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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


DISCIPLINA DE HISTÓRIA DAS RELAÇÕES ETNICO-RACIAIS
DOCENTE: Fábio Kühn
DISCENTES: Paulo Briskevitski (00333200)

RESENHA CRÍTICA
TEXTO: Scheidt, E. (2002). Ecos da revolução farroupilha no Rio da Prata. Revista
Eletrônica Da ANPHLAC, (2), 29–45. https://doi.org/10.46752/anphlac.2.2002.1341

INTRODUÇÃO:
O artigo “Ecos da Revolução Farroupilha no Rio da Prata”, produzido por
Eduardo Scheidt, à época Doutorando em História na USP, foi publicado na Revista
Eletrônica da ANPHLAC, n° 2, de 2002. Nele, o autor analisa a repercussão que a
Revolução Farroupilha teve nos jornais republicanos de Montevidéu e Corrientes,
que faziam oposição ao governador de Buenos Aires, Juan Manuel de Rosas. Assim
como as relações estabelecidas entre as facções políticas do Rio da Prata e os
Farroupilhas no Rio Grande do Sul.

RESUMO:
Inicialmente, o autor preocupa-se em evidenciar a relação de longa data
entre os habitantes da região do Rio Grande do Sul e os grupos políticos centrados
no Rio da Prata, destacando sobretudo o intercâmbio extra-fronteiriço de ideias
entre os rio-platenses e os rio-grandenses.
As relações entre esses, tornaram-se mais vivas em 1835, quando no mesmo
ano, Rosas assume o governo de Buenos Aires pela segunda vez, com uma política
centralizadora; e a Revolução Farroupilha, que mais tarde declararia seu caráter
republicano e separatista, começa no sul do Império Brasileiro. Mais tarde, com a
retomada do poder no Uruguai, por parte de Frutuoso Rivera em 1839, opositor do
regime rosista, os Farroupilhas alinham-se com Rivera e a província argentina de
Corrientes, com um discurso republicano e anti-rosista, assinando, inclusive, três
tratados diplomáticos entre 1838 e 1844. Nesse momento, Montevidéu se torna o
centro das forças contrárias à Rosas.
A partir daí, a imprensa platina começou a noticiar com bastante frequência
os acontecimentos na província rio-grandense. Assim, apesar do Uruguai
oficialmente ter declarado neutralidade diante do conflito, Rivera celebrou acordos
secretos com a República Rio Grandense, e a imprensa local, sobretudo o jornal El
Nacional, publicava textos de intelectuais e figuras públicas republicanas em apoio
aos revolucionários. Dessa forma, construiu-se uma simpatia pela Revolução
Farroupilha por parte dos republicanos rio-platenses, com alguns enxergando nessa
a continuidade da Revolução de Maio de 1810.
Porém, os interesses platinos na revolução iam além de proximidade
ideológica, pois, como explica o próprio autor, “uma vitória do movimento
rio-grandense seria um enfraquecimento do Brasil, que não havia abandonado seus
projetos de reincorporar o Uruguai em seu território.” (SCHEIDT, 2002, p. 11) Dessa
forma, as publicações de textos referenciando o movimento farroupilha continuaram
até 1840, quando praticamente desapareceram, por conta do declínio do processo
revolucionário. Ao mesmo tempo, Rosas se fortalecia em Buenos Aires e frustrava
seus opositores em Montevidéu, o que dificultava qualquer tipo de aliança com os
Farroupilhas.
Dessa maneira, seguiram-se as coisas até 1842, quando a convocação de
uma Assembléia Constituinte na República Rio Grandense colocou o movimento
farroupilha novamente nas manchetes dos jornais de Montevidéu e Corrientes. Isso
se deu, pois a formação de uma assembleia constituinte era uma das demandas
centrais dos opositores do regime rosista.
Por fim, o autor conclui ressaltando que a dinâmica entre a Revolução
Farroupilha e a imprensa rio-platense, demonstra claramente como as relações
entre diferentes facções políticas no entorno do rio da prata eram comuns, diante
de um contexto em que as identidades locais, sobrepunham-se às identidades
nacionais.

