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Brazilian Journal of Development 28082

ISSN: 2525-8761

Modelagem e simulação do processo fermentativo de cerveja artesanal

Modeling and simulation of the beer fermentation process


DOI:10.34117/bjdv9n10-045

Recebimento dos originais: 08/09/2023


Aceitação para publicação: 10/10/2023

Victor Gomes de Almeida


Bacharel em Engenharia Química
Instituição: Universidade do Grande Rio, Escola de Ciência e
Tecnologia (UNIGRANRIO)
Endereço: Av. Perimetral Prof. José de Souza Herdy, 1160, Jardim Vinte e Cinco de
Agosto, Duque de Caxias – RJ, CEP: 25071-202
E-mail: victor.almeida@eq.ufrj.br

Romulo Correia Ferreira


Doutor em Química
Instituição: Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Mato Grosso – Campus Juína
Endereço: Linha J, S/N, Zona Rural, Juína – MT, CEP: 78320-000
E-mail: romulo.ferreira@ifmt.edu.br

RESUMO
A produção de cerveja artesanal tem grande potencial de crescimento no Brasil e pode ser
classificada de acordo com o teor de álcool, variedade do extrato de malte, lupulagem ou
com o tipo de fermentação. O presente estudo comparou os modelos cinéticos de Monod,
Lee e Jin para definir qual é mais consistente com os dados experimentais de uma
produção de cerveja artesanal. Através da variável independente densidade do mosto, foi
estudado perfil da fermentação através do consumo de substrato e da formação de etanol
fazendo a leitura da densidade do mosto, então convertida em g/L de açúcar fermentável
da cerveja. Com o auxílio do software de simulação de processos EMSO, os modelos
cinéticos resultantes foram ajustados e calculados por parametrização para cada modelo
e densidade inicial do mosto. Os resultados mostram que os modelos propostos por Lee
e Jin apresentam perfis muito próximos com os dados experimentais, prevendo o
comportamento da fermentação, podendo ser utilizado para novas pesquisas na
comunidade científica e projetos na área industrial, mostrando que a inclusão de termos
de inibição por substrato e produto e a adequação do perfil matemático da curva foram
decisivos para este caso, quando comparado com o modelo proposto por Monod, que
apresentou perfis de consumo e formação não adequados para este processo.

Palavras-chave: cerveja artesanal, modelagem, simulação, monod, EMSO.

ABSTRACT
Craft beer production has significant growth potential in Brazil and can be classified
based on alcohol content, variety of malt extract, hopping, or fermentation type. This
study aims to compare the kinetic models of Monod, Lee, and Jin to identify the most
consistent model when applied to experimental data for craft beer production. Through
manipulation of the independent variable - wort density - we investigated the fermentation
profile by monitoring substrate consumption and ethanol formation. The wort density

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readings were subsequently converted to g/L of fermentable sugar in the beer. EMSO was
employed to simulate the process and parameterize the resulting kinetic models for each
initial wort density. The results demonstrate that the models proposed by Lee and Jin
closely match the experimental data and effectively predict fermentation behavior. These
models can be utilized for future research in the scientific community and in industrial
projects. Inclusion of substrate and product inhibition terms, as well as a suitable
mathematical profile of the curve, were crucial factors that distinguished the Lee and Jin
models from the model proposed by Monod. Monod's model exhibited unsuitable
consumption and formation profiles for this process.

Keywords: craft beer, simulation, monod equation, EMSO.

