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NEUROFISIOLOGIA I

AULA 2 | PARTE II | SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO: SENSAÇÕES TÁTEIS

É importante recordar que o sistema sensorial somático envolve as sensações táteis, a


percepção de temperatura, a nocicepção e a propriocepção.
Nesta seção, veremos como um toque na pele é transduzido em sinais neurais, como
essas informações seguem pelo sistema nervoso central e como o cérebro realiza a percepção
delas.

1 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO

Os receptores são terminações nervosas periféricas de neurônios sensoriais primários


(receptores neurais) essas terminações podem ou não estar associadas com outros elementos
conjuntivos ou celulares.
Os receptores somáticos estão distribuídos nos vários tecidos corporais pele,
articulações, músculos, vísceras.
As modalidades sensoriais somáticas incluem as sensações táteis (mecanoceptores),
térmicas (termoceptores), da posição do corpo (mecanoceptores), e da dor (em sua maioria
polimodais).
No entanto, a maioria dos receptores somatossensoriais estão localizados pela pele e
são mecanorreceptores.

2 INTRODUÇÃO SOBRE AS SENSAÇÕES TÁTEIS

As sensações táteis começam na pele, que pode ser do tipo glabra (sem pelos, como
palma das mãos e planta dos pés) ou pilosa. Lembrando que a pele possui uma camada
externa, a epiderme, e uma interna, a derme. A pele fornece nosso contato direto com o
mundo, e é o maior órgão sensorial que possuímos.
Uma das maiores áreas de capacidade discriminativa sensorial em seres humanos é a
polpa dos dedos das mãos. A pele na polpa do dedo indicador humano é sensível o suficiente
para discriminar um ponto saliente medindo apenas 0,006mm de altura por 0,04mm de largura
(ponto de Braile é 167 vezes maior).
3 MECANORRECEPTORES CUTÂNEOS

A maioria dos receptores sensoriais do sistema somatossensorial são


mecanorreceptores, que são sensíveis à deformação física. Os mecanorreceptores estão
presentes no corpo todo, e monitoram o contato na pele, a pressão no coração e nos vasos
sanguíneos, o estiramento dos órgãos digestórios e da bexiga urinária e a força contra os
dentes.
A pele pode sofrer estímulos de vibração, pressão, ser aguilhoada ou alisada e seus
pelos podem ser dobrados, inclinados ou puxados. Essas são formas diferentes de energia
mecânica, as quais podemos sentir individualmente, e, ainda, discriminar e interpretar
facilmente.
Temos mecanoceptores que se distinguem quanto à frequência de estímulo, pressões
preferenciais e tamanhos dos campos receptivos. A seletividade de um axônio
mecanorreceptivo depende basicamente da estrutura de sua terminação especial.

4 OS TIPOS DE MECANORRECEPTORES CUTÂNEOS

A figura a seguir ilustra os receptores sensoriais somáticos na pele.

4.1 Receptores do folículo piloso

Cada folículo é ricamente inervado por terminações nervosas livres, que se enrolam
em torno do folículo piloso ou seguem paralelo a este. Alguns folículos contêm músculos
piloeretores (arrepio), e a inervação difere para cada tipo de folículo. Terminais nervosos são
estimulados pelo movimento dos pelos. O dobramento ou movimentação do pelo causa
deformação no folículo piloso levando ao estiramento, achatamento, ou inclinação das
terminações nervosas, o que muda sua atividade e essa informação é transmitida ao SNC
(potenciais de ação). Os mecanorreceptores dos folículos pilosos podem ser tanto de
adaptação lenta como de adaptação rápida.
Para animais, esse receptor dá informação de orientação espacial, de onde vem o
vento, por exemplo. Para uma leoa caçando na savana, o sentido que o vento está batendo e
desloca o pelo dá informações espaciais para esse animal.

Explicação da figura: vemos os aferentes sensoriais que são mielinizados, os terminais


sensoriais. A fibra aferente primária fará sinapse com o neurônio na medula espinal, então
mais uma vez esse tipo de receptor corresponde a uma terminação periférica de um neurônio
pseudobipolar que é um aferente primário do sistema sensorial.

