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ISSN: 2525-8761
RESUMO
A produção de cerveja artesanal tem grande potencial de crescimento no Brasil e pode ser
classificada de acordo com o teor de álcool, variedade do extrato de malte, lupulagem ou
com o tipo de fermentação. O presente estudo comparou os modelos cinéticos de Monod,
Lee e Jin para definir qual é mais consistente com os dados experimentais de uma
produção de cerveja artesanal. Através da variável independente densidade do mosto, foi
estudado perfil da fermentação através do consumo de substrato e da formação de etanol
fazendo a leitura da densidade do mosto, então convertida em g/L de açúcar fermentável
da cerveja. Com o auxílio do software de simulação de processos EMSO, os modelos
cinéticos resultantes foram ajustados e calculados por parametrização para cada modelo
e densidade inicial do mosto. Os resultados mostram que os modelos propostos por Lee
e Jin apresentam perfis muito próximos com os dados experimentais, prevendo o
comportamento da fermentação, podendo ser utilizado para novas pesquisas na
comunidade científica e projetos na área industrial, mostrando que a inclusão de termos
de inibição por substrato e produto e a adequação do perfil matemático da curva foram
decisivos para este caso, quando comparado com o modelo proposto por Monod, que
apresentou perfis de consumo e formação não adequados para este processo.
ABSTRACT
Craft beer production has significant growth potential in Brazil and can be classified
based on alcohol content, variety of malt extract, hopping, or fermentation type. This
study aims to compare the kinetic models of Monod, Lee, and Jin to identify the most
consistent model when applied to experimental data for craft beer production. Through
manipulation of the independent variable - wort density - we investigated the fermentation
profile by monitoring substrate consumption and ethanol formation. The wort density
readings were subsequently converted to g/L of fermentable sugar in the beer. EMSO was
employed to simulate the process and parameterize the resulting kinetic models for each
initial wort density. The results demonstrate that the models proposed by Lee and Jin
closely match the experimental data and effectively predict fermentation behavior. These
models can be utilized for future research in the scientific community and in industrial
projects. Inclusion of substrate and product inhibition terms, as well as a suitable
mathematical profile of the curve, were crucial factors that distinguished the Lee and Jin
models from the model proposed by Monod. Monod's model exhibited unsuitable
consumption and formation profiles for this process.
1 INTRODUÇÃO
A cerveja é a bebida mais consumida no mundo dentro do segmento de bebidas
alcoólicas. A grande variedade existente de cerveja no mundo é o resultado de variações
de um ou mais componentes do processo1,2,3.
A cerveja artesanal se caracteriza pela alta qualidade e está relacionada a
características sensoriais diferenciadas. O aumento do seu consumo se deve ao aumento
da demanda dos brasileiros, que passaram a consumir produtos de maior valor
agregado3,4,5,6. O processo de produção da cerveja pode ser dividido em três etapas:
mosturação, fermentação e processo de acabamento. A etapa de mosturação ou brassagem
é a primeira operação unitária de todo o processo, na qual são definidos os açúcares e os
nutrientes que constituem as características sensoriais do produto1,7.
Entre muitas ferramentas usadas para estudar o processo, a modelagem cinética
possibilita entender o que está ocorrendo no processo com objetivo de otimizar as
condições de operação.7 Consiste no estudo da evolução da concentração de um ou mais
constituintes em um reator em função do tempo de fermentação, suas influências em
relação a fatores externos como pH, temperatura, inibidores, entre outros, onde as
variáveis podem ser a quantidade de microrganismo (biomassa), concentração de
8,9
produtos e concentração de substratos, que são correlacionados. Isso torna essa
ferramenta muito importante e por esta razão foi escolhida para estudar o processo de
fermentação na produção de cerveja artesanal4.
Para o presente estudo, foi utilizado a ferramenta EMSO v.10.10 (ALSOC Project)
para realizar a modelagem e simulação do processo em um sistema dinâmico (Figura 14).
A vantagem desta ferramenta é a maior flexibilidade para o usuário usar os recursos11.
2 MODELAGEM CINÉTICA
A fermentação ocorreu num biorreator operando em um sistema batelada com
volume constante e em uma reação de primeira ordem. De acordo com Levenspiel13, este
tipo de arranjo considera apenas a taxa da concentração de um componente pelo tempo,
esta taxa é descrita pela Equação 1.
