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POLO: Ipiranga

Curso: Licenciatura em artes visuais

RENASCER DA ARTE EM CADA ALUNO:

Como despertar o interesse pela arte em alunos do Ensino Fundamental II


com a nova Base Nacional Curricular Comum

ANDREA HIRSCH RA nº 1616142

SÃO PAULO
2019
Andrea Hirsch

RENASCER DA ARTE EM CADA ALUNO:

Como despertar o interesse pela arte em alunos do Ensino Fundamental II


com a nova Base Nacional Comum Curricular.

Trabalho Monográfico - Curso de


Graduação – Licenciatura em Artes Visuais,
apresentado à comissão julgadora da UNIP -
Ipiranga, sob a orientação do professor
Daniel Salzedas Ricci.

SÃO PAULO
2019
Banca Examinadora

__________________________________________

__________________________________________

__________________________________________

__________________________________________

São Paulo
2019
A Deus, meu respirar e inspirar...

À minha mãe (in memoriam), exemplo de força, fé e perseverança.


AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus sem o qual não conseguiria escrever absolutamente


nenhuma palavra.

Ao meu marido, pelo apoio e compreensão ante minha ausência.

Aos meus alunos, pelo cansaço e alegria que me proporcionam.


SUMÁRIO

RESUMO ..................................................................................................... 8

INTRODUÇÃO ........................................................................................... 10

Capítulo I: REALIDADE DA SALA DE AULA ............................................. 11

Capítulo II: UTOPIA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR ........ 14

Práticas Artísticas................................................................................... 14

Pesquisa ................................................................................................ 16

Invenção e Criação ................................................................................ 18

Capítulo III: PROCESSO DE CRIAÇÃO .................................................... 20

Nível individual - aluno ........................................................................... 21

Ser sensível ........................................................................................ 21

Ser cultural ......................................................................................... 21

Ser consciente .................................................................................... 22

Nível cultural – escola ............................................................................ 23

Criatividade: Resultado do processo ...................................................... 25

Capítulo IV: ABORDAGEM TRIANGULAR ................................................ 26

Capítulo V: PROPOSTA PEDAGÓGICA ................................................... 27

CONCLUSÃO ............................................................................................ 30

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 32


8

RESUMO

A nova Base Nacional Curricular Comum determina que a disciplina de Artes


deve abranger quatro linguagens: Dança, Teatro, Música e Artes Visuais. Contudo,
a carga horária destinada para a disciplina de Artes é extremamente pequena,
dentro de um conteúdo tão vasto. Dessa maneira, para cumprir com a vasta e
abrangente exigência da BNCC os professores de artes dos anos finais do Ensino
Fundamental tem ministrado uma grande quantidade de aulas teóricas para seus
alunos.// O presente trabalho tem como objetivo a proposta de um planejamento
didático que inspire os alunos dos anos finais do Ensino Fundamental, respeitando
as diretrizes impostas pela BNCC, tendo como pano de fundo o processo de criação
analisado por Fayga e aplicando a abordagem triangular de Ana Mae para o
contexto cibernético atual. // A educadora Ana Mae Barbosa, referência no lecionar
das artes no Brasil, propôs que o ensino deve-se dar numa abordagem triangular:
Conhecer – Fazer – Apreciar. Ana Mae diz que devemos contextualizar
historicamente a obra para então propor a prática aos alunos e em seguida sua
apreciação fazendo uma leitura de maneira profunda. Fayga Ostrower por sua vez,
disseca o processo criativo como fruto formado do ser consciente, sensível e
cultural. Com fundamentos sócio filosóficos explica de maneira profunda a
criatividade humana. // Para apresentar a proposta pedagógica que este trabalho
propõe, primeiramente contextualizamos da realidade cotidiana do lecionar de
Artes juntamente com a contextualização legal de tal docência frente a BNCC. Após
esse pano de fundo, apresentam-se duas das principais teorias as teorias que
embasam o ensino das artes: O processo criativo e a abordagem triangular, para
só então apresentar a proposta pedagógica que inspire e aumente o interesse dos
alunos do Ensino Fundamental II nas Artes.