1 INTRODUÇÃO
A cerveja é a bebida mais consumida no mundo dentro do segmento de bebidas
alcoólicas. A grande variedade existente de cerveja no mundo é o resultado de variações
de um ou mais componentes do processo1,2,3.
A cerveja artesanal se caracteriza pela alta qualidade e está relacionada a
características sensoriais diferenciadas. O aumento do seu consumo se deve ao aumento
da demanda dos brasileiros, que passaram a consumir produtos de maior valor
agregado3,4,5,6. O processo de produção da cerveja pode ser dividido em três etapas:
mosturação, fermentação e processo de acabamento. A etapa de mosturação ou brassagem
é a primeira operação unitária de todo o processo, na qual são definidos os açúcares e os
nutrientes que constituem as características sensoriais do produto1,7.
Entre muitas ferramentas usadas para estudar o processo, a modelagem cinética
possibilita entender o que está ocorrendo no processo com objetivo de otimizar as
condições de operação.7 Consiste no estudo da evolução da concentração de um ou mais
constituintes em um reator em função do tempo de fermentação, suas influências em
relação a fatores externos como pH, temperatura, inibidores, entre outros, onde as
variáveis podem ser a quantidade de microrganismo (biomassa), concentração de
8,9
produtos e concentração de substratos, que são correlacionados. Isso torna essa
ferramenta muito importante e por esta razão foi escolhida para estudar o processo de
fermentação na produção de cerveja artesanal4.
Para o presente estudo, foi utilizado a ferramenta EMSO v.10.10 (ALSOC Project)
para realizar a modelagem e simulação do processo em um sistema dinâmico (Figura 14).
A vantagem desta ferramenta é a maior flexibilidade para o usuário usar os recursos11.

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2 MODELAGEM CINÉTICA
A fermentação ocorreu num biorreator operando em um sistema batelada com
volume constante e em uma reação de primeira ordem. De acordo com Levenspiel13, este
tipo de arranjo considera apenas a taxa da concentração de um componente pelo tempo,
esta taxa é descrita pela Equação 1.

𝑑 𝐶𝑖
= µ𝑖 𝐶𝑖 (Equação 1)
𝑑𝑡

Os componentes relevantes para realizar a modelagem cinética do estudo são o


substrato, o etanol e as células viáveis.
A velocidade específica (µ) da reação de fermentação pode ser dividida em três
fatores: substrato limitante (G(s)), inibição pelo etanol (G(Et)) e inibição por
concentração celular (G(x)) (Equação 2), onde µmax é a velocidade específica máxima.

µ = µ𝑚𝑎𝑥 . 𝐺(𝑠). 𝐺(𝐸𝑡). 𝐺(𝑥) (Equação 2)

𝑑𝐶
A taxa do crescimento de um componente reacional ( 𝑑𝑡 𝑖 ) na fase exponencial é

proporcional à velocidade específica do componente (µ𝑖 ) e à concentração dos respectivos


componentes (𝐶𝑖 ), como demonstrado na Equação 3. A taxa de reação da produção do
produto (P), o consumo do substrato (S) e o crescimento biológico da levedura (X)
seguem a mesma proporcionalidade para suas respectivas velocidades específicas
(Equação 4 e Equação 5).

𝑑𝑋
= µ𝑋 . 𝑋 (Equação 3)
𝑑𝑡
𝑑𝑃
= µ𝑃 . 𝑃 (Equação 4)
𝑑𝑡
𝑑𝑆
= −µ𝑆 . 𝑆 (Equação 5)
𝑑𝑡

Correlacionando a taxa de produção e a de consumo com a taxa do crescimento


celular, obtém-se os rendimentos do crescimento celular frente ao substrato (𝑌𝑋/𝑆 ), da
produção de etanol frente ao substrato (𝑌𝑃/𝑆 ) e a capacidade produtiva da célula (𝑌𝑃/𝑋 ),
de acordo com as Equações 6, 7 e 8, respectivamente.

