrava a Zeus, realizado
em Olímpia, a cada quatro anos, em festas religiosas e desportivas, como os Jogos
Olímpicos. Havia também o Oráculo de Delfos, realizado no Santuário de Apolo, de
caráter divinatório por intermédio da sacerdotisa Pitonisa.

FONTE: <https://tinyurl.com/yb35ajhn>. Acesso em: 18 dez. 2020.

2.6.1 Os deuses do Olimpo


A religião politeísta grega englobava uma infinidade de deuses, cada um
representando uma certa faceta da condição humana e até ideias abstratas, como
justiça e sabedoria, com sua própria personificação. Os mais importantes, porém,
foram os deuses olímpicos liderados por Zeus.

DICAS

Deuses olímpicos
• Zeus: rei dos deuses e governante do monte Olimpo, deus do céu, do relâmpago, do
trovão e das tempestades, comandante dos ventos e das nuvens, deus da lei, da ordem
e da justiça. O filho mais novo dos titãs Cronos e Reia. Símbolos: raio, águia e carvalho.
• Hera: rainha dos deuses. Deusa do casamento, maternidade e das mulheres. Símbo-
los: cuco, pavão, vaca e romã. Filha de Cronos e Reia. Esposa e irmã de Zeus.
• Posidão: Deus dos mares, dos terramotos e dos cavalos. Símbolos: hipocampo, golfi-
nho e tridente. Filho de Cronos e Reia. Irmão de Zeus e Hades.
• Deméter: Deusa da agricultura, da natureza e das estações do ano. Símbolos: papoula
e cereais. Filha de Cronos e Reia, irmã de Zeus.
• Hades: Deus dos mortos, dos infernos e das riquezas da Terra. Símbolos: Elmo da es-
curidão, um bidente, um crânio e monstro de três cabeças. Filho do titã Cronos e de
Reia. Irmão de Zeus e Posidão.
• Héstia: deusa virgem do lar e da lareira. Símbolo: lareira. Filha de Cronos e Reia, e irmã de Zeus.
• Afrodite: deusa do amor, da beleza e da sexualidade. Filha de Urano e Tálassa. Símbo-
los: a pomba e o espelho.
• Apolo: deus do Sol, da cura, da peste, das artes, profecia e do tiro com arco. Símbolos
incluem a lira e o arco. Ártemis é sua irmã gémea. Filho de Zeus e de Leto.
• Ares: deus da guerra. Símbolos incluem o javali e a lança. Filho de Zeus e Hera.
• Ártemis: deusa virgem da caça, florestas, vida selvagem, lua e protetora das meninas.
Símbolos incluem o veado e o arco. Irmã gémea de Apolo, filha de Zeus e de Leto.
• Atena: deusa virgem da sabedoria, ofícios e estratégia militar. Símbolos são a oliveira e
o mocho. Filha de Zeus, de acordo com algumas tradições, com Métis.
• Dioniso: deus do vinho, das festas e do êxtase. O seu símbolo é a pantera e a videira.
Filho de Zeus e da mortal Sémele.

141
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

• Hefesto: ferreiro dos deuses; deus do fogo e da metalurgia. Filho de Zeus e Hera ou,
de acordo com algumas tradições, apenas de Hera.
• Hermes: mensageiro dos deuses; deus do comércio e dos ladrões. Símbolos incluem
o caduceu e as botas com asas. Filho de Zeus e da ninfa Maia.

Os gregos acreditavam que os deuses olímpicos residiam no Monte Olimpo


e eram venerados em todo mundo grego, com algumas variações locais, atributos e
associações particulares. Na literatura e na arte gregas, os deuses recebiam corpos e
personalidades humanas, boas e ruins, e, assim como homens e mulheres comuns,
casavam-se, tinham filhos (geralmente através de relações ilícitas), brigavam e, nas
histórias da mitologia grega, interviam diretamente nos assuntos humanos. Essas
tradições eram recontadas oralmente, pois não havia texto sagrado na religião gre-
ga, embora tenham sido feitas tentativas de escrever a tradição oral, principalmente
por Hesíodo, em sua teogonia, e, mais indiretamente, nas obras de Homero.

2.6.2 Templos, rituais e sacerdotes


Os deuses tornaram-se patronos das cidades, como Afrodite para Corinto,
Hélios para Rodes, e Atena para Atenas. Esses deuses eram invocados para ajudar em
várias situações específicas, como Ares (deus da guerra) durante as batalhas e Hera
(deusa das bodas) para casamentos. Alguns deuses gregos foram importados de ou-
tras culturas, como Adônis, da mitologia fenícia, e incorporados ao panteão grego,
enquanto rios e nascentes podiam assumir uma forma personificada, como as ninfas.

Em ocasiões especiais, a religião tornava-se mais formal, com cultos reali-


zados nos “templos” (nao = cela ou nau), espalhados por todo mundo grego, cujas
cerimônias eram realizadas por sacerdotes e seus assistentes.

FIGURA 13 – TEMPLO DE HEFESTO, EM ATENAS (449 A.C.)

FONTE: <https://tinyurl.com/y4rgwsxt>. Acesso em: 29 jul. 2020.


142
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

A princípio, os locais sagrados eram constituídos apenas por um altar


simples, construído em uma área específica; com o passar do tempo, foram cons-
truídos templos, de dimensões maiores, em homenagem a um deus em particular
que, geralmente, abrigava uma estátua para o culto da divindade. As estátuas
mais famosas foram a de Atena, no Partenon, e a de Zeus, em Olympia.

Com o tempo, todo um complexo de templos para deuses menores surgiu


em torno do templo principal, criando um grande complexo sagrado, geralmen-
te construído em uma acrópole que dominava a cidade e a região circundante.
Essa área sagrada (Témenos) era separada do resto da comunidade por um portão
simbólico ou propileno e, de fato, acreditava-se que pertencia à divindade em
questão. Os locais sagrados também recebiam doações de estátuas, fontes e até
edifícios, muitas vezes, para celebrar uma grande vitória militar e agradecer aos
deuses. Santuários maiores também tinham cuidadores permanentes (neokoroi),
responsáveis pela manutenção do local.

FIGURA 14 – TEMPLO DE HEFESTO, EM ATENAS (449 A.C.)

FONTE: <https://tinyurl.com/y7o96x37>. Acesso em: 18 dez. 2020.

Em geral, os animais sacrificados eram porcos, ovelhas, cabras ou vacas


sempre do mesmo sexo que o deus honrado. No entanto, o templo em si não era
usado para as práticas religiosas, realizadas em um altar designado fora do templo.

Curiosamente, a descrição dos detalhes das cerimonias e ritos religiosos


era uma prática evitada pelos gregos, pois se acreditava que eram sagrados de-
mais para serem divulgados por escrito. Contudo, sabemos que as práticas reli-
giosas mais comuns eram o sacrifício e a libação de sangue, que acompanhavam
as orações em homenagem a uma divindade. A carne dos animais era, então, pre-
parada, sendo uma parte oferecida ao deus e o restante consumido pelos devotos.
O abate do animal era realizado por um açougueiro ou cozinheira (megeiras), en-
quanto uma jovem espalhava sementes sobre a cabeça do animal, simbolicamen-
te, representando a vida e a regeneração no momento da morte do animal. Outros
rituais incluíam examinar as entranhas de animais sacrificados, para determinar
sinais que poderiam ajudar a prever eventos futuros.
143
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 15 – ESCULTURA NO PARTHENON (438-432 A.C.) DE TRÊS JOVENS SACRIFICANDO


UMA VACA

FONTE: <https://tinyurl.com/yyzxc69q>. Acesso em: 23 jul. 2020.

Os sacerdotes dirigiam as cerimônias religiosas fazendo orações e serviam a


um deus específico, mas não eram, necessariamente, especialistas em religião. Para
questões específicas sobre religião, o devoto poderia consultar um exegeta, que era
um funcionário do Estado com conhecimento sobre assuntos religiosos. No que se
refere ao sacerdócio, as mulheres também podiam ser tornar sacerdotisas, o que, de
certa maneira, era um papel de destaque na esfera pública da Grécia antiga – um
contraste com relação à ausência de mulheres em outros papéis públicos na socieda-
de grega. Geralmente, mas nem sempre, o sacerdote era do mesmo sexo que o deus
que representava. No entanto, as sacerdotisas estavam sujeitas a restrições adicionais,
como a exigência de serem virgens ou a idade-limite da menopausa para o desem-
penho das funções sacerdotais. Os devotos, por outro lado, podiam ser de ambos os
sexos e os rituais, com restrições, podiam excluir homens ou mulheres.

2.6.3 Mistérios e oráculos


Além das cerimônias religiosas formais e públicas, havia também muitos
ritos conhecidos apenas pelos iniciados, incluindo o mais famoso conhecido como
os Mistérios de Elêusis. Nesses grupos fechados, os membros acreditavam que
certas atividades proporcionavam benefícios espirituais, como uma vida após a
morte. Os lugares também poderiam adquirir uma conexão divina; os grandes
oráculos, como o de Apolo em Delfos e de Zeus em Dodona, podem ter começado
como lugares particularmente favoráveis para receber sinais dos deuses. Esses
oráculos foram centros importantes, e seus oráculos-sacerdotes eram consultados
por indivíduos e governantes para que as proclamações, vagas e ambíguas, aju-
dassem a orientar sua conduta futura.

144
TÓPICO 1 — CIVILIZAÇÃO GREGA: UMA INTRODUÇÃO

2.6.4 Festivais e jogos


Jogos atléticos e competições de música (especialmente tocando citara e
lira) e teatro (tragédia e comédia) eram realizados durante festivais como a Dioní-
sia em Atenas e os Jogos Pan-Helênicos nos locais sagrados mais importantes de
Olímpia, Delfos, Nemeia e Isthmia. Esses eventos contavam com a participação
de visitantes de toda a Grécia, e a experiência, talvez, era mais no sentido de uma
peregrinação do que um encontro esportivo. Confirmando seu status sagrado, a
guerra foi proibida durante esses eventos e os peregrinos tinham passagem livre
garantida. No entanto, houve também festivais muito menores, com número li-
mitado de pessoas, como a Arrhephoria em Atenas, onde apenas sacerdotisas e,
no máximo, quatro jovens participaram.

2.6.5 Religião pessoal


Embora as fontes históricas revelem muito sobre ocasiões e cerimônias
religiosas formais, deve-se lembrar que a religião grega era, de fato, praticada
em qualquer lugar, a qualquer momento, de maneira muito pessoal. Não apenas
os templos, mas também as casas podiam ser consideradas espaços sagrados. Os
indivíduos também podiam visitar um templo quando quisessem e era costume
fazer uma oração mesmo quando na rua. As pessoas deixavam ofertas, como in-
censo, flores e comida, sem dúvida com uma oração esperançosa ou em gratidão
por uma ação passada. Os indivíduos também poderiam organizar seu próprio
sacrifício privado, se tivessem os meios para fazê-lo – sendo exemplos os milha-
res de marcadores de pedra encontrados em locais sagrados. Além disso, os tem-
plos eram frequentemente visitados para buscar a cura, especialmente nos locais
associados a Esculápio, o deus da Medicina, em Epidauro.

Os gregos também procuravam sinais dos deuses na vida cotidiana e os


interpretavam como indicadores de eventos futuros – como pássaros no céu ou
uma palavra dita em um determinado momento ou até um simples espirro po-
diam ser interpretados como presságio auspicioso ou mau presságio. Essas cren-
ças e, de fato, certos aspectos da religião, como a imoralidade dos deuses retra-
tados nas artes, foram criticados por intelectuais, artistas e filósofos do século V
a.C., mas não se pode afirmar que essas críticas refletiam a visão popular, pois,
através dos registros arqueológicos e escritos, ficou demonstrado que a religião
era um aspecto fundamental da vida dos gregos antigos.

145
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A Grécia Antiga é considerada o berço da civilização ocidental.

• A Grécia Antiga era conhecida por Hélade e os gregos eram os helenos.

• A geografia na Grécia Antiga foi importante para que os gregos se tornassem


um povo de navegadores.

• A civilização minoica foi a precursora da civilização grega.

• A “Era de Ouro” dos gregos teve início com Péricles construindo a Acrópole.

• A Guerra do Peloponeso, entre Atenas e Esparta, enfraqueceu as cidades gregas.

• O enfraquecimento das cidades gregas e a ascensão da Macedônia resultou na


conquista de Alexandre, o Grande, com o início de seu império estendendo-se
até a Índia.

• A sociedade grega era bem estratificada socialmente com papéis de cada gru-
po bem definidos.

• Os gregos fundaram colônias por todo o Mediterrâneo e o Mar Negro.

• Os gregos inovaram em todas as áreas da atividade humana.

• A religião era um componente fundamental no cotidiano dos gregos antigos.

146
AUTOATIVIDADE

1 O nome “Grécia” foi criado pelos romanos a partir de sua forma latiniza-
da. É comum, através da História, que povos venham a ser chamados por
denominações dadas por outros povos. No entanto, os antigos “gregos” se
autodenominavam por outro termo. Considerando a autodenominação dos
antigos gregos, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Trácios.
b) ( ) Helenos.
c) ( ) Etruscos.
d) ( ) Micênicos.

2 Os gregos antigos foram exímios navegadores, principalmente no Mar Me-


diterrâneo. Outros povos no Mediterrâneo, como os fenícios, também se
tornaram grandes navegadores por razões semelhantes aos gregos. Como
consequência da necessidade de navegar por águas desconhecidas, os gre-
gos investiram, particularmente, em conhecimento que pudesse ser utiliza-
do para facilitar suas empreitadas marítimas. Analise as sentenças a seguir:

I- Os gregos se tornaram navegadores com objetivos apenas de expansão


militar, tendo em vista a abundância e a fertilidade de suas terras.
II- Os gregos foram impelidos para o mar pela escassez e pobreza de suas terras.
III- Os gregos se lançaram a navegação em busca de recursos naturais em
bons portos.
IV- Os gregos investiram na expansão marítima pelo desejo de divulgar e con-
verter povos a sua religião.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e IV estão corretas.


b) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas.
c) ( ) As sentenças III e IV estão corretas.
d) ( ) As sentenças II e III estão corretas.

3 Atenas e Esparta eram cidades-estados com características semelhantes,


mas também diferiam em muitos aspectos. Ambas se tornaram poderosas
na Grécia Antiga e se transformaram em rivais, rivalidade que as levou a
um conflito inevitável. No que se refere à relação entre Atenas e Esparta,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) A rivalidade entre Atenas e Esparta chegou ao ápice com a Guerra de Troia.


( ) A rivalidade entre Atenas e Esparta foi motivada pela filosofia militarista
presente em ambas.
( ) A influência de filósofos, como Sócrates, Platão e Aristóteles foi funda-
mental na formação do ideal militarista espartano.
147
( ) Em Atenas, o Período Clássico, ou a chamada “Era de Ouro” de Atenas,
com o surgimento da “democracia” para os cidadãos, foi fundamental
para forjar o caráter dos atenienses.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) F – F – V – V.
b) ( ) V – V – V – F.
c) ( ) F – F – F – V.
d) ( ) V – F – F – F.

148
TÓPICO 2 —
UNIDADE 3

INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

1 INTRODUÇÃO

A civilização romana começa com uma pequena cidade chamada “Roma”


fundada às margens do rio Tibre, na região do Lácio, Península Itálica. As tribos
latinas já habitavam a região em 1000 a.C., mas a fundação da cidade é datada de
753 a.C. Os latinos eram uma sociedade patrilinear (descendência pela linhagem
do paterna) que, entre muitas outras divindades, adorava um deus supremo Deus
Pater (“Pai Deus”), mais conhecido como Júpiter, que era associado a cavalos,
trovões, relâmpagos, tempestades e fogo. A divindade masculina como chefe do
panteão refletia o valor da masculinidade na cultura latina.

A sociedade romana, na sua origem, era patriarcal, característica que iria per-
manecer ao longo da história da República (590-27 a.C.) e do Império (entre 27 a.C.
e 476 d.C. no Ocidente e entre 330-1453 no Oriente). Embora exista uma lenda sobre
uma troiana chamada “Roma” que viajava com o herói Eneias ter fundado Roma, o
mito dos irmãos Rômulo e Remo é o mais conhecido. Essa narrativa envolve o rapto
das mulheres sabinas pelos primeiros romanos. As tribos sabinas decidem, então,
recuperar suas mulheres, mas Hercília, uma das mulheres raptadas, se torna esposa
de Rômulo, convoca as outras mulheres e as convence a permanecer com seus rap-
tores romanos. Pensa-se que essa narrativa represente, de forma mitológica, o papel
vital das mulheres na sociedade romana como elo entre famílias e na manutenção de
relações pacíficas entre facções rivais por meio do casamento (BAUER, 2007).

FIGURA 16 – A LOBA CAPITOLINA, O MITO DA FUNDAÇÃO DE ROMA

FONTE: <https://tinyurl.com/ztakss8>. Acesso em: 15 ago. 2020.

149
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

2 REPÚBLICA ROMANA
No final do século VI a.C., Roma, então uma pequena cidade-estado,
substitui a monarquia pela república e, sob o novo regime, os romanos conquis-
tariam toda a península italiana, grandes partes do mundo mediterrâneo e além.
A República e suas instituições de governo perdurariam por cinco séculos até o
início das guerras civis, quando Roma foi transformada em um regime imperial.
No entanto, boa parte do aparato político, principalmente o Senado, criado no pe-
ríodo republicano, permaneceria no período imperial, apesar do poder reduzido.

