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Anestesia Pediátrica 2002 12: 585–588

Correlação do tipo de fissura com a

incidência de complicações respiratórias
perioperatórias em lactentes com fissura labiopalatal
HIROSHI TAKEMURA M D, KAZUMASA YASUMOTO M D,
TAKASHI TOI MD E AKIYOSHI HOSOYAMADA MD
Departamento de Anestesiologia, Showa University School of Medicine, Shinagawa-ku, Tóquio,
Japão

Resumo
Fundamento: Uma pesquisa retrospectiva de 339 crianças submetidas à cirurgia
plástica primária para fissura labiopalatal foi realizada para avaliar a avaliação
pré-operatória concomitante com base na classificação da gravidade do resfriado
comum e na correlação do tipo de fissura com a incidência de complicações
respiratórias perioperatórias.
Métodos: Avaliamos a gravidade dos sintomas do resfriado comum no pré-
operatório por meio do Common Cold Score, que compreende 10 sintomas e
achados. Em seguida, determinamos a associação da incidência de complicações
respiratórias perioperatórias com o aumento da gravidade dos sintomas do
resfriado comum e também comparamos a incidência de complicações nos três
tipos de fenda em bebês saudáveis sem resfriado comum.

Resultados: A incidência de complicações respiratórias perioperatórias foi maior

no grupo com suspeita de resfriado comum.
Bebês com fissura mais grave, que apresentavam lábio leporino bilateral, mesmo
sem sintomas de resfriado comum, tiveram uma incidência significativamente
maior de complicações respiratórias perioperatórias (8,9%) do que bebês com
lábio leporino simples (1,7%, P < 0,05).
Conclusões: Os médicos devem considerar o adiamento da cirurgia plástica
primária para fissura labiopalatal em lactentes com suspeita de resfriado comum.
Nossos resultados também sugerem que a presença de uma fissura larga é um
fator de risco para causar complicações respiratórias perioperatórias em lactentes
com fissura labiopalatal. Acreditamos que uma avaliação pré-operatória cuidadosa
dos sintomas do resfriado comum nesses lactentes pode diminuir a incidência
de complicações respiratórias perioperatórias.

Palavras-chave: infecções do trato respiratório superior; complicação: respiratória

perioperatória; cirurgia: fissura labiopalatina; anestesia: infantil

Correspondência para: Hiroshi Takemura, Departamento de Anestesiologia, Escola de Medicina da Universidade Showa, 1-5-8 Hatanodai, Shinagawa ku, Tóquio
142-8666, Japão (e-mail: masuika@med.showa-u.ac.jp).