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𝛥𝑋 𝑑𝑋 𝑑𝑆
𝑌𝑋/𝑆 = = / (Equação 6)
𝛥𝑆 𝑑𝑡 𝑑𝑡
𝛥𝑃 𝑑𝑃 𝑑𝑆
𝑌𝑃/𝑆 = = / (Equação 7)
𝛥𝑆 𝑑𝑡 𝑑𝑡
𝛥𝑃 𝑑𝑃 𝑑𝑋
𝑌𝑃/𝑋 = = / (Equação 8)
𝛥𝑋 𝑑𝑡 𝑑𝑡

Rearranjando a Equação 6, Equação 7, e combinando com a Equação 3, tem-se:

𝑑𝑆 1
= −𝑌 . µ𝑋 . 𝑋 (Equação 9)
𝑑𝑡 𝑋/𝑆

𝑑𝑃 𝑌𝑃/𝑆
= . µ𝑋 . 𝑋 (Equação 10)
𝑑𝑡 𝑌𝑋/𝑆

A Equação 9 e Equação 10 são os balanços de massa para o consumo de substrato


e produção de etanol, respectivamente.
A velocidade específica do crescimento da levedura possui diversos modelos
cinéticos, que determinam o quão rápido a reação vai ocorrer, assim como se alguma
condição específica da reação possui algum efeito de inibição. Os modelos escolhidos
para comparação neste estudo são propostos por Monod13, Lee14 e Jin15.

2.1 MODELO MONOD (1950)


A equação desenvolvida por Jacques Monod13 (Equação 17) foi proposta através
de uma equação hiperbólica devido à facilidade de esta descrever modelos simples de
fenômenos de adsorção. Embora seja extensivamente prática, esta equação é simplificada.
Os parâmetros básicos de reação para esta equação são a concentração de
substrato, efeito de inibição relacionado à tolerância da levedura ao etanol23, as constantes
cinéticas de Michaelis-Menten16,17 e a velocidade específica máxima.
A constante de velocidade específica máxima é a taxa máxima da reação
elementar de formação do produto pela dissociação do complexo enzima-substrato e a
constante de equilíbrio para o sistema enzima-substrato, seja assumindo equilíbrio rápido
ou equilíbrio em estado quase estacionário. Mas nenhum desses sistemas podem ser
aplicados imediatamente ao sistema enzima-substrato.
O substrato limitante, aquele que se esgota mais rapidamente na reação, considera
apenas o efeito da transferência de massa. Se o coeficiente global de transferência de
massa (hs) para o substrato limitante começar a ser consumido, o fluxo de massa (NS) do

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volume do líquido para a célula é dada como a Equação 11, onde S é a concentração do
substrato no volume do líquido e SC é a concentração de substrato na célula.

𝑁𝑆 = ℎ𝑆 (𝑆 − 𝑆𝑐) (Equação 11)

A taxa específica máxima (µmáx) para o metabolismo da fonte de carbono principal


(substrato) é assumida como constante, independente da concentração do substrato.
Porém a taxa de transporte do substrato (µt) para a célula é dependente da concentração
do substrato, como é observado na Equação 11. Como ambos os passos ocorrem em série,
o somatório da resistência do substrato em encontrar e ser metabolizado pelo
microrganismo se torna o inverso da taxa da velocidade específica (µ), onde é
demonstrada na Equação 12.

1 1 1
= + (Equação 12)
µ µ𝑚á𝑥 µ𝑡

É possível usar a Equação 13 para encontrar a taxa de transporte do substrato (µt).


Assumindo, sem perda de generalidade, que as células de Saccharomyces cerevisiae são
esféricas podemos admitir que a razão área/volume (A/V) seja de 6/dc onde dc é o
diâmetro da célula, logo a área de células por unidade de volume da reação se estende
para a Equação 13.

𝐴 6𝑋
= (Equação 13)
𝑉 𝜌𝑑𝑐

Onde X é a concentração de biomassa, 𝜌 é a massa específica da célula. A Equação


11 pode ser convertida em taxa limite de absorção do substrato (-rS) dependente da
concentração do substrato. Esta conversão é descrita na Equação 14.

𝐴 6𝑋
(−𝑟𝑆 ) = 𝑉 𝑁𝑆 = 𝜌𝑑 ℎ𝑆 (𝑆 − 𝑆𝑐) (Equação 14)
𝑐

Usando a definição do rendimento celular da Equação 6, a taxa no qual o


crescimento celular é controlada apenas pelo fluxo de substrato em direção a célula é
apresentada na Equação 15.