2.1 MITO E LENDA


Os anos anteriores à República são perdidos em mitos e lendas. Nenhuma
fonte contemporânea do período sobreviveu. Embora grande parte da história
tenha sido perdida, o historiador romano Tito Lívio (59 a.C.-17 d.C.) ainda con-
seguiu escrever uma notável “História de Roma” (142 volumes), recontando o
tempo da monarquia até a queda da República.

No entanto, ao contrário da narrativa tradicional, a transformação da monar-


quia em República foi um processo sangrento, que levou décadas, ou mesmo, sécu-
los. Antes da derrubada do último rei, Tarquínio, o Soberbo, em 510 a.C., a história da
cidade estava envolvida em histórias de heroísmo e guerras. Dessa maneira, com a
fundação da cidade repleta por lendas, muitos preferiram o mito em vez de fatos. Por
muito tempo, os romanos admiraram a cultura dos gregos e, portanto, abraçaram a
saga de Eneias, escrita pelo escritor romano Virgílio, sobre a fundação de Roma.

Essa história propiciou aos romanos uma conexão com um passado clássico
grego. O conto mítico versa sobre Eneias, e seus discípulos, que, com a assistência da
deusa Vênus, escapa da cidade de Tróia, conquistada pelos gregos. Após uma breve
estada em Cartago, Eneias acaba rumando para o Lácio, cumprindo, assim, seu des-
tino. Seus descendentes eram os gêmeos Rômulo e Remo, filhos ilegítimos de Marte,
o deus da Guerra, e a Princesa Reia Silvia, filha do rei de Alba Longa. Salvo do afoga-
mento por uma loba e criado por um pastor, Romulo finalmente derrotou seu irmão
e fundou a cidade de Roma, tornando-se seu primeiro rei (BAUER, 2007).

Os mitos possuem dinâmica e um potencial constante de renovação, que


podem estar sujeitos a necessidades de explicação de diferentes grupos sociais
diante de fatos e acontecimentos políticos. Portanto, isso explica a variedade dos
mitos fundadores de Roma.

150
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

E
IMPORTANT

A lenda de Rômulo e Remo


Conta a lenda que Ascânio, filho do herói troiano Eneias (filho de Vênus e Anquises), teria
fundado a cidade de Alba Longa sobre a margem direita do rio Tibre. Sobre essa cidade la-
tina reinaram muitos dos seus descendentes até chegar Numitor e seu irmão Amúlio – este
destronou Numitor e, para que não pudesse ter descendência que lhe tirasse do trono,
condenou sua filha, Reia Silvia, a ser sacerdotisa da deusa Vesta, para que permanecesse
virgem. Apesar disso, Marte, o deus da Guerra, engendrou em Reia os gêmeos Rômulo e
Remo. Para salvá-los, quando eles nasceram, foram colocados em uma cesta deixada no rio
Tibre. A cesta encalhou na zona das sete colinas, situada perto da desembocadura do Tibre
no mar. Uma loba, chamada Luperca, aproximou-se do rio para beber água e lhes abrigou e
amamentou em seu refúgio do Monte Palatino até que, finalmente, os bebês foram encon-
trados e resgatados por um pastor, cuja mulher os criou. Já adultos, os gêmeos recoloca-
ram Numitor no trono de Alba Longa e fundaram, como colônia, uma cidade na margem
direita do Tibre, no lugar onde tinham sido amamentados pela loba, para serem os seus Reis.
Dizem que a loba que amamentou Rômulo e Remo foi sua mãe adotiva humana, já que o
termo loba, em latim lupa, também era utilizado, em sentido pejorativo, para as prostitutas
da época. A lenda também conta como Rômulo matou Remo. Perto da desembocadura do
rio Tibre, havia sete colinas: os montes Aventino, Celio, Capitólio, Esquilino, Palatino, Quirinal
e Viminal. Rômulo e Remo discutiram sobre o lugar onde iriam fundar a cidade e decidiram
consultar o voo das aves, da maneira etrusca. Rômulo viu doze urubus voando sobre o
Palatino, enquanto Remo viu apenas seis em outra colina. Então, Rômulo, para delimitar a
nova cidade, traçou um enquadramento com um arado no alto do monte Palatino e jurou
que mataria quem ousasse cruzá-lo. Remo desobedeceu e cruzou a linha com desprezo,
por isso seu irmão o matou e ficou como o único e primeiro Rei de Roma. Esse fato teria
acontecido no ano 754 a.C., segundo a versão da história oficial da Roma antiga.

Origem grega
Segundo outras fontes antigas, a fundação da cidade está relacionada com o mundo gre-
go, já que os fundadores tinham ascendência troiana. Essa lenda apresenta Eneias, prínci-
pe troiano, como antepassado direto de Rômulo e Remo e que, ao se casar com a filha do
rei latino, se tornou rei. Essa interpretação é encontrada não só em historiadores gregos,
como também foi defendida no mundo itálico contra outras tradições que atribuíam uma
origem arcádia, relacionadas com o “Mito de Evandro”, o aqueu, associando-a ao de Odis-
seu e Ulisses. Assim, a historiografia grega atribuiu uma origem divina e grega à fundação
de Roma, versão assumida posteriormente por essa. No entanto, não se pode considerar
admissível a tradição de uma origem troiana de Roma se comparada à data da destruição
de Troia (1200 a.C.) com os restos arqueológicos dos povoados de Lácio e Septimeontium,
semelhantes a outros muitos povoados do Bronze Final da Itália e que não são um povo-
ado importante, muito menos uma cidade.

FONTE: <https://tinyurl.com/ybognv4b>. Acesso em: 16 ago. 2020.

2.2 A REPÚBLICA: O INÍCIO


Após o reinado de Tarquínio, Roma sofreu conflitos externos e internos.
Durante a maior parte do século V a.C., a história de Roma foi uma sucessão de
guerras. Entre 510 e 275 a.C., enquanto o governo lidava com questões políticas
internas, a cidade cresceu e tornou-se o poder dominante em toda a península
151
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

italiana. Após a Batalha de Regalos (496 a.C.), quando Roma derrotou os latinos,
e a Guerra Pírrica (280-275 a.C.), contra Pirro de Épiro, Roma emergiu como uma
potência. A expansão militar ocorreu, simultaneamente, ao surgimento de uma
estrutura social e política na República, que um dia dominaria uma boa parte da
Europa atual, o norte da África e a parte ocidental do Oriente Médio. O Mar Me-
diterrâneo se tornaria um “lago romano” (Mare Nostrum).

NTE
INTERESSA

O termo Mare Nostrum foi, em sua origem, usado pelos romanos para se re-
ferir, durante as Guerras Púnicas com Cartago, ao Mar Tirreno, após a conquista da Sicília,
Sardenha e Córsega. Por volta de 30 a.C., o domínio romano estendeu-se à Península Ibé-
rica e ao Egito, e Mare Nostrum começa a ser usado no contexto de todo o Mar Mediterrâ-
neo. Outros nomes também foram empregados, incluindo Mare Internum (“Mar Interno”),
mas, curiosamente, não o termo moderno Mare Mediterraneum (Mar Mediterrâneo), que
foi uma criação latina tardia, apenas utilizada depois da queda de Roma.

No final do século XIX, o nacionalismo e o imperialismo colonial italia-


nos recriam o conceito como evocação de um passado imperial romano no Mar
Mediterrâneo. Com a chegada do fascismo, na década de 1920, Benito Mussolini
continuou a utilizar o termo na propaganda fascista, como uma versão italiana do
lebensraum (espaço vital) de Adolf Hitler.

Na atualidade, o termo “Mare Nostrum” foi escolhido como tema para a Con-
ferência Inaugural da Sociedade de Direito e Cultura Mediterrânica, realizada em ju-
nho de 2012, na Faculdade de Direito da Universidade de Cagliari, Sardenha, Itália (“La
Conferenza Inaugurale della Società di Diritto e Cultura del Mediterraneo”). No uso contem-
porâneo, o termo pretende contemplar a diversidade das culturas mediterrâneas, com
uma atenção especial ao intercâmbio e à cooperação entre as nações mediterrâneas.

152
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

FIGURA 17 – MARE NOSTRUM (MARE INTERNUM), ANO 117

FONTE: <https://tinyurl.com/y8vqzcvq>. Acesso em: 21 dez. 2020.

No entanto, antes que pudesse se tornar uma potência militar, Roma pre-
cisava de um governo estável, sendo fundamental evitar a concentração de poder
nas mãos de um indivíduo. Assim, após a queda da monarquia, a república ficou
sob o controle dos patrícios (patres), membros das grandes famílias romanas. So-
mente os patrícios podiam ocupar cargos políticos ou religiosos. Os demais cida-
dãos, ou “plebeus”, não tinham poder político, embora muitos fossem tão ricos
quanto os patrícios. No entanto, esse arranjo não poderia e não iria durar.

As tensões entre os dois grupos continuam a crescer, principalmente por-


que era entre os mais pobres que Roma recrutava a maior parte do exército e os
plebeus se perguntavam por que lutar em guerras que apenas beneficiavam os
patrícios. Finalmente, em 494 a.C., os plebeus se reuniram fora de Roma e se re-
cusaram a voltar até que tivessem direito a participar da política. Dessa maneira,
obtiveram o direito de organizar uma assembleia própria, o Concilium Plebis ou
Conselho da Plebe. Embora o governo de Roma não fosse democrático, seus cida-
dãos (excluindo as mulheres) opinavam na forma como a cidade era governada.
Após a rebelião, os plebeus participaram do sistema em que o poder residia nos
magistrados (cursus honorum) e em assembleias. O poder executivo ou “império”
(poder, autoridade) era exercido por dois cônsules eleitos pela Comitia Centuriata.
O cônsul governava por apenas um ano, presidindo o Senado, propondo leis e
comandando os exércitos. Um cônsul pode vetar a decisão do outro e, após o tér-
mino de seu mandato, ele poderia se tornar um procônsul, governando um dos
muitos territórios da república (LEWIS, 2003).

153
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 18 – ROMA: EXPANSÃO INICIAL

FONTE: <https://tinyurl.com/y4pbwxn9>. Acesso em: 15 ago. 2020.

2.2.1 Magistrados e funcionários


Havia vários magistrados menores:

• o “pretor”, único, exceto o cônsul, com poder (imperium), atuava como oficial
de justiça com jurisdição na cidade e na província;
• o “questor”, que atuava como administrador financeiro;
• o “edil”, que supervisionava a manutenção urbana, como estradas, água,
abastecimento de comida, os jogos e festivais anuais;
• o altamente cobiçado cargo de “censor”, que era eleito a cada cinco anos (mu-
danças posteriores limitaram o mandato em dezoito meses), era o recensea-
dor que examinava a lista de cidadãos e suas propriedades; podia, inclusive,
remover membros do Senado por comportamento impróprio.

Havia, no entanto, uma posição excepcional, o “ditador”, que recebia auto-


ridade irrestrita, em tempos de emergência, geralmente servindo por apenas seis
meses. O mais famoso, é claro, foi Júlio César, que foi nomeado “ditador vitalício”.
154
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

2.2.2 Assembleias
Além dos magistrados, havia também as assembleias que funcionavam
como fórum para dar voz ao povo (apenas cidadãos do sexo masculino). A princi-
pal delas era o Senado Romano (um remanescente da antiga monarquia). Embora
não remunerados, os senadores eram vitalícios, exceto, se fossem removidos pelo
censor por má conduta pública ou privada. O Senado não tinha poder legislativo,
servia apenas como órgão consultor do cônsul e depois do imperador, mas, ainda
assim, detinha um grau considerável de autoridade. Por exemplo, podia propor
leis, supervisionar a política externa e a administração e as finanças. No entanto,
o poder de promulgar leis era uma atribuição das assembleias populares. Todas
as propostas do Senado tinham que ser aprovadas por uma das duas assembleias
populares: a Comitia Centuriata, que não apenas promulgava leis, mas também
elegia os cônsules e declarava guerra, e o Concilium Plebis, que representava os
desejos dos plebeus através de seus tribunos eleitos. Além desses dois principais
órgãos legislativos, havia também várias assembleias tribais menores.

2.2.3 A cúria
O Concilium Plebis surgiu como resultado do conflito entre os plebeus e os
patrícios pelo poder político. Além de aprovar leis pertinentes aos interesses dos
plebeus, seus membros elegiam tribunos que os representavam. Embora o “Con-
selho da Plebe” tenha, inicialmente, dado aos plebeus alguma voz no governo, ao
longo do tempo, isso provou não ser suficiente. Em 450 a.C., a lei das “Doze Tá-
buas” foi promulgada para apaziguar as demandas dos plebeus e tornou-se o pri-
meiro código de leis que daria origem ao Direito Romano. A lei abordava assuntos
domésticos, com ênfase à vida familiar e à propriedade privada. Por exemplo, os
plebeus não podiam mais ser presos por dívidas e tinham o direito de apelar da
decisão de um magistrado. Posteriormente, os plebeus chegariam a se casar com
patrícios e poderiam se tornar cônsules. Em 287, com a Lex Hortensia, todas as leis
aprovadas pelo Concilium Plebis passaram a valer para plebeus e patrícios.

2.3 A EXPANSÃO DE ROMA


Com um sistema de governo estabelecido, a República se expandiu muito
além dos limites da Península Itálica. A vitória nas três guerras púnicas (264-146
a.C.), travadas contra Cartago, foi o primeiro passo para Roma se expandir na re-
gião do Mediterrâneo. Após anos de guerra e a derrota de Roma frente a Aníbal,
o Cartaginês, o Senado finalmente seguiu o conselho do senador Catão, o Ve-
lho, que dizia “Carthago delenda est!” (ou “Cartago deve ser destruída!”). As vitó-
rias romanas em Cartago (202 a.C.) e nas quatro Guerras Macedônicas (148 a.C.)
transformaram a República romana em uma verdadeira potência no Mediterrâ-
neo. A conquista dos gregos trouxe a rica cultura helenística à Roma. Apesar do
crescimento da República, os romanos nunca pretenderam governar um império.

155
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

Segundo o historiador Tom Holland, a República parecia sempre estar à beira do


colapso político, porque a velha aristocracia agrária não mudava e o fosso entre
ricos e pobres só aumentava (HOLLAND, 2011).

Roma era mais do que apenas um estado guerreiro; os romanos acredita-


vam na importância da família e no valor da religião, além de entenderem que
cidadania ou civitas definia o significado de ser civilizado. Esse conceito de cida-
dania logo seria posto à prova quando os povos nos territórios conquistados co-
meçaram a desafiar a autoridade romana. Contudo, o constante estado de guerra
não apenas enriqueceu a República, mas também ajudou a moldar sua sociedade.
Sob a influência grega, os deuses romanos tradicionais se transformaram, pois,
em Roma, a expressão pessoal de crença de um indivíduo não era importante.
Para os romanos, a estrita adesão a um conjunto rígido de rituais era o que impor-
tava, evitando, assim, os perigos do fervor religioso.

Em Roma, os cortiços eram o símbolo das divisões sociais. A cidade era


o refúgio para os que buscavam uma vida melhor. No entanto, quando as ex-
pectativas de uma vida melhor não se concretizavam, um número crescente de
migrantes acabavam morando em áreas pobres da cidade ou mesmo se tornavam
moradores de rua. Os habitantes, nesses bairros pobres, viviam com medo cons-
tante de incêndio e desabamento. A higiene inexistia, as ruas eram sujas e mal
iluminadas e os índices de crime eram alarmantes. Essas áreas da cidade eram
um terreno fértil para doenças e o descontentamento da população aumentava.

2.3.1 Os irmãos Graco


A luta entre ricos e pobres permaneceria até o colapso da República. Todavia,
alguns na elite romana tentavam encontrar soluções para os problemas sociais. No sé-
culo II a.C., os irmãos Graco, ambos tribunos, tentaram, mas falharam, em implemen-
tar as mudanças necessárias. O primeiro deles, Tibério Graco, entre várias propostas
de reforma, sugeriu doar terras aos desempregados e aos pequenos agricultores, mas
os senadores, muitos dos quais eram grandes proprietários de terra, protestaram ve-
ementemente. Até o Concilium Plebis rejeitou a ideia e, embora a proposta tenha se
tornado lei, ela não pôde ser aplicada. Os distúrbios que ocorreram após a aprovação
da lei resultaram na morte de trezentas pessoas, incluindo o próprio Tibério Graco.

O irmão mais novo de Tibério, Caio Graco, também apoiava a ideia de dis-
tribuir terras, mas seu destino foi selado quando propôs estender a cidadania a
todos os aliados dos romanos. Como seu irmão mais velho, suas propostas encon-
traram resistência, resultando na morte de três mil de seus apoiadores e no seu
suicídio. O fracasso dos irmãos Graco em implementar mudanças sociais em Roma
seria um dos vários indicadores de que a República estava fadada a desaparecer.

Décadas mais tarde, em 88 a.C., outro romano surgiu para iniciar uma série
de reformas. Um general chamado Lúcio Cornélio Sula marchou com seu exército
sobre Roma e tomou o poder. Sula derrotou o Rei Mitrídates, do Ponto, na Anatólia,

156
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

e esmagou os samnitas com a ajuda dos generais Pompeu e Crasso. Em seguida, ex-
purgou o Senado Romano e reorganizou os tribunais, promulgando uma série de re-
formas. Em 79 a.C., deixou o poder para se tornar um simples cidadão (LEWIS, 2003).