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586 H. TAKEMURA ET AL.
Introdução
O defeito anatômico da fissura labiopalatal (FLP) causa uma
série de distúrbios associados nos primeiros meses de
desenvolvimento infantil. Sabe-se que as dificuldades iniciais
de alimentação associadas às fissuras resultam em ganho
de peso inadequado (1) e a irritação da cavidade nasal
causada por alimentos e saliva pode causar infecções, como
sinusite e timpanite (2). Além disso, bebês com FLP podem
apresentar infecções respiratórias recorrentes (3). A cirurgia
plástica primária precoce promove uma melhora dessas
condições e, portanto, todos os esforços devem ser feitos
para evitar a
cancelamento da cirurgia devido ao risco de complicações
anestésicas.
A presença de qualquer infecção no trato respiratório
superior pode induzir a complicações respiratórias
perioperatórias (CRP). No entanto, em nossa prática clínica,
encontramos lactentes saudáveis com FLP que
experimentaram inesperadamente PRC induzido por anestesia
durante cirurgia plástica primária.
Portanto, questionamos se a avaliação respiratória pré-
operatória baseada em sintomas comuns pode avaliar
adequadamente o risco potencial de desenvolvimento de
CRP em diferentes tipos de anormalidades morfológicas de
FLP. Até onde sabemos, essa questão não foi abordada
anteriormente na literatura.
O objetivo deste estudo clínico retrospectivo foi esclarecer
a utilidade da avaliação pré-operatória que usamos para
classificar a gravidade dos sintomas do resfriado comum e a
correlação do tipo de fissura com a incidência de PRC em
lactentes com FLP.
Métodos
Este estudo retrospectivo envolveu 339 lactentes, com idades
entre 2 e 5 meses, submetidos à cirurgia plástica primária
(reparação de lábio e nariz) para FLP entre janeiro de 1995 e
junho de 1999 em nosso hospital. Pacientes com cardiopatia
congênita ou defeitos toracoabdominais foram excluídos, mas
pacientes com problemas nas vias aéreas, como síndrome
de Pierre-Robin e Treacher-Collins, foram incluídos.
Classificamos os indivíduos em um dos três grupos: bebês
com lábio leporino, incluindo lábio leporino e mandíbula
(grupo 1, n ¼ 125), bebês com FLP unilateral (grupo 2, n ¼
154) e bebês com FLP bilateral (grupo 3, n ¼ 60). Lactentes
que apresentavam apenas fenda palatina foram excluídos
deste estudo, pois a cirurgia plástica primária não é indicada
abaixo dos 6 meses de idade.
Em nosso instituto, todos os lactentes com FLP têm
radiografia de tórax e hemograma examinados antes da
operação. Posteriormente, pediatras, otorrinolaringologistas
e anestesiologistas, respectivamente, realizam avaliações
clínicas. A decisão de serem ou não aptos para anestesia em
cirurgia plástica primária é baseada nessas avaliações globais.
Registros anestésicos documentaram que todos os
pacientes receberam atropina 0,015 mgÆkg–1 por via intramuscular
30 minutos antes do início da anestesia. Anestesia
foi induzido com máscara facial com sevoflurano a 5% em
mistura de O2/N2O (33%/66%) e intubação realizada com
laringoscópio e técnica de pressão cricoide em caso de
intubação difícil. Em seguida, os pacientes foram ventilados
e a concentração de sevoflurano ajustada entre 1,5% e 3%
para manter a anestesia. Drogas opioides e bloqueadores
neuromusculares não foram administradas no intraoperatório.
Um eletrocardiógrafo e estetoscópio precordial foram usados
para monitorar o sistema cardiovascular. Outros
monitoramentos incluíram concentração inspirada de oxigênio,
dióxido de carbono expirado, saturação de oxigênio (oximetria
de pulso) e temperatura retal.
Avaliamos a gravidade dos sintomas do resfriado comum
no pré-operatório por meio do Common Cold Score (4), que
calculamos a partir do prontuário médico e do histórico pré-
anestésico de cada paciente. O Common Cold Score
compreende 10 sintomas e os achados são mostrados na
Tabela 1. Um ponto é atribuído a cada um e o escore é obtido
pela soma dos pontos. Uma pontuação mais alta indica uma
maior gravidade dos sintomas do resfriado comum. Os graus
de gravidade são classificados em três grupos: grupo
saudável (0–2 pontos), grupo limítrofe (3–4 pontos) e grupo
de alto risco (5 ou mais pontos).
Em seguida, analisamos a incidência de PRC em diferentes
graus de resfriado comum e comparamos a incidência de
PRC em diferentes tipos de CLP. No presente estudo,
definimos PRC como aquela induzida apenas pela anestesia.
Esta definição incluiu laringoespasmo e broncoespasmo
durante a indução anestésica, aumento das secreções das
vias aéreas e dessaturação (SpO2 £ 95%) durante a
manutenção anestésica e sintomas respiratórios observados
imediatamente após a extubação que exigiram intervenção
terapêutica adicional. Os efeitos da cirurgia que podem ter
induzido a CRP, nomeadamente hemorragia
2002 Blackwell Science Ltd, Anestesia Pediátrica, 12, 585–588
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COMPLICAÇÕES RESPIRATÓRIAS EM FISSURA LÁBIO-PALATAL 587

tabela 1
Dez sintomas e achados do Common Cold Score

Sintomas e achados

Obstrução nasal, rinorreia, espirros Vermelhidão

da faringe, inchaço das amígdalas Tosse,
escarro, rouquidão Som respiratório anormal
Febre alta: acima de 38 C em bebês, acima de
37,5 C em crianças Perda de apetite, vômitos, diarreia Achados
anormais no exame de radiografia de tórax Aumento na contagem de
leucócitos: acima de 12 · 109 l
)1 )1
em lactentes, acima de 10 · 109 l em crianças
Sintomas de resfriado comum dentro do período pré-operatório de 2 semanas
Fator de envelhecimento (fator imunológico): menos de 6 meses de idade

Atribui-se um ponto a cada um e a pontuação é obtida pela soma dos pontos. Quanto maior a pontuação, maior a gravidade dos sintomas do resfriado comum. Os
graus de gravidade são classificados em três grupos: grupo saudável (0–2 pontos), grupo limítrofe (3–4 pontos) e grupo de alto risco (5 ou mais pontos). WBC,
glóbulo branco. Adaptado com permissão (4).

