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A POLÍTICA BRASILEIRA E O PROJETO NACIONAL*

Léo de Almeida Neves**

Resumo: comparação das crises mundiais dos anos 30 e atual e as


perspectivas para a construção de um projeto nacional brasileiro
a partir das potencialidades nos setores de petróleo, mineração,
biocombustíveis, agropecuária e industrial.
Palavras-chave: Brasil; Projeto Nacional.

POLITICS AND THE BRAZILIAN NATIONAL PROJECT


Abstract: comparison of the global crisis of the 30s and today and the
prospects for building a project from the Brazilian national capabilities
in the oil, mining, biofuels, agriculture and industry.
Keywords: Brazil; National Project.

Vou me permitir uma abordagem mais abrangente do tema que me


foi atribuído, A Política Brasileira e o Projeto Nacional
País que se preza não pode prescindir de um projeto nacional, e a sua
concepção necessariamente sofre as injunções da conjuntura internacional,
notadamente em época de globalização.
Retorno para longe focalizando o crash de 1929 na Bolsa de Nova
York, que começou em 24 de outubro, a “quinta-feira negra”, contudo o pior
aconteceu dia 29 de outubro de 1929, quando a Bolsa de Valores de Nova
York teve queda de 80% e as ações viraram pó. A renda nacional decresceu
38% entre 1929 e 1932. O desemprego atingiu 25% da população ativa e mais
de 15 milhões perderam o trabalho. Segmentos da indústria, da agricultura
e do setor produtivo em geral soçobraram, cinco mil instituições bancárias
e assemelhadas quebraram. Muitos que perderam tudo foram levados ao
desespero e alguns ao suicídio. A economia norte-americana decresceu 11%
em 1930, 9,5% em 1931 e 15% em 1932.
Franklin Delano Roosevelt elegeu-se Presidente da República dos
Estados Unidos em 1933 e pôs em execução o plano econômico e social
denominado New Deal. Nos primeiros famosos 100 dias de governo, iniciou
*
Palestra proferida em 22 de novembro de 2008, na cidade de Curitiba-PR, Campus Universitário
Bezerra de Menezes/UNIBEM, por ocasião do V Congresso Curitibano de Geografia, com o tema
“Geografia: movimento estudantil, projeto nacional e participação política.”
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Membro da Academia Paranaense de Letras, ex-deputado federal e ex-Diretor da CREAI do Banco
do Brasil

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programas de emergência para os desempregados, assegurando renda mínima


à classe obreira. O princípio básico era de que “fome não se discute”.
Através do Federal Reserve fez-se o controle do sistema bancário,
injetando-lhe recursos públicos, ao mesmo tempo em que se promovia
o refinanciamento e o perdão de parte das dívidas das empresas e dos
agricultores, bem como eram garantidos depósitos bancários de pessoas
físicas e jurídicas, e se proporcionava liquidez aos bancos.
O governo federal criou órgão de planejamento industrial e estabeleceu
política firme no setor agrícola de garantia de preços, formação de estoques
e de comercialização controlada. O Estado incumbiu-se da realização de
obras de infra-estrutura, com destaque para construção de rodovias e usinas
hidrelétricas.
Os mecanismos automáticos do mercado foram substituídos pela
atuação centralizadora do Estado e se evitou a desordem social e econômica
que poderiam acometer os Estados Unidos.
A dinamização da economia nos anos que precederam a II Guerra
Mundial fortaleceu o complexo industrial-militar e restaurou e consolidou a
prosperidade da América do Norte.
Houve desdobramentos políticos do período de depressão econômica
que avassalou os Estados Unidos; resultando no fortalecimento na Itália do
fascismo de Benito Mussolini, na Alemanha a ascensão nazista de Adolf Hitler
e no Brasil a vitória da Revolução de outubro de 1930, liderada por Getúlio
Vargas. Contribuiu igualmente para a consolidação do regime comunista
implantado na Rússia em 1917 e na formação da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS), sob a chefia de Trotsky, Lenin e, depois, Stalin.
Agora, no 2º semestre de 2008, nova crise econômica eclodiu nos
Estados Unidos e se irradiou pelo mundo. Não se pode ignorar que um bom
sistema financeiro e o mercado de capitais ajudam o progresso, porque se
criam incentivos à elevação da taxa de poupança e os recursos disponíveis
impulsionam a economia real, aumentando a produtividade e acelerando o
desenvolvimento. Esse status quo impulsionou o desenvolvimento econômico
dos Estados Unidos, Europa, Japão, Coréia do Sul, China e do Brasil após os
anos 70.
Mas o governo George Bush subverteu essa lógica. Seu secretário
do Tesouro, Henry Paulson, quando assumiu o cargo em 2006, proclamou
no seu discurso “as virtudes da completa liberdade de funcionamento do
mercado financeiro e o seu propósito de liberá-lo do resto da regulação, que
na sua opinião ainda inibia a inovação, aumentava os custos pela redução da
competitividade e dessa forma reduzia o crescimento do PIB e do emprego”.
Enfim, garantia-se a liberdade total aos desatinos dos empréstimos
hipotecários sem peias, da propagação do sub-prime e do conjunto das

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atividades do sistema financeiro, multiplicando-se as loucuras do mercado,


a ponto do BIS – Banco de Compensações Internacionais (Banco Central
dos Bancos Centrais) com sede em Basiléia, Suíça −, calcular que em 2007
as operações totais com derivativos e quejandos chegaram a 600 trilhões
de dólares, correspondendo a dez vezes mais a soma do Produto Interno
Bruto Mundial, de aproximadamente US$ 54,3 trilhões. A insanidade tinha
que dar no que deu: quase colapso do sistema financeiro norte-americano e
mundial.
Assistimos situação paradoxal: Os EUA são a origem do problema, mas
como o dólar é moeda de curso universal, com poder de emissão ilimitada, do
planeta inteiro se remetem dólares para a América do Norte, que vão repousar
na aquisição de títulos do tesouro norte-americano. Nas Bolsas de Valores
de todos os continentes a cotação das ações vem caindo, alternando altas e
baixas, aplicações em títulos são desfeitas, remessas de lucros para os EUA
são maximizadas.
A crise desencadeada pela falta de controle e de regulamentação do
sub-prime do crédito imobiliário e pelos derivativos financeiros, praticados no
sistema bancário norte-americano, se alonga e provoca desemprego e recessão
nos Estados Unidos, Alemanha, Itália, Espanha, Japão e em outros países.
O ex-presidente do Federal Reserve durante 19 anos, Sr. Alan
Greenspan, em depoimento na Câmara dos Representantes fez autocrítica
dizendo que se equivocara sobre a capacidade do mercado resolver os
problemas econômicos sem alguma intervenção ou regulação governamental,
ainda que em aspectos pontuais.
Nos Estados Unidos, bancos comerciais e de investimentos,
seguradoras e companhias imobiliárias atuavam soltos e se arregalavam
com alavancagem de 30 a 50 vezes. Ademais, a América do Norte apresenta
perigoso déficit de US$ 800 bilhões na balança comercial e o mesmo valor na
execução do orçamento, cada um correspondendo a 6% do PIB de US$ 13,8
trilhões. Tanta irresponsabilidade tinha que dar no que deu; o estouro da
manada previsível e anunciado.
Segundo avaliação do Banco Central da Inglaterra, as perdas globais
para bancos e investidores chegarão a US$ 2,8 trilhões, mas é admirável a
mobilização para debelar a enrascada pelos governos e bancos centrais dos
Estados Unidos, dos países da União Européia, da Rússia, do Japão, enfim,
solidariedade total. Bancos e instituições de empréstimos hipotecários foram
parcialmente estatizados, alguns bancos absorvidos por outros, contas
bancárias de depositantes receberam garantias governamentais, bancos
centrais baixaram os juros em uníssono: o Fed para 1% ao ano, Banco Central
da Inglaterra 3%, Banco Central Europeu 3,5%, Coréia 3%, Japão 0,3%.

