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A Geopolítica Americana

da Independência à Guerra-Fria
João Rua*

RESUMO da Guerra-Fria; basicamente idealista na


A potência imperial americana, tradicio- filosofia e realista na ação. O objetivo deste
nalmente ligada aos temas clássicos da trabalho é apresentar e debater os problemas
estratégia e relações internacionais, é discuti- e contradições que têm marcado tal política,
da, aqui, a partir da influência que as especialmente no que tange em implicações
principais concepções teóricas — idealismo, para a América Latina.
realismo, isolacionismo e internacionalismo/ PALAVRAS—CHAVE:
globalismo — têm tido na sua política exter- Estados Unidos; Poder; Estratégia;
na, nos dois últimos séculos, até o período Política Externa.

FF-

D
e há muito, as relações internacionais A concepção idealista, de base Kantiana, com-
deixaram os gabinetes diplomáticos e preendia que os problemas ligados à guerra e à
as instituições militares e passaram a manutenção da paz seriam resolvidos em um con-
interessar os acadêmicos que passaram a se ocupar, certo de nações que buscaria a harmonia e a co-
preferencialmente, das múltiplas relações entre os operação entre os homens e entre as nações, ba-
eventos internacionais de um país e os seus rebati- lizada (tal harmonia) por princípios morais e
mentos internos com a inevitável valorização dos éticos. A Liga das Nações nasceu a partir desta
temas culturais, econômicos, político-estratégicos, concepção.
dentre outros. As concepções teóricas 1igad2s ao A Segunda Guerra Mundial demonstrou quão
realismo político (doravante chamadas de realis- difícil seria a manutenção de um sistema dessa
tas) e aquelas ligadas ao idealismo, doravante refe- ordem. Principalmente durante a Guerra Fria for-
ridas como idealistas, desde cedo, marcaram os taleceu-se a concepção realista (de base Hobbe-
debates que passaram a interessar uma gama cada siana) que não tem como objeto principal a ex-
vez mais ampla de estudiosos da temática e que só plicação das causas do poder: concentra-se no
recentemente admitiram uma outra concepção poder em si mesmo, sendo a busca deste consi-
chamada de liberal-internacionalista ou globalis- derada inata ao ser humano (Vigevani et al.,
ta. Para Beck (1999, p. 27) trata-se de uma con- 1994, p. 7). Preocupa-se, predominantemente,
cepção de que o mercado mundial substitui a ação com a polaridade política, militar e ideológica e
política numa perspectiva neoliberal que reduz a lança pequena atenção às questões econômicas,
multidimensionalidade da global i7.ação a uma úni- subsumidas por aquelas polaridades. No contexto
ca, a econômica, subordinando as demais dimen- pós-Guerra Fria, esta concepção tem sofrido al-
sões — ecológica, cultural, política etc. gumas transformações e, numa leitura, denomi-

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nada por alguns, neo-realista, incorpora às suas O quadro multipolar anterior à Primeira
tradicionais polaridades as preocupações econô- Guerra Mundial define um equilíbrio de poder
micas. Por exemplo, nas últimas décadas, a tradi- mantido por um grande número de potências
cional proposição realista de independência entre constituídas por antigos impérios ou potências
a esfera interna e a externa na ação dos estados emergentes, como os Estados Unidos — objeto
dificilmente se sustentou, por conta da intensa de nosso estudo; o período de entre-guerras foi
atuação das organizações da sociedade civil. marcado por multipolaridades indefinidas, onde
Como veremos, no decorrer do trabalho, é os Estados Unidos se consolidam como potên-
esta concepção que vai predominar até os dias cia; no período pós-Segunda Guerra desenvol-
atuais, mesmo, eventualmente, "incorporando" ve-se uma bi-polaridade em que os Estados Uni-
ao seu discurso princípios idealistas/internacio- dos passam a definir uma logística global e a
nalistas ou sendo influenciada pela concepção URSS passa a atuar como potência política e
globalista, mas sem abrir mão de uma certa "ra- militar e se torna o "antagônico" dos Estados
zão cínica" que marca indelevelmente a concep- Unidos, numa oposição marcada pela "Guerra-
ção realista. A fusão da concepção realista com a Fria"; com a superação da bi-polaridade e des-
globalista-internacionalista tem sido dominan- mantelamento do império soviético, define-se
te a partir dos anos oitenta, principalmente nos um quadro complexo em que, se por um lado os
Estados Unidos. Estados Unidos emergem como única superpo-
A concepção globalista ou liberal-internacio- tência em termos militares, em termos econô-
nalista tenta incorporar a dimensão e a influên- micos e políticos alternam-se situações em que a
cia das questões econômicas nas relações inter- hegemonia americana se faz sentir e, ao mesmo
nacionais (Vigevani et al. 1994, p. 9). Diferen- tempo, se criam condições para outras potências
temente dos realistas (e neo-realistas), "os glo- fazerem valer suas posições. Estas contradições
balistas consideram que o livre-mercado e a ple- na atuação da superpotência americana marcam
na vigência das regras de concorrência, os mais momento presente e vão constituir uma das
perfeitos possíveis seriam o principal veículo na indagações a serem enunciadas neste trabalho.
maximização das vantagens de todos os atores O momento atual é caracterizado por novas
internacionais, estatais e privados" (Vigevani et questões não tipicamente territoriais como a bi-
al., 1994, p. 11). Valorizam o papel dos atores odiversidade, as patentes de seres vivos ou o uso
privados, demonstrando a importância que as da Internet. Tudo isto marcado por uma volta à
empresas transnacionais/globais adquirem nos discussão da multipolaridade (até mesmo pro-
anos oitenta e como passam a desempenhar pa- vocada pelos Estados Unidos); por uma re-defi-
pel de relevo nas relações internacionais, imbri- nição dos órgãos representativos (como a ONU,
cadas com os órgãos do Estado. Esta concepção na Cúpula do Milênio, no início de setembro
torna-se marcante no pós-Guerra-Fria, durante de 2000); por uma aceleração da economia, que
governo Clinton (mesmo com fortes doses de não vem sendo acompanhada pela política, na
realismo), mas o governo George W. Bush pare- velocidade das transformações por uma série de
ce fundir o realismo, marcado por um crescente novas alianças estratégirns, agora misturadas a
isolacionismo da potência americana e um glo- alianças comerciais, que fazem com que o jogo
balismo marcado por um intervencionismo se- político atual esteja mais preso à economia do
letivo. Os globalistas aceitam que a natureza dos que ao controle efetivo de territórios (como ve-
conflitos internacionais é, antes de tudo de na- remos com relação aos Estados Unidos); por uma
tureza econômica, antes do que ideológico-mili- importância maior das pressões internas, marca-
tar como prescrevem os realistas. das pelos interesses externos dos cidadãos de um