4.2 Corpúsculos de Pacini

São receptores cutâneos, mecânicos que estão associados à transmissão do tato mais
grosseiro.
Situam-se em profundidade na derme, por isso estão associados a sensações mais
profundas e eventualmente de maior intensidade. Podem ter L 2 mm x D 1 mm. Cada mão
humana possui cerca de 2.500 com a maior concentração nas polpas dos dedos, palma e dorso
das mãos. Detectam vibração (200 a 300 Hz), pressão ou toque mais grosseiro e são de rápida
adaptação. Possuem, além disso, campo receptivo grande.
Explicação da figura: o prolongamento periférico da terminação nervosa sofre uma
bifurcação e cada uma das terminações possui uma cápsula. A terminação nervosa (de um
aferente primário sensorial) é desmielinizada e envolvida por uma cápsula com 20 a 70
camadas concêntricas (como se fosse uma cebola) de tecido conjuntivo com um líquido
viscoso entre elas (que está associada à função de adaptação). Ao comprimirmos a pele,
haverá uma deformação dessas camadas e um movimento dos líquidos entre elas, o que
estimulará o terminal sensorial dentro da cápsula.
A propriedade de adaptação rápida desse tipo de receptor está associada às suas
características estruturais, a essa especialização (cápsula). Se pegarmos esse receptor,
corpúsculo de Pacini, e tirarmos as camadas de tecido conjuntivo, se retirarmos essa
especialização (cápsula) e testar a atividade elétrica desses receptores, eles mudam de
característica, o que significa que a estrutura está associada à função. Quando o receptor está
encapsulado, ele se comporta como um receptor do tipo fásico, ou seja, que denota o início e
fim dos estímulos.
Explicação da figura: ao realizar um estímulo mecânico nesse receptor (compressão),
há uma distorção das camadas e do líquido entre elas, quando o estímulo é retirado, há uma
tração dessas camadas no sentido contrário. Ao serem comprimidas, ele gera um potencial
receptor. Enquanto o estímulo está aplicado, paradinho, ele não dispara nada (silencia), e
quando o estímulo é retirado, essa distorção, tração no sentido contrário pelo retorno das
camadas gera um outro potencial de ação. Se retirar essas camadas, o receptor perde essas
características, tornando-se um receptor de adaptação lenta, isto é, o potencial receptor gerado
é de longa duração (dura durante todo o tempo de estímulo).

4.3 Corpúsculo de Meissner

Tem 1/10 do tamanho do corpúsculo de Pacini. Localizam-se entre as papilas dérmicas


na pele glabra (na pele sem pelos), e são responsáveis pela sensação de toque leve e tato fino.
São altamente sensíveis a vibrações em torno de 50 Hz, de baixa frequência. São receptores
de adaptação rápida. O campo receptivo é pequeno. Esses receptores fornecem informações
com grande discriminação tátil, em regiões em que o tato é mais sofisticado.

4.4 Receptores de Merkel

Localizados mais superficialmente (epiderme). Compostos por uma terminação


nervosa e células não nervosas achatadas (discos de Merkel). Promovem informação
relacionada à pressão e textura. São de adaptação lenta (associados a estímulos de longa
duração) e possuem campos receptivos pequenos.
4.5 Terminações de Ruffini

Localizados na derme da pele pilosa e glabra. Levemente menores que os corpúsculos


de Pacini. Sensíveis ao estiramento da pele e à pressão sustentada. Acredita-se estarem
envolvidos na modulação do movimento de pinça, de apreensão ao se pegar um objeto. São de
adaptação lenta e possuem campo receptivo grande.

Como já mencionado, os mecanoceptores que se distinguem quanto à frequência de


estímulo, pressões preferenciais e tamanhos dos campos receptivos. O quadro a seguir mostra
essas diferenças em relação ao tamanho do campo receptivo e à frequência de estímulo
(adaptação rápida ou lenta).
Explicação da figura: a figura mostra a diferença de tamanho dos campos receptivos
dos corpúsculos de Meissner e dos corpúsculos de Pacini. Na primeira ilustração da mão
(referente aos corpúsculos de Meissner), cada círculo em azul corresponde à área da pele que
ativa uma fibra associada ao corpúsculo de Meissner. Já na segunda ilustração da mão
(referente aos corpúsculos de Pacini), observa-se que o campo receptivo é grande, então a
capacidade de localização do estímulo é muito menor em relação aos corpúsculos de
Meissner.