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Contrastando com esses números o Banco Central do Brasil aplica a Taxa Selic
de 13,75%, ou seja, o maior juro real do universo.
Alguns trilhões de dólares estão sendo injetados no sistema financeiro,
porém daqui para frente novas regras e controles dificilmente deixarão de
ser adotados. Os EUA dominam o padrão monetário mundial com poder de
emitir dólar sem limites, moeda aceita em todo o planeta, mas economistas
chineses já sugerem que se crie “moeda diversificada e uma ordem financeira
justa que não seja dependente dos Estados Unidos”.
Se ainda imperassem as idéias do fundamentalismo vermelho de
Mao-Tsé-Tung, a República Popular da China poderia pôr de joelhos o gigante
capitalista, porquanto detém reservas próximas a 2 trilhões de dólares, sendo
o maior aplicador em títulos do Tesouro norte-americano com US$ 585
bilhões. Mas a debacle do capitalismo não interessa à China, que colaborará
no que for possível para ajudar seu maior parceiro comercial de mais de US$
350 bilhões anuais. Vejam a atitude vigorosa da República Popular da China
que no dia 9 de novembro de 2008 anunciou a aprovação de um programa
de investimentos internos para os próximos dois anos com a fabulosa cifra
de US$ 586 bilhões, a fim de estimular a economia e suavizar os efeitos da
desaceleração econômica mundial fruto da recessão estadunidense.
O colosso chinês teve o PIB acrescido de 11,9% em 1997, este ano
cai para 9,4% e em 2009 ficará em 7,9%, o que pode alterar-se com este
programa de investimentos, que foi precedido nos dois meses anteriores com
cortes nas taxas de juros. Os programas chineses mais aquinhoados são os da
área de transportes, meio ambiente e infra-estrutura rural.
Certamente, os Estados Unidos superarão as dificuldades do
momento, porque sua economia ainda é sólida, acumulando mais de 20%
do PIB global. A energia do empreendedorismo está amalgamada em toda
sociedade. A inovação tecnológica, a excelência científica e a multiplicidade
de patentes não tem similitude em país algum.
As Bolsas têm regras de interrupção dos leilões quando despencam
de 10 a 15%, suavizando o impacto das quedas. O Fed está socorrendo com
os valores que forem necessários as instituições financeiras e seguradoras,
utilizando os US$ 700 bilhões aprovados pelo Congresso, depois que
cometeu o erro de deixar quebrar o outrora poderoso Banco Lehman Brothers.
As indústrias automobilísticas, General Motors à frente, estão à beira da
bancarrota, implorando apoio financeiro governamental.
Só um fator poderá acarretar o enfraquecimento do império norte-
americano: a mentalidade belicosa das suas elites governamentais, insufladas
pelo complexo industrial e militar, excessivamente influente depois da II
Guerra Mundial. O próprio Comandante em Chefe das forças aliadas no
conflito, general Eisenhower, eleito em 1953 presidente dos Estados Unidos,

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em memorável discurso fez um alerta em relação ao conúbio industrial-


militar.
Na guerra do Iraque/Afeganistão, os EUA já gastaram perto de
1 trilhão de dólares. Por pouco, Bush não invadiu o Irã; faltou-lhe talvez
apoio interno, uma vez que as pesquisas revelam somente 24% de aprovação
ao seu governo.
Na recente campanha eleitoral, os candidatos a Presidente da
República, Barack Obama e John McCain, se rivalizaram em proclamar a
supremacia e o intervencionismo preventivo ianque. A candidata a Vice de
John McCain, a governadora do Alasca Sarah Palin, em entrevista à televisão,
colocou a Rússia no rol dos inimigos por causa da invasão da Geórgia e da
intenção de manter a Base Militar de Sebastopol, na Criméia, território da
Ucrânia que integrava a extinta União Soviética.
Em setembro último, ignorando que a República Popular da China
é essencial para a recuperação econômica dos Estados Unidos, o presidente
George Bush autorizou a venda de US$ 6,5 bilhões em armamentos
ultramodernos a Taiwan, que a China considera território seu.
Contudo, em iniciativa sensata, George Bush convocou e presidiu
em Washington, dia 15 de novembro de 2008, reunião do G20, que somado
à União Européia representa 88,7% do PIB mundial. O G20 voltará a reunir-
se no 1º trimestre de 2009, já com Barack Obama na presidência, o que
possibilitará decisões concretas, diferentes das vagas declarações de princípios
da reunião presidida por Bush e, nesse ínterim, grupos de trabalho discutirão
medidas para aprofundar os marcos regulatórios do sistema financeiro global,
estímulos fiscais às economias em recessão, aumento dos investimentos
estatais, restabelecimento dos fluxos de crédito, mudança no formato de
órgãos multilaterais como o FMI e o Banco Mundial.
Compõem o G20, que na verdade tem 22 membros, EUA, Alemanha,
Japão, China, Inglaterra, Itália, Canadá, Rússia, Brasil, Índia, África do Sul,
Arábia Saudita, França, Argentina, Austrália, Coréia do Sul, Espanha, Holanda,
Indonésia, México, Turquia e União Européia.

Frutos da revolução de 30
Vamos abordar agora fatos e circunstâncias do Brasil. O regime
implantado pela Revolução de 30 distanciou-se pouco a pouco do liberalismo
econômico vigente nos períodos do Império e na 1ª República, e o Estado
atuou firmemente como regulador das atividades privadas, incumbindo-se do
planejamento econômico global.
A superabundância das safras de café, nosso principal produto de
exportação, do qual detínhamos mais da metade da produção universal,
provocou a redução para um terço de seu preço entre 1929 a 1931. O governo

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adquiriu 28 milhões de sacas excedentes e queimou estoques, restabelecendo