FIGURA 19 – OS IRMÃOS GRACO

FONTE: <https://tinyurl.com/yxbp9rck>. Acesso em: 15 ago. 2020.

3 FIM DA REPÚBLICA
A República não entrou em colapso devido a ameaças externas, mas caiu
por problemas internos e pela incapacidade de se ajustar a um estado em cons-
tante expansão. Até as antigas profecias dos Oráculos Sibilinos previam que o
fracasso da República viria internamente, e não por causa de invasores estrangei-
ros. Os sinais que anunciavam a mudança não faltavam. No século I a.C. (90-88
a.C.), a exigência do status de cidadão pelos aliados de Roma foi um sinal dessa
agitação, que resultou na chamada “Guerra Social”. Durante anos, os aliados ro-
manos foram leais à República e forneceram soldados para a guerra, mas não
eram considerados cidadãos. Como os plebeus anteriormente, eles pleiteavam
reconhecimento e foi preciso uma guerra civil para que as coisas mudassem. Con-
trariando o Senado, a cidadania foi finalmente concedida a todos os habitantes da
península italiana (excluindo os escravos). Posteriormente, Júlio César estenderia
a cidadania além da Itália e a concederia aos habitantes da Ibéria e da Gália.

Na mesma época, outros problemas internos ameaçaram a estabilidade da


República. Marco Túlio Cícero, estadista e poeta romano, descobriu uma conspira-
ção, liderada pelo senador romano Lúcio Sérgio Catilina, para derrubar o governo
romano. Cícero, por sua vez, também acreditava que a República estava em declínio
devido à decadência moral. Problemas como esse, juntamente com medo e inquie-
tação, chamaram a atenção de três homens, por volta do ano 60 a.C.: Júlio César,
Pompeu e Marcus Licínio Crasso – este ficou famoso por derrotar a revolta escrava,
liderada por Espártaco, em 71 a.C., enquanto Pompeu se destacara na Ibéria e no
Oriente, e Júlio César provara ser um comandante militar excepcional. Juntos, os três
homens formaram o que os historiadores chamam de Primeiro Triunvirato. Por qua-
se uma década, eles controlaram as decisões do governo da República. Depois que
César deixou o cargo de cônsul, em 59 a.C., e rumou, com seu exército, para a Gália

157
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

e a Germânia, Pompeu tornou-se governador da Ibéria, embora ele governasse de


Roma. Simultaneamente, Crasso buscou a fama no Oriente, onde acabou sendo der-
rotado e morto pelos partas (persas), em 53 a.C., na Batalha de Carras.

A tensão entre Pompeu e César aumentou após a morte de Crasso. Pom-


peu tinha ciúmes do sucesso e da fama de César, enquanto César queria retornar
à política. Inevitavelmente, em 48 a.C., as diferenças os levaram ao confronto na
Batalha de Farsalos, na Tessália (atual Grécia). Pompeu foi derrotado e fugiu para
o Egito, onde foi morto, em 48 a.C., por Ptolomeu XIII. César, assim, assegurou o
controle das províncias do Oriente e do norte da África, retornando à Roma como
herói, para ser clamado ditador vitalício.

Os inimigos, e até aliados, viam o poder de César como uma séria ameaça
à República e, não obstante, sua popularidade por causa da reforma, que causou
o seu assassinato, em 44 a.C., decretou o fim da República. Seu herdeiro e entea-
do, Otaviano, venceu o rival, Marco Antônio, tornando-se o primeiro imperador
de Roma com o título de “Augusto” (HILL, 2009).

NTE
INTERESSA

“Et tu, Brute?” é uma expressão latina que significa “e tu, Brutus?” ou “até tu,
Brutus?”, que teria sido proferida, em 44 a.C., pelo ditador romano Júlio César, no momento
de seu assassinato, ao seu filho adotivo Marco Brutus.

3.1 ROMA IMPÉRIO


O Império Romano, em seu auge, por volta de 117, era a maior estrutura
política no mundo Ocidental e, em 285, havia se tornado vasto demais para ser
governado, sendo, portanto, dividido pelo Imperador Diocleciano (284-305) em
império do Ocidente e do Oriente. No Ocidente, o Império Romano teve início
quando Augusto César (27 a.C.-14 d.C.) se tornou o primeiro imperador de Roma,
terminando quando o último imperador romano, Romulo Augusto (475-476), foi
deposto pelo rei germânico Odoacro (476-493). No Oriente, o império continuou
como Império Bizantino até a morte de Constantino XI (1449-1453) na conquista
de Constantinopla pelos turcos otomanos.

3.1.1 As primeiras dinastias no Império Romano


Após a Batalha de Áccio, em 31 a.C., Caio Otávio Augusto, sobrinho e her-
deiro de Júlio César, tornou-se o primeiro imperador de Roma e recebeu o título
de “César Augusto”. Embora Júlio César seja considerado, por alguns, o primeiro

158
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

imperador de Roma, ele nunca foi agraciado com o título de “imperador”. Júlio Ce-
sar foi escolhido pelo Senado como “ditador”, em virtude de seus feitos militares e
poder político. Em contrapartida, o Senado concedeu a Augusto o título de “impe-
rador” por ele ter destruído os inimigos de Roma e ter restituído sua estabilidade.

Augusto governou o Império de 31 a.C. até sua morte, no ano 14. Ele te-
ria declarado: “encontrei Roma como uma cidade de barro, mas a deixei como
uma cidade de mármore”. Augusto reformou as leis, estabilizou as fronteiras do
império, iniciou vastos projetos de construção e deixou um legado duradouro de
Roma como uma potência política e cultural. A Pax Romana (paz romana), tam-
bém conhecida como Pax Augusta, iniciada por Augusto, foi um tempo de paz e
prosperidade, até então, desconhecido e que durou mais de 200 anos.

Após a morte de Augusto, o poder passou a seu herdeiro, Tibério (14-37),


que continuou as políticas anteriores, mas não possuía a força de caráter e vi-
são de Augusto. Essa tendência continuaria, mais ou menos de forma constante,
com os imperadores que se seguiram: Calígula (37-41), Cláudio (41-54) e Nero
(54-68). Esses cinco primeiros governantes do império são chamados de dinastia
júlio-claudiana – para os dois nomes de família, Júlio e Claudio, de que eles des-
cendem (seja por nascimento ou por adoção). Apesar de Calígula ter se tornado
conhecido por sua depravação, e aparente insanidade, seu início de governo foi
louvável. O seu sucessor, Cláudio, expandiu o poder de Roma até a atual Grã-
-Bretanha. Ambos, Calígula e Cláudio, acabaram assassinados. Já o governo de
Nero, pior que o de seus antecessores, terminou tragicamente com seu suicídio e
o fim da dinastia júlio-claudiana, o que deu início a um período de agitação social.

O fim da dinastia júlio-claudiana foi seguido pelo período conhecido


como “O Ano dos Quatro Imperadores”. Após o suicídio de Nero, em 68, Galba,
governador da Hispânia, se tornou o imperador, em 69, e, quase instantaneamen-
te, se mostrou incapaz de governar, sendo, por isso, assassinado pela Guarda
Pretoriana. Otão, imediatamente, o sucedeu, mas Vitélio, um general que gover-
nava a Germânia, não reconheceu o novo imperador e iniciou uma breve guerra
civil que terminou com o suicídio de Otão e a ascensão de Vitélio ao trono. Este,
porém, não se mostrou mais apto a governar do que Galba. As legiões no Oriente
aclamavam o general Vespasiano como imperador e marcharam sobre Roma. Vi-
télio foi, então, assassinado e Vespasiano (69-79) assumiu o poder exatamente um
ano depois que Galba subira ao trono.

Vespasiano fundou a dinastia flaviana, caracterizada por grandes projetos


de construção, prosperidade econômica e expansão do império. O governo de
Vespasiano foi próspero, como evidenciado por seus projetos de construção, que
incluíam o Anfiteatro Flaviano (o famoso Coliseu de Roma), finalizado por seu
filho Tito (79-81). Em 79, no reinado Tito, ocorreu a erupção do Monte Vesúvio,
que destruiu as cidades de Pompeia e Herculano.

Tito ficou conhecido por sua habilidade de lidar com as consequências


trágicas da erupção do Vesúvio e o grande incêndio de Roma, em 80. No entanto,
ele morreu de febre, em 81, e seu irmão, Domiciano (81-96), assumiu o governo
159
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

do império. Domiciano expandiu os limites de Roma, reparou os danos causados


à cidade pelo grande incêndio, continuou os projetos de construção iniciados por
seu irmão e melhorou a economia do império. Mesmo assim, seus métodos e polí-
ticas autocráticas o levaram a entrar em choque com o Senado, e ele acabou sendo
assassinado em 96 (GRANT, 1978).

DICAS

“Roma” é uma série de televisão de drama histórico britânica-americana-ita-


liana criada por John Milius, com duas temporadas. A história se passa na Roma Antiga
do século I a.C., durante a transição da República para o Império, e apresenta um enorme
elenco de personagens, muitos baseados em figuras reais de registros históricos. A série
recebeu muita atenção da mídia desde o início e foi homenageada com inúmeros prêmios
e indicações, tendo sido um sucesso de classificação para a HBO e a BBC. Assista ao trailer
de “Roma” em: https://tinyurl.com/yb9t9x4q.

3.1.2 Os cinco bons imperadores


O sucessor de Domiciano foi o senador Marco Coceio Nerva, fundador
da dinastia nerva-antonina, que governou Roma, entre 96 e 192, que foi marcado
pela prosperidade. Nesse período, Roma foi governada por sete imperadores:
Nerva, Trajano, Adriano, Antonino Pio, Marco Aurélio, Lúcio Vero e Cómodo.
Entre eles, cinco foram considerados excepcionais, chamados de “Os Cinco Bons
Imperadores de Roma”, com exceção de Lúcio Vero e Cómodo.

Vero governou, junto a Marco Aurélio, até a sua morte, em 169. Já Cómo-
do (180-192), filho e sucessor de Marco Aurélio, foi um dos piores imperadores
de Roma e morreu ao ser estrangulado por seu parceiro de luta livre, em 192,
terminando a dinastia nerva-antonina e elevando o prefeito Pertinax (que prova-
velmente planejou o assassinato de Cómodo) ao poder.

FIGURA 20 – EXPANSÃO MÁXIMA DO IMPÉRIO ROMANO DURANTE O REINO DE TRAJANO (117)

FONTE: <https://bit.ly/3ykSxBc>. Acesso em: 15 ago. 2020.


160
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

3.1.3 A dinastia dos Severos


Pertinax governou por apenas três meses antes de ser assassinado, ten-
do sido seguido, em rápida sucessão, por outros quatro governantes no período
conhecido como “O Ano dos Cinco Imperadores”, que culmina com a ascensão
de Sétimo Severo ao poder. Severo (193-211) fundou a dinastia dos severos, der-
rotou os partos no Oriente e expandiu o império. Suas campanhas na África e
na Grã-Bretanha foram demoradas e caras e contribuiriam para as dificuldades
financeiras posteriores de Roma. Severo foi sucedido por seus filhos, Caracala e
Geta, até o primeiro mandar assassinar o outro.

Caracala governou até 217, quando foi assassinado por seu guarda-costas.
No reinado de Caracala, a cidadania romana foi estendida para todos os homens
livres no Império. Dizia-se que a lei havia sido promulgada como meio de au-
mentar a receita tributária porque, após sua aprovação, haveria mais contribuin-
tes para pagar impostos. A dinastia dos Severos continuou, em grande parte, sob
a orientação e a manipulação de Julia Mesa (conhecida como a “imperatriz”), até
o assassinato de Alexander Severo, em 235, que mergulhou o império no caos
conhecido como “Crise do Terceiro Século” (235-284).

NOTA

A partir dos séculos II e III d.C., o Império Romano iniciou uma forte crise, que levou
à fragmentação de sua parte Ocidental, apesar de o lado Oriental permanecer existindo sob o
nome de Império Bizantino. Essa crise estava relacionada com a instabilidade política e econômi-
ca enfrentada por Roma. Esse processo foi acentuado com os ataques dos germânicos.

FONTE: <https://tinyurl.com/ydfmgoge>. Acesso em: 21 dez. 2020.

3.1.4 Dois impérios: Oriente e Ocidente


O período, também conhecido como da “Crise Imperial”, foi caracterizado
por guerras civis constantes, nas quais vários líderes militares lutavam pelo contro-
le do império. A crise, finalmente, levou à dissolução do Império, que, em 268, se
dividiu em três regiões distintas: o Império Gálico (incluindo as províncias romanas
da Gália, a Bretanha e, brevemente, a Hispânia); o Império Palmirense (incluindo as
províncias orientais da Síria Palestina e Egito); e o Império Romano, propriamente
dito, independente, centrado na Península Itálica. Mais tarde, Aureliano (270-275)
reunificou o Império e a crise terminou com a ascensão de Diocleciano.

161
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

O Império sob o governo de Aureliano (270-275), cujas políticas foram melho-


radas por Diocleciano, estabeleceu a “Tetrarquia” (a regra dos quatro) para manter a
ordem em todo o Império. No entanto, o Império ainda era tão vasto que Diocleciano
o dividiu em dois, em 285, para implementar uma administração mais eficiente e
promoveu um de seus oficiais, Maximiano (286-305), à posição de coimperador.

Dessa maneira, Diocleciano criou os Impérios Romano do Ocidente e o


Romano do Oriente (também conhecido como Império Bizantino). Como uma
das principais causas da crise imperial era a falta de clareza na sucessão, Diocle-
ciano decretou que os sucessores seriam escolhidos e aprovados desde o início
da regra de um indivíduo. Dois desses sucessores foram os generais Magêncio
e Constantino. Diocleciano retirou-se voluntariamente do governo em 305 e a
tetrarquia se dissolveu à medida que regiões rivais do império disputaram entre
si o domínio. Após a morte de Diocleciano, em 311, Magêncio e Constantino mer-
gulharam o Império novamente na guerra civil (LEWIS, 2003).

FIGURA 21 – DIVISÃO DO IMPÉRIO ROMANO NO SÉCULO III

FONTE: <https://tinyurl.com/y27ffgwh>. Acesso em: 15 ago. 2020.

3.1.5 Constantino e o Cristianismo


Em 312, Constantino derrotou Magêncio na Batalha da Ponte Mílvia e se
tornou o único imperador dos Impérios do Ocidente e do Oriente (entre 306 e
337). Acreditando que Jesus Cristo foi responsável por sua vitória, Constantino
iniciou uma série de leis, como o Edito de Milão (313), que implementava a tole-

162
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

rância religiosa em todo o Império, mais especificamente a tolerância pela fé que


passou a ser conhecida como cristianismo. De maneira análoga aos imperadores
romanos anteriores, que haviam reivindicado um relacionamento especial com
uma divindade para aumentar sua autoridade, Constantino escolheu, portanto,
Jesus Cristo. O Primeiro Concílio de Niceia (325) que ele presidiu serviu para nor-
matizar a fé cristã, decidindo sobre questões importantes, como a divindade de
Jesus, a trindade e quais textos bíblicos seriam selecionados para compor a Bíblia.
Constantino estabilizou o império, valorizou a moeda e reformou as forças arma-
das, além de ter fundado a cidade de “Nova Roma” no local da antiga cidade de
Bizâncio (atual Istambul), que passou a ser conhecida como “Constantinopla”.

Constantino ficou conhecido, posteriormente, como “o Grande” graças a


historiadores cristãos que o retrataram como um “campeão” do cristianismo; po-
rém, como foi observado por outros historiadores, o epíteto “o Grande” poderia
ser atribuído pelas reformas culturais e políticas, bem como por sua habilidade
em campo de batalha e em seus projetos de construção. Após a sua morte, seus
filhos herdaram o Império e, rapidamente, embarcaram em uma série de conflitos
que ameaçaram as realizações de Constantino.

Assim, Constantino II, Constâncio II e Constante I dividiram o Império


entre si, mas logo teve início um conflito entre eles por mais poder e territórios.
Constantino II e Constante I foram mortos como consequência da disputa, e
Constâncio II morreu, mais tarde, depois de nomear seu primo, Juliano, como
seu sucessor e herdeiro. Juliano governou por apenas dois anos (361-363) e, como
era adepto do neoplatonismo, rejeitou o cristianismo e culpou Constantino e os
cristãos pelo declínio do Império. Enquanto implementava, pelo menos oficial-
mente, uma política de tolerância religiosa, Juliano, sistematicamente, removeu
os cristãos de posições influentes do governo, proibiu o ensino e a disseminação
da religião e baniu os cristãos do serviço militar. Sua morte, em campanha militar
contra os persas, terminou a dinastia que Constantino havia começado, pois ele
foi o último imperador “pagão” de Roma, tendo ficado conhecido como Juliano,
o “Apóstata”, por sua oposição ao cristianismo (BAUER, 2007).

FIGURA 22 – MOSAICO DE CONSTANTINO, O GRANDE, NA BASÍLICA DE SANTA SOFIA (ISTAMBUL)

FONTE: <https://bit.ly/3hwVVD2 >. Acesso em: 15 ago. 2020.