e inchaço, foram excluídos deste estudo porque não tiveram
influência na eficácia da avaliação pré-operatória.
As variáveis qualitativas foram comparadas por meio do
teste qui-quadrado. P < 0,05 foi considerado estatisticamente
diferente.
Resultados
Nos lactentes do grupo saudável, o grupo 3 apresentou
a maior incidência de CRP (8,9%) de todos os tipos de
fissura e foi observada diferença estatisticamente
significativa entre os grupos 1 e 3 (P < 0,05) (Tabela 3).
No grupo limítrofe, não foi possível avaliar estatisticamente
a incidência de CRP entre os três fissurados
tipos porque o pequeno número de pacientes dificultou a
interpretação dos resultados.

Não houve documentação perdida em nenhum dos registros

Discussão
anestésicos durante a cirurgia, devido à dupla verificação
da entrada de dados pela equipe anestésica. Todos os O presente estudo esclareceu a armadilha na avaliação
indivíduos preencheram o critério de idade de menos de 6 pré-operatória de lactentes com FLP antes da cirurgia
meses de idade. Os lactentes submetidos à cirurgia não plástica primária. Reconhecemos a limitação deste estudo
apresentaram achados faríngeos anormais, sintomas retrospectivo. A anestesia foi variável, pois o clínico usou o
intestinais, febre alta ou achados anormais na radiografia método mais familiar para eles e nossa amostra de
de tórax. Um total de 326 de 339 (96%) lactentes foram pacientes no grupo limítrofe foi pequena. No entanto,
classificados no grupo saudável por seu escore de resfriado acreditamos que os achados do presente estudo elucidaram
comum, 13 (4%) no grupo limítrofe e nenhum no grupo de um fator de risco pré-operatório de CRP em lactentes
alto risco. PRC ocorreu em 4% (12 de 326 lactentes) do submetidos à cirurgia plástica primária para correção da
grupo saudável, em contraste com 23% (3 de 13 pacientes) FLP.
do grupo limítrofe. Este resultado foi altamente significativo A avaliação pré-operatória usando o Common Cold
(P <0,001). Score parece útil para avaliar a gravidade da
A Tabela 2 descreve os detalhes do CRP em cada grupo.
Tabela 3
mesa 2 Incidência de complicações respiratórias perioperatórias (CRP) e número de
Detalhes das complicações respiratórias perioperatórias (CRP) no grupo pacientes no grupo saudável
saudável e limítrofe
Grupo Incidência de PRC, n (%)
Grupo Grupo saudável (n) Grupo limítrofe (n)
Grupo 1 1,7 (2/119)
Nº de pacientes 12 3 Grupo 2 3,3 (5/151)
Dessaturação 8 1 Grupo 3 8,9 (5/56)*
Laringoespasmo 4 1
3 1 Grupo 1 ¼ de bebês com lábio leporino, incluindo lábio leporino e mandíbula;
Aumento da secreção das vias aéreas
1 0 grupo 2 ¼ lactentes com fissura labiopalatal unilateral; grupo 3 ¼ lactentes
Broncoespasmo
1 1 com fissura labiopalatina bilateral. *Significativamente diferente do grupo 1 (P
um acesso de tosse
< 0,05).