𝑑 𝐶𝑖
= µ𝑖 𝐶𝑖 (Equação 1)
𝑑𝑡
𝑑𝐶
A taxa do crescimento de um componente reacional ( 𝑑𝑡 𝑖 ) na fase exponencial é
𝑑𝑋
= µ𝑋 . 𝑋 (Equação 3)
𝑑𝑡
𝑑𝑃
= µ𝑃 . 𝑃 (Equação 4)
𝑑𝑡
𝑑𝑆
= −µ𝑆 . 𝑆 (Equação 5)
𝑑𝑡
𝛥𝑋 𝑑𝑋 𝑑𝑆
𝑌𝑋/𝑆 = = / (Equação 6)
𝛥𝑆 𝑑𝑡 𝑑𝑡
𝛥𝑃 𝑑𝑃 𝑑𝑆
𝑌𝑃/𝑆 = = / (Equação 7)
𝛥𝑆 𝑑𝑡 𝑑𝑡
𝛥𝑃 𝑑𝑃 𝑑𝑋
𝑌𝑃/𝑋 = = / (Equação 8)
𝛥𝑋 𝑑𝑡 𝑑𝑡
𝑑𝑆 1
= −𝑌 . µ𝑋 . 𝑋 (Equação 9)
𝑑𝑡 𝑋/𝑆
𝑑𝑃 𝑌𝑃/𝑆
= . µ𝑋 . 𝑋 (Equação 10)
𝑑𝑡 𝑌𝑋/𝑆
volume do líquido para a célula é dada como a Equação 11, onde S é a concentração do
substrato no volume do líquido e SC é a concentração de substrato na célula.
1 1 1
= + (Equação 12)
µ µ𝑚á𝑥 µ𝑡
𝐴 6𝑋
= (Equação 13)
𝑉 𝜌𝑑𝑐
𝐴 6𝑋
(−𝑟𝑆 ) = 𝑉 𝑁𝑆 = 𝜌𝑑 ℎ𝑆 (𝑆 − 𝑆𝑐) (Equação 14)
𝑐
6𝑌𝑋/𝑆
µ𝑡 = ℎ𝑆 (𝑆 − 𝑆𝑐) (Equação 15)
𝜌𝑑𝑐
6𝑌𝑋/𝑆
µ𝑚𝑎𝑥 ∗ ℎ (𝑆 − 𝑆𝑐)
𝜌𝑑𝑐 𝑆
µ= 6𝑌𝑋/𝑆 (Equação 16)
µ𝑚𝑎𝑥 + ℎ (𝑆 − 𝑆𝑐)
𝜌𝑑𝑐 𝑆
µ𝑚𝑎𝑥 ∗ 𝑆
µ= (Equação 17)
𝐾𝑆 + 𝑆
µ𝑚𝑎𝑥
𝐾𝑆 = 6𝑌𝑋/𝑆 (Equação 18)
ℎ
𝜌𝑑𝑐 𝑆
𝐸
µ𝑚á𝑥 = 𝐴. 𝑒 − 𝑅𝑇 (Equação 19)
produção de etanol obtido da glicose. O modelo cinético introduz dois fatores de inibição,
efeitos da inibição por produto e inibição por substrato. Os parâmetros cinéticos destes
fatores foram estimados pelo Método dos Mínimos Quadrados (MMQ). Foi determinado
que o efeito de inibição do produto domina o efeito de inibição pelo substrato para a faixa
de concentrações estudadas, contudo ainda há os dois efeitos presentes na fermentação15.
O estudo observa experimentalmente uma velocidade específica sendo expressa
por uma função exponencial englobando ambos os efeitos de inibição, sendo descrita na
Equação 20.
µ𝑚á𝑥 .𝑆
µ= . 𝑒 (−𝑃𝑘1 − 𝑆𝑘2 ) (Equação 20)
𝐾𝑆 +𝑆
𝑃
µ = µ𝑚á𝑥 (1 − 𝑃 )𝑛 (Equação 21)
𝑚á𝑥
𝑋
µ = µ𝑚á𝑥 (1 − 𝑋 )𝑚 (Equação 22)
𝑚á𝑥
µ𝑚𝑎𝑥 ∗ 𝑆 𝑃 𝑋
µ = (1 − 𝑃 )𝑛 (1 − 𝑋 )𝑚 (Equação 23)
𝐾𝑆 + 𝑆 𝑚á𝑥 𝑚á𝑥
3 METODOLOGIA
Temperatura (°C) - 20 -
3.1 BRASSAGEM
Todos os experimentos fermentativos foram conduzidos seguindo os mesmos
parâmetros da brassagem numa panela de aço inox 304 com capacidade para 35 L pelo
método BIAB (Brew In A Bag) em bateladas de 25 litros20,21.