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país, que influem, mais do que nunca, nas polí- go balizaremos nosso recorte temporal no final
ticas externas; por uma transformação das em- da Guerra-Fria.
presas multinacionais em empresas globais, tanto Os primeiros "princípios" que podem ser per-
pela forma de atuação quanto pela área de abran- cebidos como uma proto-geopolítica (o termo
gência, para só citar algumas das múltiplas carac- geopolítica só será cunhado por Kjellen, em
terísticas do complexo momento atual, marcado, 1899) mas que deixaram marras profundas (pre-
profundamente, por novas geopolíticasi de esta- sentes e invocadas até hoje) na logística interna-
dos, empresas, grupos de diversas naturezas e uma cional norte-americana podem ser relacionados
injunção entre os diversos atores. à Doutrina Monroe, ao Destino Manifesto e às
O objetivo central deste trabalho é exami- formulações de A. T..Mahan a respeito do poder
nar, numa visão geral, as ações geopolíticas do marítimo.
Estado norte-americano que redundaram na
afirmação do país como potência planetária, DA INDEPENDÊNCIA A
num período que vai da independência até a POTÊNCIA MUNDIAL
Guerra-Fria.
Nossa opção foi, sobretudo, pelo viés das re- Nas duas primeiras décadas do século XIX, a
lações político-militares, tão importantes no úl- jovem nação americana, ainda em formação, cor-
timo século para a política internacional norte- ria riscos de invasão por potências européias de
americana, por percebê-las sintéticas (no senti- áreas já incorporadas ao seu território ou de áre-
do de integradoras) e, mais especificamente, ge- as que viriam a ser incorporadas, como o litoral
opolíticas, além de ser uma abordagem menos do Pacífico onde ingleses e russos penetravam.
freqüente nos dias atuais. Embora sem desco- O presidente James Monroe reagiu enviando ao
nhecer a dimensão econômica (valorizada pela Congresso uma declaração — a Doutrina Mon-
geografia política), por vezes "submersa" nas tei- roe — que nunca chegou a ser votada como lei,
as das relações político-estratégicas, como no mas sua linguagem ambígua tem servido aos
contexto da Guerra-Fria, por exemplo, aquela mais distintos propósitos, nos dois últimos sé-
dimensão percebe-se ressurgida vigorosa, ulti- culos, principalmente como justificativa às su-
mamente, como veremos na parte final do tra- cessivas intervenções na América Latina. Para
balho quando nos distanciaremos da abordagem Naro (1987)
político-militar-estratégica, e, simultaneamente
do "olhar" dominante até o fim da Guerra-Fria. com a Doutrina Monroe declarou-se que
Como nos ocuparemos dos Estados Unidos e os Estados Unidos não tinham nenhuma
as abordagens predominantes têm sido as con- pretensão sobre as colônias ou dependênci-
cepções idealista/internacionalista, realista (a as de quaisquer potências européias. Da
mais marcante) e globalista/internacionalista mesma forma, alertou-se aos governos eu-
(mesmo que influenciada pelas demais), é a elas ropeus sobre o perigo que correriam caso
que daremos mais atenção e é com elas que dia- insistissem em expandir a sua hegemonia
logaremos. para o hemisfério americano. Segundo um
Para se compreender a presença americana no dos trechos da Doutrina, os Estados Uni-
mundo atual é preciso retomar alguns princípi- dos considerariam a menor tentativa, por
os norteadores do projeto nacional de constru- parte das potências européias, de estender
ção dos Estados Unidos e observar as intencio- o seu domínio a qualquer porção desse he-
nalidades e/ou coincidências que têm favorecido misfério, perigosa para a paz e segurança
a emergência do país como potência. Neste arti- americanas. (Naro, 1987, p. 20)