2002 Blackwell Science Ltd, Anestesia Pediátrica, 12, 585–588

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588 H. TAKEMURA ET AL.
sintomas de resfriado comum em lactentes com FLP. É
provável que a presença concomitante de sintomas de
resfriado comum aumente o risco, conforme evidenciado
pela maior incidência de PRC (23%) no grupo limítrofe.
Esse resultado sugere que o adiamento da cirurgia para
FLP deve ser considerado em lactentes com suspeita de
resfriado comum. A maioria dos entrevistados na pesquisa
por questionário com tesiologistas de anestesia realizada
por Tait et al. (5) afirmaram que febre, tosse produtiva,
sibilância e estertores e/ou roncos estavam entre os
sintomas individuais considerados como contraindicações
para cirurgia eletiva em pacientes pediátricos com infecções
do trato respiratório superior, e que a cirurgia era geralmente
adiada até 3-4 semanas após a resolução de uma infecção
do trato respiratório superior. No entanto, ao anestesiar
lactentes com infecções do trato respiratório superior, várias
modificações nas técnicas anestésicas são consideradas:
hidratação intravenosa, umidificação, evitando intubação e
utilizando anestesia regional (5). Infelizmente, o uso de tais
modificações é limitado durante a cirurgia de lactentes com
FLP, pois devemos usar anestesia geral por intubação
traqueal porque o campo cirúrgico coincide com a via aérea
superior. É relatado que não há aumento da morbidade
para crianças que se apresentam para pequenas cirurgias
com infecção aguda não complicada do trato respiratório
superior que não requerem intubação traqueal (6) e a
maioria das complicações está associada à intubação
traqueal (7). Portanto, permanece difícil anestesiar bebês
com FLP que abrigam infecções do trato respiratório
superior.
Nossa adesão estrita aos resultados da avaliação pré-
operatória limitou a cirurgia principalmente aos indivíduos
classificados no grupo saudável do presente estudo. No
entanto, lactentes saudáveis com FLP bilateral tiveram a
maior incidência de CRP (8,9%), mesmo quando as
avaliações pré-operatórias não revelaram sintomas de
resfriado comum. Essas PRC inesperadas podem ter
ocorrido porque os bebês com FLP bilateral têm maior
probabilidade de sofrer infecções respiratórias recorrentes
devido às fissuras largas. Sabe-se que a reatividade das
vias aéreas é aumentada na fase pós-infecção (8,9) e,
portanto, a via aérea superior em lactentes com FLP
bilateral pode ser mais reativa do que em lactentes com
outros tipos de fissuras. Portanto, os efeitos estimulatórios
causados pela intubação nessa área hiper-reativa poderiam
induzir CRP e aumentar a morbidade
avaliar. Outra explicação possível para a maior incidência
de PRC é que a gravidade de alguns sintomas de resfriado
comum, como rinorreia ou roncos, pode ser subestimada
devido à estrutura anatômica de uma fenda ampla.
Consequentemente, os médicos devem estar cientes
desses fatores quando
avaliação de sintomas de resfriado comum no pré-
operatório em bebês com fendas largas.
Concluímos que os médicos devem considerar o
adiamento da cirurgia plástica primária para FLP em
lactentes com suspeita de resfriado comum e que um dos
fatores de risco pré-operatórios para PRC em lactentes com
FLP é ter uma fenda larga. Nossos resultados sugerem que
uma avaliação minuciosa da presença de sintomas de
resfriado comum nessas crianças pode minimizar a
incidência de CRP. Os critérios usados no Common Cold
Score parecem sensíveis o suficiente para avaliar a
gravidade dos sintomas do resfriado comum no pré-
operatório em bebês com FLP. No entanto, uma avaliação
usando apenas essa pontuação pode não ser adequada
para se chegar a uma decisão. Portanto, há a necessidade
de um estudo prospectivo envolvendo uma amostra
populacional maior para determinar novos critérios de
avaliação para avaliação pré-operatória, exclusivos para lactentes com FLP
Referências
1 Jones WB. Ganho de peso e alimentação no recém-nascido com fissura: um
estudo de três centros. Fenda Palatina J 1988; 25: 379–384.
2 Jaffe BF, DeBlanc CB. Sinusite em crianças com fissura labiopalatina. Arch
Otolaryng 1971; 93: 479–482.
3 Steward DJ. Cirurgia plástica e reconstrutiva. In: Steward DJ, ed. Manual de
Anestesia Pediátrica. Nova York: Churchill Livingstone Inc., 1995: 253–266.
4 Mizushima A, Satoyoshi M. Avaliação pré-operatória por escore de resfriado
comum em crianças Rinsho Masui 1989; 13: 28–34.
5 Tait AR, Reynolds PI, Gutstein HB. Fatores que influenciam a decisão do
anestesiologista de cancelar a cirurgia eletiva para a criança com infecção
do trato respiratório superior. J Clin Anesth 1995; 7: 491–499.
6 Tait AR, Knight PR. Os efeitos da anestesia geral nas infecções do trato
respiratório superior em crianças. Anestesiologia 1987; 67: 930–935.
7 Tait AR, Ketcham TR, Klein MJ et al. Complicações respiratórias
perioperatórias em pacientes com infecções do trato respiratório superior.
Anestesiologia 1983; 59: A433.
8 Empey DW, Laitinen LA, Jacobs L et al. Mecanismos de hiper-reatividade
brônquica em indivíduos normais após infecção do trato respiratório superior.
Am Rev Respiro Dis 1976; 113: 131–139.
9 Tait AR, Knight PR. Complicações respiratórias intraoperatórias em pacientes
com infecções do trato respiratório superior. Can J Anaesth 1987; 34: 300–
303.
Aceito em 19 de fevereiro de 2002
2002 Blackwell Science Ltd, Anestesia Pediátrica, 12, 585–588