Palavras Chaves: Arte, BNCC, Metodologia, Abordagem triangular, Proposta


pedagógica.
9

ABSTRACT

The new Common National Curriculum Base states that the Arts subject
should cover four languages: Dance, Theater, Music and Visual Arts. However, the
workload devoted to the arts discipline is extremely small, within such a vast content.
Thus, in order to fulfill BNCC's vast and comprehensive requirement, the art
teachers of the final years of elementary school have given a large number of
theoretical classes to their students. // The present work aims at the proposal of a
didactic planning that inspire students in the final years of elementary school,
respecting the guidelines imposed by the BNCC, against the background of the
creative process analyzed by Fayga and applying Ana Mae's triangular approach to
the current cyber context. // The educator Ana Mae Barbosa, a reference in the
teaching of the arts in Brazil, proposed that teaching should take place in a triangular
approach: Know - Do - Enjoy. Ana Mae says that we must historically contextualize
the work and then propose the practice to the students and then their appreciation
by reading deeply. Fayga Ostrower, in turn, dissects the creative process as the fruit
formed of the conscious, sensitive and cultural being. With socio-philosophical
foundations it profoundly explains human creativity. // In order to present the
pedagogical proposal that this work proposes, we first contextualize the daily reality
of teaching Arts along with the legal contextualization of such teaching in front of the
BNCC. After this background, we present two of the main theories that support the
teaching of the arts: The creative process and the triangular approach, to only then
present the pedagogical proposal that inspires and increases the interest of
elementary school students. Arts.

Keywords: Art, BNCC, Methodology, Triangular approach, Pedagogical proposal.


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INTRODUÇÃO

A nova Base Nacional Curricular Comum determina que a disciplina de Artes


deve abranger quatro linguagens: Dança, Teatro, Música e Artes Visuais. Contudo,
a carga horária destinada para a disciplina de Artes é extremamente pequena,
dentro de um conteúdo tão vasto. Dessa maneira, para cumprir com a vasta e
abrangente exigência da BNCC os professores de artes dos anos finais do Ensino
Fundamental tem ministrado uma grande quantidade de aulas teóricas para seus
alunos.

A educadora Ana Mae Barbosa, referência no lecionar das artes no Brasil,


propôs que o ensino deve-se dar numa abordagem triangular: Conhecer – Fazer –
Apreciar. Ana Mae diz que devemos contextualizar historicamente a obra para
então propor a prática aos alunos e em seguida sua apreciação fazendo uma leitura
de maneira profunda.

Fayga Ostrower por sua vez, disseca o processo criativo como fruto formado
do ser consciente, sensível e cultural. Com fundamentos sócio filosóficos explica
de maneira profunda a criatividade humana. Porém, como aplicar isso em quarenta
e cinco ou cinquenta minutos por semana numa sala de aula com os adolescentes
cibernéticos do século XXI?

Não se pode ignorar que somos frutos do nosso meio e a arte é o resultado
socio cultural do artista. Dessa maneira, não se pode ignorar que as artes
contemporâneas compreendem uma tecnologia e uma velocidade nunca vistas
antes. Mas esse é o contexto de nossos alunos.

O presente trabalho tem como objetivo a proposta de um planejamento


didático que inspire os alunos dos anos finais do Ensino Fundamental, respeitando
as diretrizes impostas pela BNCC, tendo como pano de fundo o processo de criação
analisado por Fayga e aplicando a abordagem triangular de Ana Mae para o
contexto cibernético atual.
11

Capítulo I: REALIDADE DA SALA DE AULA

A primeira pergunta que o professor de artes se depara ao entrar na sala de


aula atualmente é: “Professor, hoje é aula prática?”. Não deveria ser assim mas é
o que ocorre. Sabe-se que a realidade é distinta em escolas particulares e públicas,
e mesmo entre as escolas particulares há uma grande discrepância entre as
grandes instituições e as pequenas que lutam para sobreviver. Independentemente
do contexto escolar, é certo que todo professor no Brasil é preso pelas algemas do
vestibular. E esse cárcere hoje abrange, inclusive, os docentes de artes.

Com a obrigatoriedade e cobrança de resultados nas provas (ENEM /


Vestibular) os professores de artes começaram a intensificar seus conteúdos
teóricos. O que antes acontecia para fundamentar sua aula e inspirar seus alunos,
agora acontece de maneira maçante, expositiva e superficialmente.

Suas cargas horárias na grade escolar não aumentaram. Pelo contrário,


estão cada vez mais reduzidas. Para os anos do Ensino Fundamental II, de acordo
com a Resolução nº 81 da Secretaria da Educação de 16-12-2011, a carga horária
de artes determinada pelo MEC é de duas aulas semanais.

Além disso, o número de alunos por turma não diminuiu. De acordo com o
Parecer do Conselho Nacional de Educação nº 8/2010 as salas de aula possuem
em média 30 alunos e o mesmo parecer aprovado em 5/5/2010 manteve tal
número.

