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AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE SANTO ANDRÉ

Escola Secundária de Santo André Jan.24


Ano letivo 2023-2024

Domínio de Educação Literária PROFESSORA: Anabela Jorge

Nome __________________________________________ 12.º Ano - Turma ____ N.º_____

LISBON REVISITED (1923)

Não: não quero nada.


Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!


A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!


Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.


Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?


Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!


Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja de companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —


Eterna verdade vazia e perfeita!

Ó macio Tejo ancestral e mudo,


Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...


E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!

LISBON REVISITED (1923)

Atitude abúlica que se opõe à atitude eufórica da fase futurista e sensacionista: cético
angustiado, abúlico, torna-se o poeta da reflexão metafísica, tentando encontrar um sentido
para o mistério da vida

Aspetos futuristas: tom provocatório e irreverente

Aspetos intimistas: tédio, cansaço perante a vida + nostalgia da infância + afastamento dos
outros

abundância de advérbios de negação (“não”) - pessimismo, recusa, revolta perante a vida


(atitude abúlica), como se fosse esta a causa da sua angústia

presente do indicativo (“quero”, v.1) - denuncia o estado de espírito do sujeito poético no


momento presente: negatividade, pessimismo e recusa
“A única conclusão é morrer!”, v.4” - recusa tudo o que é conclusivo, exceto a morte
(semelhança com Ricardo Reis: fugacidade da vida e inevitabilidade da morte)

presente do conjuntivo com valor exortativo ( “falem”, v.6; “Tirem”, v.7) abundância de frases
imperativas (“Não me tragam estéticas!”, v.5): - função apelativa: rejeição da civilização
moderna e das verdades que a sociedade tem para oferecer, atitude resultante do cansaço face
às imposições/normas da vida.

“Que mal fiz eu aos deuses todos?” (v.11)  pergunta retórica: espanto do próprio sujeito
lírico pelo facto de não se deixar levar pelas deslumbrantes conquistas da civilização
moderna, isto é, admiração por ser diferente das outras pessoas
não se insere no sistema social que o envolve e grita a sua diferença de forma pungente,
reivindicando para si mesmo a condição daquele que tem consciência de que entre o seu
“eu” e os outros existe um abismo intransponível.

Temas
- inexorabilidade da morte
- recusa da estética, da moral, das ciências, das artes da civilização moderna: rejeição das
verdades que a sociedade tem para oferecer
- direito à solidão e ao silêncio
- infância como símbolo da felicidade perdida
- agressividade e incompatibilidade entre o “eu” e os outros (sente-se marginalizado,
incompreendido)
- afastamento total face à realidade que o cerca

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