163
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

3.1.6 Império Bizantino (330-1453)


Após o breve governo de Joviano, que restabeleceu o cristianismo como
a fé oficial e revogou vários éditos de Juliano, o governo do Império passou para
Teodósio I (379-395), que, em 380, continuou as reformas religiosas de Constantino,
proibindo as práticas religiosas “pagãs” e convertendo templos em igrejas cristãs.
Nessa época, a famosa Academia de Platão foi fechada por ordem de Teodósio.

No entanto, a aristocracia romana e as pessoas comuns mantinham os va-


lores tradicionais de suas tradições religiosas. A coletividade, baseada em valores
comuns, que incluía a religião tradicional, foi substituída pela instituição de uma
religião que removeu os deuses da terra e da sociedade humana e proclamou que,
doravante, apenas um deus governava dos céus. O novo deus, diferentemente
dos deuses antigos, não tinha interesse especial em Roma, pois ele era o deus de
todos, o que distanciava a religião de seu caráter romano, pois, antes, sua crença
era patrocinada pelo Estado, e os rituais e os festivais serviam para celebrar o sis-
tema romano. Teodósio, tão dedicado à promoção do cristianismo, seria o último
a governar os Impérios Oriental e Ocidental.

3.1.7 O fim do Império Romano do Ocidente


De 376 a 382, Roma travou uma série de guerras contra os godos invasores,
que ficou conhecida como “Guerras Góticas.” Em 378, na Batalha de Adrianópolis,
o imperador romano Flávio Júlio Valente (364-378) foi derrotado pelos exércitos de
uma coligação de povos bárbaros. Esse evento foi considerado pelos historiadores
como evidência definitiva do declínio do Império Romano do Ocidente. Várias teo-
rias tentam explicar as causas que levaram ao fim do Império, mas, ainda hoje, não
há um consenso universal sobre quais seriam esses fatores específicos. Edward Gi-
bbon, historiador britânico do século XVIII, argumentou, em sua clássica, A História
do Declínio e Queda do Império Romano, que o cristianismo desempenhou um papel
fundamental no fim do Império Romano, pois a nova religião minou a estrutura
social baseada nas práticas religiosas tradicionais (GIBBON, 2000).

No entanto, a vastidão Império o tornava quase ingovernável, dificultando a


sua administração, e as duas partes do Império se viam mais como concorrentes do
que como entidades complementares. Ademais, a pressão crescente das tribos ger-
mânicas e suas constantes incursões em Roma poderiam ter sido tratadas de maneira
mais eficaz, se não fosse pela corrupção, especialmente entre governadores provin-
ciais, e pelo tratamento injusto dos godos. As legiões romanas formadas, em grande
parte, por mercenários “bárbaros” que não tinham vínculos étnicos com Roma, não
protegiam as fronteiras com a mesma eficiência de outrora nem o governo poderia
facilmente coletar impostos nas províncias. Além disso, a desvalorização da moeda,
iniciada na dinastia dos Severos, aumentou a inflação e o trabalho escravo generali-
zado privava os cidadãos pobres da oportunidade de trabalhar. Por fim, a chegada
dos visigodos ao Império, no século III, fugindo dos invasores hunos e suas rebeliões
subsequentes, também foram citados como fator contribuinte do declínio.

164
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

3.1.8 Invasões do Império Romano do Ocidente


O último imperador, Rômulo Augusto, foi deposto, em 476, pelo rei ger-
mânico Odoacro, marcando o fim do Império Romano. O Império Romano do
Oriente, porém, continuou como Império Bizantino, até 1453. O Império Romano
do Ocidente seria reinventado, mais tarde, como Sacro Império Romano (962-
1806), mas essa seria apenas uma entidade política muito distante daquilo que foi
Império Romano da Antiguidade, sendo um “império” apenas no nome.

FIGURA 23 – INVASÕES DOS POVOS GERMÂNICOS (SÉCULO V)

FONTE: <https://tinyurl.com/yyrdsozp>. Acesso em: 15 ago. 2020.

O “Período de Migração” foi um período na história da Europa durante e


após o declínio do Império Romano do Ocidente. Nesse período, ocorre uma mi-
gração generalizada e invasões de povos, notadamente tribos germânicas, hunos,
os primeiros eslavos e os ávaros nos territórios dominados pelos Império Roma-
no. O período é tradicionalmente considerado com início em 375 (com a invasão
dos hunos) e término por volta de 568 (com a conquista da atual Itália pelos Lom-
bardos). O fenômeno ficou conhecido como “invasões bárbaras” porque a his-
toriografia adotou a perspectiva grega e romana dos eventos (HALSALL, 2008).

165
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

No entanto, especialistas contemporâneos, como Guy Halsall e Thomas


Noble, entre outros, afirmam que as migrações “bárbaras” foram resultado do
declínio do Império Romano do Ocidente e não sua causa. Descobertas arqueo-
lógicas confirmaram que as tribos germânicas e eslavas eram formados por agri-
cultores, que provavelmente, foram envolvidos na política de um império que já
estava se desintegrando por várias outras causas (NOBLE; GOFFART, 2006). A
chamada “Crise do Terceiro Século” causou mudanças significativas dentro do
Império Romano, tanto em sua porção ocidental como oriental. Em particular,
a fragmentação econômica enfraqueceu muitas das forças políticas, culturais e
econômicas que mantiveram o império unido (HALSALL, 2008).

NTE
INTERESSA

O termo “bárbaro” tem origem do grego bárbaros e, na Grécia Antiga, era usa-
do para designar aqueles que não falavam grego e não seguiam os costumes gregos. Em
Roma, para designar os povos germânicos, celtas, gauleses, ibéricos, trácios, ilírios, berberes
e sármatas, entre outros. No início da Idade Moderna, os gregos bizantinos o usavam, de
maneira pejorativa, para identificar os povos turcos. Na China, na Antiguidade, tal nomencla-
tura era utilizada para identificar os povos que viviam além dos limites da civilização chinesa.

FONTE: <https://tinyurl.com/7aobcce>. Acesso em: 22 dez. 2020.

4 ROMA: ASPECTOS SOCIAIS, POLÍTICOS E CULTURAIS

4.1 HIERARQUIAS E CONFLITOS


A família era o núcleo da sociedade romana. As famílias estáveis foram cria-
das para uma sociedade estável e se tornaram o componente mais importante de
uma hierarquia baseada no gênero (masculino), cidadania, ancestralidade e classi-
ficação do censo (onde se morava e quanta terra possuía). Inicialmente, um cidadão
era definido como qualquer homem acima de quinze anos que era membro de uma
das três tribos originais dos latinos, estando apto a desfrutar do poder político.

No topo da hierarquia política, havia um líder (o cônsul durante a repú-


blica, imperador durante o império), o senado, os juízes e as assembleias. No topo
da hierarquia social, havia o chefe da casa (pater familias), sua esposa, filhos e, em
alguns casos, sua família extensa (irmãs solteiras, mães viúvas e pais idosos). O
patriarcado, em ambas as esferas (política e social), operava de acordo com as
regras do paternalismo: os que estavam no poder eram obrigados a cuidar dos
que estavam abaixo deles. Assim, o cônsul e o imperador, na esfera pública, ou o
chefe da família, na esfera privada – ambos no topo da hierarquia –, cuidavam de
seus dependentes em troca de lealdade e serviços.

166
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

4.1.1 Políticos romanos


A sociedade era dividida em dois estamentos ou classes: os patrícios (aris-
tocratas), na elite romana, e os plebeus (comuns), no estamento ou classe baixa.
Inicialmente, o sistema, como um todo, favorecia os patrícios, mas a situação mu-
dou após o chamado “Conflito das Ordens” (500-287), como resultado da luta
entre os plebeus e os patrícios. Esse conflito, no período da República, começou
quando os patrícios romanos, em campanha militar contra as tribos vizinhas, pre-
cisaram de homens para seus exércitos. Em 494 a.C., os plebeus, que compunham
a maior parte das forças militares, se recusaram a lutar até obterem direitos po-
líticos. As exigências dos plebeus foram atendidas através de novas leis que lhes
permitiam enviar seu próprio representante (Tribuno da Plebe) ao senado e, em
449 a.C., pelas Leis das Doze Tábuas, que foram publicadas para que todos pu-
dessem entender que ninguém estava acima da lei.

Antes do conflito, os plebeus eram cidadãos de segunda classe, proibidos


de se casar com patrícios; porém, após 445 a.C., eles conquistam direitos políticos
e as barreiras sociais foram abolidas. Quando o conflito das ordens terminou, a
sociedade romana foi definida por cinco classes ou estamentos sociais:

• Patrícios e plebeus: é um equívoco considerar os patrícios tradicionalmente


como nobres e os plebeus como pobres sem-terra; os patrícios compunham o
senado e eram a classe ou segmento dominante, mas havia muitas famílias ple-
beias poderosas. Com o passar do tempo, algumas famílias patrícias perderam
sua riqueza e sua posição social, enquanto o oposto aconteceu com algumas
famílias plebeias. Basicamente, os patrícios eram a aristocracia por direito de
nascença e os plebeus formavam o resto da sociedade romana. No entanto, ser
plebeu não era sinônimo de pobreza ou ignorância; agricultores, artesãos, pro-
fessores, empreiteiros e arquitetos, além de muitas outras profissões respeitá-
veis, eram realizadas por plebeus, de acordo coma a hierarquia social romana.
• Equestres (classe equestre, cavaleiros): eram originalmente cavaleiros mon-
tados e recrutados entre os patrícios no período inicial da República. Entre-
tanto, após 218 a.C., eles se tornaram associados à atividade comercial, como
consequência de uma lei que proibia os senadores de se envolverem no co-
mércio. Dessa maneira, os equestres que eram patrícios, mas não ocupavam
postos no senado, dedicavam-se às finanças, à arrecadação de impostos, às
operações de importação/exportação e ao comércio de escravos.
• Libertos: eram escravos que haviam conseguido comprar sua liberdade ou ha-
viam sido libertados por seus proprietários. Escravos libertos podiam receber
a cidadania, mas não podiam ocupar cargos políticos. No entanto, os filhos de
escravos libertos recebiam plenos direitos como cidadãos. Os libertos podiam
exercer qualquer atividade que fossem qualificados, mas, muitas vezes, con-
tinuavam realizando atividades que previamente já faziam quando escravos.
• Escravos: eram o segmento mais baixo da sociedade romana. Sem direitos e conside-
rados propriedade a qualidade de vida do escravo variava de acordo com o proprie-
tário e a atividade desempenhada. A vida nas minas ou na construção de estradas era

167
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

consideravelmente mais dura que a do que os escravos artesãos ou músicos. Mesmo


assim, independente da profissão eles estavam sujeitos aos caprichos de seus pro-
prietários, que podiam espancá-los e mesmo matá-los por motivo fúteis.
O Por outro lado, os romanos dependiam dos escravos para fazer qualquer
trabalho indesejado. As escravas serviam suas amas em todos os aspectos,
ajudando-as a tomar banho, a vestir-se, a cuidar das crianças, a limpar a
casa, entre outras atividades. Os escravos serviam ao dono da casa em
muitas funções, como assistentes, tutor de crianças, garçom, mordomo,
guarda-costas, superintendente de propriedades, entre outros. A certa al-
tura, foi considerado instituir uma lei exigindo que os escravos usassem
um determinado uniforme, mas ideia foi abandonada por temor que os es-
cravos percebessem sua força numérica e pudessem se rebelar. As revoltas
de escravos eram um medo constante entre romanos, principalmente em
razão da revolta, entre 73 e 71 a.C., liderada por Espártaco, que aterrorizou
os romanos por muitos anos após ser debelada.

NOTA

No ano de 73 a.C., Espártaco, um gladiador trácio, revoltou-se e fugiu com


outros 74 gladiadores. Juntos, formaram um exército com a adesão de milhares de outros
escravos que viviam em Roma. Alguns estudiosos chegam a falar que o exército formado
por Espártaco reuniu, aproximadamente, 100 mil homens, ameaçando seriamente a
instituição da escravidão durante a República Romana. O exército de escravos liderado
por Espártaco chegou várias vezes a vencer as legiões do exército romano no sul da Itália.
No ano de 71 a.C., o exército romano empreendeu uma grande força tarefa, vencendo
os rebeldes. Mais de 6 mil escravos foram crucificados e o líder Espártaco morreu em
combate. Dessa maneira, terminou, em 71 a.C., a maior revolta de escravos do mundo
antigo, que abalou as estruturas do escravismo em Roma.

FONTE: <https://tinyurl.com/ybopvqhz>. Acesso em: 21 dez. 2020.

DICAS

Uma indicação de filme sobre Espártaco é o premiado “Spartacus”, com direção


de Stanley Kubrick (1960), estrelado por Kirk Douglas, Jean Simmons, Peter Ustinov, Lawren-
ce Olivier e Tony Curtis. Assista ao trailer de “Spartacus” em: https://tinyurl.com/ybupu27f.

168
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

FIGURA 24 – SOLDADO ROMANO CONDUZINDO CATIVOS ACORRENTADOS, POR VOLTA DE


200, NA ATUAL TURQUIA

FONTE: <https://bit.ly/3yfSMgE>. Acesso em: 15 ago. 2020.

O A maioria dos escravos era de estrangeiros capturados em guerra, mas


alguns romanos venderam a si mesmos ou a seus filhos como escravos
como forma de pagar dívidas. Algumas famílias patrícias mantinham um
número enorme de escravos em uma propriedade, os quais serviam aos
interesses do núcleo do estado romano: a família.

E
IMPORTANT

Estima-se que, por volta do século I, os escravos formavam de 30 a 40% da


população da Península Itálica. Em todo o Império Romano, a população escrava era
estimada em cerca de 5 milhões, o que correspondia a 10 a 15% da população. A elite
romana correspondia apenas a 1,5% da população do império, mas possuía 49% de todos os
escravos. Metade do total de escravos trabalhava no campo e a outra metade, nas cidades.
Na Roma Antiga, a escravidão não estava relacionada a grupos étnicos específicos, sendo
que os escravos se originavam da Europa e das regiões no entorno do Mar Mediterrâneo,
incluindo celtas, germânicos, trácios, eslavos, cartagineses, etíopes, entre outros. Após o
século I a.C., não foi mais permitida a escravização de romanos e outros povos italianos.

FONTE: <https://tinyurl.com/7xy2yg5>. Acesso em: 15 ago. 2020.

4.2 FAMÍLIA
Há muito mais fontes históricas sobre as famílias patrícias do que as ple-
beias, porém a estrutura era a mesma em ambas. O pai era o chefe da família e
tomava todas as decisões sobre finanças e criação dos filhos. Os pais tinham con-
trole total sobre os filhos, independentemente de idade ou estado civil, desde o
nascimento até a morte (embora um filho pudesse recorrer à justiça para exigir a

169
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

emancipação de seu pai, se comprovado que seu pai era incompetente ou que cla-
ramente agia contra os interesses do filho). O pai ainda tinha o direito de decidir
se seu filho recém-nascido seria criado ou abandonado.

O parto era feito em casa, com a participação dos escravos da mãe. Os ho-
mens não participaram do parto, embora, às vezes, em lares da elite romana, um
médico fosse chamado para estar disponível em caso de um parto difícil. Depois
que a criança nascia, era limpa e colocada no chão, esperando a decisão do pai, o
qual poderia pegar a criança, significando que ela era aceita na casa, ou se afastar,
rejeitando-a para que fosse retirada da casa e deixada nas ruas. Um pai podia
rejeitar o filho por qualquer motivo e sua vontade não podia ser contestada. É
provável que filhas tenham sido mais rejeitadas do que filhos, uma vez que os
filhos eram obrigados a continuar com o nome da família e a fortuna. Não obs-
tante, os recém-nascidos, de qualquer sexo, podiam ser abandonados por razões
financeiras, especialmente se a família já tinha um ou mais filhos saudáveis. Os
bebês abandonados eram frequentemente resgatados por comerciantes de escra-
vos, que os criavam para vendê-los mais tarde.

NTE
INTERESSA

Havia, pouco afeto, segundo os padrões modernos, entre pais e filhos na Roma Anti-
ga. A mãe ou um parente idoso ficava responsável por criar meninos e meninas, e, durante as refei-
ções, no âmbito doméstico, as crianças podiam se sentar à mesa, mas não participar da conversa.

FONTE: <https://tinyurl.com/ya6twxjo>. Acesso em: 22 dez. 2020.

4.2.1 Mulheres
As mulheres estavam sujeitas à vontade de seus pais durante toda a vida,
mesmo depois do casamento, e não tinham voz ou poder político. As filhas eram
educadas para administrar uma casa e cuidar de seus maridos. Nos estágios fi-
nais da República, embora tenham conquistado alguns direitos, ainda estavam
sob o controle de seus pais e maridos. Mesmo assim, podiam pedir o divórcio,
fazer abortos (com o consentimento do homem), herdar, gerenciar e vender pro-
priedades; já as mulheres mais pobres podiam trabalhar e vender seus produtos.
Elas não tinham direito legal sobre os filhos, que, em caso de divórcio, ficavam
sob a guarda do pai. Quando uma mulher alcançava 15 anos de idade, ou mesmo
antes, o pai arranjava o marido que julgava adequado – na maioria das vezes, o
casamento era realizado com homens mais velhos.

