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MELO ROCHA Ambiente
MELO ROCHA Ambiente
JSBN 972-8069-21-9
t - J u
JÚRIS ET
DE JURE
Nos vinte anos da Faculdade de Direito
da Universidade Católica Portuguesa - Porto
Coordenação
JOÊIS ET DEJUMB
NM 28 UM ta Ftoldafe dt Direlte á» UCF • rcrIQ
Fana, 19«
fp. <03-642
604 Mdrio cie Melo Rocba
5 Idem, ibidem.
' ob. cit., p. 21.
' Cf, ALEXANDRE KISS - in «Le droii à une protection efficace de I' environnement»
— Actes des Journées Strasbourgeoises - 1992 — pp. 517 e ss.
s Cf. FERDINANDO ALBANESE — ob. cit,, p. 21.
606 Mdrio cie Melo Rocba
nacionais concluídos sob a égide das Nações Unidas, como o pacto rela-
tivo aos direitos civis ou políticos (art. 6.°) ou o relativo aos direitos
económicos, sociais e culturais (arts. 2.° a 15-°).
X evolução doutrinária referida correspondeu uma evolução no que
respeita à inserção normativa do direito ao ambiente com o objecto des-
crito. No plano internacional e para lá da Declaração de Estocolmo e
da Carta mundial da Natureza (instrumentos normativos sem carácter
obrigatório), têm sido os instrumentos regionais de protecção dos direitos
do homem que, expressamente, se referem ao direito ao ambiente; é o
caso da Carta africana dos direitos do homem e dos povos, adoptada
em 1 9 8 1 d o Protocolo adicional à Convenção americana dos direi-
tos do homem no domínio dos direitos económicos, sociais e culturais,
adoptada em 1988 H, da Convenção sobre os direitos da criança, de
1989 15 , e da Convenção 169 da OTI, de Junho de 1989 l6 .
Atenção especial merecem o TUE e a CEDH. Enquanto o primeiro
se refere expressamente ao ambiente, elevando o tema a objectivo comu-
nitário e consagrando-o em termos tais que é aqui que o princípio da
integração pode ir mais longe17, a segunda não se refere ao ambiente
e não menciona o «direito ao ambiente» como um dos direitos garan-
tidos no elenco que este instrumento normativo internacional acolhe.
A própria comissão o confirmou declarando que o direito à protecção
da natureza não se encontrava, enquanto tal, protegido pela Conven-
ção 18 . 0 facto é que, desde 1976, a jurisprudência da Comissão tem vindo
a evoluir e a matéria tem sido considerada quer na perspectiva do inte-
resse individual quer na do interesse colectivo podendo justificar a limi-
19 São marcos desta evolução os casos «Arrondelle Vs. Reino Unido» (queixa
n." 7889/77) e «Herrick Vs. Reino Unido» (queixa n." 11185/84) - vd. infra pp. 24 e 32.
20 Sobre o tema, Vd. ALEXANDRE KISS — «Peut-on definir le droit de 1'homme à
1'environnement?», onde o autor dá conta da acesa polémica ocorrida no Colóquio
organizado pelo Conselho Europeu do direito do ambiente, em Bona - Junho de 1975;
in R.J.E 1/1976 - p p . 1 5 e s s .
vd. ALEXANDRE KISS — in «Le droit à ia conservation ( . . . ) » , cit, p. 445.
21
1. Introdução
CARPENTIER, O art. 1 0 0 . " «não constitui nem em si, nem no seu espírito,
nem na sua letra, um instrumento que possa assegurar a protecção da
saúde do homem e do seu meio ambiente»30. Sustentou-se, por outro
lado, que sempre se poderia invocar o disposto no art. 235.° aí integrando
as questões ambientais, uma vez que o artigo determina que «se se con-
siderar necessária uma acção da Comunidade para realizar, no funcio-
namento do Mercado Comum, um dos objectivos da Comunidade, sem
que o presente Tratado tenha previsto os poderes de acção requeridos
para o efeito, o Conselho decidindo por unanimidade e após consulta
da Assembleia, adoptará as disposições apropriadas». Mas também aqui
surgiriam dificuldades, bastando que um Estado-membro fizesse uma
interpretação restritiva do normativo para que, por si só, se opusesse à
sua aplicação.
4. Perspectivas futuras
I I I ) O D I R E I T O AO A M B I E N T E C O M O D I R E I T O D O H O M E M
" Cf. J O S É JUSTE R U I Z - «La evolución dei derecho internacional de! médio
ambiente» — 1993, Madrid — in «Hacia un nuevo orden internacional y europeo» -
pp. 407 e 408.