5 CANAIS IÔNICOS MECANOSSENSÍVEIS

Os mecanorreceptores, receptores táteis, possuem canais iônicos mecanossensíveis.


Como vimos na aula anterior, os termorreceptores e nociceptores possuem receptores de
membrana que fazem a transdução de estímulos térmicos e nociceptivos, respectivamente.
No caso dos mecanorreceptores, o estímulo pode ser causado pelo estiramento,
pressão e esmagamento da pele, por exemplo. Então, os mecanorreceptores estão associados a
canais iônicos que convertem a força mecânica em uma mudança na corrente iônica. As
forças aplicadas a esses canais alteram a abertura do poro, aumentando ou diminuindo a
abertura do canal iônico.
Os canais iônicos modulam sua abertura e fechamento por três mecanismos principais:
a) Canais iônicos sensíveis ao estiramento da membrana lipídica, tensão na membrana induz
diretamente a abertura do canal iônico.
b) Canais iônicos que se abrem quando uma força é aplicada a estruturas extracelulares
acopladas aos canais por peptídeos.
c) Canais associados a estruturas proteicas intracelulares (citoesqueleto). O estresse sobre o
citoesqueleto regula a abertura do canal.

6 CAPACIDADE DISCRIMINATIVA

A capacidade para discriminarmos características detalhadas de um estímulo varia


consideravelmente ao longo do corpo. Em humanos, as pontas dos dedos são a área de maior
resolução. Teste de discriminação de 2 pontos.
Alguns pontos muito relevantes (cairão na prova):
- Quanto maior a densidade de mecanoceptores por área de pele, maior a capacidade
discriminativa.
- Quanto maior o número de receptores com campos receptivos pequenos (por exemplo,
discos de Merkel), maior a capacidade discriminativa.
- Quanto maior a área de representação e processamento cortical por cm 2 de pele, maior a
capacidade de processamento.
- Podem haver mecanismos neurais especiais destinados às discriminações de alta resolução.
7 AXÔNIOS AFERENTES PRIMÁRIOS DO TATO

A pele está ricamente inervada por axônios que percorrem pela vasta rede de nervos
periféricos o trajeto em direção ao sistema nervoso central.
Os axônios que transmitem a informação dos receptores somatossensoriais à medula
espinal ou ao tronco encefálico são os axônios aferentes primários do sistema
somatossensorial. Os axônios aferentes primários adentram à medula espinal pelas raízes
dorsais e seus corpos celulares estão nos gânglios da raiz dorsal (DRG). Os axônios aferentes
primários apresentam diâmetros variados e seus tamanhos correlacionam-se com o tipo de
receptor sensorial do qual recebem a sinalização.

Os aferentes primários táteis são principalmente terminações nervosas especializadas


de fibras do tipo Aβ. Lembrando que para a dor e temperatura as fibras são Aδ e C. As fibras
Aβ são de alta velocidade de condução, de 35 a 75 m/s, as segundas mais velozes. Possuem de
6 a 12 µm de diâmetros, e são ricamente mielinizadas (alta capacidade de isolamento elétrico,
com alta resistência de membrana e menor perda de corrente).
8 ORGANIZAÇÃO SEGMENTAR DA MEDULA ESPINAL

A maioria dos nervos periféricos comunica-se com o sistema nervoso central via
medula espinhal, a qual está envolta pela coluna vertebral óssea. O arranjo dos pares de raízes
dorsal e ventral está mostrado na figura abaixo, e se repete 30 vezes ao longo da extensão da
medula espinhal humana.
Cada nervo espinhal consiste em axônios da raiz dorsal e da raiz ventral, que passam
através de um forame entre as vértebras da coluna. Existe o mesmo número de nervos
espinhais que o de forames entre as vértebras, ou seja, 30 pares de nervos espinais. Os 30
segmentos espinhais estão divididos em quatro grupos, e cada segmento recebe a
denominação da vértebra seguinte adjacente à origem do nervo: cervical (C) 1 a 8, torácico
(T) 1 a 12, lombar (L) 1 a 5 e sacral (S) 1 a 5.