ANÁLISE DO ARTIGO:
Diante do apresentado por Eduardo Scheidt, acredito que, em geral, ele
tenha sido feliz em evidenciar as repercussões da Guerra dos Farrapos nos jornais
Uruguaios e da província de Corrientes. Pois, como evidencia Spencer Leitman, em
seu livro “Raízes Sócio-Econômicas da Guerra dos Farrapos”, de 1979, o interesse
platinos no conflito e as ligações, inclusive pessoais, entre as lideranças políticas da
região eram bastante intensas, o que certamente garantiu a repercussão do conflito
nos jornais palatinos, tanto em Montevidéo, como em Corrientes.
Além disso, o autor indica que entre o ano de 1838 e 1839 as publicações
nos jornais referentes ao conflito tiveram um pico. Nesse sentido, as razões que ele
apresenta para isso são: 1) O vitorioso avanço das tropas revoltosas republicanas
nesse período; e 2) a tomada do poder por Fructuoso Rivera no Uruguai, grande
opositor do regime Rosista. Além desses, o enfraquecimento do Império Brasileiro,
através da independência da província do Rio Grande do Sul, aparece como um
terceiro, e talvez mais definitivo, motivo.
Aqui, porém, é onde Scheidt faz uma análise insuficiente. Pois, acredito que
haja um quarto motivo, mais ou menos central, para a intensa circulação de
publicações sobre o conflito no período. Esse, deve-se ao fato dos Farroupilhas
anteriormente terem “vacilado” nas suas posições republicanas. Como apresentou
Arthur Lima de Avila, (2011, p. 197), Bento Gonçalves, no início do processo de
revolta, apresentava os motivos da insatisfação relacionando-os a uma má
administração do Império, e não, necessariamente, à monarquia. Assim, o caráter
republicano e separatista que posteriormente viria a adquirir a revolta, surgiria
apenas diante de uma conjuntura específica. Dessa forma, a adoção do
republicanismo e separatismo, relaciona-se com o endurecimento das posições do
Império diante das reivindicações iniciais dos Farroupilhas.
Além disso, antes de alinhar-se com Montevidéu e Corrientes, os Farrapos
mantiveram boas relações justamente com Manuel Oribe e buscavam apoio de Juan
Manuel Rosas. Porém, mudou-se a conjuntura e mudaram-se os aliados, e, após as
negociações com Rosas não garantirem o apoio esperado, juntamente com o
fortalecimento da facção de Rivera contra Oribe, os Farrapos passam a apoiar
Rivera no Uruguai e seus aliados na província de Corrientes. (Avila, 2011, p. 197).
Portanto, acredito que a imprensa rio-platense esforçou-se também para
convencer a opinião pública de que os Farrapos seriam genuínos aliados
republicanos. Afinal, a publicação de textos de autores como Juan Bautista Alberdi,
da romântica “geração de 1837”, que reivindicam a Revolta Farroupilha como
sucessora da Revolução de Maio de 1810, serviria, justamente, para legitimar a
posição dos revoltosos no conflito, assim como o apoio, velado ou aberto, das
facções políticas rio-platenses.
Por fim, apesar dessa limitação na análise, creio que o trabalho de Eduardo
Scheidt é bastante competente em apresentar as demais questões que envolvem o
tema, trabalhando-as de maneira completa, clara e sucinta, permitindo total
compreensão dos fatos e argumentos apresentados que sustentam sua tese.

Referência Bibliográfica:

FUJII, William M. Os farrapos no Prata: as relações do Rio Grande do Sul


farroupilha com o Estado Oriental do Uruguai (1835-1845). Dissertação (Mestre
em História) - Departamento de História, Instituto de Ciências Humanas da
Universidade de Brasília. Brasília, p. 182. 2017.

Scheidt, E. (2002). Ecos da revolução farroupilha no Rio da Prata. Revista


Eletrônica Da ANPHLAC, (2), 29–45. https://doi.org/10.46752/anphlac.2.2002.1341

LEITMAN, Spencer. Raízes Sócio-Econômicas da Guerra dos Farrapos. Rio de


Janeiro, RJ. Editora Graal LTDA. 1979.

PESAVENTO, Sandra J. A Revolução Farroupilha. 1ª edição. São Paulo. Editora


Brasiliense, 1° de janeiro de 1990.

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