170
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

NTE
INTERESSA

Mulher e sexualidade
Desde o início da república romana, houve uma grande ênfase na virgindade da mulher.
Pudicitia (castidade) era uma deusa da pureza feminina adorada pelas mulheres romanas
e apenas as virgens eram autorizadas a entrar em seu templo. A vida sexual da mulher
começava com a consumação de seu casamento no cubículo do marido ou sala privada.
Nas casas romanas, era comum que homens e mulheres tivessem cada um o seu próprio
cubículo, o que permitia, em tese, terem uma vida sexual independente. Contudo, era
esperado que as mulheres tivessem relações sexuais apenas com seus maridos, embora,
para os homens, fosse comum ter várias parceiras sexuais. Depois do casamento, as mu-
lheres eram vigiadas para se manterem fiéis e castas. A mera possibilidade de adultério, por
parte da mulher, já era motivo suficiente para o divórcio.

FONTE: <https://tinyurl.com/ybe8fk5f>. Acesso em: 22 dez. 2020.

4.2.2 Casamento
O casamento entre dois cidadãos romanos era legal apenas de forma con-
sensual, mas, não raro, era imposto. As cerimônias de casamento, geralmente,
aconteciam logo após o nascer do sol, simbolizando a nova vida em que o casal
estava iniciando. A cerimônia exigia dez testemunhas para ser legal e, embora
houvesse um sacerdote, ele não oficiava. A noiva recitava um voto tradicional
e, posteriormente, na festa de casamento, organizava-se um grande banquete. A
noiva, enquanto caminhava, jogava uma moeda dedicada aos espíritos das es-
tradas (uma oferta para dar sorte ao seu futuro caminho no casamento) e dava
duas moedas ao novo marido, uma para homenageá-lo e outra para homenagear
os espíritos da sua casa. Enquanto caminhavam juntos, o noivo distribuía nozes
e doces para a multidão e as pessoas os seguiam (em um ritual semelhante, nos
dias de hoje, ao jogar arroz nos casamentos) até chegarem à casa do noivo.

Em casa, o noivo carregava a noiva, e os historiadores sugerem que isso


pode ter sido “outra sobrevivência do casamento por captura”, referenciando à
passagem do “rapto das mulheres sabinas” (NARDO, 2004). Provavelmente, era
um gesto simbólico que retirava a noiva de sua antiga vida, carregando-a para a
nova. Amigos e familiares próximos eram, então, convidados, e o marido oferecia a
sua esposa fogo e água como elementos essenciais da casa, acendendo uma lareira.
Em seguida, era oferecida uma festa até o casal se retirar para seus aposentos.

171
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 25 – CASAMENTO NA ROMA ANTIGA

FONTE: <https://tinyurl.com/y4qucx2u>. Acesso em: 15 ago. 2020.

4.2.3 Casa e família


A idade mínima legal para uma menina se casar era 12 anos e, para o
menino, 15 anos, mas a maioria dos homens se casava, em média, por volta dos
26 anos. Isso ocorria porque os homens eram considerados emocionalmente ins-
táveis entre 15 e 25 anos. As meninas eram consideradas mais precoces (fato acei-
to nos dias de hoje) e, portanto, estavam prontas para as responsabilidades do
casamento bem mais jovens que os noivos. O objetivo principal do casamento
era gerar e educar os filhos, que se tornariam, eventualmente, membros responsá-
veis e produtivos da sociedade. Como os homens dominavam a hierarquia social,
a prioridade era em torno do filho primogênito. Nove dias após o nascimento
de uma criança do sexo masculino (oito dias para uma mulher), o bebê recebia
um nome durante a cerimônia de purificação, conhecida como “lustração”, e um
amuleto para afastar os maus espíritos. O amuleto dos meninos era chamado de
“bula” e o das meninas de “lúnula”, ambos os objetos eram feitos de chumbo, ou
de tecido e ouro nas famílias mais ricas.

Os meninos usavam a “bula” até os 15 anos, quando eram considerados


adultos, e, após uma cerimônia de maioridade, se tornavam cidadãos. As me-
ninas usavam a “lúnula” até pouco antes do casamento, quando a descartavam
junto com seus brinquedos, roupas de infância e vestiam roupas e acessórios fe-
mininos. O garoto era criado para aprender os negócios de seu pai ou, se fosse um
patrício ou equestre, aprender a cavalgar, caçar e lutar. Na época da República,
o serviço militar era obrigatório e, portanto, todo homem aprendia habilidades
marciais, independentemente da classe; já durante o Império, o serviço militar era
voluntário. As meninas eram criadas para se tornarem esposas e mães – embora
existam exemplos notáveis de mulheres poderosas na história romana.

172
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

O lar era governado pelo pai, mas era mantido pela mãe em todos os
níveis, e isso incluía torná-lo um refúgio de paz e harmonia. Apesar de todos
os membros da família serem responsáveis por agradar aos deuses e espíritos,
cabia principalmente à mulher zelar para que os espíritos da família fossem res-
peitados. Os espíritos dos ancestrais e parentes eram homenageados durante o
festival da Parentália. Havia também as jubas (espíritos coletivos dos mortos) e
os lêmures (mortos na ira) homenageados e apaziguados no festival dos mortos
comunitário, chamado de Lemúria (origem do termo “lamúria”).

4.3 RELIGIÃO E ESTADO


O Estado romano patrocinou e incentivou crenças religiosas organizadas
em rituais padronizados. Durante o ano, havia festivais celebrando os deuses,
grandes feitos do passado ligados aos deuses e a colheita fornecida pela Providên-
cia. O maior festival do calendário romano foi a “Saturnália”, que honrava Saturno,
o deus agrícola. Ela foi celebrada, em alguns períodos, de 17 a 23 de dezembro e,
durante o festival, o trabalho era interrompido, o comércio fechava e todas as ativi-
dades eram suspensas. Era a única época do ano em que o chefe da família renun-
ciava a sua responsabilidade e o membro mais jovem da casa assumia o controle.
Todas as leis e rituais eram relaxados e os escravos eram autorizados a participar
das festividades como iguais. As pessoas vestiam roupas coloridas, decoravam
suas casas com flores, grinaldas e estatuetas de cerâmica e convidavam amigos e
familiares para festas e bebidas, enquanto as celebrações comunitárias recebiam
todos da vizinhança. Os presentes eram trocados, geralmente incluindo pequenas
figuras de Saturno como o doador de todos os presentes, e, no dia seguinte, todos
se recuperaram das festividades e voltavam à vida normal.

A celebração da Saturnália é a precursora da celebração de Natal. Os es-


tudiosos em geral concordam que Jesus, provavelmente, teria nascido na prima-
vera, mas a Igreja, de acordo com sua política de cristianizar as festas “pagãs”
populares, escolheu o dia 25 de dezembro para celebrar o nascimento de Jesus.
No entanto, a Saturnália foi a mais popular de muitas festas religiosas e serviu
para unir a sociedade romana em torno de um chefe de estado, como também de
um chefe de família: a família do povo romano.

4.3.1 Crenças e influências iniciais


As primeiras formas da religião romana eram de natureza animista. As
crenças baseavam-se em espíritos que habitavam tudo ao seu redor e em espíritos
de seus ancestrais. Inicialmente, uma tríade Capitolina (possivelmente derivada
de uma influência sabina) foi adicionada aos espíritos. A tríade era composta pelos
deuses Marte, o deus da guerra e suposto pai de Rômulo e Remo (fundadores de
Roma); Quirino, o deificado Rômulo que vigiava o povo de Roma; e, finalmente,
Júpiter, o deus supremo, que, juntamente com os espíritos, era adorado em um

173
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

templo no monte Capitolino. Mais tarde, com a influência dos etruscos, a tríade
mudaria para incluir Júpiter, que continuava sendo o deus supremo, Juno, sua
esposa e irmã, e Minerva, filha de Júpiter.

A existência de colônias gregas no Sul da Península italiana levou os romanos


a adotarem deuses gregos. Religião e mito se tornaram um só. Sob essa influência,
os deuses romanos se tornaram mais antropomórficos, com características humanas
de ciúme, amor, ódio etc. No entanto, a expressão individual de crença não era
importante, mas, sim, a adesão estrita a um conjunto rígido de rituais. As cidades
adotaram suas próprias divindades e realizavam seus próprios rituais. Templos
em homenagem aos deuses foram construídos por todo o império, porém, eram
considerados o “lar” do deus e o culto ocorria fora do templo.

Em Roma, não havia classe sacerdotal e, desde o tempo do imperador


Augusto, o imperador assumia o título de pontífice máximo ou sumo-sacerdote.
Além dos pontífices, havia os augúrios, indivíduos que liam as entranhas de animais
e o voo dos pássaros para interpretar presságios que transmitiam a vontade dos
deuses. Rituais elaborados eram realizados para trazer vitórias militares e nenhuma
declaração de guerra ou evento importante era realizada sem a aprovação clara dos
deuses. Com origem na época dos etruscos, um adivinho sempre era consultado,
pois era considerado perigoso ignorar os presságios. Spurinna, um adivinho
romano, previu a morte de Júlio César nas entranhas dos animais. O comandante
romano Públio Claudio Pulcro teve sua carreira militar destruída após uma derrota,
por ignorar os presságios durante a Primeira Guerra Púnica.

Com a expansão do império nos Bálcãs, na Ásia Menor e no Egito, a


religião romana absorveu muitos dos deuses e cultos das nações conquistadas,
mas os deuses gregos sempre seriam as referências mais importantes. Com
apenas algumas exceções, a maioria dos deuses romanos tinha seus homólogos
gregos. A mitologia romana teria uma influência significativa no império, política
e socialmente, bem como no legado romano.

4.4 SÉCULO IV: OS ROMANOS E A ARTE DA GUERRA


Si vis pacem, para bellum (“Se quer paz, prepare-se para a guerra”) Vegécio.

Ao longo dos séculos, as conquistas romanas são resultado de vários fato-


res. Roma tinha um exército numeroso, disciplinado, logística sofisticada, enge-
nheiros especializados e uma diplomacia eficiente. Além disso, por meio de uma
rede de aliados e uma política inclusiva para povos conquistados, os romanos re-
crutavam combatentes adicionais, navios e materiais vitais para suas campanhas.
Acima de tudo, Roma estava em contínuo estado de guerra porque acreditava
que, além de se defender, era preciso impor a outros povos o que os romanos
acreditavam ser sua superioridade cultural.

174
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

Na cultura romana, os valores marciais eram altamente considerados e a


guerra era uma fonte de prestígio cuja progressão na elite romana dependia de
carreira militar bem-sucedida. De fato, o conflito na cultura romana remonta às
origens de Roma e a luta mítica entre Rômulo e Remo. Portanto, a sede de guerra,
combinada com o que Políbio chamou de “recursos inesgotáveis em suprimentos
e homens”, tornaria Roma um inimigo terrível para os povos do Mediterrâneo
e além. No entanto, houve também momentos em que os romanos enfrentaram
inimigos formidáveis, como Cartago, a Pártia, as tribos germânicas ou mesmo os
próprios romanos em guerras civis.

Na República, a declaração de guerra estava, em teoria, nas mãos do povo,


mas, na prática, a decisão era tomada pelo Senado. A partir de Augusto, no Impé-
rio, a decisão passa a ser do Imperador. Uma vez decidida a ação militar, certos
rituais precisavam ser executados, como sacrifícios e adivinhações, com o intuito
de receber presságios favoráveis, e os rituais de suplicação, nos quais orações e
oferendas eram realizadas para os principais deuses.

FIGURA – 26 LEGIÕES ROMANAS

FONTE: <https://bit.ly/3uUjbP4>. Acesso em: 15 ago. 2020.

4.4.1 Estrutura dos exércitos romanos


Os exércitos romanos deixavam sua marca por onde passavam, abrindo
estradas, construindo depósitos e bases militares. As legiões romanas recrutavam
homens, entre 16 e 60 anos, e funcionavam como meio de romanização das po-
pulações nas terras conquistadas. Um ou dois cônsules conduziam a guerra no
campo de batalha, embora o comando também pudesse estar nas mãos de um
pretor ou pró-magistrado, que também podia comandar legiões separadamente.
Se ambos os cônsules estivessem presentes, trocavam de comando todos os dias.
No período imperial, o próprio imperador poderia liderar o exército. Tribunos e
Legados também podiam comandar uma legião ou destacamentos subsidiários e
cada manípulo de 200 homens era comandado por um centurião anterior e pos-
terior (o primeiro era sênior), resultando em cerca de 60 centuriões por legião.

175
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

DICAS

O termo latino legio significa “recrutamento”, que, por sua vez, tem origem
em legere (escolhido ou recrutado).

FONTE: https://tinyurl.com/y97p3nto. Acesso em: 22 dez. 2020.

No início do período republicano, a formação de tropas seguiu o exemplo


da Falange grega, mas, entre os séculos III e I a.C., as táticas das legiões mudaram.
A maior unidade do exército romano se tornou a “legião” com 4.200 homens,
divididos em 30 divisões ou manípulos, distribuídos em três linhas organizadas
como um tabuleiro de xadrez. À frente da legião, eram posicionados de 800 a 1.200
homens com armas leves, apoiados por 300 cavaleiros, geralmente formados pe-
los aliados de Roma. Esses dois grupos eram usados como uma tela de proteção
para as legiões de infantaria pesada e evitavam ataques inimigos nos flancos das
legiões. No século I a.C., ambos desapareceram das formações militares, mas a
cavalaria retornou no período imperial. Tropas mercenárias, especializadas com
habilidades que os romanos não possuíam, também poderiam ser empregadas,
como arqueiros e atiradores de Creta de Rodes.

Os manípulos eram móveis, disciplinados em sua formação, e podiam ro-


tacionar seu envolvimento com o inimigo para permitir a entrada de novas tropas
na batalha. A manobrabilidade era também facilitada pela adoção de armamento
mais leve, a espada curta ou gládio e o dardo pilum, em vez da lança pesada tra-
dicional e o escudo côncavo com cabo central. Além disso, os romanos entendiam
que o terreno poderia ser um fator importante para auxiliar ou dificultar os mo-
vimentos das tropas. Assim, a tropas também eram constantemente treinadas e
manobras de batalha complexas eram realizadas.

A partir do ano 100, o manípulo foi abandonado e a legião foi dividida em


10 coortes de 480 homens, que permaneceriam como a unidade tática romana bá-
sica. Nesse período, as legiões também assumiram nomes e identidades perma-
nentes. Em 167 a.C., havia oito legiões, mas, em 50 a.C., esse número havia subido
para cerca de 15 legiões. Augusto, em 31, criou, pela primeira vez, um exército
permanente e totalmente profissional, com uma estrutura central de comando e
logística, resultando em uma força permanente de 300 mil homens, abrindo cami-
nho para os enormes exércitos dos séculos posteriores, de 25 a 30 legiões, em todo
o Império. No ano 6, o imperador também criou um tesouro especificamente para
os militares (aerarium militare), que foi financiado por impostos e permitiu um
sistema de benefícios de aposentadoria. Outra política de Augusto era garantir a
lealdade, selecionando, cuidadosamente, militares para as posições de comando.

176
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

FIGURA 27 – FORMAÇÃO COMPLETA DE UMA LEGIÃO ROMANA EM BATALHA

FONTE: <https://tinyurl.com/yxr68hxe>. Acesso em: 15 ago. 2020.

• Recompensa e punição dos legionários romanos: os legionários romanos


faziam um juramento de lealdade (sacramentum) ao imperador. Era um ato
simbólico importante para garantir a lealdade e o espírito de corpo, pelos
quais os exércitos romanos se tornaram famosos desde o início da República
e que foram responsáveis por muitas vitórias no campo de batalha. A disci-
plina também era implementada através de um sistema de recompensas e
punições. Os soldados poderiam receber condecorações, dinheiro e promoção
por demonstrar coragem e iniciativa. No entanto, a falta de recompensas e
o serviço militar excessivamente longo, sem licença, podiam causar queixas
que, às vezes, se transformavam em motins. A punição era aplicada de várias
formas e poderia ser atribuída à dissidência (motim), mas também à covardia
em combate. Em particular, o castigo da dizimação (decimatio) era geralmente
reservado para casos de covardia. A punição era aplicada, por sorteio, em um
homem entre grupos de dez; os nove restantes o executavam por apedreja-
mento ou estrangulamento. Outras punições incluíam perda do espólio, do
pagamento ou do posto. As punições ainda podiam incluir flagelação, expul-
são desonrosa, escravidão ou mesmo execução. O princípio mandava que, ao
quebrar o juramento de lealdade, o soldado perdia todos os seus direitos.

NTE
INTERESSA

Um legionário romano treinava marchando 29 km em 5 horas. Posteriormen-


te, aumentava a distância marchando 34 km em 5 horas, em um único dia (a uma velo-
cidade média de 7 km/h). Nas marchas, os legionários levavam a sarcina (carga individual
levada por cada legionário) que consistia de: loculus (mochila), capa, panela, patera (mar-
mita) e rede. Além disso, também carregavam armadura, ferramentas, armas e escudo. No
total, nas marchas, um legionário romano carregava entre 30 e 40 kg.

FONTE: <https://tinyurl.com/y7gp9jrq>. Acesso em: 15 ago. 2020.