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6𝑌𝑋/𝑆
µ𝑡 = ℎ𝑆 (𝑆 − 𝑆𝑐) (Equação 15)
𝜌𝑑𝑐

Quando a concentração do substrato é alta, a taxa de transporte do substrato (µt) é


muito maior do que a taxa específica máxima nas condições dadas, sendo assim,
observando a Equação 11, a influência da taxa de transporte é insignificante e µmax = µ.
Realocando a Equação 15 na Equação 11 e rearranjando em função da velocidade
específica, temos a Equação 16.

6𝑌𝑋/𝑆
µ𝑚𝑎𝑥 ∗ ℎ (𝑆 − 𝑆𝑐)
𝜌𝑑𝑐 𝑆
µ= 6𝑌𝑋/𝑆 (Equação 16)
µ𝑚𝑎𝑥 + ℎ (𝑆 − 𝑆𝑐)
𝜌𝑑𝑐 𝑆

A concentração de substrato na célula (SC) é desconhecida, contudo pode-se


pressupor que é muito menor do que a concentração de substrato no volume do biorreator
(S ≫ SC), logo pode-se considerar que (S - SC) ≅ S. Assim a Equação 16 começa a tomar
a forma da equação Monod, como é evidenciado na Equação 17, substituindo com a
Equação 18, sendo Ks uma constante empírica característica da levedura18.

µ𝑚𝑎𝑥 ∗ 𝑆
µ= (Equação 17)
𝐾𝑆 + 𝑆
µ𝑚𝑎𝑥
𝐾𝑆 = 6𝑌𝑋/𝑆 (Equação 18)

𝜌𝑑𝑐 𝑆

A equação de Arrhenius (Equação 19) permite calcular a variação da constante da


velocidade de uma reação química com a mudança de temperatura. Onde o fator pré-
exponencial ou frequência de colisão (A), que está relacionado com a frequência em que
os reagentes se encontram; a energia de ativação (E) é a energia mínima necessária para
que ocorra a reação; a constante dos gases ideais (R) e a temperatura (T). Esta constante
é referente a velocidade específica máxima (µmáx)19.

𝐸
µ𝑚á𝑥 = 𝐴. 𝑒 − 𝑅𝑇 (Equação 19)

2.2 MODELO JIN (1981)


O modelo Jin15 aborda a fermentação em reatores de mistura perfeita ligados em
série aplicando um agente protetor para auxiliar o crescimento da levedura e aumentar a

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produção de etanol obtido da glicose. O modelo cinético introduz dois fatores de inibição,
efeitos da inibição por produto e inibição por substrato. Os parâmetros cinéticos destes
fatores foram estimados pelo Método dos Mínimos Quadrados (MMQ). Foi determinado
que o efeito de inibição do produto domina o efeito de inibição pelo substrato para a faixa
de concentrações estudadas, contudo ainda há os dois efeitos presentes na fermentação15.
O estudo observa experimentalmente uma velocidade específica sendo expressa
por uma função exponencial englobando ambos os efeitos de inibição, sendo descrita na
Equação 20.

µ𝑚á𝑥 .𝑆
µ= . 𝑒 (−𝑃𝑘1 − 𝑆𝑘2 ) (Equação 20)
𝐾𝑆 +𝑆

Onde k1 e k2 são coeficientes obtidos experimentalmente6. Foi calculado


experimentalmente valor de k1 para 0,06035 L.g-1, k2 para 0,00550 L.g-1 e KS para 0,22
g/L.

2.3 MODELO LEE (1983)


O modelo de Lee foi proposto para fermentação em reatores de mistura perfeita
ligados em série para a produção de etanol através da fermentação da glicose com
concentração elevada de leveduras7. Com isto os efeitos inibitórios presentes são da
concentração da levedura e da concentração do produto (etanol) devido à alteração do
meio14.
A taxa do crescimento da levedura (µ) cessa quando a concentração de etanol está
entre 80 g/L e 150 g/L e este fator de inibição pode ser descrito como a Equação 21.