A organização segmentar dos nervos espinais e a inervação sensorial da pele estão


relacionadas. A área da pele inervada pelas raízes dorsais direita e esquerda de um único
segmento espinhal é denominada dermátomo. Ao serem mapeados, os dermátomos delineiam
uma organização em bandas da superfície corporal. A organização dos dermátomos é melhor
visualizada em um corpo em disposição quadrúpede.
Os dermátomos são as regiões da superfície cutânea inervadas pelos segmentos
espinhais e pelas três divisões do nervo trigêmeo. A primeira figura abaixo mostra os
dermátomos da cabeça, a segunda representa os do corpo.

Quando uma raiz dorsal é seccionada, o dermátomo correspondente do lado da lesão


não perde a sensação total. A sensação somática residual é explicada pelo fato de que as raízes
dorsais adjacentes inervam as áreas com sobreposição. Para perder, portanto, toda a sensação
em um dermátomo, três raízes dorsais adjacentes devem estar seccionadas.
A pele inervada pelos axônios de uma raiz dorsal é claramente revelada por uma
condição chamada de herpes zoster, na qual todos os neurônios de um único gânglio da raiz
dorsal ficam infectados com o vírus.
Os neurônios que recebem sinalização sensorial dos aferentes primários são chamados
de neurônios sensoriais secundários (ou de segunda ordem). A maioria dos neurônios
sensoriais secundários da medula espinhal localiza-se nos cornos dorsais.
Os calibrosos axônios mielinizados Aβ que conduzem a informação tátil cutânea
entram no corno dorsal e se ramificam. Um ramo faz sinapse com neurônios secundários na
parte profunda do corno dorsal (formam circuitos locais-reflexos), essas conexões podem
desencadear ou modificar respostas reflexas rápidas e inconscientes. O outro ramo do axônio
aferente primário Aβ ascende diretamente para o encéfalo (percepção consciente) via
substância branca na coluna da medula espinal.

9 VIA DA COLUNA DORSAL-LEMNISCO MEDIAL - A VIA DO TATO

A informação sobre o tato ou a vibração da pele segue uma via em direção ao encéfalo
que é totalmente distinta da via em que seguem as informações sobre a dor e a temperatura.
Diferentemente da via espino-talâmica, em que o neurônio fazia sinapse na medula espinal e o
neurônio de segunda ordem cruzava na medula (decussação), na via do tato, o cruzamento
ocorrerá na altura do bulbo na região chamada de lemnisco medial.
Assim, até que a informação alcance os núcleos da coluna dorsal no bulbo a
informação está relacionada ao mesmo lado do corpo. A partir deste ponto (decussação), a
informação sensorial que trafega de um lado do encéfalo está relacionada com as sensações
originadas do lado oposto.
Nos pontos de sinapse ao longo da via a informação sensorial pode ser modificada por
grupos adjacentes de aferências e por eferências do córtex. Então, em cada ponto de sinapse
pode haver interferência de outras vias que estão se projetando por ali. Porque cada ponto de
sinapse é um ponto de processamento neuronal, pois é onde a informação é transmitida, então
se houver uma mudança no status neuroquímico isso pode influenciar na passagem da
informação adiante. Isso é comum em muitos circuitos neuronais.

Explicação da figura: os ramos do aferente primário podem fazer sinapse na própria


medula espinal, mas boa parte dos ramos se projetam para o encéfalo via coluna dorsal
(substância branca da medula espinal), no bulbo, mais especificamente nos núcleos da coluna
dorsal ocorre a sinapse com um neurônio de segunda ordem, que cruza para o lado contra-
lateral e agora sim se projeta para o tálamo, onde fará sinapse com neurônios de terceira
ordem e se projetará para o córtex somatossensorial primário.