o equilíbrio estatístico e recuperou os preços.
A dívida externa era impagável, e o governo decretou a moratória
em setembro de 1931. Estabeleceu-se o monopólio do câmbio pelo Banco do
Brasil e reescalonaram-se as dívidas da lavoura e dos pecuaristas, assim como
50% dos débitos dos cafeicultores foram perdoados.
A Revolução de 1930 encontrou a economia e a administração
pública do Brasil em absoluto caos. Os Estados cobravam tarifas diferenciadas
no imposto de circulação de mercadorias para outras unidades federativas;
ademais, os Estados tinham o direito constitucional de cobrar imposto de
exportação e podiam contratar livremente empréstimos internacionais, cujo
pagamento não era honrado, abalando o conceito do país. A União assumiu
as dívidas externas dos Estados e transferiu para o governo federal a cobrança
do imposto de exportação.
O subsolo brasileiro pertencia a particulares, e as multinacionais do
petróleo apoderaram-se de vastas extensões do nosso território. Em ato de
afirmação de soberania, em 10 de julho de 1934, foi editado o Código de
Minas, passando ao domínio da União as riquezas minerais do subsolo, que a
partir daí só poderiam ser exploradas mediante concessão.
Os Estados compravam diretamente do exterior armas e equipamentos
bélicos para suas polícias e brigadas militares, de tal sorte que São Paulo,
Minas Gerais e Rio Grande do Sul poderiam enfrentar de igual para igual o
frágil exército federal. As bandeiras dos Estados se sobrepunham à nacional.
O governo federal subordinou as polícias estaduais ao Exército e
proibiu que importassem armas. As bandeiras estaduais foram simbolicamente
queimadas no Panteon da Pátria junto ao Ministério da Guerra no Rio de
Janeiro, unificando-se o culto e respeito à bandeira brasileira. Reaparelhou-se
o Exército e a Marinha, e foi criado o Ministério da Aeronáutica, garantindo-
se a unidade nacional, como o Duque de Caxias havia assegurado durante o
Império.
Em 1937, devido à situação da balança comercial, o governo
restabeleceu o monopólio cambial e criou controles sobre as importações.
Em 11 de abril de 1938, criou-se o Conselho Nacional do Petróleo (CNP)
precursor da Petrobras, e no dia 29 do mesmo mês nacionalizou-se a indústria
de refinarias, deixando com o setor privado a distribuição de derivados e o
varejo dos postos de gasolina.
Cabe destacar a criação do DASP em 30 de julho de 1938, que
iniciou o processo de racionalização do serviço público, instituindo concurso
de admissão em detrimento do nepotismo, com treinamento de pessoal e
modernização da máquina administrativa.

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Fazia parte do ideário da Revolução tornar realidade a indústria de


base da siderurgia. A Comissão Preparatória do Plano Siderúrgico Nacional,
decretada em 5 de agosto de 1939, não chegou a resultado algum. Os Estados
Unidos negociavam e empurravam com a barriga qualquer apoio. Vargas,
então, deu um golpe de mestre. Pronunciou em junho de 1940 a bordo do
encouraçado Minas Gerais famoso discurso, interpretado como de simpatia
aos países do Eixo (Alemanha, Italia e Japão), que nessa fase colhiam êxitos
na 2ª Guerra Mundial.
Isso forçou uma definição norte-americana, e em 9 de abril de 1941,
Getulio Vargas decretou a criação da Cia. Siderúrgica Nacional, marco da
emancipação econômica do Brasil, que se tornou realidade com financiamento
e fornecimento do maquinário pelos Estados Unidos, habilmente negociados
com o presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt, no contexto
da cessão de bases militares no Nordeste e da participação do Brasil na
guerra, a favor dos aliados, enviando a Força Expedicionária Brasileira (FEB)
e esquadrilha da FAB, para combater os alemães na península italiana.
Após encampar a estrangeira Itabira Iron, que nada produzia, o
governo federal fundou a Cia. Vale do Rio Doce em 1º de junho de 1942,
transformada na maior exportadora mundial de minério de ferro.
Em 1º de maio de 1943, Vargas decretou a Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT), com 921 artigos que assegurou a coesão social, fator
determinante para a industrialização e crescimento econômico do país.
Em 1952, Getulio criou o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico (BNDE), até hoje o grande impulsionador das atividades
produtivas do país, e o Banco do Nordeste, voltado para o crescimento da
região nordestina.
Em 3 de outubro de 1953, sancionou a Lei 2004/53 e nasceu
a Petrobras, oriunda de Mensagem presidencial enviada ao Congresso
Nacional.
Sem dúvida, de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954 e de 1955 a 1960,
governo Juscelino Kubitschek de Oliveira, houve um projeto de Nação, com
o Estado se colocando a frente de planos estratégicos, notadamente nas áreas
energéticas e de transportes, que a iniciativa privada nacional e estrangeira
não tinham interesse em levar avante.
Há que se creditar aos governos do regime militar várias iniciativas
importantes de caráter nacionalista, como a criação da Embratel (em 16 de
setembro de 1965), da Petroquisa (Decreto nº 61.981, de 28 de dezembro de
1967), da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais - CPRM (Decreto-
Lei nº 764, de 15 de agosto de 1969), da Empresa Brasileira de Aeronáutica
– EMBRAER (Decreto nº 770, 19 de agosto de 1969), da Telebrás (09 de
novembro de 1972, nos termos da autorização inscrita na Lei n° 5.792, de

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11 de julho de 1972), da Embrapa (Lei nº 5.881, em 7 de dezembro de


1972), construção das hidrelétricas de Itaipu (1975) e Tucuruí (1976), e
robustecimento da Petrobrás com novas refinarias e a descoberta de petróleo
na Bacia de Santos.
A partir da eleição de Fernando Collor em 1990, contemporâneo de
Margareth Thatcher, na Inglaterra e de Ronald Reagan, nos EUA, instalou-se
período de idéias neoliberais, desmontando-se o Estado com privatizações,
força total aos banqueiros e ao mercado. Entre outros efeitos deletérios
aconteceu o apagão de 2001, que reduziu o PIB em 2%, conseqüência dos
parcos investimentos em linhas de transmissão e em geração de energia
elétrica.

Projeto nacional do Brasil


Não há dúvida que os Estados Unidos, a Europa e o Japão vão
enfrentar período provavelmente longo de recessão econômica, que alcançará
menos os países emergentes como os do chamado BRIC, Brasil, Rússia, Índia
e China, cujos PIBs são: Brasil e Rússia US$ 1,3 trilhão cada; Índia de US$
1,1 trilhão e China US$ 3,3 trilhões.
Economistas de renome têm ressaltado a superioridade do Brasil em
relação à Rússia, China e Índia devido à solidez da democracia, inexauríveis
reservas minerais, por possuir 10% das terras agriculturáveis do mundo e por
não sofrer fenômenos naturais como terremotos, maremotos, furacões, pela
unidade lingüística em todo seu imenso território, pela ausência de problemas
raciais, religiosos, de minorias étnicas e de conflitos separatistas.
Para cumprir seu destino de tornar-se potência mundial, o Brasil precisa
definir metas estratégicas, aproveitando suas excepcionais potencialidades.
Visualizo como áreas prioritárias o petróleo, minérios, biocombustíveis,
agropecuária e modernização industrial, sobre as quais passarei a discorrer.

Petróleo para a atual e futuras gerações


O achado da Petrobrás em 2007 do campo de Tupi e a camada pré-
sal representam espetacular ganho, que se reveste de caráter intertemporal,
projetando-se sobre as gerações futuras. Todavia, terá de haver modificação
no marco regulatório do setor de petróleo e gás, permitindo a partilha da
produção com a União. As companhias que participarem da exploração
não serão proprietárias do óleo. Esse é o regulamento utilizado pela Rússia,
Catar, Iraque e Nigéria. O contrato de prestação de serviços é a praxe da
Arábia Saudita, Irã, Kuwait e Venezuela. O Brasil usa o inconveniente
contrato de concessão, com as concessionárias ficando donas do petróleo que
descobrirem.