177
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

4.4.2 Estratégias
Os “Comentários” de Júlio César sobre a “Guerra Gálica” descreveram
a importância da logística, da determinação e da confiança na estratégia militar
romana. De modo análogo, Júlio César destacou a inovação, o patriotismo e a
disciplina em seus efeitos positivos no moral das tropas. Além disso, ele ressaltou
o papel fundamental da inteligência para obter informações do inimigo antes da
batalha. Os comandantes podiam manter (como o próprio César) um consilium
ou conselho de guerra com seus oficiais, para apresentar e discutir estratégias de
ataque e utilizar a experiência dos veteranos. Ao longo dos séculos, os romanos
experimentaram vitórias e derrotas, mas é interessante observar que os coman-
dantes, geralmente, não eram responsabilizados e a culpa, invariavelmente, re-
caía sobre os soldados. De qualquer forma, seria uma combinação de todos esses
fatores que garantiria o domínio militar romano por séculos.

Os comandantes romanos, quase sempre, preferiam um ataque decisivo e


frontal (sempre precedido por um reconhecimento adequado, feito por uma van-
guarda de observação de tropas exploradoras). Estratégia e táticas, como aterrori-
zar a população e vingança, misturavam-se a clemência e acordos com o inimigo.
A partir do século I a.C., houve um aumento no uso de fortificações, entrincheira-
mento e cercos no campo de batalha. Após o século III, a defesa das fronteiras do
Império tornou-se uma prioridade, o que resulta na fortificação das cidades e a mo-
bilização de unidades menores de soldados (vexillationes), entre 500 e 1.000 homens.
Tal estratégia foi consequência das táticas de guerrilhas empregadas pelos inimigos
dos romanos para evitar um choque direto com as poderosas legiões romanas. Júlio
César também foi um grande defensor dos cercos porque esses minavam a resistên-
cia inimiga e pressionavam a população a aceitar o domínio romano.

Uma das táticas utilizadas pelos legionários era Repellere équites (tática de
repelir cavaleiros), ao formar um quadrado cerrado com escudos combinados
com lanças (Figuras 28). Outra tática era a formação testudo ou da tartaruga, usa-
da principalmente em cercos.

FIGURA 28 – TÁTICA DA LEGIÃO ROMANA: REPELLERE ÉQUITES

FONTE: <https://bit.ly/3yjiReU>. Acesso em: 15 ago. 2020.

178
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

FIGURA 29 – TÁTICA DA LEGIÃO ROMANA: FORMAÇÃO TESTUDO OU DA TARTARUGA

FONTE: <https://tinyurl.com/y9g3t4yq>. Acesso em: 21 dez. 2020.

4.4.3 Logística
O exército imperial marchava em uma ordem impecável e o aparato militar
romano incluía cavalaria, arqueiros, auxiliares, artilharia, porta-estandartes, trom-
petistas, servos, mulas de bagagem, ferreiros, engenheiros, topógrafos e construto-
res de estradas. Ao chegar ao seu destino, os romanos construíam um acampamen-
to fortificado e, graças a uma logística eficiente, eram abastecidos sem depender
dos recursos locais. Quando os suprimentos chegavam ao acampamento, eram ar-
mazenados em um celeiro (hórreo), construído sobre palafitas e bem ventilado, para
conservar bens perecíveis. Esses depósitos eram protegidos pelos gatos contra seus
principais inimigos, os ratos – pela mesma razão, os gatos também eram usados
em navios. O emprego de médicos (medici) e assistentes médicos (capsarii), ligados
às unidades militares, foi uma inovação do período imperial. Até mesmo hospitais
(valetudinarium) eram construídos dentro dos campos fortificados.

4.4.4 Guerra Naval


A estratégia naval romana diferia pouco dos métodos empregados pelos
gregos. Os navios eram movidos por remadores e sua função principal era trans-
portar tropas, mas, quando ocorriam batalhas navais, os navios se transformavam
em armas, usando seus aríetes, envoltos em bronze, fixados na proa do navio. Os
romanos já haviam empregado navios na República, mas foi por volta de 260 a.C.
que eles construíram uma frota de 100 quinqueremes e 20 trirremes, em resposta
à ameaça de Cartago. Os quinqueremes, com cinco bancos de remadores, estavam
equipados com uma ponte móvel na proa, chamada de corvus (corvo), usada para
perfurar e prender embarcações inimigas, para que fossem abordadas pelos legio-
nários. Os romanos conseguiram derrotar a frota cartaginesa, principalmente por-
que foram capazes de substituir navios e homens perdidos mais rapidamente.

Em 31 a.C., ocorreu a grande batalha naval perto de Áccio, entre as frotas


de Otaviano contra Marco Antônio e Cleópatra. Após a vitória, o novo imperador,
Augusto, criou duas frotas, a classis Ravennatium, com sede em Ravenna, e a clas-
sis Misenatium, com base em Miseno, que operou até o século IV. Havia também

179
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

frotas baseadas em Alexandria, Antióquia, Rodes, Sicília, Líbia e Grã-Bretanha,


além de uma no rio Reno e outras duas no rio Danúbio. Essas frotas permitiram
que Roma respondesse rapidamente a qualquer necessidade militar em todo o
império e abastecesse o exército em suas várias campanhas.

As frotas eram comandadas por um prefeito (praefectus) designado pelo


imperador. O capitão de um navio possuía patente de centurião ou o título de
trierarca. As frotas eram baseadas em portos fortificados, como Portus Julius, na
Campânia, que incluía portos artificiais e lagoas conectadas por túneis. As tripu-
lações de navios de guerra romanos eram, na realidade, mais soldados do que
marinheiros, pois eles deveriam atuar como tropas terrestres quando necessário.
Eram tipicamente recrutados nas classes mais pobres, mas também podiam in-
cluir prisioneiros de guerra e escravos.

FIGURA 30 – TRIRREMES DA SEGUNDA GUERRA PÚNICA

FONTE: <https://bit.ly/3hsXpy1>. Acesso em: 15 ago. 2020.

4.4.5 Os espólios do vencedor


As vitórias nos campos de batalha aumentavam o território e as riquezas, o
que forçava os inimigos a aclamar por paz. Roma, assim, mandava uma mensagem
inequívoca para seus inimigos: Roma não apenas defenderia suas fronteiras, mas
a máquina de guerra romana era movida por uma sede insaciável por conquistas.

Os rituais consagrados à vitória, durante a República, incluíam a oferenda


das armas, capturadas ao inimigo, aos deuses, especialmente a Marte, Minerva
e Vulcano. Além disso, os comandantes vitoriosos retornaram como heróis em
uma grande procissão pelas ruas de Roma. Esse desfile se chamava “triunfo” e
iniciava com o comandante entrando na cidade em uma carruagem, seguida por
uma suntuosa procissão, que incluía cativos, tesouros, como ouro e obras de arte,
e até animais exóticos das terras conquistadas.

O general, que passava a ser chamado de vir triumphalis (homem triunfa-


dor), desfilava em uma toga colorida (toga picta), uma túnica púrpura com borda-
dos em ouro (tunica palmata), segurava um cetro de marfim e tinha, atrás dele, um
escravo segurando uma coroa de ouro sobre sua cabeça e sussurrando: “Respice
post te. Hominem te esse memento. Memento mori” (“Olhe ao seu redor. Não se es-
180
TÓPICO 2 — INTRODUÇÃO À ORIGEM DE ROMA

queça de que você é apenas um homem. Lembre-se de que um dia você vai mor-
rer”). Do período imperial em diante, apenas os imperadores podiam desfrutar
do “triunfo”, mas, na ocasião, a prática tinha se tornado menos frequente.

Os comandantes vitoriosos também usavam os despojos da guerra para em-


belezar Roma, por exemplo, o teatro de Pompeu, o fórum de Augusto e o Coliseu
de Vespasiano. Outras obras arquitetônicas celebratórias incluíam obeliscos e co-
lunas, mas, talvez, o monumento mais impressionante da vaidade militar romana
tenha sido o Arco do Triunfo, sendo o de Constantino I o maior e mais elaborado.

Os gastos com a máquina militar eram o que mais pesava no orçamento


do estado romano. Entretanto, a guerra produzia riquezas e escravos indispensá-
veis para os romanos e, em um período posterior, a guerra passou a ser defensiva,
para garantir a sobrevivência da civilização romana. Os sucessos militares asse-
guravam à civilização romana riquezas e estabilidade, mas as derrotas, muitas
vezes, abalavam as estruturas romanas e provocavam instabilidade. Todavia, ao
longo de muitos séculos e em três continentes, os romanos demonstraram a efi-
cácia de um exército bem treinado, disciplinado e liderado por comandantes ta-
lentosos. Após o fim da civilização romana, muito tempo depois surgiu uma má-
quina militar de escala e profissionalismo semelhantes à criada pelos romanos.

FIGURA 31 – TRIUNFO ROMANO

FONTE: <https://bit.ly/3ePA4Vw>. Acesso em: 15 ago. 2020.

NOTA

Como visto, a Civilização Romana durou cerca de mil anos, período em que
Roma, a partir de uma cidade fundada à margem do rio Tibre, na Península Itálica, se tor-
nou a capital de um império de proporções e sofisticação inéditas até então. Os romanos,
como será visto no Tópico 3, deixaram um imenso legado em praticamente todas as áreas
conhecimento, que permanece vivo entre nós e cuja perenidade atestam, de forma inso-
fismável, sua importância cardinal.

181
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

DICAS

Uma sugestão de leitura são os dois volumes do livro História de Roma, pu-
blicado pela Universidade de Coimbra, em Portugal, que pode ser acessada por meio do
Google Books: https://bit.ly/3wi32mZ e https://bit.ly/3tRv86D.

182
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A origem de Roma tem um aspecto envolto em lendas, como a lenda de Rô-


mulo e Remo e outros mitos fundadores relacionados à cultura grega.

• Inicialmente, Roma organiza-se politicamente no regime republicano.

• As instituições políticas foram fundamentais para a longa duração da civili-


zação romana.

• O prestígio e a liderança política em Roma eram conquistados através da guerra.

• Júlio César, por meio de seus feitos militares, tornou-se ditador e, mais tarde,
imperador.

• A sociedade e a política, em Roma, se baseavam no poder patriarcal.

• A luta dos plebeus terminou com a conquista de direitos antes reservados aos
patrícios.

• No período imperial, Roma alcança sua expansão máxima com a dinastia ner-
va-antonina.

• A sociedade romana era estratificada e tensões sociais e conflitos ocorreram


em diversas ocasiões ao longo de sua história.

• A divisão de um império tão vasto e com partes culturalmente diferentes se


concretizou no século III.

• As invasões dos povos germânicos e conflitos internos causaram a queda do


Império Romano no Ocidente.

• O Império Romano do Oriente ou Bizantino durou até o século XV, quando


foi conquistado pelos turcos otomanos.

183
AUTOATIVIDADE

1 A adoção de mitos de criação era comum nas sociedades antigas para esta-
belecer uma origem divina, que justificasse não apenas o domínio de uma
elite dominante, mas também o domínio sobre outros povos. Roma não foi
diferente e adotou um mito criador. Analise as sentenças a seguir:

I- A fundação de Roma se fundamenta no mito de Prometeu.


II- A fundação de Roma se fundamenta no mito de Pandora.
III- A fundação de Roma se fundamenta na lenda dos irmãos Rômulo e Remo.
IV- A fundação de Roma se fundamenta na narrativa, de origem grega, do
mito de Evandro.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Apenas as sentenças I e IV estão corretas.


b) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
c) ( ) Apenas as sentenças III e IV estão corretas.
d) ( ) Apenas as sentenças I e IV estão corretas.

2 Dois políticos romanos, no século II, tentaram realizar uma reforma agrária,
além de outras reformas sociais em benefício dos segmentos mais vulnerá-
veis na sociedade romana. Eles eram tribunos, eleitos pela plebe, e acabaram
sendo vítimas dos senadores insatisfeitos com as medidas propostas. Quem
eram os tribunos romanos proponentes das reformas revolucionárias?

a) ( ) Júlio César e Brutus.


b) ( ) Tibério e Caio Graco.
c) ( ) Constantino e Trajano.
d) ( ) Marco Antonio e Otávio.

3 O ______________, antes uma religião perseguida, se tornou, no


____________, a religião oficial do Império Romano. Os papéis se inverte-
ram e os cultos religiosos tradicionais romanos foram gradualmente extin-
tos. O imperador _________________, em particular, percebeu no cristianis-
mo a oportunidade de unir o império e reforçar seu poder.

Assinale a alternativa que preenche as lacunas na sequência CORRETA:

a) ( ) Paganismo; século III; Augusto Severo.


b) ( ) Judaísmo talmúdico; século V; Constantino II.
c) ( ) Catolicismo romano; século VI; Magêncio.
d) ( ) Cristianismo; século IV; Constantino.

184
TÓPICO 3 —
UNIDADE 3

LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, abordaremos o legado das civilizações grega e romana, que


contribuiu decisivamente para a fundação de outras civilizações que surgiram no
entorno do Mar Mediterrâneo e na Europa propriamente dita. Assim, conhecere-
mos as principais inovações e contribuições de gregos e romanos para a região.

2 LEGADO DA CIVILIZAÇÃO GREGA


Aos gregos antigos, atribuem-se as fundações da cultura ocidental como
resultado de suas contribuições inovadoras no esporte, na medicina, na arquite-
tura e na política, entre outros campos de conhecimento. A seguir, serão destaca-
das algumas invenções gregas que permanecem relevantes no mundo contempo-
râneo (BRENDAN, 2009).

FIGURA 32 – O MUNDO DE ACORDO COM HECATEU DE MILETO (550-476 A.C.) GEÓGRAFO


GREGO DO PERÍODO CLÁSSICO QUE APRESENTOU MELHORIAS EM RELAÇÃO AO MAPA
ANTERIOR DE ANAXIMANDRO

FONTE: <https://tinyurl.com/y7z6q72m>. Acesso em: 18 dez. 2020.

185
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

2.1 INVENÇÕES E INOVAÇÕES DO PERÍODO CLÁSSICO


GREGO
A seguir, destacamos duas inovações advindas do período Clássico grego:
a arquitetura (colunas e estádios) e as esculturas humanas como arte.

2.1.1 Arquitetura: colunas e estádios


Atualmente, em praticamente qualquer cidade do mundo ocidental, po-
demos encontrar exemplos da arquitetura grega nas ruas e, especialmente, nas
construções. As colunas dóricas, iônicas e coríntias, talvez, sejam as contribuições
arquitetônicas mais comuns que sustentam telhados e adornam fachadas em tea-
tros, tribunais e prédios governamentais em todo o mundo. Os gregos as usavam
em seus templos, muitos dos quais ainda existem apesar de guerras, terremotos
e incêndios. O Partenon, construído em 432 a.C., é o remanescente maior e mais
famoso da arquitetura da Grécia Antiga. O “estoa” (pórtico), com colunatas, que
protegia dos elementos climáticos, o ginásio com banheiros e campos de treina-
mento, o teatro semicircular com fileiras crescentes de assentos e o estádio retan-
gular para esportes são apenas algumas das características da arquitetura grega
encontradas em qualquer cidade moderna.

FIGURA 33 – INFLUÊNCIA ARQUITETÔNICA DA GRÉCIA ANTIGA: O CAPITÓLIO, SEDE DO


CONGRESSO DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

FONTE: <https://bit.ly/3uUWlXD>. Acesso em: 28 jul. 2020.

2.1.2 Escultura Humana em Arte


Na Arte, as inovações gregas podem ser percebidas na escultura de fi-
guras humanas. As culturas anteriores e contemporâneas aos antigos gregos re-
presentavam a figura humana em uma posição estática. No entanto, escultores
gregos desenvolveram uma técnica mais dinâmica. No período arcaico, a postura
tornou-se um pouco mais relaxada, os cotovelos um pouco mais flexionados su-
gerindo tensão e movimento. No período clássico, as estátuas romperam com

186
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

todas as convenções e se tornaram figuras sensuais e contorcidas, que parecem


saltar do plinto (pedestal). A escultura e a arte gregas, em geral, priorizam a pro-
porção, o equilíbrio e a perfeição idealizada do corpo humano. Essas caracterís-
ticas seriam continuadas pelos romanos e, posteriormente, influenciariam a arte
renascentista (BRENDAN, 2009).

FIGURA 34 – FAMÍLIA ATENIENSE

FONTE: <https://tinyurl.com/zedqxze>. Acesso em: 28 jul. 2020.

2.2 A DEMOCRACIA GREGA


Para os antigos gregos, os cidadãos deveriam ter direito de escolher seus
governantes e, mais importante, essa contribuição devia ser direta e pessoal. Con-
sequentemente, em algumas cidades-estados gregas como Atenas, nos séculos
V-IV a.C., os cidadãos (homens livres com mais de 18 anos) podiam participar
ativamente do governo ao comparecerem à assembleia pública para falar, ouvir e
votar. A assembleia ateniense tinha capacidade para 6 mil pessoas. Uma votação
majoritária simples era calculada pela contagem das mãos levantadas.

Além da ideia de democracia direta, todos os cidadãos podiam, e, de fato,


se esperava, participar do governo, servindo como magistrados ou em qualquer
cargo oficial. Entretanto, qualquer pessoa que viesse a abusar de sua posição pú-
blica, que geralmente era apenas temporária, poderia ser expulsa da cidade no
voto secreto, conhecido como “ostracismo”.