𝑃
µ = µ𝑚á𝑥 (1 − 𝑃 )𝑛 (Equação 21)
𝑚á𝑥

Esta equação prediz que em uma determinada concentração de etanol (Pmáx) as


leveduras vão parar de crescer. A potência (n) informa o quão forte é a inibição do etanol
no crescimento da levedura, conforme a potência aumenta, a constante da taxa de
crescimento celular (µmáx) diminui para uma concentração constante de etanol. Quando
não há fator de inibição pelo etanol, a potência equivale a zero. A Equação 18 não se
aplica para concentrações de etanol (P) maior do que a concentração máxima (Pmáx).

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No início da fermentação a taxa de crescimento possui uma relação linear com a


concentração celular (X). Contudo, para um número elevado de células da levedura, a
relação entre a taxa de crescimento e a concentração celular perde-se essa linearidade em
uma faixa entre 60 g/L e 100 g/L. Este efeito inibitório do número de células no meio é
expresso de forma similar à inibição por produção de etanol, sendo demonstrada na
Equação 2214.

𝑋
µ = µ𝑚á𝑥 (1 − 𝑋 )𝑚 (Equação 22)
𝑚á𝑥

E a equação da velocidade específica então é o produto da equação Monod com


os termos de inibição por produto e concentração celular. Combinando a Equação 20,
Equação 21 e Equação 17, obtemos a Equação 23.

µ𝑚𝑎𝑥 ∗ 𝑆 𝑃 𝑋
µ = (1 − 𝑃 )𝑛 (1 − 𝑋 )𝑚 (Equação 23)
𝐾𝑆 + 𝑆 𝑚á𝑥 𝑚á𝑥

O valor de n e m foram calculados experimentalmente pelo Lee14 para 1, Pmáx para


90 g/L, Xmáx para 100 g/L e KS para 1,6 g/L.

2.4 ENVIRONMENT FOR MODELING, SIMULATION, AND OPTIMIZATION-EMSO


O simulador é uma ferramenta valiosa para aplicações, desde a validação do
projeto, controle e operação de uma planta até o aumento da produção e redução de custos.
Esses fatos, entre outros, aumentaram o interesse da indústria em ferramentas de software
de modelagem, simulação e otimização, mas essas ferramentas ainda são vistas pelos
usuários como insuficientes11.
Nesse contexto, este estudo utilizou a ferramenta EMSO (Environment for
Modeling, Simulation, and Optimization) v.10.10, produzida pela ALSOC Project, para a
modelagem e simulação de um processo em um sistema dinâmico. A grande vantagem
dessa ferramenta é a sua flexibilidade, permitindo que o usuário faça uso de seus recursos
de forma mais eficiente. A linguagem de modelagem proposta pelo EMSO é composta
por três estruturas principais: o modelo, que é uma descrição matemática de um
dispositivo; o dispositivo, que é uma instância de um modelo; e o fluxograma, que mostra
o processo analisado compreendendo um conjunto de dispositivos11.

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3 METODOLOGIA

A variável independente deste estudo cinético foi a densidade inicial do mosto


(tabela 2), com temperatura fixada em 20ºC.

Tabela 1. Condições de fermentação


Parâmetros - 0 +

Temperatura (°C) - 20 -

Densidade 1,045 1,050 1,055


Fonte: Próprio autor.