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Inexoravelmente, entraremos no seleto clube dos principais


exportadores de petróleo e, sabiamente, a Petrobras optou por privilegiar a
venda ao exterior de produtos industriais refinados de valor agregado. Os
investimentos serão de US$ 43 bilhões em ampliação das onze atuais e na
construção de novas refinarias no Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará, Rio
Grande do Norte e Maranhão, aqui uma gigante de 600.000 barris/diários.
Até 2012, a Petrobras investirá a espantosa soma de US$ 112,4 bilhões. A
Petrobras lançou programa de construção de 146 embarcações de apoio
marítimo até 2014, encomendou 56 sondas, sendo 28 no Brasil, e 49 navios
petrolíferos à indústria naval.
O subsolo pertence à União, isto é, a todos nós brasileiros, a partir
do Decreto de nacionalização de 1934 e todas as Constituições que vieram
depois mantiveram com a União as reservas naturais. A Petrobras recebeu
poderes de exercer o monopólio estatal do petróleo, e alcançou em 2007 a
produção de praticamente dois milhões de barris por dia, garantindo com
sobra nossa auto-suficiência.
Nos cinco anos finais da década de 90, a Petrobras correu risco de ser
privatizada. Em 1998, o governo federal vendeu a estrangeiros na Bolsa de
Nova Iorque 34,04% de ações ordinárias pertencentes à União, sem ingressar
um tostão nos cofres da empresa. Pela troca de ativos na Argentina com a
petrolífera espanhola Repsol, esta abocanhou um terço da refinaria Alberto
Pasqualini sediada no Rio Grande do Sul. No Senado e na imprensa houve
campanha para privatizar todas as demais refinarias, felizmente sem obter
êxito.
A emenda constitucional n.º 5 de 1995, proposta pelo poder executivo,
aboliu o monopólio da Petrobrás, e a Lei 9.748/1997 abriu às firmas privadas
e estatais a extração do petróleo mediante licitações da Agência Nacional do
Petróleo (ANP), assegurando-lhes a propriedade e livre exportação do óleo
encontrado.
O anúncio oficial do Campo de Tupi aconteceu poucos dias antes do
9.º Leilão da Agência Nacional do Petróleo (ANP), e esta excluiu do Edital
41 blocos com as mesmas características do campo Tupi. Os editorialistas
de alguns jornais, determinados comentaristas econômicos, “consultores
petrolíferos”, parlamentares conservadores protestaram veementemente contra
a retirada dos blocos, alegando “quebra de contrato”, mudança unilateral de
regras, e que o leilão poderia fracassar. Não houve insucesso e 117 lotes foram
arrematados.
Há que se modificar o marco regulatório da legislação do petróleo,
que outorga concessões de conformidade com a Lei 9478/97. Além das
concessionárias se apossarem do petróleo, a União tem participação financeira

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de apenas 1% a 40% em exploração de águas profundas, enquanto no mercado


mundial a média recebida pelos países concedentes é de 84%.
A União terá de ficar com grande quinhão da renda do petróleo obtido
(de 75 a 90% do valor real), dividindo a receita com estados e municípios
sob a forma de tributo, de royalty ou partilha. Talvez venha a ser o caso de
convivermos com modelos diferenciados, conforme os blocos localizados em
áreas com menor ou maior probabilidade de achar o precioso ouro negro.
É plenamente admissível estimar-se as reservas totais de petróleo
do Brasil em pelo menos 80 bilhões de barris. Multiplicando-se 80 por US$
50,00 o barril (cotação atual que deve subir no futuro, pois já valeu US$
140,00 o barril e apesar da atual recessão o consumo não deve diminuir
muito) representa uma riqueza fantástica de US$ 4 trilhões, da qual a União
deve ser aquinhoada com parcela significativa.
Em recente evento patrocinado pela Fundação Getulio Vargas em São
Paulo, o ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Newton Monteiro,
avaliou nossas riquezas de “ouro negro” em 339 bilhões de barris, que seriam
a maior do mundo, superior às da Arábia Saudita.
Preocupante a declaração do Embaixador norte-americano Brad
Clifford Sobel, em visita a São Paulo, “de que está surgindo uma nova área
de cooperação entre os dois países, o petróleo, que enxerga oportunidades de
parcerias com petrolíferas americanas como Exxon e Chevron, ou empresas
fornecedoras de serviços, como a Halliburton”, a empresa mais aquinhoada
na exploração do petróleo do Iraque, e já infiltrada na Agência Nacional do
Petróleo (ANP).
O embaixador disse que funcionários do seu governo devem vir ao
Brasil em breve para tratar do assunto e que o primeiro será o Secretário de
Segurança Interna dos EUA, Michael Chertoff.

Soluções para a exploração do petróleo e do gás no Brasil


Aproveito este cenáculo de inteligência e cultura, o V Congresso
Curitibano de Geografia, para longe de qualquer conotação ideológica de
esquerda ou de direita, pró ou contra o governo, apontar soluções que me
parecem apropriadas e compatíveis com o interesse nacional na exploração
do petróleo e do gás do pré-sal.
1– Somente as reservas calculadas na Bacia de Santos dos campos de Tupi
(até 8 bilhões de barris/dia) e de Iara (até 4 bilhões), praticamente dobram
as já conhecidas no Brasil de 13,9 bilhões de barris. O “ouro negro” abaixo
da camada pré-sal é de excelente qualidade (leve) e sete campos já foram
descobertos, faltando explorar o restante dos 800 quilômetros que se estendem
do Espírito Santo a Santa Catarina.

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2– A pergunta é como aproveitar tamanho potencial em benefício das atuais


e futuras gerações? A estratégia a ser delineada em novel marco regulatório
precisa em primeiro lugar salvaguardar a propriedade do petróleo para a
União, nos termos da Constituição Federal de 1988, revogando-se o artigo
26 da Lei 9478/97, que transferiu a propriedade a quem o produz. Ao mesmo
tempo, colocar a Petrobras como única operadora do petróleo do pré-sal, pois
foi ela que o descobriu na condição de líder mundial inconteste em tecnologia
de perfuração de águas ultra profundas.
3– A meta seguinte é industrializar e exportar produto refinado (diesel, nafta,
querosene, etc.) de alto valor agregado e nesse aspecto merece aplausos o
programa da Petrobras de modernizar suas refinarias e construir novas plantas
industriais para elevar a capacidade instalada de 1,9 milhão para 3,2 milhões
de barris/dia. Isso cobrirá apenas as projeções de produção de petróleo, sem
contar o pré-sal. Há que se planejar e erguer refinarias para manufaturar o
petróleo que está por vir. Cabe fomentar a indústria petroquímica, ainda que
a Petrobras tenha capital minoritário.
4– A fim de reservar exclusividade à Petrobras na exploração do pré-sal,
impõe-se a fundação de uma empresa 100% estatal, sem caráter operacional,
que ficaria dona não só das áreas remanescentes do pré-sal, mas de todas as
demais do país. As já licitadas permaneceriam com as vencedoras dos leilões,
sem quebra de contratos.
5– Nos blocos do pré-sal já licitados, vizinhos às áreas da União, integrando
um só reservatório, far-se-ia a unitização (linguagem da Lei 9478/97)
atribuindo-se a parte da União à nova estatal, que passaria as tarefas executivas
à Petrobras.
6– Para explorar outros blocos do pré-sal, a Petrobras na posição de
majoritária formaria Sociedades de Propósito Específico com firmas nacionais
e estrangeiras, somando meios financeiros com apoio logístico e tecnológico. A
Petrobras estabeleceria em cada projeto o percentual conveniente de parceria
e escolheria suas sócias. Por delegação da nova estatal, a Agência Nacional
de Petróleo (ANP) continuaria realizando leilões de blocos nas outras áreas
do país, colocando em realce o critério do índice de nacionalização dos
equipamentos.
7– No turbilhão da crise do sistema financeiro dos EUA, contaminando a
estrutura dos bancos europeus, as linhas de crédito escassearam. Daí a
necessidade premente da Petrobras aumentar seu capital em R$ 100 bilhões,
com chamada em dinheiro de todos os acionistas, inclusive do exterior,
garantindo esse direito aos que utilizaram o Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS) para adquirir ações da Petrobras. Ao acionista controlador (a