Como parte do aparato democrático, o sistema de júri foi estabelecido,


ou seja, o princípio pelo qual os acusados de crimes tinham que ser julgados por
seus pares. Atualmente, dependendo do país, um sistema de jurados geralmente
consiste em um número determinado de pessoas, mas, na antiga Atenas, era a
assembleia inteira e cada membro era escolhido aleatoriamente usando um siste-
ma chamado de kleroterion. O dispositivo distribuía fichas, aleatoriamente, e, se
alguém pegasse um preta, teria que ser jurado naquele dia. O sistema garantia
que ninguém soubesse, antecipadamente, quem seria jurado do dia, não sendo,
portanto, possível tentar subornar ou influenciar as decisões. Em um sistema cui-
dadosamente elaborado, os jurados eram até compensados por suas despesas.
187
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 35 – KLEROTERION: O SISTEMA GREGO PARA SORTEIOS

FONTE: <https://tinyurl.com/y6r3hrox>. Acesso em: 22 jul. 2020.

DICAS

O Kleroterion era um dispositivo de pedra com buracos no formato de linhas


verticais, um tubo de madeira e algumas bolas. Assim, os cidadãos elegíveis que se apre-
sentavam para assumir determinadas posições entregavam fichas de bronze nos quais
seus nomes estavam inscritos. Essas fichas eram inseridas nos espaços da pedra e, quando
estavam todos preenchidos, as bolas pretas e brancas eram introduzidas no tubo, que
terminava com um dispositivo acionado por uma manivela. Toda vez que a manivela dava
uma volta, uma bola saía. Se fosse preta, a primeira fila de cartões era retirada, o que signifi-
cava que os cidadãos cujos nomes apareciam nelas não participariam naquela ocasião. Se
a bola era branca, a fila de fichas permanecia no lugar e, assim, era selecionado o primeiro
grupo de eleitos, para, então a seleção dar continuidade.

FONTE: <https://tinyurl.com/y8lanaxg>. Acesso em: 18 dez. 2020.

2.3 ENGENHARIA E DISPOSITIVOS MECÂNICOS


Os gregos construíram dispositivos mecânicos que permitiram mover pedaços
maciços de mármore usando o bloco e o equipamento, guincho e guindaste para seus
enormes templos e muralhas da cidade. Eles criaram túneis nas montanhas, como o
túnel de um quilômetro, em Samos, construído no século VI a.C. Os aquedutos e os
moinhos de água também são exemplos de engenharia criativa dos gregos, seja des-
viando água para onde ela era mais necessária ou aproveitando a força da natureza.

No entanto, área de maior inovação dos gregos tenha sido a produção, em


pequena escala, de dispositivos mecânicos. À lendária figura de Dédalo, arquiteto
do labirinto do rei Minos, atribui-se a habilidade de criar autômatos reais e todo
tipo de maravilhas mecânicas. Dédalo pode nunca ter existido, mas as lendas ao
seu redor indicam o amor grego por todas as coisas magicamente mecânicas. Os
dispositivos gregos incluíam:

188
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

• relógio de sol portátil de Parmenião, feito de anéis (400-330 a.C.);


• despertador de água, creditado a Platão (428-424 a.C.), que usava água que
caía através de vários vasos de barro que, eventualmente, causavam ar pressão
para soar um apito;
• anemoscópio de Timosthenes, no século III a.C., para medir a direção do vento;
• órgão hidráulico do século III a.C., de Ktesibios;
• hodômetro, que media distâncias terrestres usando uma roda e rodas dentadas;
• aríete suspenso, para derrubar os portões inimigos;
• lança-chamas com um fole e um caldeirão de líquido inflamável que os
boeotianos usavam com tanto efeito na Guerra do Peloponeso.

2.4 RACIOCÍNIO MATEMÁTICO E GEOMETRIA


Outros povos demonstraram grande interesse pela Matemática, mas, tal-
vez, a única contribuição dos gregos tenha sido a sua aplicação a problemas prá-
ticos. Para os gregos, a Matemática era inseparável da Filosofia, da Geometria, da
Astronomia e da ciência em geral. A grande conquista grega foi a ênfase no raciocí-
nio dedutivo na formulação de uma conclusão logicamente certa. Tales de Mileto,
por exemplo, analisou seus números para prever com precisão o eclipse solar de 28
de maio de 585 a.C. e, a ele, é creditado o cálculo da altura das pirâmides com base
no comprimento de suas sombras. Sem dúvida, o matemático grego mais famoso
foi Pitágoras (571-497 a.C.), com o teorema geométrico que ainda leva seu nome,
que define que, em qualquer triângulo retângulo, o quadrado do comprimento da
hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos comprimentos dos catetos.

NTE
INTERESSA

O teorema de Pitágoras leva o nome do matemático grego Pitágoras (570-495


a.C.), que tradicionalmente é creditado pela sua descoberta e demonstração, embora se
argumente que o conhecimento do teorema seja anterior (há muitas evidências de que ma-
temáticos babilônicos conheciam algoritmos para calcular os lados em casos específicos,
mas não se sabe se conheciam um algoritmo tão geral quanto o teorema de Pitágoras).

FONTE: <https://tinyurl.com/y82gkqxr>. Acesso em: 18 dez. 2020.

189
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 36 – TEOREMA DE PITÁGORAS: A SOMA DAS ÁREAS DOS QUADRADOS CONSTRUÍ-


DOS SOBRE OS CATETOS (A E B) EQUIVALE À ÁREA DO QUADRADO CONSTRUÍDO SOBRE A
HIPOTENUSA (C)

FONTE: <https://tinyurl.com/y82gkqxr>. Acesso em: 18 dez. 2020.

2.5 MEDICINA
Os gregos consideravam a doença um castigo divino, embora, a partir do
século V a.C., tenha sido adotada uma abordagem mais científica e, tanto o diag-
nóstico quanto a cura, se tornaram mais precisos. Os sintomas e sua cura eram cui-
dadosamente observados, testados e registrados. Dieta, estilo de vida e constituição
individual foram todos reconhecidos como fatores importantes para o diagnóstico
da doença. Tratados médicos foram escritos, sendo os mais famosos elaborados por
Hipócrates (V-IV a.C.). Uma melhor compreensão do corpo humano aconteceu a
partir do estudo e da observação de soldados feridos, que mostrou, por exemplo, a
importância de se observar as diferenças entre artérias e veias, embora a dissecção
de seres humanos só tenha ocorrido no período Helenístico (III-II a.C.). Os me-
dicamentos foram aperfeiçoados com ervas, enquanto o aipo era conhecido por
ter propriedades anti-inflamatórias, a clara de ovo por ajudar a cicatrizar feridas
e o ópio por proporcionar alívio da dor ou funcionar como anestésico. Apesar de
a cirurgia ter sido evitada e ainda houvesse muitas explicações absurdas, pelos
padrões modernos, sem mencionar uma forte conexão com a religião, os médicos
gregos contribuíram, consideravelmente, para o avanço da medicina.

2.6 JOGOS OLÍMPICOS


As competições esportivas já eram conhecidas, na Idade do Bronze, nas
civilizações minoica e micênica do Egeu. Entretanto, foi na Grécia, no período
arcaico, que nasce um evento esportivo que se tornaria tão importante ao ponto
de ser usado como referência para o calendário. Os primeiros Jogos Olímpicos fo-
ram realizados em meados de julho, em 776 a.C., em Olímpia, em homenagem ao
deus grego Zeus. A cada quatro anos, a partir de então, atletas e espectadores se

190
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

reuniam em todo o mundo grego para realizar grandes feitos esportivos e ganhar
favores dos deuses. As últimas Olimpíadas antigas ocorreram, em 393 d.C., após
293 olimpíadas consecutivas.

FIGURA 37 – LUTADORES OLÍMPICOS DE 510 A.C.

FONTE: <https://tinyurl.com/y5to8zd7>. Acesso em: 28 jul. 2020.

Durante as Olimpíadas, estabelecia-se uma trégua em todos os conflitos,


amplamente respeitada para permitir que participantes e espectadores viajassem
em segurança para Olímpia. No início, havia apenas um evento: o estádio, que era
uma corrida, a pé, em um circuito do estádio (cerca de 192 m), no qual cerca de 45
mil espectadores, do sexo masculino, se reuniam para torcer pelo seu favorito. O
evento ficou cada vez maior ao longo dos anos, com corridas mais longas adiciona-
das à competição e novos eventos realizados, como arremesso de disco, boxe, pen-
tatlo, luta-livre, corridas de carruagens e até competições de trompetistas e arautos.

Juízes especialmente treinados supervisionavam os eventos e aplicavam


penalidades a quem infringisse as regras. Os vencedores recebiam uma coroa de
folhas de oliveira e glória, e talvez, alguma recompensa para sua cidade natal. Em
1896, os Jogos Olímpicos foram revividos e incorporados, desde então, ao nosso
tempo como um evento global, embora tiveram que durar mais mil anos para se
igualarem à longevidade de sua versão original na Grécia Antiga.

2.7 FILOSOFIA
Os grandes pensadores gregos abordaram questões que intrigavam os se-
res humanos. Figuras como Sócrates, Platão e Aristóteles, nos séculos V-IV a.C.,
questionaram e debateram, incessantemente, de onde viemos, como evoluímos,
para onde iríamos e se deveríamos nos preocupar com essas questões. Por exem-
plo, no século VI a.C., Anaximandro sugere que o universo é eterno e infinito e a
origem de todas as coisas finitas.

191
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

FIGURA 38 – BUSTO DE ARISTÓTELES EM MÁRMORE, CÓPIA ROMANA DE UM ORIGINAL GREGO


EM BRONZE POR LÍSIPO, ANO DE 330; O MANTO EM ALABASTRO É UMA ADIÇÃO MODERNA

FONTE: <https://tinyurl.com/y2wxbblr>. Acesso em: 28 jul. 2020.

Coletivamente, todos esses pensadores ilustram um fator comum: o desejo


de responder a perguntas, independentemente da dificuldade. Os filósofos gregos
também não se limitaram a respostas teóricas, pois muitos também eram físicos, bi-
ólogos, astrônomos e matemáticos. A abordagem e a contribuição dos gregos para
a Filosofia, em geral, estão resumidas na afirmação de Parmênides (530-460 a.C.):
como não se pode confiar nos sentidos, deve-se usar o raciocínio para cortar a né-
voa da superstição e do mito e usar quaisquer ferramentas, à nossa disposição, para
encontrar as respostas que procuramos. Talvez, não tenhamos avançado muito nas
soluções justamente porque os pensadores gregos foram capazes de fornecer tantas
respostas. Contudo, certamente, a maior e mais duradoura contribuição dos gregos
antigos para a humanidade, além de todo legado de conhecimento, tenha sido o
espírito ilimitado de investigação (WATERFIELD, 2009).

2.8 CIÊNCIA E ASTRONOMIA


Como no campo da Filosofia, os sábios gregos estavam interessados em
encontrar soluções que explicassem o mundo ao seu redor. Todos os tipos de te-
orias foram propostos, testados e debatidos, como o fato de a Terra ser redonda e
girar em torno do sol, e não o contrário, a Via Láctea ser composta por estrelas e a
Humanidade ter evoluído de outras formas de vida etc. – são apenas algumas das
ideias que os pensadores gregos contemplavam na época. Arquimedes (287-212
a.C.), durante um banho, descobriu o deslocamento e exclamou “Eureka!”. Aris-
tóteles (384-322 a.C.) desenvolveu a lógica e classificou o mundo natural. Erastós-
tenes (276-195 a.C.) calculou a circunferência do globo a partir das sombras pro-
jetadas por objetos em duas latitudes diferentes. Ressalta-se, mais uma vez, que
não foram as descobertas individuais que foram importantes, mas, sim, a crença
geral de que todas as coisas podiam ser explicadas pelo raciocínio dedutivo e
pelo exame cuidadoso das evidências disponíveis.

192
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

NTE
INTERESSA

A palavra “Eureka” foi supostamente pronunciada pelo cientista grego Arqui-


medes (287-212 a.C.), quando descobriu como resolver um dilema complexo apresentado
pelo rei Hierão. O rei queria saber o volume de ouro em sua coroa. Arquimedes sabia que,
para isso, ele precisaria calcular a densidade da coroa e comparar com a densidade do
ouro. O problema era como medir o volume da coroa sem a derreter. Arquimedes desco-
briu a solução quando entrou numa banheira com água e observou que o nível da água
subia quando ele entrava. Concluiu, então, que para medir o volume da coroa bastava
mergulhá-la em água e calcular o volume de água deslocado. Conta-se que ele saiu nu,
correndo pelas ruas e gritando eufórico: “Eureka! Eureka!” (“Achei! Achei!”) – a descoberta
desse grande cientista grego ficou conhecida como “O Princípio de Arquimedes”.

FONTE: <https://tinyurl.com/yceh3fyq>. Acesso em: 18 dez. 2020.

2.9 TEATRO
Em Atenas, no século VI, os gregos inventam a performance teatral. As
tragédias gregas tinham origem no recital de poemas épicos ambientados em mú-
sicas ou rituais que envolviam música, dança e máscaras em homenagem a Dioní-
sio, o deus do vinho. Essas tragédias, populares e gratuitas, foram apresentadas,
inicialmente, em festivais religiosos e interpretadas por atores profissionais em
teatros ao ar livre. As peças clássicas não eram apenas um passatempo fugaz, mas
eram parte essencial da educação do ateniense.

Nas tragédias, o público era envolvido nas reviravoltas do enredo, apresen-


tadas em contos da mitologia grega, e nas situações dramáticas com personagens
heroicos. O elenco era limitado, mas o coro acrescentava o componente musical ao
espetáculo. No teatro grego, notadamente na comédia, os políticos e filósofos, entre
outros, eram criticados e os dramaturgos tornaram os espetáculos mais sofisticados
com coreografias, figurinos exóticos e efeitos especiais, como atores pendurados
em fios ocultos. De forma análoga a tantos outros ramos de conhecimento, a in-
dústria do entretenimento moderna tem uma dívida com os antigos gregos. Espe-
cificamente sobre a base da dramaturgia moderna, o teatro grego contribuiu com a
utilização de cenários, de elementos e de figurinos diversos, da música, da mímica
e da dança, e, por fim, com o enredo, os atores, com a plateia e as encenações.

193
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

NTE
INTERESSA

Foi na Grécia que surgiu a dramaturgia com Téspis, que também representou,
pela primeira vez, o deus Dionísio, criando o ofício de ator. Também na Grécia antiga sur-
giram dois gêneros do teatro: a tragédia e a comédia. Nas tragédias gregas, os temas eram
ligados às leis, à justiça e ao destino. Nesse gênero, eram contadas histórias que quase
sempre terminavam com a morte do herói. Os autores de tragédia grega mais famosos fo-
ram Ésquilo, Sófocles e Eurípedes. Ao contrário da tragédia, na comédia grega as histórias
visavam o riso do espectador, eram formas engraçadas de perceber a vida chamadas sáti-
ras. Um grande autor de comédia grega foi Aristófanes. Todos esses autores influenciaram
muito o teatro que veio depois e suas peças são encenadas até hoje.

FONTE: <https://tinyurl.com/yae87rd9>. Acesso em: 18 dez. 2020.

FIGURA 39 – MÁSCARAS DO TEATRO GREGO

FONTE: <https://tinyurl.com/y5o6hth6>. Acesso em: 28 jul. 2020.

3 LEGADO DA CIVILIZAÇÃO ROMANA


O legado do Império Romano é abrangente e significativo, comparável ao
de outras civilizações da Antiguidade clássica, como a persa, a egípcia, a grega ou
a chinesa. O próprio Império Romano, construído sobre o legado de outras cultu-
ras, como a Grécia Antiga, deixou uma herança considerável, que inclui aspectos
culturais, leis, crenças religiosas e avanços tecnológicos. Esse legado sobreviveu ao
fim do próprio império e passou a moldar outras civilizações em um processo que
continua até hoje. A cidade de Roma era a civitas (refletida na etimologia da palavra
“civilização”), matriz da civilização ocidental e das culturas subsequentes.

194
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

3.1 O LATIM
O latim, idioma da Roma antiga, permanece, em uso, na Idade Média,
pela Igreja Católica Romana, como latim eclesiástico e o latim vulgar, enquanto a
língua comum, dá origem as línguas românicas (principalmente italiano, francês,
espanhol, português e romeno).

FIGURA 40 – REGIÃO DE ORIGEM DO LATIM NA PENÍNSULA ITÁLICA

FONTE: <https://bit.ly/3eQv6b5>. Acesso em: 22 dez. 2020.

NOTA

O latim é uma língua clássica pertencente ao ramo itálico das línguas indo-
-europeias. Era originalmente falado na área ao redor de Roma, na região central da atual
Itália (como demonstrado na figura a seguir), conhecida como Latium. Como resultado da
expansão inicial da República Romana, tornou-se a língua dominante na península italiana
e, posteriormente, em todo o Império Romano ocidental.

195
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

LÍNGUAS ROMÂNICAS NA EUROPA CONTEMPORÂNEA

FONTE: <https://tinyurl.com/cytplow. Acesso em: 22 dez. 2020.

As cinco línguas românicas mais faladas por número de falantes nativos


são: espanhol (480 milhões), português (270 milhões), francês (77 milhões), italia-
no (65 milhões) e romeno (24 milhões). Das principais línguas românicas, o italia-
no é a mais próxima do latim, seguida pelo espanhol, romeno e português, sendo
a mais divergente o francês. No entanto, todas as línguas românicas estão mais
próximas umas das outras do que do latim clássico. Os mais de 900 milhões de
falantes nativos de línguas românicas são encontrados em todo o mundo, princi-
palmente nas Américas, Europa e partes da África.