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No dizer da autora, os Estados Unidos se co- e ao domínio sobre o Caribe; pela aceitação da
locavam como tutores de toda a América. relação ambivalente com a Inglaterra que, ape-
A Doutrina Monroe tem sido, recorrente- sar de numerosos choques, sempre acabou na
mente, invocada para justificar ações de inter- aceitação inglesa da hegemonia americana no
venção diversas, seja no "Big Stick" de Theodore hemisfério ocidental; pelo desejo de expansão do
Roosevelt (1901) seja nas "Políticas de Boa Vi- comércio com o Oriente, especialmente o Japão
zinhança" ou "Aliança para o Progresso". Na ver- e a China.
dade, essa doutrina significava, antes de tudo, Para Pamplona, com as noções de destino
uma autêntica autoproclamação de direitos na- manifesto e de povo escolhido
turais de uma jovem potência que emergia do
outro lado do Atlântico, para o livre exercício de que teria como missão difundir as tra-
sua política de expansão nesta parte do globo, dições democráticas e igualitárias da Re-
conforme nos mostra Costa (1992, p. 66). volução Americana, com as quais (a opi-
À medida que o processo de colonização do nião pública) ainda acreditava findamen-
Oeste prosseguia, o colono participava de um tar suas ações, fez-se o ajuste com as práti-
compromisso ideológico a que Francis Sullivan cas concretas que exigiam o emprego da
denominou, em 1845, de o Destino Mandes- força para a expansão do comércio e do po-
to2, que representava um desejo, compartilhado derio naval norte-americanos. (Pamplona,
pelos colonos de estender a sua "comunidade" 1995, p. 32)
até o Pacífico (Naro, 1987, p. 6). Enquanto os
norte-americanos avançavam sobre o remoto Juntando-se a isso as formulações do spence-
Oeste, pressupostos românticos intensificavam- rianismo ou do darwinismo social que entendi-
36 lhes a fé sobre a superioridade e o destino glori- am como natural a expansão dos mais fortes so-
oso de suas instituições livres, as quais teriam a bre os mais fracos e a missão civilizatória e cristi-
missão de espalhar-se por todos os vastos terri- anizadora do homem branco, além da difusão
tórios a oeste do Mississippi. Nesse conjunto de do progresso à maneira ocidental, teremos o ba-
idéias vagas cabiam os interesses dos especula- lizamento moral e ético para as ações geopolíti-
dores de terras, dos colonos ávidos de terras li- cas que caracterizaram o final do século XIX. A
vres e religiosos desejosos de estender sua atua- presença norte-americana no ultramar é neces-
ção missionária para o oeste e para o Pacífico. sária, pois "o processo civilizatório cria mais e
A anexação do Texas, a guerra com o México mais nobres necessidades e o comércio segue o
(com a conseqüente incorporação do vasto oes- missionário" (Sellers et al, 1985, p. 265).
te) e a atuação na bacia do Pacífico e o domínio O capitão (depois almirante) Alfred T.
do comércio com o Oriente, a partir dos portos Mahan, estudioso da influência do poder marí-
de San Diego, San Francisco e do Puget Sound timo sobre a história, afirmava que uma nação
(já em meados do século XIX) demonstram bem agrícola e industrial moderna necessitava de
como esse ideário serviu como justificativa a ex- mercados externos para seus excedentes. Para isso
pansionismos de diversas naturezas. uma marinha mercante eficiente apoiada por forte
Os interesses externos, seletivamente apoia- marinha de guerra, a aquisição de portos e de
dos pela opinião pública norte-americana, eram, estações carvoeiras no exterior passaram a ser exi-
segundo Sellers et al. (1985, p. 263), constitu- gências de uma grande nação expansionista, re-
ídos basicamente: pela expansão de governos li- presentada por uma elite da política externa da
vres, republicanos e constitucionais; por uma qual Mahan fazia parte, além de Theodore Roo-
aceitação das idéias ligadas à Doutrina Monroe sevelt, que se tornaria presidente dos Estados