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009


24 A POLÍTICA BRASILEIRA E O PROJETO NACIONAL

União) caberia preferência para comprar ações que não fossem subscritas.
Note-se que a Petrobras é a mais lucrativa das empresas nacionais.
Segundo dados oficiais, encaminhados à CVM (Comissão de Valores
Mobiliários), no terceiro trimestre de 2008 a Petrobras lucrou R$ 10,8 bilhões
(96% a mais do que em igual período do ano passado). Isso por causa da
desvalorização do real e de aumento da produção. Nos 9 meses de janeiro a
setembro de 2008 o lucro líquido alcançou R$ 26,5 bilhões, 61% a mais do
que em igual período do ano passado.
8– A União terá que assumir o poder de decisão sobre o ritmo de exportação
de óleo cru – se acelerado ou moderado – levando em conta que os carros
elétricos e os movidos a hidrogênio vêm aí, no embalo das campanhas
anti-poluição, e ao mesmo tempo assegurar primazia de oferta às nossas
refinarias.
9– A União criará imposto de exportação nas vendas ao exterior de petróleo
bruto com percentual diferente para o óleo pesado e o óleo leve. Além da
receita orçamentária, esse tributo garantiria a preferência de suprimento para
as refinarias localizadas no Brasil.
10– Elaboração com urgência de plano de incentivos fiscais e creditícios para
produzir no país os navios, plataformas e maquinários em geral fundamentais
à exploração do petróleo.
11– O Brasil não pode correr o risco de empanzinar-se de moeda estrangeira,
supervalorizando o real e inviabilizando vendas ao exterior de manufaturados,
daí o imperativo de ser criado um Fundo Soberano Intergerações, que seria
gerido pela nova estatal tendo como agentes operacionais o BNDES e o
Banco do Brasil que, entre diferentes incumbências internas, financiariam
no Mercosul/América Latina obras de infra-estrutura ou empreendimentos
industriais/comerciais de companhias brasileiras.
12– Destinar à educação, saúde e às áreas que forem selecionadas os enormes
recursos que serão arrecadados em razão do incremento da atividade
petrolífera e das modificações legais, alteando-se para 84% a Participação
Especial da União, com atribuição de 16% à operadora, procedimento médio
aplicado em todas as regiões do planeta.
13– Para não sacrificar verbas de investimentos, a Petrobras ficará excluída de
oferecer recursos para o superávit primário.
14– Dosar ao estritamente necessário os investimentos em perfuração da
Petrobras no exterior, priorizando gastos no Brasil.
15– Suspender a distribuição de lucros aos acionistas por 3 (três) anos para

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009


Léo de Almeida Neves 25

suprir de receita os enormes investimentos necessários. Depois, as benesses


lhes retornarão em quíntuplo com a multiplicação dos lucros.
Se for conduzida com isenção, inteligência e racionalidade, a era do
petróleo trará notável impulso econômico ao Brasil e benefícios incalculáveis
ao nosso povo.

Exemplos históricos da influência do petróleo na vida das nações


Não se pode ignorar o ensinamento da história de que as Guerras
do Petróleo justificam invasões e derrubadas de governo, criam países
independentes e impõem ditaduras. A invasão do Iraque pelos Estados Unidos
é um exemplo incontestável. O Premier Mossadeh do Irã foi destituído após
nacionalizar o petróleo.
Alguém dúvida que foi por causa do petróleo que George Bush
invadiu o Iraque? As questões da energia elétrica e do petróleo fizeram parte
da Carta Testamento de Vargas, escrita com seu próprio sangue em 24 de
agosto de 1954. Seu vigoroso empenho para emancipar o país na produção
energética, enfrentando poderosos interesses internacionais, representou um
dos motivos da conspiração que o reacionarismo armou para derrubá-lo do
poder.
Getulio anunciou em Curitiba, dia 19 de dezembro de 1953, 1º
Centenário da Emancipação Política do Paraná, que criaria a Eletrobrás. Dia
seguinte desabaram nas bolsas de valores de Nova Iorque, os preços das ações
das multinacionais (Light and Power, Bond and Share e Empresas Elétricas
Brasileiras) que praticamente monopolizavam a produção e distribuição de
energia no Brasil, e não realizavam novos investimentos, limitando-se a auferir
lucros e remetê-los para o exterior. No eixo Rio/São Paulo, o polvo da Light
era o principal anunciante de jornais e rádios, juntamente com as empresas
petrolíferas. O “Repórter Esso”, melhor e mais ouvido noticioso radiofônico,
em edição extraordinária, teve o privilégio de divulgar a morte de Vargas e a
íntegra de sua Carta Testamento.
A criação da Petrobras em 1953 já tinha afrontado os donos das
gigantes internacionais de petróleo. Isso fica bem claro com a leitura do livro
dos jornalistas norte-americanos Gerard Colby com Charlotte Dennett, “Seja
feita a vossa vontade”, com o subtítulo “a conquista da Amazônia: Nelson
Rockefeller e o evangelismo na idade do petróleo” (Editora Record, 1998),
tradução de Jamari França.
Na concepção de Rockefeller (então “rei do petróleo”), partilhada
pelo governo estadunidense, nos anos de pós-guerra em 1945, “quem quer
que controle a torneira do petróleo do Oriente Médio pode controlar o destino
da Europa. No entanto, a torneira latino-americana teria que fechar, porque

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009


26 A POLÍTICA BRASILEIRA E O PROJETO NACIONAL

uma superabundância de petróleo derrubaria preços e lucros. A solução


encontrada por Washington é que as reservas de petróleo da América Latina
não deveriam ser exploradas e sim mantidas pelas empresas americanas como
reservas de petróleo” (pag. 225)
Essa obra baseou-se em documentos oficiais, liberados pelo governo
estadunidense depois de 50 anos dos acontecimentos, e mostra que a política
nacionalista de Getulio Vargas quanto à exploração do petróleo teve decisiva
influência em sua deposição pelas Forças Armadas, em 29 de outubro de
1945, e na crise política de agosto de 1954.
O livro comenta a fundação da Petrobras e diz que “Vargas tentou
preservar para a Petrobras todos os direitos de exploração, utilização e novo
refino. As empresas americanas, lideradas pela Standard Oil, reagiram. O
Brasil era um dos maiores mercados de petróleo do hemisfério, controlado
pela Standard, Shell, Gulf, Texaco e Atlantic. Se Vargas expandisse a pequena
capacidade de refino do Brasil através da Petrobras, as empresas seriam
excluídas de todo o crescimento neste mercado crucial” (pag. 294). O livro
deixa evidenciado que por causa da política nacionalista do petróleo houve o
congelamento dos empréstimos norte-americanos ao Brasil.
As firmes posições de Getulio na questão do petróleo, na defesa da
Amazônia e da autonomia econômica do Brasil foram fatores que determinaram
a confessada interferência do Embaixador norte-americano Adolfo Berle no
afastamento de Vargas da Presidência da República, em 1945.
O livro relata (pág. 214) que “o petróleo brasileiro e as empresas
estatais caíram sob a vigilância estreita do Embaixador Berle, que pediu a
Vargas a substituição por um americano do diretor brasileiro da Cia. Vale
do Rio Doce”. O livro diz (pag. 215) que Vargas “continuava se opondo a
qualquer controle estrangeiro sobre a exploração de recursos da Amazônia.
Preservar a autonomia econômica do Brasil sempre foi uma prioridade”.
“No dia 29 de setembro de 1945, Berle jogou sua bomba sobre o
palácio presidencial”. A obra conta em minúcias o discurso do Embaixador
dos EUA na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), pondo em dúvida as
intenções de Getulio realizar eleições. Nesse discurso ele aludiu que entre
os direitos de “liberdade interna” estavam o “direito de acesso aos recursos
econômicos do mundo”. “No dia do golpe contra Getulio, Berle foi a uma
festa. Ao saber que uma rádio anunciara a renúncia de Vargas eu bebi meu
café e conhaque em relativa calma, Berle, anotação do diário de 30 de outubro
de 1945” (pags. 217 a 219 e 937).
O livro (pag. 222) salienta as diretrizes traçadas pelos EUA ao
término da 2ª Guerra: “Nacionalizações proibidas, mesmo a reserva de uma
indústria para a iniciativa privada nacional era inaceitável. A administração
Truman estava efetivamente decretando que todas as economias, recursos,

