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2o DOMINGO DO TEMPO COMUM

(Is 62,1-5; Sl 95; 1Cor 12,4-11; Jo 2,1-11)

Acabamos de ouvir o relato do Evangelho segundo João onde Jesus


intervém prodigiosamente numa festa de casamento para abastecer o
estoque de vinho que tinha acabado. Nos parece estranho o evangelista
dedicar o primeiro sinal de Jesus, de sete realizados no seu evangelho, a
uma coisa tão banal como o fim do vinho de uma festa de casamento. No
entanto, um olhar mais atento para teologia judaica e cristã primitiva, o que
parecia superficial torna-se cheio de sentido. De fato, estamos no terreno da
teologia e da historia de Israel, do povo eleito de Deus ao qual João quer dar
um novo sentido. Cada expressão desta passagem que acabamos de ouvir
tem uma razão de estar escrita. Cada simbolismo utilizado no texto do autor,
tem profundas raízes na historia do povo de Deus.
Tudo se dá numa festa de casamento. De fato, há algo que expressa
melhor o amor entre duas pessoas que uma celebração de casamento com
todo seu simbolismo? Quando duas pessoas que se amam se casam,
formam uma família, e isso representa uma nova etapa na vida dos dois e
das famílias envolvidas. Sair da casa dos pais, se responsabilizar, dividir as
tarefas, criar expectativas, tudo isso faz parte do jeito de nossa cultura
celebrar o casamento. Mas no tempo de Jesus, a celebração do casamento
era diferente. A festa não durava apenas uma noite, se estendia por dias e
dias. Os noivos muitas vezes só se conheciam no casamento, e muitas vezes
era mais uma relação de interesses tribais do que propriamente amor entre
duas pessoas. Mas havia exceções, como sempre. No entanto, o relato de
João quer nos contar outro tipo de casamento: fala da união indissolúvel
entre Deus e seu povo, muitas vezes expressada com símbolos do
casamento no Antigo Testamento (cf. Is 62,5; Os.2; Is1,21-26; Ez. 16). A
união agora se dá entre Jesus e a Igreja, comunidade de fiéis (Ef 5,32-33.25;
Mt 22,1-14; 2Cor 11,1-4; Ap 12; 19,7-9).
Na antiga religião do templo, o que era um peso, representado pelas
leis e decretos que todo judeu piedoso deveria cumprir, como era o caso das
abluções ( limpeza ritual com água), Jesus troca pela alegria (simbolizado no
vinho). O vinho traz alegria ao coração, diz o Cântico dos Cânticos, e
simboliza a vida do povo, a vida real e não ritual. Além do mais, o vinho
também é símbolo do Espirito (At 2,15-16).
O que jesus faz é devolver, no primeiro sinal, na nova criação, a
alegria que a religião ritualística tinha tirado da vida das pessoas. Jesus
transforma a religião naquilo que ela deve ser: fonte de alegria e de encontro,
de religar (religare=religar, religião).
Olhando por este viés, podemos questionar se a religião que
praticamos não está transformada em simples gestos e rituais “aguados”,
sem sabor, sem vida. Evangelho significa uma notícia alegre. Será que por
vezes não proclamamos o evangelho com tom autoritário e ameaçador?
Será que por vezes fazemos propaganda de Jesus de maneira errada, o
transformando num juiz sem piedade, cheio de raiva pelos pecadores? Não
seria o contrário? Basta ler os textos dos quatro evangelhos e percebemos
que muitas vezes nossa fala sobre Deus não combina com a boa noticia que
Jesus nos trouxe sobre Ele. A igreja, reunião dos que aceitam Jesus em sua
vida, é o lugar do encontro, da fraternidade, da partilha de vida, de bens e de
dons como Paulo escreveu aos cristãos de Corinto há dois mil anos atrás
(1Cor 12,4-11). Por isso, o discípulo/a de Jesus não pode se apresentar as
pessoas que ainda não creem Nele como alguém triste, sem alegria. O santo
padre, o papa Francisco, escreveu isso na sua Exortação Apostólica
“Evangelii Gaudium”(alegria do Evangelho), quando diz: “ há cristãos que
parecem ter escolhido viver uma quaresma sem páscoa” (n. 6). No entanto,
“a alegria do evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se
encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por ele e são libertados do
pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento! Com Jesus Cristo, a
alegria renasce sem cessar”(n. 1).
De fato, é o que acontece quando deixamos Cristo entrar de verdade
em nossa vida: a alegria da vida retorna. Nada pode nos abalar porque o
Senhor está conosco, sempre. Deixe Cristo transformar uma vida aguada,
sem gosto, numa vida cheia de alegria e esperança, como bem escreveu
João no texto que ouvimos hoje no evangelho. “cantai ao Senhor Deus um
canto novo, manifestem seus prodígios a todos os povos”(Sl 95)

Curitiba, 17 de janeiro de 2016. Segundo domingo do tempo comum.


Pe. Fr. Edson Guedes, OFMcap.

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