3.2 GOVERNANÇA
Uma das mais importantes contribuições romanas para a organização po-
lítica dos estados foi a separação dos poderes em Executivo, Legislativo e Judi-
ciário, bem como a harmonia existente entre eles. No ramo Executivo de Roma,
durante a República, os responsáveis eram os cônsules, no Legislativo, as assem-
bleias e, no Senado Romano e juízes, o Judiciário. Embora Atenas, na Grécia, seja
o berço da democracia, foi em Roma que esse conceito se desenvolveu. O modelo
de governo e o conceito de república democrática e representativa seriam adota-
dos por quase todos os Estados modernos.

196
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

3.3 DIREITO ROMANO


O princípio de que todos eram iguais perante a lei, independentemente de
sua classe social, também é uma inovação romana, assim como o julgamento por
júri, direitos civis, testamentos pessoais e corporações empresariais. As Doze Tábuas
tratavam de aspectos específicos da lei, bem como de penalidades, tendo sido expan-
didas sob o reinado de Justiniano I (527-565 DC) em 50 livros de leis denominados
de “Pandetos”, mais conhecidos hoje como o Digesto, que foi perdido com a queda
de Roma e só foi descoberto na Idade Média (1070), quando se tornou a base para as
leis da Europa. O direito romano e a política republicana (desde a época da República
Romana) deixaram um legado duradouro, influenciando as repúblicas nas cidades-
-estados italianas no período medieval e as repúblicas democráticas modernas.

3.4 TECNOLOGIA E ENGENHARIA


Engenharia, ciências, arte e arquitetura seguem o mesmo padrão e mui-
tos dos itens comuns, hoje em dia, foram inventados ou desenvolvidos pelos ro-
manos. A estrada romana é o exemplo mais famoso, mas os romanos também
inventaram o concreto (embora haja a crença de ser uma invenção moderna) que
secava rapidamente e era muito mais resistente do que o concreto usado na atu-
alidade. A resistência excepcional do concreto romano possibilitou a construção
de aquedutos e pontes resistentes, bem como de outras estruturas. Eles também
aperfeiçoaram a abóbada, o arco e a cúpula em projetos de construção. Estradas,
edifícios, arcos e aquedutos romanos ainda existem hoje, mais de 2.000 anos de-
pois de terem sido construídos. A arquitetura romana era tão impressionante,
tanto na funcionalidade quanto na estética, que serviu de modelo para constru-
ções espalhadas por todo mundo moderno e contemporâneo.

3.5 RELIGIÃO
As crenças e rituais religiosos romanos também influenciaram o desen-
volvimento posterior do cristianismo. Constantino, o Grande ditou o Credo Ni-
ceno fundamental em 325, que foi adotado pela Igreja Católica e, às vezes, de
forma modificada, por igrejas protestantes posteriores. Os conceitos do sacerdote
servindo a divindade pessoalmente, de transformação através do ritual, nomea-
ção de sacerdotes por uma junta (collegia), um sumo pontífice e padres menores,
recitação de um ritual religioso em latim e o uso de incenso em culto de adoração
era todas as tradições romanas adotadas pela Igreja, naturalmente, já que o cris-
tianismo foi oficialmente adotado e promovido pelos romanos.

197
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

3.6 CONSIDERAÇÕES SOBRE O LEGADO ROMANO


O calendário usado no Ocidente deriva do calendário criado por Júlio César
e os nomes dos dias da semana (nos idiomas românicos) e dos meses do ano tam-
bém vieram de Roma. Complexos de apartamentos (conhecidos como “ínsula”), ba-
nheiros públicos, fechaduras e chaves, jornais, sapatos, um sistema postal (inspira-
do nos persas), cosméticos, lupa e o conceito de sátira na literatura foram criados ou
aperfeiçoados pelos romanos. Os romanos eram hábeis em emprestar e aperfeiçoar
aquelas invenções ou conceitos que encontravam entre a população indígena das
regiões que conquistaram. Portanto, é difícil dizer o que é uma invenção romana
“original” e o que é uma inovação em um conceito, técnica ou ferramenta preexis-
tente. Todavia, pode-se dizer, com segurança, que o Império Romano deixou um
legado duradouro que continua a influenciar o modo de vida na atualidade.

O legado duradouro dos romanos não deveria ser nenhuma surpresa,


pois, ao longo de um milênio, os romanos se expandiram de sua pequena aldeia
nas margens do rio Tibre para se tornar a cultura dominante na bacia do Mediter-
râneo. No entanto, mais de 1.500 anos após seu colapso, os romanos continuam
a cativar a imaginação. Grandes obras como a Eneida de Virgílio e o Coliseu em
Roma continuam a inspirar as novas gerações com o desejo de aprender mais so-
bre os romanos e sua cultura, que continua influenciando a vida das pessoas em
todo o mundo, quer elas saibam ou não. A organização das vilas e o planejamento
da cidade, as frases latinas usadas nas decisões judiciais, a burocracia, a moeda
padronizada, o calendário, a piscina pública, a biblioteca pública, os centros cí-
vicos e as praças, tudo, vêm dos romanos. Na verdade, é muito difícil imaginar o
mundo moderno como o conhecemos sem o legado da Roma antiga.

UNI

Como texto complementar, selecionamos um artigo sobre a obra de Martin


Bernal, com o intuito de incluir a abordagem polêmica inerente ao conceito da “Atenas
Negra”, não pretendendo validar ou desqualificar o trabalho de Bernal. No entanto, ao con-
templar a possibilidade de uma influência marcante de civilizações africanas e asiáticas entre
os gregos, Bernal rompeu com uma tradição eurocentrista, entre tantas, que ainda perma-
necem em voga nos estudos de História. Afinal, parece ser consenso, entre historiadores,
que civilizações se desenvolvem a partir do legado de outras e do contato entre culturas di-
ferentes. Outrossim, todas as grandes civilizações foram sociedades multiculturais, portanto,
além do mérito de provocar um debate historiográfico necessário, a obra de Martin Bernal
insere, nessa discussão, uma agenda política contemporânea a “tradições” historiográficas
forjadas em um zeitgeist ultrapassado, permeado de racismo, pseudociência e colonialismo.

198
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

NTE
INTERESSA

O autor Martin Gardiner Bernal foi Professor Emérito de Estudos do Oriente Pró-
ximo na Universidade de Cornell, New York, Estados Unidos. Além de fluência em francês e
chinês, ele conhecia o grego, hebraico, árabe, latim, italiano, alemão, japonês, vietnamita, chi-
chewa (falado na África meridional) e várias línguas do Oriente Próximo. Martin Gardiner Ber-
nal, sinologista, historiador e cientista político, nasceu em 10/3/1937 e morreu em 9/6/2013.

199
UNIDADE 3 — GRÉCIA E ROMA

LEITURA COMPLEMENTAR

UMA HÉLADE NEGRA? UMA NOTA NO DEBATE SOBRE A TEORIA DA


“ATENAS NEGRA”

A. K. Jayesh

Os três volumes da obra Black Athena: The Roots Afroasiatic of Civilization


Classical (em português “A Atenas Negra: as origens afro-asiáticas da Civilização
Clássica”), de autoria de Martin Gardiner Bernal (1937-2013), publicada em 1987,
têm sido objetos de contínuo debate e curiosidade. No volume 1, sob o título A
Invenção da Grécia Antiga de 1785 a 1985, Bernal afirmava que a Grécia Antiga, fon-
te da civilização ocidental, em seu passado remoto foi conquistada e civilizada
por seus vizinhos “mais avançados” do Egito e da Fenícia. Essa visão da História,
que Bernal chamou de “modelo antigo”, poderia ser encontrada nos textos dos
gregos clássicos e helenísticos. Para Bernal, essa era a visão aceita sobre as origens
culturais gregas até o século XIX, quando foi substituída pelo “modelo ariano”. O
vitorioso e hegemônico “modelo ariano”, segundo Bernal, nega os assentamentos
egípcio-fenícios na Grécia, na Idade do Bronze, e, em vez disso, postula, que, por
volta de 2300 a.C., a Grécia continental foi conquistada pelos dos helenos de lín-
gua indo-europeia. Para Bernal, essa teoria não foi produto de pesquisa acadêmi-
ca moderna, mas, sim, da atmosfera cultural do século XIX, impregnado de ideias
relacionadas a Romantismo, racismo e progresso, que se tornaram dominantes no
Ocidente após a Revolução Francesa por medo de outra revolução. O controverso
trabalho de Bernal, não obstante, ganhou o prêmio do Socialist Review Prize (1987),
em 1990, o American Book Award (Prêmio do Livro Americano do Ano), e foi obje-
to de um painel presidencial, em 1989, na reunião anual da American Philological
Association (Associação Filológica Americana). Além disso, foi traduzido para o
árabe, francês, alemão, italiano, japonês, coreano, espanhol, sueco e turco.

Quatro anos depois, Bernal lançou um segundo volume, dessa vez, para pro-
var a origem, no Oriente Próximo, da civilização ocidental. Essa nova abordagem ela-
borada por meio de plausibilidades, em vez de provas, baseava-se, ao contrário do
prometido, em evidências arqueológicas e documentais, uma análise de mitos, lendas
e rituais, ou através de estudos etimológicos. O livro, assim, exigia uma revisão radical
das cronologias aceitas, para o segundo milênio, da chamada era cristã, no Egito e no
Mar Egeu. O problema, porém, era que os argumentos e as evidências utilizadas para
tal revisão e a metodologia empregada não conseguiram convencer os especialistas.
Mesmo assim, o livro ganhou o Prêmio A. N. C. Kwanzaa (1991), foi o “Livro do Ano”
no Mainichi Shimbun (2004) e foi traduzido para o francês, italiano e japonês.

A recepção hostil e a rejeição à obra de Bernal, entre os volumes 2 e 3


(2006), resultaram no livro Black Athena Writes Back: Martin Bernal Responds to His
Critics (em português “A Atenas Negra escreve de volta: Martin Bernal responde
a seus críticos”). Talvez, nessa altura, os críticos de Bernal tivessem percebido a
futilidade de sua empreitada e desistido. No entanto, na parte final do “Black
200
TÓPICO 3 — LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES GRECO-ROMANAS

Athena”, Bernal procurou fornecer evidências linguísticas para a alegação de que


quase 40% do vocabulário grego ainda não é conhecido. As palavras com origem
indo-europeia têm suas raízes, de fato, nas línguas afro-asiáticas. Ainda nesse
período, a Sociedade Asiática de Calcutá, em 2005, homenageou Bernal com a
Medalha de Ouro do Memorial Indira Gandhi. Assim, depois da China, Grécia e
Oriente Próximo, era a vez da Índia ser tomada sob as asas de Bernal.

É difícil e intelectualmente ingênuo quantificar o papel do Egito na evo-


lução das instituições da Grécia Antiga. Os gregos mantiveram um longo contato
com o Egito e, talvez, mais importante, refletiam profundamente sobre o Egito,
explorando a relação com aquela civilização mais antiga, inclusive, em diversos
gêneros, tais como Arte, Literatura e Filosofia. Como o Egito não poderia ter con-
tribuído de maneira significativa para o desenvolvimento cultural grego ao lon-
go do tempo? Entretanto, a maioria especialistas do período clássico da história
grega não admitia o debate. Ao fazer isso, reforçaram uma imagem dos antigos
gregos como produtos de uma excepcionalidade, autocriados e autossuficientes,
para não mencionar que estavam cercados por povos de pele escura e seus alia-
dos. Portanto, não é de se admirar que teorias racistas tenham achado a imagem
dos antigos gregos tão atraente. No entanto, a “civilização ocidental”, no trabalho
de Bernal, é mais uma vez objeto de intenso escrutínio racial. E o próprio Bernal
parece profético ao antecipar os desejos que movem a política de hoje, uma vez
que afirmou que: “Meu inimigo não é a Europa, mas, sim, a ideia de que a pureza
é mais criativa do que a miscigenação. Eu acredito que a civilização grega é tão
fascinante precisamente por sua mistura”.

A prova disso, segundo o artigo, é que os próprios classicistas, após o


advento da história das ciências sociais e a ascensão do pós-modernismo, se afas-
taram do paradigma isolacionista em direção a um que enfatiza o contato e a
“fertilização cruzada” de culturas no momento que “A Atenas Negra” de Martin
Bernal apareceu em cena.
FONTE: Adaptado de JAYESH, A. K. Black Hellas? A Footnote to the Black Athena Debate. JLT, v. 7,
n. 1-2, p. 86-110, 2013. Disponível em: https://bit.ly/3fm70E9. Acesso em: 23 abr. 2021.

201
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• O legado greco-romano serviu de base civilizacional para as sociedades no


entorno do Mediterrâneo, na Europa e além.

• A influência arquitetônica da Grécia Antiga pode ser notada em construções


por todo o mundo.

• No período clássico grego, as estátuas tornaram-se figuras sensuais e contorcidas


que parecem saltar do plinto (pedestal). A escultura e a arte gregas, em geral,
priorizam a proporção, o equilíbrio e a perfeição idealizada do corpo humano.

• Pitágoras (571-497 a.C.) foi o matemático grego mais famoso e criou o teorema
geométrico que ainda leva seu nome.

• Na Medicina, os remédios foram aperfeiçoados com ervas, enquanto o aipo


era conhecido por ter propriedades anti-inflamatórias, a clara de ovo por aju-
dar a cicatrizar feridas e o ópio por proporcionar alívio da dor ou funcionar
como anestésico.

• Em 1896, os Jogos Olímpicos foram revividos e incorporados, desde então, ao


nosso tempo, como um evento global. Entretanto, os atuais Jogos Olímpicos
precisaram de mais mil anos para se igualarem à longevidade de sua versão
original na Grécia Antiga.

• Parmênides (530-460 a.C.) afirmava que não se pode confiar nos sentidos, devendo-
-se usar o raciocínio para cortar a névoa da superstição e do mito e usar quaisquer
ferramentas, à nossa disposição, para encontrar as respostas que procuramos.

• O latim, idioma da Roma antiga, permaneceu em uso, na Idade Média, pela


Igreja Católica Romana, como latim eclesiástico e o latim vulgar; a língua co-
mum deu origem às línguas românicas (principalmente italiano, francês, es-
panhol, português e romeno).

• Uma das mais importantes contribuições romanas para a organização política


dos estados foi a separação dos Poderes em: Executivo, Legislativo e Judiciá-
rio e a harmonia entre eles.

202
• Estradas, edifícios, arcos e aquedutos romanos ainda existem mais de 2.000
anos depois de terem sido construídos.

• É muito difícil imaginar o mundo moderno como o conhecemos sem o legado


da Roma antiga.

CHAMADA

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203
AUTOATIVIDADE

1 O legado civilizacional greco-romano abrange várias áreas do conhecimen-


to humano. Esse legado foi, principalmente, mas não somente, fundamen-
tal no Ocidente. Sobre o legado de gregos e romanos, classifique V para as
sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) O legado de gregos e romanos não pode ser avaliado conjuntamente, pois


as contribuições de ambos foram em áreas completamente diferentes.
( ) O legado grego foi, principalmente, na área militar e o romano no pensa-
mento filosófico.
( ) Os romanos revolucionaram a Matemática e os gregos deixaram um le-
gado fundamental na área do Direito.
( ) No que se refere a religião o legado romano foi fundamental na estrutu-
ração da Igreja Católica Apostólica Romana.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – V – V – F.
b) ( ) F – F – V – V.
c) ( ) F – F – F – V.
d) ( ) V – V – F – V.

2 Os romanos destacaram-se em obras de engenharia graças à tecnologia que


desenvolveram com a utilização de materiais inovadores, que tornaram as
obras construídas extremamente duradouras. Uma das inovações romanas
foi fundamental para tornar suas obras perenes. Com relação a esse mate-
rial, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Tijolo.
b) ( ) Concreto.
c) ( ) Gesso.
d) ( ) Ferro.

3 O legado duradouro dos romanos não deveria ser nenhuma surpresa, pois,
ao longo de um milênio, os romanos se expandiram de sua pequena aldeia
nas margens do rio Tibre para se tornar a cultura dominante na bacia do
Mediterrâneo. No entanto, mais de 1.500 anos após seu colapso, os romanos
continuam a cativar a imaginação pelo valor perene de suas contribuições.
Analise as sentenças a seguir:

I- Por obras como “Eneida” e o Coliseu.


II- Pela moeda padronizada e o calendário.
III- Pela inovação política de uma forma inicial de democracia.
IV- Pela ideia pioneira na Filosofia de um universo infinito.

204
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) Apenas as sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Apenas as sentenças I, II e III estão corretas.
c) ( ) Apenas as sentenças III e IV estão corretas.
d) ( ) Apenas as sentenças I e a IV estão corretas.

4 Assim como o legado das civilizações greco-romanas, as contribuições para


civilizações são inúmeras e influenciam nossas vidas de maneira perene
e acentuada. Sobre as contribuições greco-romanas, elabore um texto com
dois parágrafos sobre o legado grego na área das Ciências e do legado ro-
mano na área de Política.

205
REFERÊNCIAS
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Press; 1998.

BAUER, S. W. The History of the Ancient World. New York: W. W. Norton &
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