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Léo de Almeida Neves 27

indústrias, comércio e mercados do mundo deviam estar abertos à penetração


das corporações americanas”.
Dá para dizer-se que qualquer semelhança dessa política de 65 anos
atrás com a proposta da ALCA (Aliança de Livre Comércio das Américas) não
é mera coincidência, mas sim a continuidade de consciente ação político-
governamental, que deu como resultado os EUA se tornarem a nação mais
rica do mundo.

Vantagem de contar com bancos estatais


Para ultrapassar com sucesso a grave crise internacional, provocada
pelo sub-prime dos empréstimos hipotecários nos EUA, uma das vantagens
comparativas do Brasil é possuir bancos estatais de grande porte como a
Caixa Econômica Federal, cobrindo principalmente empréstimos nas áreas
de habitação e saneamento; Banco do Brasil, atendendo com presteza a
área agropecuária, desde a criação em 1937 da Carteira de Crédito Agrícola
e Industrial do Banco do Brasil (CREAI), que tive o privilégio de dirigir
de 1961 a 1964, durante o governo João Goulart; e o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico (BNDES), fundado em 1952, que este ano
chegará à aplicação de aproximadamente R$ 100 bilhões, suplantando o
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial.
O BNDES e o Banco do Brasil têm dado suporte, a juros baixos (este
ano é de 6,25% a Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP) e prazos longos,
às empresas privadas e estatais, nacionais e estrangeiras. O BNDES também
injeta ponderáveis recursos no capital das empresas, como acionista, o que
resultou em capitalização e novos investimentos.
Setores estratégicos serão contemplados pelo BNDES até 2011 com
R$ 35,9 bilhões para energia elétrica, incluídas as usinas do Rio Madeira de
Santo Antônio e Jirau, sendo que novas 25 usinas vão agregar ao sistema 11,5
mil megawatts. Conforme estudos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE),
até 2025, a nossa capacidade hidrelétrica estará esgotada, e o Plano Nuclear
brasileiro prevê instalar no país até seis novas centrais nucleares, afora Angra
3, em construção.
Para o setor siderúrgico, estão contratados R$ 28,8 bilhões de
financiamentos para três novas siderúrgicas, com realce para a alemã Thyssen
Krupp em associação com a “Vale”, no Rio de Janeiro, investimento de R$ 9
bilhões, e cinco projetos de expansão da Companhia Siderúrgica Nacional,
Gerdau e Usiminas.
Na verdade, faz parte relevante de um projeto nacional transformar
matéria prima em produto industrializado; por exemplo, o ideal é exportar
aço ao invés de minério de ferro, café solúvel e torrado e moído no lugar de
café verde, e assim por diante.

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28 A POLÍTICA BRASILEIRA E O PROJETO NACIONAL

No campo da industrialização, BNDES e Banco do Brasil empurrarão


para cima os projetos de inovação industrial, incorporação de novas
tecnologias, absorção de processos de ponta.
Já somos detentores de indústrias diversificadas, que abrangem amplo
espectro de atividade manufatureira, o que nos dá capacidade competitiva em
qualquer mercado.
No setor de bens primários, estamos no ápice das estatísticas de
exportação de minério de ferro, café, suco de laranja, carne bovina, frango,
soja, açúcar e outros.
Somos o maior produtor e exportador de etanol, biocombustível da
cana de açúcar, produto pouco poluente, com vantagem de menor custo sobre
o álcool do milho (USA) ou da beterraba (União Européia). No biodiesel, à
base de múltiplas matérias primas, temos supremacia.

Brasil detentor das maiores reservas minerais do planeta


Os países mais ricos do mundo – Estados Unidos, Japão e União
Européia – são muito dependentes das riquezas minerais com que a natureza
contemplou generosamente o Brasil.

Dependência mineral das potências mundiais


EUA UE Japão
Nióbio 100% 100% 100%
Manganês 98% 100% 100%
Alumínio 91% 97% 100%
Zinco 57% 57% 48%
Cobre 13% 80% 80%

A situação norte-americana é mais grave devido ao dinamismo


e poderio de sua economia, apesar da crise econômica que a sobressalta,
resultando em que, com apenas 7% da população mundial, os EUA consomem
45 vezes mais zinco do que o resto do mundo; 52 vezes mais alumínio; 64
vezes mais ferro; 102 vezes mais cobre e 176 vezes mais chumbo (cálculos
do físico e engenheiro Bautista Vidal, responsável pelo programa do Proálcool
no governo Ernesto Geisel, com Severo Gomes Ministro da Indústria e
Comércio).
Ainda segundo o emérito professor Bautista Vidal, o Brasil, único
produtor de quartzo de primeira qualidade, vende-o por metade de 1 dólar
o quilo e depois importa o mesmo quartzo transformado em componentes
óptico-eletrônicos por preço superior a 3.000 dólares o quilo.

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009


Léo de Almeida Neves 29

Sem embargo, todas as grandes potências recorrem à importação


de nossos minérios para construir o “avião invisível”, aeronaves em geral,
foguetes de lançamento, nave Columbia, estação orbital, navios, submarinos,
automóveis, chips de computador, supercondutores, instrumentos de alta
precisão e tantos outros produtos essenciais à sociedade contemporânea.
Cabe enfatizar a superioridade estratégica do Brasil em relação
aos membros do G7 (EUA, Japão, Alemanha, França, Inglaterra, Itália,
excetuando-se o Canadá), porque possuímos 80% das reservas mundiais de
nióbio, 100% do quartzo e boa parte do titânio, bauxita, caulim, cobre, zinco
e tório. Somos o 6º maior detentor de reservas internacionais do estratégico
urânio, e estamos entre os sete países que desenvolveram a tecnologia do
enriquecimento industrial do urânio.
Segundo geólogos da CPRM, o nióbio é encontrado na reserva
indígena Raposa Serra do Sol em Roraima e a reserva indígena Balaio no
mesmo Estado conteria depósito de nióbio maior que o e de Araxá em Minas
Gerais, que produz 95% do nióbio consumido no mundo. Temos reservas
para 400 anos no atual nível de extração do minério de ferro, o mais rico do
universo em teor metálico. Nossas reservas de caulim podem ser exploradas
por 350 anos, as de bauxita por 187 anos, as de ouro por mais de 25 anos.
O Brasil precisa com urgência elaborar uma política de exploração
mineral para as reservas indígenas e o restante do território nacional.
Não foi sem razão que o prestigiado ex-Secretário de Estado dos
EUA, Henry Kissinger, doutrinou em 1979:
Os países industrializados não poderão viver da maneira como
existiram até hoje, se não tiverem a sua disposição os recursos
não renováveis do planeta. Para isso, terão de montar sistemas
mais requintados e eficientes de pressões e constrangimentos, que
garantam a consecução de seus objetivos.