10 A VIA TÁTIL TRIGEMINAL

A sensação somática da face é suprida, principalmente, pelos grandes ramos do nervo


trigêmeo (nervo craniano V), o qual entra no encéfalo pela ponte. O nervo trigêmeo divide-se,
de cada lado, em três nervos periféricos que inervam a face, a região bucal, os dois terços
distais da língua e a dura-máter que recobre o encéfalo. As sensações da pele em torno dos
ouvidos, da região nasal e da faringe são fornecidas por outros nervos cranianos: o facial
(VII), o glossofaríngeo (IX) e o vago (X).
Explicação da figura: os axônios sensoriais de grande diâmetro do nervo trigêmeo
levam informação tátil dos mecanorreceptores da pele. Eles fazem sinapse com neurônios de
segunda ordem do núcleo trigeminal ipsolateral, na altura do bulbo, que é análogo a um
núcleo da coluna dorsal. Os axônios do núcleo trigêmeo decussam e projetam-se para o
tálamo. Por fim, a informação é retransmitida para o córtex somatossensorial.

11 O CÓRTEX SOMATOSSENSORIAL

Assim como para todos os demais sistemas sensoriais, os níveis mais complexos do
processamento somatossensorial ocorrem no córtex cerebral. A maior parte do córtex
relacionada ao sistema somatossensorial está localizada no lobo parietal. A área de Brodmann
3b, reconhecida como o córtex somatossensorial primário (S1), situa-se no giro pós-central
(logo atrás do sulco central). O giro pré-central corresponde à área motora. Outras áreas
corticais que também processam informação somatossensorial estão ao lado de S1, incluindo:
as áreas 3a, 1 e 2 no giro pós-central, e as áreas 5 e 7 no córtex parietal posterior adjacente
(ver na figura abaixo).
11.1 Área 3b: córtex somatossensorial primário (S1)

A área 3b recebe o nome de córtex somatossensorial primário porque:


a) Recebe grande no de aferências do núcleo ventral posterior (VP) do tálamo (camada IV).
b) Seus neurônios são extremamente responsivos aos estímulos somatossensoriais, mas não a
outros tipos de estímulos sensoriais.
c) Lesões nesta área prejudicam drasticamente a sensação somática.
d) Quando estimulada eletricamente produz sensações somáticas.
A área 3a também recebe grande aferência do tálamo, entretanto, está mais relacionada
às informações sobre a posição do corpo, do que sobre o tato.
As áreas 1 e 2 recebem densa inervação da área 3b, sendo que:

- A projeção da área 3b para a área 1 (3b 1) envia principalmente informação sobre textura.

- A projeção da área 3b para a área 2 (3b 2) enfatiza informação sobre tamanho e forma.
Pequenas lesões restritas às áreas 1 e 2 produzem deficiências esperadas na
discriminação da textura, do tamanho e da forma.
11.2 Organização colunar do córtex somatossensorial

O córtex somatossensorial, assim como outras áreas do neocórtex é organizada em


camadas. As aferências talâmicas para S1 chegam principalmente na camada IV, e neurônios
da camada IV projetam para outras camadas.
Outra importante similaridade com as outras regiões corticais é que os neurônios de S1
que possuem aferências e respostas similares ficam dispostos verticalmente em colunas que se
estendem perpendiculares as camadas corticais (ver figura abaixo).

O conceito de coluna vertical foi descrito pela primeira vez para o córtex
somatossensorial pelo cientista Vernon Mountcastle, da Universidade John Hopkins.
Diferenças entre os campos receptores (em violeta) de neurônios encontrados nas
várias áreas somestésicas. Em algumas áreas há neurônios cujos campos se estendem por
vários dedos, e até bilateralmente.

11.3 Somatotopia cortical ou organização topográfica do córtex sensorial somático

A estimulação elétrica de uma região na superfície de S1 pode causar sensações


somáticas localizadas em uma parte específica do corpo. A movimentação de forma
sistemática do estimulador ao longo de S1 resultará em sensações que se deslocam ao longo
do corpo. O neurocirurgião americano-canadense Wilder Penfield, da Universidade McGill,
utilizou esse método de estimulação, entre as décadas de 1930 a 1950, para mapear o córtex
de pacientes durante neurocirurgias.
Os campos receptivos dos neurônios de S1 produzem um mapa ordenado do corpo no
córtex. O mapeamento das sensações da superfície corporal em uma área do encéfalo é
chamado de somatotopia.