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Unidos. Todo esse movimento expansionista com Ainda focalizando esse ideário que serviu (tem
vistas à dominação de recursos e mercados, do servido?) como justificativa e estímulo às ações
final do século XIX, teria seu coroamento com a encetadas pelo Estado americano, Baudrillard,
construção do Canal do Panamá, inaugurado em complementa ao escrever que:
1914, defendida por Mahan.
Costa (1992, p. 69) lembra que, "com A convicção idílica dos americanos de
Mahan, surge uma ótica norte-americana das que são o centro do mundo, a potência
relações internacionais nesse contexto", princi- suprema e o modelo absoluto não é falsa. E
palmente após sua obra mais importante publi- baseia-se menos nos recursos, nas técnicas e
cada em 1890 ( The Influence of Sea Power Upon nas armas do que no pressuposto milagroso
History) ou a de 1900 (The Problem of Ásia and de uma utopia encarnada, de uma socie-
its Effect Upon International Politics) na qual pre- dade que se instituiu a partir da idéia de
coniza a importância de pontos de apoio (colô- que é a realização de tudo aquilo com que
nias ou protetorados) em volta do continente as outras sociedades têm sonhado. Ela (a
eurasiático e espalhados pelo globo para o de- sociedade) sabe-o, crê nisso e, finalmente,
senvolvimento das atividades navais e para a os outros também crêem. (Baudrillard
manutenção da hegemonia pelas potências ma- apud Rua, 1998, p. 62)
rítimas e navais. Além de valorizar a interdepen-
dência das marinhas mercantes e de guerra, como Esse mundo ideal, para o mesmo autor, tem
já vimos, demonstra que o poder marítimo tem sido consagrado pelo cinema que, juntamente com
sua chave em três elementos: produção, navega- outros mass-media, tem mundializado, para o
ção e colônias, e que é necessária uma prepara- senso comum, o modelo americano de sociedade.
ção militar com a transformação de seu potenci- A emergência da potência americana pode ser r-;
al econômico territorial e marítimo em poder buscada no século XIX, logo após a Guerra da
estratégico, ainda de acordo com Costa (1992, Secessão, quando, com exceção de alguns confli-
p. 72-73). tos internos contra os índios no Oeste, começa
Rua (1998), ao analisar esse quadro geral de um sistemático processo de expansão externa em
princípios que marcaram o século XIX como o direção à Ásia do Pacífico e à América Latina. A
século da formação e da expansão da potência aquisição do Alasca, comprado à Rússia em 1867;
americana, demonstra que: nesse mesmo ano a anexação das ilhas Midway;
a deflagração da guerra contra a Espanha, em
Desse modo, a idéia do Oeste Selva- 1898, que impulsionou a expansão para a Ásia
gem que precisava ser conquistado e do- e para as Antilhas, marcaram a política america-
mado, funcionou como signo dos mais im- na de superar as potências européias na busca
portantes da história americana. As aspi- por mercados.
rações territoriais têm se somado às aspira- A influência americana no século XIX foi con-
ções de liberdade, tanto para as populações seguida graças à obtenção de possessões, prote-
oprimidas dos outros continentes, quanto torados e à intervenção militar em diversas áreas
para os oprimidos no próprio país. As pla- do mundo, que colocaram os Estados Unidos na
nícies, as montanhas e os desertos, divul- primeira linha das potências mundiais, mas tam-
gados pelo cinema, acabaram por se tornar bém se pode afirmar que houve um "exoterismo
marcas da liberdade e da amplidão que carregado de princípios expansionistas e conver-
dominam a sociedade americana. (Rua, tido em pragmatismo, através de aquisições e
1998, p. 61-62) anexações realizadas pela União", no dizer de

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Barbosa (apud Rua, 1998, p. 56). Ou, conti- mos, priorizava o poder marítimo, enquanto
nuando com Rua (1998, p. 56), "A Primeira Mackinder prioriza o poder terrestre), mas não
Guerra Mundial, ao arruinar os países europeus, deixaram de ser a interlocução básica para os
facilitou a ascensão dos Estados Unidos, o que analistas. Suas principais obras foram: The Geo-
só vai se concretizar, efetivamente, no pós-Se- graphical Pivot of History (1904) e The Round
gunda Guerra Mundial, quando se torna a po- World and the Winning of the Peace (1943).
tência-lider do bloco capitalista". Mello assim apresenta o pensamento de Ma-
ckinder:
UM INTERVENCIONISMO
MILITANTE CADA VEZ MAIS Essa teoria tinha como idéia-chave a
PRONUNCIADO existência de uma rivalidade secular en-
tre dois grandes poderes antagônicos que se
Nas primeiras décadas do século XX, ainda confrontavam pela conquista da suprema-
com forte influência do grupo do qual Mahan cia mundial: o poder terrestre e o poder
fazia parte, os Estados Unidos dão os passos de- marítimo. O primeiro sediava-se no cora-
cisivos para se tornarem a potência dominante ção da Eurásia e, mediante uma expansão
dos anos novecentos. As influências que se farão centrífuga, procurava apoderar-se das re-
sentir na geopolítica americana, ao longo deste giões periféricas do Velho Mundo e obter
século, serão variadas e abrangem Mackinder, saídas para os mares abertos. O segundo,
Haushofer, Spykman, Brzezinski, sem falar de situado nas ilhas adjacentes ou nas regiões
Bowman, Hartshorne, Gottman e outros para marginais eurasianas, controlava a linha
só citar alguns dos que se debruçaram preferen- circunferencial costeira do grande continen-
371 cialmente sobre os Estados Unidos, com traba- te e, mediante uma pressão centrípeta,
lhos fundamentais, principalmente na área aca- procurava manter o poder terrestre encur-
dêmica, mas não somente aí, como bem mostra ralado no interior da Eurásia. (Mello,
Costa (1992, p. 232-233) 1999, p. 11-12)
Os trabalhos do geógrafo britânico Halford
Mackinder servem de base para grande parte da Retomada várias vezes, esta teoria foi revista
geopolítica do século XX. Embora não sendo no auge da Segunda Guerra, adicionando-lhe
americano, seus estudos influenciaram, sobrema- novas contribuições como, por exemplo, a subs-
neira, a política externa americana e os pesquisa- tituição do mapa mundi plano que usava até
dores deste século. então por um redondo (Round World) que per-
Sinteticamente pode-se dizer que Mackinder, mitiu ajustes e correções à teoria do Heartland.
numa época marcada pelo poder naval inglês, Para Costa:
dirigiu sua atenção para as vantagens geoestraté-
gicas do poder terrestre sobre o poder marítimo. Do ponto de vista de uma geografia
Para ele, a posição pivô do Heartland, situado no política aplicada às estratégias globais,
centro da massa terrestre eurasiana, significava numa conjuntura marcada por disputas
que quem ocupasse essa posição exerceria influ- hegemônicas, em escala mundial, as idéi-
ência dominante na política mundial e domina- as de Mackinder, essencialmente pragmá-
ria as potências marítimas. Marcada por fortes ticas e destinadas a formar opinião, aca-
influências organicistas, as formulações de Ma- baram por influir numa ampla área do
ckinder foram muito combatidas, pois se opu- pensamento geopolítico, o que inclui até
nham às formulações de Mahan (que, como vi- mesmo autores notoriamente situados em