No ano anterior, 1978, o todo-poderoso Henry Kissinger já havia


sentenciado em relação ao Brasil: “A segurança dos EUA não poderá permitir
que surja um outro Japão ao sul do equador.”
Curiosamente, no mês de abril de 1997, marcado para o dia 06 de
maio o leilão de privatização da “Vale”, e antecedendo a votação pelo Senado
da Lei que regulamentou a flexibilização do monopólio do petróleo e fragilizou
a Petrobrás, Henry Kissinger, então fazendo consultoria para governos e
empresas multinacionais, veio ao Brasil e foi recebido com todas as pompas,
no Palácio do Planalto, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 9 de
abril e, no dia seguinte, pelo Ministro da Fazenda Pedro Malan. Consumou-se
o leilão de privatização da Vale por míseros US$ 3,3 bilhões na data marcada,
estarrecendo a opinião pública, uma vez que geólogos da Companhia

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009


30 A POLÍTICA BRASILEIRA E O PROJETO NACIONAL

de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) avaliavam, na fase anterior à


privatização, o conjunto das imensas reservas minerais da Companhia Vale do
Rio Doce em US$ 1,7 trilhões (um trilhão e setecentos bilhões de dólares).
A Vale estatal atuava da jazida ao porto, já era a maior exportadora
do planeta de minérios de ferro, muito lucrativa, administrava 11 portos,
inclusive Itaqui, no Maranhão, e Tubarão, no Espírito Santo, construiu e
administrava ferrovias com notável padrão de eficiência como Carajás-Itaqui e
Minas-Vitória e mantinha parcerias e joint ventures com 20 firmas estrangeiras,
grandes consumidoras de seus minérios.
Pela sua relevância, o tema da venda da “Vale” não poderia ter sido
tratado sob a ótica da ideologia, a favor ou contra a presença do Estado na
economia. Por deter a maior província mineral do mundo, a Serra de Carajás,
inigualável biodiversidade, 25% da água potável do planeta, o Brasil ostenta
vantagens comparativas sobre EUA, Japão e Europa que favorecem nossa
privilegiada inserção como potência mundial na era da globalização, se
soubermos lutar e defender o interesse nacional.
Outro ângulo importante a ser focalizado é o fato de que 400.292
Km quadrados de áreas de mineração em nosso território já pertencem a
19 mineradoras internacionais. O Almirante Roberto Gama e Silva adverte
com razão sobre os enclaves territoriais estrangeiros na Amazônia, em
conseqüência da privatização da Vale. “Na região da Serra dos Carajás, a Vale
é detentora de 500.000 hectares de áreas de servidão. As suas coligadas ou
subsidiárias receberam a concessão de mais de 1 milhão de hectares como área
de servidão, somando 1,5 milhão de hectares. Esses enclaves territoriais
poderão representar o passo inicial para a internacionalização da Amazônia,
tese esposada por muitas entidades e governantes estrangeiros”.
Destaque-se que a “Vale” ainda estatal requereu e obteve concessões
de pesquisa e de lavra que abrangem mais da metade do território nacional.
A maior parte delas estão caducas porque se esgotaram os prazos previstos
no Código de Mineração. O normal é que fossem declaradas peremptas e
objeto de novas licitações para empresas nacionais e estrangeiras. No entanto,
o governo entregou-as no negócio do século 20, proporcionando lucro de
trilhões de dólares aos felizardos compradores da Vale.
Outro engodo do governo foi a entrega de 104 pontos e 335 áreas
do território brasileiro para os compradores da Vale. O artifício usado foi
um Contrato de Risco entre a Vale e o BNDES (50% cada), abrangendo as
áreas onde se identificaram mas não tinha sido quantificada a existência de
minérios. Aproveitaram o grito da opinião pública que precedeu o leilão contra
a entrega das gigantescas e imensuráveis jazidas de minérios, já descobertas,
para favorecer ainda mais os felizardos compradores. O BNDES comprometeu-
se a investir R$ 450 milhões e, após 7 anos de contrato não poderia vender

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009


Léo de Almeida Neves 31

sua participação de 50% a terceiros, nem mesmo a uma nova empresa estatal
de mineração que viesse a ser criada. A Vale extinguiu a subsidiária específica
Docegeo, e nunca mais se falou sobre esse contrato de pesquisa de minérios
BNDES – Vale.
A União possui uma ação Golden Share da Vale, mas concordou (não
vetando) em 2006 a compra da mineradora Inco do Canadá pelo valor de
US$ 18 bilhões, e dessa forma a empresa reduziu seus ativos no Brasil que
eram de 98% no tempo de estatal para 60%. E agora com a baixa do preço
do zinco, seu principal produto, o valor patrimonial da Inco desvalorizou-se
40%.

Defesa da Amazônia e da Soberania Nacional


A região amazônica está infestada de ONGs alienígenas e há muito
tempo é cobiçada por nações de fora devido suas estupendas riquezas minerais,
incalculáveis mananciais de água e incomensurável biodiversidade. Proliferam
por aí teses de internacionalização do “pulmão do mundo”, cuja floresta o
“Brasil não saberia preservar”, e ela seria “patrimônio da humanidade”.
A realidade concreta da Amazônia concentrar imensos lençóis de
petróleo e fantásticas reservas de minérios desperta a volúpia dos países ricos,
com alguns de seus líderes defendendo a perda ou limitação da soberania
brasileira na região, a pretexto de preservar a floresta amazônica.
As vozes que se ergueram nesse sentido abrangem desde o então
chefe comunista da ex-URSS, Mikhail Gorbachev, até o saudoso líder socialista
da França, François Mitterrand, a conservadora inglesa Margaret Thatcher e
dirigentes norte-americanos como Al Gore, Bill Clinton e George Bush pai.
Não há perigo iminente, porém ecoa orquestrada campanha para
convencer a opinião pública, principalmente nos Estados Unidos e Inglaterra,
de que a Amazônia pertence ao mundo e não ao Brasil.
Nesse contexto, compete ao governo federal rastrear, vigiar e
investigar as atividades das centenas de Organizações Não Governamentais
(ONGs), sediadas nos Estados que integram a Amazônia, provavelmente
muitas delas abertas para patrocinar grupos econômicos e quem sabe até a
serviço de governos estrangeiros.
Já é momento da Amazônia constituir-se em uma das prioridades da
atuação do governo federal. Cabe ao Presidente da República conduzir, ele
próprio, o processo de crescimento e de reforço militar da região e ao mesmo
tempo salvaguardar o meio-ambiente, os ecosistemas e a biodiversidade.
Os estudos de aproveitamento racional das florestas, com o seu
manejo adequado, precisam ser intensificados, de modo a demonstrar que
temos competência para explorar e, simultaneamente, renovar e conservar
florestas.