11.4 O homúnculo somatotópico

Um mapa somatotópico é chamado, algumas vezes, de homúnculo (para diminutivo de


“homem” em latim; o pequeno homem no cérebro). O homúnculo seria uma projeção do
corpo humano se considerássemos não a superfície real, mas sim a superfície de
processamento cortical de cada área do corpo.
Observa-se que o mapa somatotópico não está na mesma escala do corpo humano. Ou
seja, o tronco é grande, mas a representação cortical é pequena, e os dedos, que são menores,
possuem grande representação cortical, por exemplo. As mãos são ricas em receptores, e de
nada iria adiantar essa variedade de receptores se não houvesse uma grande área de
processamento cortical. Em vez disso, o mapa parece uma caricatura: a boca, a língua e os
dedos são absurdamente grandes, ao passo que o tronco, os braços e as pernas são pequenos.
O tamanho relativo da área do córtex que processa cada parte do corpo está
correlacionado à densidade de aferências sensoriais recebidas daquela determinada parte. O
tamanho do mapa também está relacionado à importância da aferência sensorial daquela parte
do corpo (espécie específico, ou seja, a importância de uma parte do corpo pode variar
consideravelmente entre as diferentes espécies). A figura abaixo ilustra o mapa somatotópico
de diferentes espécies. Por exemplo, as grandes vibrissas faciais (bigodes) dos roedores
recebem uma área enorme em S1 para seu processamento, ao passo que os dígitos das patas
recebem uma área relativamente pequena.
A informação do dedo indicador é mais útil do que a do cotovelo. A importância da
informação tátil de nossas mãos e dedos é óbvia, mas por que dedicar tanto poder de
processamento cortical à boca? As duas prováveis razões devem-se às sensações táteis serem
importantes na produção da fala e que os lábios e a língua (sensações somáticas, além do
paladar) são a última linha de defesa na decisão sobre um alimento, se é nutritivo e delicioso
ou se é algo que poderia o sufocar, quebrar seu dente ou arranhar sua faringe.

12 PLASTICIDADE DO MAPA CORTICAL

O que acontece ao mapa somatotópico no córtex quando uma aferência for removida,
como, por exemplo, a de um dedo? A “área do dedo” no córtex ficaria simplesmente sem
utilidade? Ou esse tecido passaria a ser utilizado pelas aferências originadas de outras fontes?
As respostas a essas questões poderiam ter implicações importantes para a recuperação
de uma função após lesão de um nervo periférico. Na década de 1980, o neurocientista
Michael Merzenich e colaboradores, da Universidade da Califórnia, iniciaram uma serie de
experimentos para testar essas hipóteses (figura abaixo)
Primeiro, as regiões de S1 que são sensíveis à estimulação da mão em um macaco-da-
noite adulto foram cuidadosamente mapeadas com microeletrodos. Então, um dedo da mão (o
dígito 3) foi removido cirurgicamente.
Após vários meses, o córtex foi novamente mapeado. Qual foi o resultado? A área do
córtex destinada originalmente ao dígito amputado respondia agora à estimulação dos dígitos
adjacentes. Houve uma evidente reorganização da circuitaria subjacente à somatotopia
cortical. O mapa somatotópico pode ser reorganizado a partir da deficiência de aferências de
partes do corpo.
No experimento da amputação, o motivo da reorganização desse mapa foi a ausência
de aferências do dígito que estava faltando. O que aconteceria se a atividade da sinalização
aferente de um digito estivesse aumentada? Para responder a essa questão, os macacos foram
treinados para utilizar dígitos específicos para realizar uma tarefa, pela qual eles recebiam um
alimento como recompensa.
Após várias semanas de treino, os experimentos de mapeamento com microeletrodos
mostraram que a representação dos dígitos estimulados tinha expandido em comparação a dos
dígitos adjacentes, não estimulados. Esses experimentos revelaram que os mapas corticais são
dinâmicos e que seu ajuste depende da quantidade de experiência sensorial. Experimentos
subsequentes em outras áreas do córtex (visual, auditiva, motora) têm mostrado que é comum
esse tipo de plasticidade do mapa cortical.