3.1 BRASSAGEM
Todos os experimentos fermentativos foram conduzidos seguindo os mesmos
parâmetros da brassagem numa panela de aço inox 304 com capacidade para 35 L pelo
método BIAB (Brew In A Bag) em bateladas de 25 litros20,21.
A etapa de mostura se deu em três rampas de temperatura: 50ºC por 10 minutos,
65ºC por 60 minutos e 76ºC por 15 minutos com uma taxa de 2 °C/min entre elas. Após
a mostura, o mosto foi fervido por 1 hora. Lupulagem (variedade Saaz com 4,0% de alfa
ácido): Adições feitas no início da fervura (40g), e no fim da fervura (20g). Em seguida
foi efetuado o whirlpool22. Quando o mosto chega na temperatura próxima de 20°C, o
mosto primário foi separado a fim de ser utilizado para as diluições pretendidas.
Para minimizar os riscos associados à contaminação bacteriana, a água mineral é
fervida e resfriada antes de ser utilizada com diluente para obter as concentrações de
açúcar desejadas a partir do mosto primário. Ao todo serão 6 fermentadores para realizar
a fermentação.
As faixas de concentração de açúcar foram ajustadas após a etapa de fervura,
analisando a concentração de açúcar por densidade e corrigindo com água pré-fervida de
acordo com a Equação 24.

900
𝑀 = ∗ (𝐷𝑑 − 1) (Equação 24)
0,055

Os parâmetros utilizados para a simulação estão descritos na Tabela 5 e o fator de


frequência foram calculados por parametrização para cada modelo e densidade inicial do
mosto.

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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A fim de analisar a consistência entre os modelos cinéticos e os resultados
experimentais, os perfis de consumo do substrato e a taxa de formação do etanol foram
comparados entre os modelos de Lee, Jin e Monod.
O comportamento observado nas medidas de densidade do mosto ao longo do
tempo de fermentação mostra uma tendência muito próxima quando comparado com o
modelo de Lee (Figura 1). Na figura 1C, que faz a leitura da fermentação do mosto mais
diluído, verifica-se um pequeno desvio da tendência do gráfico simulado em relação com
os dados experimentais. Os resultados para valores mais altos de concentração de
substrato (figuras 1A e 1B), segundo Lee, demonstram concordância com os resultados
experimentais durante toda a fermentação.

Figura 1. Gráficos de concentração (g/L) de substrato e etanol de acordo com o tempo de fermentação
(em dias) comparando o resultado experimental da fermentação de mosto cervejeiro nas densidades
iniciais de 1,055 g/mL (A), 1,050 g/mL (B) e 1,045 g/mL (C) e a simulação segundo o modelo de Lee.

Fonte: Próprio autor.

O modelo de Jin não considera a inibição pelo crescimento celular, mas compensa
os cálculos considerando a inibição do substrato com perfil exponencial, levando a uma
taxa menor nas primeiras horas, o que torna o perfil bem próximo ao observado nos
resultados experimentais (Figura 2).

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Figura 2. Gráficos de concentração (g/L) de substrato e etanol de acordo com o tempo de fermentação
(em dias) comparando o resultado experimental da fermentação de mosto cervejeiro nas densidades
iniciais de 1,055 g/mL (A), 1,050 g/mL (B) e 1,045 g/mL (C) e a simulação segundo o modelo de Jin.

Fonte: Próprio autor.

O modelo de Lee foi proposto para fermentação e produção de etanol através da


fermentação da glicose com concentração elevada de leveduras, e considera os efeitos
inibitórios da concentração da levedura e da concentração do produto (etanol), que sofre
alteração do meio a cada instante, levando em conta que a taxa de crescimento da levedura
(µ) cessa com concentração de etanol a partir de 80 g/L.
A aplicação do modelo de Lee neste caso apresentou maior decréscimo da
velocidade de formação de etanol nas primeiras 100 horas da fermentação (fase
exponencial), comparando como o modelo de Jin (figura 3), indicando ser influência do
termo de inibição por concentração celular associado ao perfil matemático não linear,
diferente do modelo de Jin, que trata de um perfil exponencial. Apesar do modelo de Lee
não seguir o mesmo perfil do resultado experimental nas primeiras 100 horas de
fermentação do mosto a 1,045 g/mL de densidade (figura 3C), para concentrações mais
elevadas observadas nas figuras 3A e 3B, este modelo apresentou maior correspondência
em relação aos resultados experimentais.
O modelo cinético de Jin introduz efeitos da inibição por produto e por substrato.
Os parâmetros cinéticos destes fatores foram estimados pelo Método dos Mínimos
Quadrados (MMQ). Foi determinado que o efeito de inibição do produto domina o efeito
de inibição pelo substrato para a faixa de concentrações estudadas, mas como ainda há os
dois efeitos presentes na fermentação, nota-se desvios nos perfis dos gráficos
apresentados na figura 3 (3A, 3B e 3C) que tem influência da velocidade específica que
é expressa por uma função exponencial, englobando ambos os efeitos de inibição.