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campos opostos. Assim, Haushofer e seu gru- co de espaço geral e abstrato, uma entida-
po tomam-lhe emprestado o conceito de de que modela e determina todas as de-
Heartland e o aplicam à geopolítica alemã mais esferas da vida social, ele conclui que
envolvida pelos projetos do III Reich. (Cos- espaço rege a história da humanidade.
ta, 1995, p. 78) Também como Ratzel, condena os povos
que se conformam com as pequenas como-
Outra forte influência sobre a geopolítica didades de um rincão seguro e acolhe-
americana (e mundial) é a que exerceu o alemão dor, preferindo os que almejam o espaço
Karl Haushofer. Seja por influência direta sobre ideal ao seu futuro. (Costa,1992, p. 132)
os círculos militares, seja pelo desejo, por parte
de geógrafos americanos (Bowman, Hartshorne Por conta do comprometimento ideológico
e outros) de se contraporem às idéias geopolíti- da geopolítica alemã, tanto a geopolítica em ge-
cas alemãs, que consideravam anti-científicas ral como a própria geografia política ficaram bas-
(Costa, 1992, p. 120). tante atingidas e, como veremos, somente nos
Foram as teses do Heartland e da ilha mun- anos 70, no contexto da Guerra Fria, esses cam-
dial, desenvolvidas por Mackinder, juntamente pos do conhecimento retomam sua importância
com a teoria orgânica de estado (desenvolvida científica.
por Ratzel), que constituíram a base para a geo- Continuando na busca das principais influ-
política alemã. A visão orgânica de Estado afir- ências sobre a geopolítica americana, agora nos
mava que todos os componentes deste cresciam períodos anteriores e posteriores à Segunda Guer-
juntos, em um único corpo, com vida própria e ra Mundial, retomamos, com Spykman, as in-
em harmonia. Os valores espirituais, transcen- fluências de Mahan e, principalmente, de Ma-
dentais da união solo/gente (que vêm de Hegel ckinder. 39
1
e Herder) acrescidos do darwinismo social, ser- Challand e Rageau (1993, p. 28) resumem
viram de justificativa intelectual para os objeti- bem as idéias de N.J. Spykman que, inspiran-
vos expansionistas da geopolítica alemã. do-se em Mackinder, adapta alguns conceitos
Profundamente marcado pelas concepções elaborados por este último às circunstâncias dos
geopolíticas do sueco Kjellen, Haushofer, e o anos 30. De acordo com esses autores, o geógra-
grupo ao qual pertencia, desenvolvem, em Mu- fo Spykman, que tinha uma visão do mundo
nique, no entre-guerras, uma linha milito pró- como um sistema fechado em que nenhum país
pria de análise geopolítica baseada em três eixos: pode ficar isolado de suas relações com os de-
conceito de espaço, enunciado por Ratzel, e a mais, argumenta quç somente uma aliança an-
demonstração de que uma potência necessitava glo-americana (potências marítimas) e russa (po-
de espaço; o conceito de ilha mundial e de He- tência terrestre) poderiam impedir a Alemanha
artland desenvolvidos por Mackinder; a combi- de controlar as regiões costeiras eurasiáticas e
nação Norte-Sul dos continentes apresentada por atingir, assim, a dominação mundial. Ele rejei-
Haushofer e que influencia, mesmo hoje em dia, ta, entretanto, as conclusões estratégicas de Ma-
a política euro-africana da União Européia ckinder concernentes à importância do contro-
(Challand e Rageau, 1993, p. 28). le da área pivô do mundo (Heartland), privele-
Costa demonstra que giando o controle do anel marítimo (Rimland)
que cerca o Heartland.
Haushofer leva a extremos o que cha- Mello (1999, p. 93), ao traçar um panorama
mamos de determinismo territorial de do grande debate que se travava nos Estados
Ratzel. Partindo de um conceito metafisi- Unidos a respeito dos aspectos fundamentais da