12.1 Sensações de “membros-fantasma”

Uma experiência comum entre os amputados é a percepção de sensações que se


originariam do membro que está faltando, quando, na verdade, outras partes do corpo são
tocadas. Essas sensações de “membro fantasma” são comumente evocadas pela estimulação
de regiões da pele cujas representações somatotópicas são limítrofes àquelas do membro
amputado. Por exemplo, a sensação pode ser provocada em um braço fantasma pela
estimulação da face.
Métodos de obtenção de imagens funcionais do cérebro revelam que as regiões
corticais destinadas originalmente aos membros faltantes passam a ser ativadas com a
estimulação da face. Ainda que essa plasticidade possa ser adaptativa, no sentido de que o
córtex não fique ocioso, a correlação equivocada entre a estimulação e a percepção nos
amputados indica que isso possa levar à confusão na interpretação das sinalizações em S1.

12.2 Remapeamento contínuo do córtex somatossensorial

Os violinistas e outros músicos que tocam instrumentos de corda devem dedilhar


continuamente as cordas com sua mão esquerda. Os dedos da outra mão, a que segura o arco,
recebem consideravelmente menos estimulação individual. O imageamento funcional de S1
mostra que a quantidade de córtex dedicada aos dedos da mão esquerda é consideravelmente
maior nesses músicos.
É provável que este seja um processo de remapeamento contínuo que ocorre no córtex
de cada pessoa na medida em que variam as suas experiências de vida. Assim, aumentos na
atividade aferente de uma determinada área do corpo podem ocasionar expansão da área
representativa cortical.
12 O CÓRTEX PARIETAL POSTERIOR (ÁREAS 5 E 7)

A informação sensorial não é restrita em S1 ou no córtex sensorial no giro pós-central.


Existem outras áreas sensoriais que são de integração, que são chamadas áreas secundárias e
terciárias. Em termos gerais, o córtex parietal posterior parece ser essencial para a percepção e
interpretação das relações espaciais, a noção exata do corpo e o aprendizado das tarefas que
envolvem a coordenação do corpo no espaço. Essas funções envolvem uma complexa
integração da informação somatossensorial com a de outros sistemas sensoriais,
principalmente com o sistema visual.
O córtex somatossensorial secundário recebe aferências diretas do tálamo VP e de S1.
Somatotopia pouco precisa, campos receptivos grandes, integração de estímulos simultâneos
em várias partes da pele. Projeta para o córtex insular e regiões temporais envolvidas com a
memória-aprendizado tátil.

A informação percorre os sistemas sensoriais de forma segregada e é, posteriormente,


integrada em áreas de associação corticais (são áreas integrativas). O córtex parietal
posterior é uma área de convergência de informações sensoriais segregadas, que são
integradas para formar gerar representações neurais particularmente complexas.
As informações percorrem o sistema sensorial de forma segmentada, separada, e
chegam em regiões diferentes do córtex somatossensorial e tem um primeiro nível de
processamento, e depois é direcionada às áreas 5 e 7 do córtex parietal, onde será integrada
com outras informações sensoriais que darão sentido e contexto a essas informações. É por
conta da integração no córtex de associação que eu não só identifico que eu tenho um objeto
na minha mão retangular, frio, com botões, mas de olhos fechados eu já consigo identificar
que se trata de um controle de televisão, por exemplo (integração).
O córtex parietal posterior não está relacionado apenas com o processamento sensorial
somático, mas também com o de estímulos visuais, planejamento de movimentos, e com a
atenção.

12.1 Lesões no córtex parietal posterior: agnosia tátil e síndrome de negligência

Estereognosia é a capacidade de reconhecer objetos por meio do tato, sem


informações visuais. Indivíduos com a estreognosia preservada conseguem distinguir uma
chave no bolso ou na mão com os olhos fechados apenas por tocar o bolso ou a chave.
Indivíduos com agnosia tátil ou estereognosia anormal não conseguem reconhecer o
objeto, apesar de a percepção tátil ser normal em seus aspectos mais simples, e podem não ter
problemas de reconhecer o objeto apenas pelo som ou visão.

As lesões no córtex parietal também podem causar uma síndrome de negligência, na


qual uma parte do corpo ou uma parte do mundo (por exemplo, todo o campo visual à
esquerda do centro da visão) é ignorada ou suprimida, e sua própria existência é negada.

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