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32 A POLÍTICA BRASILEIRA E O PROJETO NACIONAL

Contamos com o maior sistema fluvial do universo e não é concebível


que queiram impedir o Brasil de utilizar economicamente suas hidrovias −
o mais barato dos transportes – com a invocação de comprometimento do
meio-ambiente.
Entrementes, alastra-se o ponto de vista de que futuramente não
existirá um só poder universal hegemônico − econômico e militar −, porém
vários que terão necessariamente convivência harmônica, desde que não se
agigante predomínio inquestionável de um deles, posição hoje exercida pela
América do Norte.
O Brasil está no limiar da arrancada para o progresso, desde que
não seja tragado pela avalanche da globalização, que minimiza o conceito de
Pátria e ameaça universalizar um só idioma, criar legislação transcendendo
fronteiras, ignorar Estados soberanos e contemplar multinacionais com
direitos extraterritoriais.
A realidade contemporânea registra célere globalização das
comunicações, das operações instantâneas do mercado de capital, da
integração dos sistemas produtivos e das atividades econômicas em geral,
todavia a globalização política de natureza imperialista, alardeada e desejada
pelas nações hegemônicas, jamais será implantada, porque os sentimentos de
língua, tradição, religião, Pátria e liberdade são muito fortes, e a resistência
das nacionalidades não admite rendição.
Os blocos possivelmente estarão constituídos pelos Estados Unidos,
União Européia, Rússia, China, Índia, Japão, África do Sul/Nigéria e Brasil/
América Latina. O Governo brasileiro propôs e conseguiu a criação da Unasul
(União das Nações Sul Americanas) e do Conselho Sul-Americano de Defesa
(com restrições do Ministro da Guerra da Colômbia), o que praticamente anula
o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca e a Junta Interamericana
de Defesa, sob controle estadunidense.
Nesse interregno, os EUA restabeleceram em 2008 a Quarta Frota
no Caribe e Atlântico Sul (ativa de 1943 a 1950 e desativada em 1951),
concomitantemente com a descoberta pela Petrobras das gigantescas jazidas
do pré-sal localizadas na plataforma marítima de 200 milhas, estando em
processo de aprovação na ONU sua ampliação para 350 milhas, o que
acrescentará à faixa oceânica sob soberania brasileira cerca de 4 milhões e
meio de quilômetros quadrados, mais da metade do território nacional.
O Almirante Gary Roughead, Chefe de Operações Navais da Marinha
dos EUA, declarou restabelecida a Quarta Frota com as seguintes palavras:
“Não se enganem; essa frota estará pronta para qualquer operação, a qualquer
hora em qualquer lugar”.

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009


Léo de Almeida Neves 33

O Contra Almirante Joseph Kernan, comandante da Quarta Frota,


atribui a esta “funções pacíficas para atendimentos humanitários e combate
ao narcotráfico”, só para os ingênuos acreditarem.
Ainda bem que, por proposta do Presidente José Sarney, a ONU
tornou o Atlântico Sul Zona de Paz, livre de armas nucleares. A Resolução
41/11 foi aprovada em 27.10.1986, por 126 votos a favor e um contra, o dos
Estados Unidos.
Nesse contexto geopolítico, é fundamental para o Brasil apressar o
submarino a propulsão nuclear, concebido pela nossa Marinha de Guerra, e
não regatear verbas orçamentárias para submarinos convencionais. O governo
não pode procrastinar a duplicação da frota de patrulha, insuficiente para
vigiar a extensão marítima dos novos campos de petróleo.
Está na hora de repudiar definitivamente os conceitos da doutrina de
Washington, aceitos por governos neoliberais, de que a função do Exército
é ater-se à luta contra o narcotráfico e o terrorismo, e que a “soberania é
limitada”. Já houve o absurdo de admitir-se uma “tropa de intervenção rápida”,
chefiada pelos EUA, para resolver pendências na América Latina.
Felizmente, está se firmando a idéia de que o Brasil necessita
desenvolver uma indústria bélica moderna, e a primeira medida é modificar a
lei de licitações nº 8666, flexibilizando critérios para compras de armamentos,
com total primazia ao que é produzido aqui. A revitalização da Imbel está no
contexto.
É preciso também que o BNDES e o Banco do Brasil dêem tratamento
especial aos financiamentos para investimentos fixos, capital de giro e linhas
de exportação às empresas componentes do arco de defesa.
Uma autêntica força dissuasiva tem de ser integrada por aviões,
navios, submarinos, veículos motorizados, baterias anti-aéreas, foguetes,
mísseis, etc., tudo de conteúdo e tecnologia nacionais.
Passo importante se deu com a recente aquisição governamental de
50 helicópteros Super Cougar, que serão construídos pela Helibras, no Polo
Aeronáutico de Helicópteros de Itajubá/MG, com nacionalização progressiva
dos sistemas mecânicos, eletrônicos e de combate.
Para patrulhar nosso imenso espaço aéreo, a Força Aérea Brasileira
precisa equipar-se urgentemente de aeronaves de última geração, com o
compromisso de transferência de tecnologia. O Edital do Ministério da Defesa
excluiu o avião russo Sukhoy-35E, recentemente adquirido pela Venezuela,
que seria o preferido pelos pilotos da FAB. Só foram incluídos no Edital o
francês Rafale-C, da Dassault Aviation (acionista da Embraer), o Boeing norte-
americano e o Gripen da Suécia.
Conforme memorando de entendimento, assinado em abril/2008,
pelos ministros da Defesa, Nelson Jobim, e dos Assuntos Estratégicos,

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34 A POLÍTICA BRASILEIRA E O PROJETO NACIONAL

Mangabeira Unger, e o general Valentin Sobolev, secretário-adjunto do


Conselho de Segurança Nacional russo, os dois países firmaram parceria nas
áreas de submarinos, caças e veículos lançadores de satélite (VLS), que deverá
ser ratificada na visita do presidente russo ao Brasil nos próximos dias.
Recentemente, celebrou-se Acordo de colaboração Militar França-
Brasil assinado pelos Presidentes Lula e Nicolai Sarkozi, em encontro na
Guiana Francesa. Prevê-se uma empresa binacional dos dois países para
fabricar no Brasil o casco do submarino nuclear e interiores da belonave. A
França também transferirá tecnologia para submarinos convencionais.
Um Plano Estratégico de Defesa Nacional está em fase de aprovação
pelo Presidente da República, oferecendo apoio e incentivo para a indústria
brasileira de armamentos e reestruturando regras do Serviço Militar
Obrigatório. O Brasil é nação ordeira e pacífica, mas o fortalecimento das
Forças Armadas constitui imperativo de defesa nacional para salvaguardar
nosso porvir inexorável de super-potência.
Para chegar a bom termo um projeto nacional com a envergadura e
abrangência das idéias aqui expostas é fundamental a participação dos jovens,
notadamente líderes estudantis e universitários.
O individualismo está muito arraigado na população e o sentimento
de Pátria, muito arrefecido nos segmentos da sociedade contemplados com
melhor participação na renda nacional, e que sofrem a influência direta da
mídia de jornal, revista, rádio e televisão, excessivamente dominada pelos
conceitos de cosmopolitismo e de globalização.
É preciso reunir as reservas de civismo e espírito público que
felizmente ainda remanescem na política, nas casas legislativas, no executivo,
nos sindicatos, nas entidades representativas como a OAB, a ABI e outras.
Ainda há muitos idealistas na cátedra, no meio universitário, nas religiões, na
classe jornalística. Com a união de todos, será edificado um Brasil poderoso
economicamente, com seu povo vivendo em paz, harmonia e equidade
social.

GEOGRAFIA ECONÔMICA - n° 3 - Florianópolis - julho 2009

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