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Figura 3. Gráficos de concentração (g/L) de etanol de acordo com o tempo de fermentação (em horas)
comparando o resultado experimental da fermentação de mosto cervejeiro nas densidades iniciais de
1,055 g/mL (A), 1,050 g/mL (B) e 1,045 g/mL (C) e a simulação segundo os modelos de Lee e Jin.

Fonte: Próprio autor.

Após parametrizar cada fator de frequência de acordo com a densidade inicial e o


modelo proposto, verificou-se que a frequência de colisões aumenta proporcionalmente
com a densidade inicial do mosto, mostrando ser um comportamento linear para todos os
modelos estudados.
A aplicação da equação de Monod apresentou um comportamento inconsistente
com os resultados obtidos experimentalmente, o que demonstra claramente que a
influência dos termos de inibição pela concentração de produto e levedura são
fundamentais para que um modelo se aproxime de um resultado experimental.

5 CONCLUSÃO
A escolha adequada do modelo cinético utilizado em processos químicos e
bioquímicos é de suma importância na indústria e na pesquisa, pois permite a otimização
do processo, redução de possíveis custos e prever o comportamento do processo e da
quantidade produto. As diferenças dos termos de inibição de cada modelo e nas funções
matemáticas utilizadas afetou diretamente na simulação do processo. O modelo de Jin
considera os termos de inibição do substrato e produto com um comportamento
exponencial na fase de atenuação, o que se mostrou satisfatório na comparação com os
resultados experimentais assim como o modelo de Lee, que considera um modelo
matemático não exponencial, mas tem o termo de inibição por concentração celular
fazendo com que os perfis de formação de produto e consumo de substrato sejam muito
próximos para as condições analisadas.

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A simulação considerando apenas a equação de Monod apresentou


comportamento bem diferente do observado experimentalmente e isto se deve ao fato de
que este modelo considera apenas a concentração de substrato como termo de inibição, o
que evidencia a relevância dos termos de inibição por produto e pela concentração celular.
O fator de frequência tem papel importante para definir a velocidade que a reação
vai ocorrer. Quanto maior a densidade inicial do mosto, maior a quantidade de açúcares
fermentáveis, com isso, maior a probabilidade da colisão do substrato com a levedura,
aumentando o fator de frequência. A relação linear observada entre o fator de frequência
com a densidade do mosto é uma evidência disso. Este fator apresentou comportamento
linear para a faixa de densidade 1,045 a 1,055 com rendimento de açúcares fermentáveis
do mosto de 91% para todos os modelos estudados.

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REFERÊNCIAS

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Energéticas e Sensorial. 2012. 103 f. Dissertação (Mestrado em Agronomia – Energia na
Agricultura). Faculdade Ciências Agronômicas da Unesp. Botucatu-SP, 2012.
https://repositorio.unesp.br/handle/11449/90522

2. SEBRAE–Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas. Potencial


de consumo de cervejas no Brasil. Resposta técnica. Disponível em:
<http://www.sebrae.com.br>. Acesso em: 08/05/2023.

3. Luiz, A. G.; Hoffmann, E. C.; Teixeira, D. A.; Rego, V. M., Neto, J. V. Cerveja
artesanal aromatizada com frutos do cerrado brasileiro. Brazilian Journal of
Development, Curitiba, v. 9, n. 8, p. 24350-24363, aug., 2023.
https://doi.org/10.34117/bjdv9n8-080

https://respostas.sebrae.com.br/boletim-potencial-de-consumo-de-cervejas-no-brasil/
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