" Cf. A. POSTGIJONE — «Per un tribunale íntemazionale deíPambiente» — in «ALti
dei Convegno Roma; 21-24 Aprile 1989 - Giuffré, Milano, 1990.
H Cf. conclusões do Seminário Interamericano sobre Direitos Humanos e Meto
Ambiente — (Brasília, 1992) — in «Derechos Humanos, Desarrolio sustentable y Médio
Ambiente» - San José de Costa Rica, 1995 - p. 291.
620 Mário de Meto Rocha
Mas a questão central que, por ora, nos ocupa diz respeito à rela-
ção que deve ser estabelecida entre o direito a um meio ambiente são e
o direito ao desenvolvimento como direito do homem. Ora, o conceito
de «desenvolvimento sustentável» pode ser a chave que relacione o
ambiente com o direito ao desenvolvimento na medida em que coloca
a tónica na necessidade de ver conjuntamente o meio-ambiente e o
desenvolvimento, não apenas no presente mas sobretudo tendo em conta
o futuro. São vários os textos que o referem: a título de exemplo e para
além do Tratado de Maastricht que incorporou o conceito de desenvol-
vimento sustentável, citem-se a «Declaração Ministerial sobre Desen-
volvimento Sustentável e Ambientalmente Sadio» adoptado pela reunião
de Bangkok de Outubro de 1990, a «Declaração de Brasília sobre o Melo-
-Ambiente» de 1989, o Relatório «Nossa Própria Agenda» de 1990 da
Comissão Latino-Americana sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente,
enfim o «Relatório sobre o Desenvolvimento Humano de 1991» do PNUD
- que advertiu para a estreita relação entre a probreza e a degradação
ambiental —, textos que elevaram o «desenvolvimento sustentável» à
categoria de princípio de direito internacional contemporâneo.
A Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento da ONU de 1986 64
afirma que «a pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento
e deveria ser participante activo e beneficiário do direito ao desenvolvi-
mento». Importa, por isso, precisar que uma coisa é o «direito inter-
nacional do desenvolvimento» - que é um sistema normativo que regula
as relações entre Estados «juridicamente iguais mas economicamente
desiguais» Ss — e outra o «direito ao desenvolvimento» — como direito
do homem e como tal proclamado pela Declaração de 1986.
Resta referir as dificuldades no que concerne à efectivação do direito
ao desenvolvimento e no seu controlo, sobretudo à escala global e de
possíveis mecanismos («v.g., rapporteur» especial no seio da ONU),
numa época em que há quem sustente que o quotidiano desconstrói o
direito e em que se tenderá a atribuir ao registo consuetudinário um
papel mais incisivo, paralelamente a uma drástica deslegiferação ou
69 Cf. Acórdão io Supremo Tribunal das Filipinas, cit. por MAGUELONNE DÊJEANT-
no art. 8.°, A Comissão lembrou que nos termos desta disposição da Con-
venção, um Estado não deve apenas respeitar mas proteger efectivamente
os direitos garantidos por ela e que ela não deve ser interpretado como
aplicando-se exclusivamente às medidas directas tomadas pelas auto-
ridades. Referindo-se à decisão do caso «Powell e Rayner Vs. Reino
Unido», a Comissão considerou que a questão de saber se as autorida-
des espanholas tinham assegurado o respeito suficiente dos direitos de
que a requerente é titular, ao abrigo do art. 8.°, exigia um exame de
fundo. Todavia, haveria de ocorrer um acordo.
São várias as conclusões a retirar da evolução jurisprudencial
demonstrada por estes sete casos.
A i .* conclusão é a de que em seis dos sete casos apreciados, houve
reconhecimento por parte dos órgãos da Convenção de ingerência
na vida privada e no domicílio (caso» «Arrondelle», «G. e B.», «Baggs»,
«Powell e Rayner», «S.» e «Lopez Ostra»);
A 2.* conclusão é a de que esta quase unanimidade já não existiu
quanto à justificação da ingerência. Assim, enquanto em três deles a
Comissão estimou que as ingerências não eram justificáveis («Arrondelle»,
«Baggs» e «Lopez Ostra»), para os outros três, a Comissão e o Tribu-
nal consideraram que as ingerências se justificavam («G. e E.»; «Powell
e Rayner»; «S»);
A 3-* conclusão é a de que no único caso apreciado pelo Tribunal
(caso «Powell e Rayner Vs. Reino Unido»), apesar de considerar que
as ingerências se justificavam, o Tribunal preferiu declarar-se incom-
petente, escudando-se no «princípio da subsidariedade» e considerando
que os Estados dispõem de uma grande «margem de apreciação»;
Por fim, a 4. 1 conclusão: os órgãos da Convenção operam uma
gradação nos prejuízos ambientais (sonoros, olfactivos, visuais, etc.),
considerando que os menos justificáveis e os mais justiciáveis são os
que atentam imediatamente contra a saúde física do homem.