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grande estratégia a ser adotada pelo governo necessidade de se lembrar a importância destas
americano no campo da política internacional, formulações no contexto do pós-guerra e do esta-
no período de entre-guerras, apresenta as prin- belecimento dos pactos militares subseqüentes.
cipais correntes que o influenciavam, algumas Os anos 70, em pleno contexto da Guerra
atuando como diretrizes desde o século XIX, Fria, marcam o ressurgimento da geopolítica
outras desenvolvidas nas primeiras décadas do americana agora relacionada aos nomes de Ag-
século XX. new, Kissinger e Brzezinski, às teorias do Domi-
O problema da manutenção da paz mundial nó, e da Contenção com influências do Hear-
num período de ascensão do nazi-fascismo colo- tland de Mackinder e do Rimland de Spykman
cou em campos opostos os partidários do idea- (retomado) e de sua Doutrina Truman disposta
lismo e do realismo em matéria de relações in- a barrar, por todos os meios, inclusive militares,
ternacionais. o expansionismo soviético. Aparece, aí, bastante
Os idealistas, marcados pelo espírito wilso- reforçado, o debate entre realistas/neo-realistas
niano (pensamento internacionalista do presi- e os globalistas/internacionalistas enquanto os
dente Wilson), propunham a adoção de um sis- isolacionistas ficam sem qualquer destaque num
tema de segurança mundial para preservar a paz, contexto marcado pela Guerra-Fria.
coordenado pela Liga das Nações. Os realistas Desta última fase (pós-anos 70), escolhemos
demonstravam que a paz só poderia ser mantida Brzezinski, para focalizar por conta de ser um
mediante uma política de poder norteada pelos dos mais importantes formuladores da política
critérios da segurança e interesses nacionais. de distensão, através da contenção, durante o
Concepções mais tradicionais do pensamen- governo Carter da segunda metade dos anos 70
to americano, nessa matéria, incluíam os isolaci- cuja obra mais importante foi Game Plan: a
40 onistas e os intervencionistas (que vêm desde a Geoestrategic Framework for the Conduct of U.S.-
independência e que acabaram por se fundir às Soviet Contest de 1986. Basearemos, inicialmen-
outras duas concepções). Os primeiros foram te, nossas referências em Mello (1999, p. 135).
responsáveis pela não participação do país na Brzezinski, naquela obra, faz uma análise ge-
Liga das Nações e defendiam uma política de opolítica e estratégica do conflito americano-so-
"esplêndido isolamento" em relação aos assun- viético, promove um balanço global da confron-
tos exteriores ao continente americano, já que o tação Leste-Oeste, sugere linhas de ação para a
país se encontrava protegido pelos dois maiores política de segurança nacional norte-americana
oceanos. Os intervencionistas advogavam a par- e esboça cenários sobre os desdobramentos da
ticipação americana em todos os eventos que rivalidade entre as duas superpotências que,
colocassem em perigo a segurança e os interesses anos mais tarde, mostraram atualidade quando
do país, a exemplo do que ocorrera na Primeira do esfacelamento do império soviético que ele
Guerra Mundial. anunciara, ao demonstrar que o poderio desse
Spylcman, realista intervencionista, participou império era unidimensional e que as despesas
ativamente desse debate e escreveu duas obras militares exageradas conduziriam à sua derroca-
essenciais para a discussão na época (American da, o que se antecipa às teses declinistas de Paul
Strategy inWorld Politics e Geography ofthe Peace, Kennedy.
ambas em 1944) onde afirmava que as forças A política de contenção americana, frente à
americanas tinham de ocupar as bordas do con- expansão soviética em busca do domínio da Eu-
tinente eurasiano (primeira linha de defesa), rásia e da preponderância mundial, apresentada
para, então, estabelecer a segunda linha de defe- por Brzezinski, desenvolve-se ao longo de três
sa no próprio continente americano. Não há frentes estratégicas basilares: a do Extremo Oci-

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dente da Eurásia, a do Extremo Oriente da Eu- percebidas pois influenciam todo o planeta e se
rásia e a do Sudoeste da Ásia onde existem "Es- constituem um espelho para grande parte da
tados-pinos geopolíticos", com maior influência população mundial.
política, maior peso econômico ou geoestratégi- Há, entretanto, um contraste nítido entre a
co, que deveriam merecer maior atenção dos Es- imagem projetada internacionalmente pelos Es-
tados Unidos. As alianças militares demonstram tados Unidos e a que a população americana tem
bem esta intenção. de seu país e dela mesma. Isto ocorre por conta
Outro autor que valoriza (e critica) as contri- de contrastes e contradições vividas pela política
buições de Brzezinsk é Vesentini (2000, p. 95) externa americana e pela imagem projetada in-
quando analisa as idéias de Kissinger e Brzezinski terna e externamente, num movimento de inde-
dentro do "realismo geoestratégico" como com- finições (isolacionismo, intervencionismo, realis-
ponente da nova ordem mundial. Diz aquele mo, idealismo) que marca aquela política há sé-
autor que culos.
Jacquet e Moisi, de quem transcrevemos
Em resumo, tanto Kissinger quanto Br- muitas das idéias aqui apresentadas (1996, p.
zezinski ( e também, embora com impor- 259), demonstram que quando os americanos
tantes nuanças, Huntington) identificam- elegeram Clinton, em 1992, após o triunfo de
se com o chamado realismo — a corrente Bush na Guerra do Golfo, queriam alguém que,
que vê somente ou principalmente o Esta- sobretudo, olhasse para a "casa" deles. Isto só
do nacional como protagonista no cenário aconteceu em parte — recuperou-se a produção
mundial e a sua atuação tem por base não econômica, as taxas de desemprego caíram mui-
ideais (democracia, direitos humanos, igua- to — mas não há como os Estados Unidos pode-
litari smo etc.) e sim interesses materiais — rem voltar-se exclusivamente para si mesmos, 41-
e ambos, especialmente Brzezinski, são como deseja boa parte da população. A insegu-
quase continuadores da tradição geopolíti- rança interna e externa torna-se obsessiva e o
ca clássica: Kissinger e Brzezinski racioci- contraste entre a imagem de potência projetada
nam principalmente em termos geoestra- para o exterior com a imagem de vulnerabilida-
tegicos e estão preocupados, antes de tudo, de vivida pelo cidadão médio é mais perceptível
com a manutenção da hegemonia global do que nunca. Os debates entre os candidatos
dos Estados Unidos. (Vesentini, 2000, p. Gore e George W. Bush, na eleição em fins de
109) 2000, demonstraram as ambigüidades da polí-
tica externa norte-americana. O primeiro apre-
UMA SUPERPOTÊNCIA. À sentava uma posição mais globalista/internaci-
PROCURA DE UM PAPEL onalista do que o segundo, com um discurso
isolacionista marcado por um intervencionis-
Os Estados Unidos continuam a representar mo seletivo, desde que ameaçados os interesses
um papel central no mundo atual. Eles estão nacionais.
onipresentes e tornaram-se a referência obriga- Para os americanos continua a interrogação
tória, como modelo negativo ou positivo. Sua sobre o papel dos Estados Unidos perante um
política externa, incluindo a comercial — básica mundo que a população conhece muito mal e
para compreender as relações internacionais e não consegue estabelecer os nexos necessários
geopolíticas atuais; seus problemas sociais: suas entre o "eu e o outro". A política externa é um
produções culturais, incluindo a produção cine- assunto de poucos. Por outro lado a geografia na
matográfica e musical, não podem passar desa- escola americana nunca se colocou como disci-