A etapa de mostura se deu em três rampas de temperatura: 50ºC por 10 minutos,
65ºC por 60 minutos e 76ºC por 15 minutos com uma taxa de 2 °C/min entre elas. Após
a mostura, o mosto foi fervido por 1 hora. Lupulagem (variedade Saaz com 4,0% de alfa
ácido): Adições feitas no início da fervura (40g), e no fim da fervura (20g). Em seguida
foi efetuado o whirlpool22. Quando o mosto chega na temperatura próxima de 20°C, o
mosto primário foi separado a fim de ser utilizado para as diluições pretendidas.
Para minimizar os riscos associados à contaminação bacteriana, a água mineral é
fervida e resfriada antes de ser utilizada com diluente para obter as concentrações de
açúcar desejadas a partir do mosto primário. Ao todo serão 6 fermentadores para realizar
a fermentação.
As faixas de concentração de açúcar foram ajustadas após a etapa de fervura,
analisando a concentração de açúcar por densidade e corrigindo com água pré-fervida de
acordo com a Equação 24.
900
𝑀 = ∗ (𝐷𝑑 − 1) (Equação 24)
0,055
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A fim de analisar a consistência entre os modelos cinéticos e os resultados
experimentais, os perfis de consumo do substrato e a taxa de formação do etanol foram
comparados entre os modelos de Lee, Jin e Monod.
O comportamento observado nas medidas de densidade do mosto ao longo do
tempo de fermentação mostra uma tendência muito próxima quando comparado com o
modelo de Lee (Figura 1). Na figura 1C, que faz a leitura da fermentação do mosto mais
diluído, verifica-se um pequeno desvio da tendência do gráfico simulado em relação com
os dados experimentais. Os resultados para valores mais altos de concentração de
substrato (figuras 1A e 1B), segundo Lee, demonstram concordância com os resultados
experimentais durante toda a fermentação.
Figura 1. Gráficos de concentração (g/L) de substrato e etanol de acordo com o tempo de fermentação
(em dias) comparando o resultado experimental da fermentação de mosto cervejeiro nas densidades
iniciais de 1,055 g/mL (A), 1,050 g/mL (B) e 1,045 g/mL (C) e a simulação segundo o modelo de Lee.
O modelo de Jin não considera a inibição pelo crescimento celular, mas compensa
os cálculos considerando a inibição do substrato com perfil exponencial, levando a uma
taxa menor nas primeiras horas, o que torna o perfil bem próximo ao observado nos
resultados experimentais (Figura 2).
Figura 2. Gráficos de concentração (g/L) de substrato e etanol de acordo com o tempo de fermentação
(em dias) comparando o resultado experimental da fermentação de mosto cervejeiro nas densidades
iniciais de 1,055 g/mL (A), 1,050 g/mL (B) e 1,045 g/mL (C) e a simulação segundo o modelo de Jin.
Figura 3. Gráficos de concentração (g/L) de etanol de acordo com o tempo de fermentação (em horas)
comparando o resultado experimental da fermentação de mosto cervejeiro nas densidades iniciais de
1,055 g/mL (A), 1,050 g/mL (B) e 1,045 g/mL (C) e a simulação segundo os modelos de Lee e Jin.
5 CONCLUSÃO
A escolha adequada do modelo cinético utilizado em processos químicos e
bioquímicos é de suma importância na indústria e na pesquisa, pois permite a otimização
do processo, redução de possíveis custos e prever o comportamento do processo e da
quantidade produto. As diferenças dos termos de inibição de cada modelo e nas funções
matemáticas utilizadas afetou diretamente na simulação do processo. O modelo de Jin
considera os termos de inibição do substrato e produto com um comportamento
exponencial na fase de atenuação, o que se mostrou satisfatório na comparação com os
resultados experimentais assim como o modelo de Lee, que considera um modelo
matemático não exponencial, mas tem o termo de inibição por concentração celular
fazendo com que os perfis de formação de produto e consumo de substrato sejam muito
próximos para as condições analisadas.
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