Diz o art. L* do Protocolo n.° 1: «Qualquer pessoa singular ou colec-
tiva tem direito ao respeito dos seus bens. Ninguém pode ser privado
do que é sua propriedade a não ser por utilidade pública e nas condi-
ções previstas na lei e pelos princípios gerais do direito internacional.
As condições precedentes entendem-se sem prejuízo do direito que os
Estados possuem de pôr em vigor as leis que julguem necessárias para
a regulamentação do uso dos bens, de acordo com o interesse geral, ou
O Diretto ao Ambiente como Direito eto Homem no Quadro Europeu 631
87 Idem, ibidem.
88 Cf. queixa n. a 11185/84.
99 Cf. queixa n.° 10911/84.
O Diretto ao Ambiente como Direito eto Homem no Quadro Europeu 635
** 0 que há uns anos seria impensável não o é hoje: considerar que todas as
formas de poluição integram o conceito de «outro perigo público que ameace a vida
640 Mdrio cie Melo Rocba
da nação» para efeitos do art. 15.VCEDH. O constatado fracasso dos resultados prá-
ticos da Cimeira do Rio de 1992 feito recentemente na l i . ' Cimeira da Terra (Nova
Yorque, 1 9 9 7 ) provam-no. Como observou ANTONOPOULOS - para outro contexto —
o carácter grave e excepcional do perigo (a que se reporta o artigo) advém da pala-
vra «outro»; o perigo deve revestir uma excepcionalidade e uma gravidade paralelas
às existentes numa situação de guerra, sendo já Irrelevante a sua origem (cf. «La
jurisprudence des organes de la CEDH, Leyden - 1967 - p. 221). E a Comissão,
concordantemente, sustenta haver lugar ao conceito quando, cumulativamente, esti-
verem reunidas as seguintes características: tratar-se de uma situação actual ou emi-
nente; que piovoque repercurssões em toda a nação; que constitua uma ameaça à
vida organizada da comunidade; e que as medidas restritivas previstas pela Conven-
ção para garantirem a segurança, a saúde, a ordem pública se revelem insuficientes
para combaterem aquele perigo público (cf. «Repertoire de ia Jurisprudence relativa
á la CEDH - Heule - p. 229).
" Cf. LAURENCE B O I S S O N DE CHAZOURNES — in «La mise en oeuvre du Droit
International dans le domaine de laprotection de ]'environnement: enjeux et défis»
- in RGDIP. Tome IC - 1995 - p. 72.
Cf. J 0 L 58, 1997.
O Diretto ao Ambiente como Direito eto Homem no Quadro Europeu 641
o facto é que, paia se alcançar efeito útil, é necessário que «os meca-
nismos de promoção, como os de reacção, constituam etapas diieren-
tes mas complementares de um «continuum»
No âmbito da UE, o Conselho adoptou recentemente uma posição
comum sobre o plano para rever a aplicação do quinto programa .de
acção em matéria de ambiente, cujo objectivo é promover o desenvol-
vimento sustentável. O plano identifica áreas prioritárias, uma das quais
é um maior rigoi na aplicação da legislação ambiental. Ocorre que,
apesar de se entender que os instrumentos normativos continuam a ser
o fulcro da política ambiental da UE, a Comissão tem vindo a defender
a utilização de outros instrumentos (v. g., acordos voluntários e apli-
cação de impostos ambientais102) para reforçar a via do desenvolvimento
sustentável.
Outra questão é a de saber se estes mecanismos serão inseridos no
actual modelo jurídico europeu — e vistos à luz dos «direitos europeus
específicos» que o Tratado de Maastricht consagrou e o Tratado de
Amesterdão veio reforçar — ou se as questões ambientais também aju-
darão à criação de um novo modelo jurídico à escala europeia, que
antecederia alterações significativas à escala internacional. Neste último
plano, apontando para uma nova ordem sócio-ecológica internacional,
sustentada por normas jurídicas que superem quadros clássicos de refe-
rência e que potenciem vastas áreas consensuais.
BIBLIOGRAFIA