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plina afirmada... E México, Brasil, Vietnam ou associadas a reformas institucionais, desestatizan-
Somália pouca diferença (?) fazem para o públi- tes, sustentadas pela abundante oferta de capi-
co americano, quando mencionados na mídia. tais, propiciada por uma crescente globalização
A Guerra Fria ajudava muito no equaciona- financeira.
mento da relação com a alteridade, simplifican- Em plena época do predomínio do discurso
do-a. Havia um inimigo facilmente identificável anunciador do "declinismo" norte-americano,
e o jogo da segurança interna, ao coincidir com Tavares (1998) , em artigo escrito em 1985, cha-
o intervencionismo, desta vez socialmente legi- ma atenção para a capacidade de recuperação da
timado, nas relações internacionais, satisfazia o hegemonia dos Estados Unidos ao afirmar que:
cidadão comum. Este maniqueísmo permitiu
reconciliar duas escolas opostas do internacio- O fulcro do problema [da recuperação]
nalismo americano, idealismo e realismo, contra não reside sequer no maior poder econômi-
um inimigo tão claramente identificável. co e militar da potência dominante, mas
Esses balizamentos políticos subsumiram os sim na sua capacidade de enquadramento
econômicos. No período da Guerra-Fria, Os Es- econômico-financeiro e político-ideológico
tados Unidos exerceram uma "hegemonia com- de seus parceiros e adversários. Este poder
placente" (Fiori, 1998, p. 103), estimulando a deve-se menos à pressão transnacional de
recuperação européia e japonesa e aceitando o seus bancos e corporações em espaços locais
intervencionismo estatal que culminou na cria- de operação, do que a uma visão estratégi-
ção do Welfáre State e da atual União Européia. ca da elite financeira e militar americana
Ao mesmo tempo, o conflito ideológico alcança- que se reforçou com a vitória de Reagan.
va os países subdesenvolvidos e transformava o (Tavares, 1998, p. 28)
—Zr! "desenvolvimentismo" na grande bandeira oci-
dental contra a expansão socialista com promes- Haveria, de acordo com a autora, uma acei-
sas de superação do atraso econômico e da dimi- tação geral da necessidade de ajustes recessivos,
nuição das desigualdades sociais. como política econômica, sincronizados com uma
A crise econômica dos anos setenta atinge os ideologia conservadora.
Estados Unidos, o projeto desenvolvimentista e fim da Guerra-Fria coloca novamente o
as políticas de base Keynesiana, ainda em plena debate entre os idealistas e realistas, frente à glo-
Guerra-Fria, e alimenta os discursos sobre a de- balização e à complexificação do mundo, forne-
cadência norte-americana como potência mun- cendo às contradições americanas uma ocasião
dial. O conservador Ronald Reagan reacendeu única para se explicitarem. Hoje em dia, soter-
os conflitos da Guerra-Fria (diplomacia das ar- rados os fantasmas da Guerra Fria, retoma-se o
mas) e, com seus planos de valorização do dólar debate secular sobre a estratégia exterior e das
e a aliança entre o poder do estado e o capital, relações com os outros países, fortemente mar-
principalmente o financeiro (diplomacia do dó- cado pela emergência da concepção internacio-
lar), estabeleceu as bases para a recuperação da nalista/globalista se contrapondo aos realistas e
hegemonia americana. Ainda de acordo com Fi- isolacionistas.
ori (1998, p. 121), nos anos oitenta "consolida- Até o fim da Guerra-Fria continuaram vigo-
se e generaliza-se a nova estratégia econômica rando os princípios clássicos da geopolítica ame-
norte-americana para sua periferia... Em 1989, ricana vindos da Doutrina Monroe e do Desti-
um economista norte-americano chamou de no Manifesto. Apenas as formulações do poder
Consenso de Washington ao programa de polí- marítimo estavam superadas pelas novas tecno-
ticas fiscais e monetárias". Tais políticas foram logias bélicas. O novo papel dos Estados Unidos

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no pós-Guerra-Fria merece um estudo aprofun- Neste artigo tentaremos juntar estas duas concepções.
dado que está sendo efetuado. 2 Esse jornalista proclamava o direito divino do povo
O lugar que os Estados Unidos ocupam no americano de subjugar o continente e espalhar suas
instituições benevolentes sobre ele.
mundo não permite o isolacionismo que alguns
americanos almejam (e que o presidente atual
REFERÊNCIAS
prioriza). A verdadeira questão posta atualmen-
BIBLIOGRÁFICAS
te é muito mais sobre a natureza do intervencio-
nismo do que sobre o intervencionismo em si.
BECK, Ulsich. O que é Globalização? Equívocos do
Os problemas econômicos, políticos e sociais globalismo. São Paulo: Paz e Terra, 1999. 282p.
crescentes vividos internamente pelo país (em- CHALIAND, G. e RAGEAU, J. Atlas Stratègique. Paris:
bora com grandes realizações, nesses aspectos) Librairie Arthème Fayard, 1993. 220 p.
conduzirão a qual política externa? Contradições CHIAPPIN, J. R. N. O Paradigma de Huntington e o
e contrastes no interior da sociedade americana Realismo Político. Lua Nova, CEDEC, São Paulo, n. 34, p.
(Rua, 1998, p. 79) têm se refletido, freqüente- 37-54. 1994.
mente, nas indecisões (e, às vezes, falta de coe- COSTA, Wanderley Messias da. Geografia Política e
rência) quanto à política externa, setor que pou- Geopolítica. São Paulo: HUCITEC, 1992. 374 p.
co interessa ao público americano. Isto tem dado FIORI, José Luis. Globalização, hegemonia e império. IN:
TAVARES, Maria da Conceição e FIORI, José Luis (orgs.).
ao presidente e ao congresso a possibilidade de
Poder e Dinheiro — uma economia política da globalização.
um intervencionismo seletivo (intervenção em
Petrópolis: Vozes, 1998. 413 p. p. 87-150.
algumas situações e abandono de outras). JACQUET, J. e MOISI, D. Une Superpuissance em quête
d'um role. Ramsés 1997, Institut Français dês Rélations
NOTAS Internationales, Paris, p. 229-280. 1996.
MELLO, L. I. A. Quem tem Medo da Geopolítica? São
Professor-assistente do Departamento de Geografia da Paulo: Hucitec/Edusp. 1999. 228 p.
UERJ e do Departamento de Geografia e Meio-Am- MOISI, D. États-Unis: Réglages Externes et Incertitudes
biente da PUC-RIO. Politiques. Ramsés 1998, Institut Français dês Rélations
Como definição básica de Geopolítica, ficamos com Internationales, Paris, p. 61-71. 1997.
dois momentos de Vesentini quando escreve que "a NARO, Nancy. A Formação dos Estados Unidos. Campinas:
geopolítica, então, é o discurso do Estado capitalista Atual/UNICA2v1P, 1987. 72 p.
sobre o espaço geográfico; é o conhecimento (sempre PAMPLONA, M.A. Revendo o Sonho Americano (1890-
voltado para a ação) que visa a assegurar e fortalecer a
1972). São Paulo: Atual, 1995. 106 p.
soberania de um Estado nacional tanto em relação
RUA, J. Estados Unidos: Crise e Recuperação da Potência
aos demais Estados como sobre o seu território, no
Imperial. IN: HAESBAERT, Rogério (org.). Globalização e
seio da sociedade onde ele encontra sua razão de exis-
Fragmentação no Mundo Contemporâneo. Niterói: EdUFF,
tir" (1986, p. 57). Fica patente, aí, mais uma vez, a
1998. 308 p. p. 55-104.
ação intencional relacionada à soberania. O mesmo
SELLERS, Charles; MAY, Henry; MCMILLEN, Neil R.
autor, em obra recente (Vesentini, 2000, p. 10), ao
tentar distinguir estratégia, geoestratégia e geopolíti- Uma Reavaliação da História dos Estados Unidos. Rio de
ca, lembra que esta última "tem como preocupação Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990. 472 p.
fundamental a questão da correlação de forças — an- TAVARES, Maria da Conceição. A retomada da Hegemo-
tes vista como militar, mas hoje como econômico- nia norte-americana.IN: TAVARES, Maria da Conceição e
tecnológica, cultural e social — no âmbito territorial, FIORI, José Luis (orgs.). Poder e Dinheiro — uma economia
com ênfase no espaço mundial". Amplia-se, assim, o política da globalização. Petrópolis: Vozes, 1998. 413 p. p.
conceito, tentando superar a relação direta geoestra- 27-54.
tégia/geopolítica, embora, como o próprio autor ad- VESENTINI, J. W. A Capital da Geopolítica. São Paulo:
mite, na prática isto sempre tenha sido extremamen- Ática, 1986. 249 p.
te dificil.

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VESENTINI, J. W. Novas Geopolíticas. São Paulo: Contex- realism, isolationism and internationalism
to, 2000. 125 p. — have had on its foreign policy during the
VIGEVANI, T; VEIGA, J.P.C.; MARIANO, K.L.P.
two last centuries; basically idealistic in
Realismo versus Globalismo nas Relações Internacionais.
Lua Nova, CEDEC, São Paulo, n. 34, p. 5-26. 1994.
philosophy but realistic in execution. The
aim of the present essay is to show and
A.13STRACT debate the problems and contradictions
that had paved such policy, especially its
The American imperial potency,
implications for Latin America.
traditionally linked with classic themes of
strategy and power relations, is discussed KEy-woRns:
here in terms of the influence that the United States; Power; Strategy; Foreign
main theoretical approaches — idealism, Policy.

-71
,4

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