Quanto à estrutura física para as aulas de artes, nada é determinado ou


estipulado pelo MEC. De acordo com o Parecer nº 8, na Tabela 24, exige-se
laboratório de informática e ciências e quadra coberta por exemplo, mas verifica-se
a ausência da exigibilidade de um ateliê ou uma sala destinada para o ensino das
artes. Sem um local apropriado para trabalhar com a diversidades de materiais que
a disciplina exige, o docente adequa suas aulas ao espaço que lhe fora destinado:
uma sala sem bancadas com carteiras comuns que não cabem uma folha em
tamanho A3 e sem pias para a limpeza de instrumentais como pincéis. Surge então
a questão: Se a disciplina de Educação Física, por exemplo, precisa de uma quadra
para que haja resultado em seu lecionar, é possível que o ensino da disciplina de
12

artes seja eficaz sem um local apropriado? Essa é uma reflexão que será abordada
de forma mais profunda mais adiante.

Percebe-se que os pontos até aqui apresentados para a descrição da


realidade da sala de aula (resultados em vestibulares, cargas horárias enxutas,
número elevado de alunos em sala, falta de espaço físico adequado), são pontos
problemáticos que dificultam o trabalho docente.

Contudo, além das problemáticas acima apontadas, há outro ponto de


relevante importância no que se refere a realidade da sala de aula: a
interdisciplinaridade.

A interdisciplinaridade tem sido muito pronunciada e defendida atualmente.


A BNCC (2018, p.15) corrobora tal afirmação pois foi toda elaborada em volta dessa
temática central, como verifica-se em seu texto introdutório:

A BNCC propõe a superação da fragmentação radicalmente


disciplinar do conhecimento, o estímulo à sua aplicação na vida real, a
importância do contexto para dar sentido ao que se aprende e o
protagonismo do estudante em sua aprendizagem e na construção de seu
projeto de vida.
(...)
Essas decisões, (...), referem-se, entre outras ações, a:
(...);
• decidir sobre formas de organização interdisciplinar dos
componentes curriculares e fortalecer a competência pedagógica das
equipes escolares para adotar estratégias mais dinâmicas, interativas e
colaborativas em relação à gestão do ensino e da aprendizagem; [grifos
nossos]

Vejamos como Claudete Machado (1997, p.60) define e discorre sobre o


tema:

A interdisciplinaridade é equivalente a integração, interpretação


de métodos e conteúdo entre disciplinas que se dispõe a trabalhar
conjuntamente em um determinado objeto de estudo. Para facilitar a
conceituação da interdisciplinaridade, pode-se contrapô-la à noção de
multidisciplinaridade. Neste último caso, os profissionais são justapostos,
cada um fazendo o que sabe. Não há integração nem quanto ao método
e nem quanto ao conteúdo. Contrariamente, na interdisciplinaridade, tal
integração ocorre durante a construção do conhecimento, de forma
conjunta, desde o início da colocação do problema. O conhecimento é
gerado em um nível qualitativo diferente daquele existente em cada
disciplina auxiliar.

Certamente é um tema que norteia o ensino atual e faz parte da realidade


em sala de aula.
13

Cristiane Celly, em seu artigo “Interdisciplinaridade e o ensino de arte”


explica a relação entre ambos, vejamos:

A interdisciplinaridade é um fenômeno contínuo, que nunca pára,


que está em constante movimento. A Arte é um objeto de conhecimento
dinâmico, de vida, de significados, de criação e sensibilização. Por tais
motivos é que ambas estão intimamente ligadas, se completam e se
fundem. Trabalhar de forma interdisciplinar no currículo de Arte se faz
necessário, pois não existe um efetivo ensino de Arte se ele não
proporcionar ao aluno a reflexão, a experimentação e a criação. [grifos
nossos]

Percebe-se que a arte proporciona conexões transdisciplinares que aumenta


o interesse dos alunos e contribui para um aprendizado mais eficaz e menos
teórico.

Contudo, não podemos afirmar que tal assunto é exclusivamente positivo.


Sua teoria é excelente, mas a prática da interdisciplinaridade em sala de aula tem
aspectos muito peculiares.

No cotidiano escolar o docente de artes atua como braço de várias


disciplinas por conta da interdisciplinaridade. O professor de geografia que pede
ajuda com seus mapas e maquetes, o professor de ciências que solicita a produção
do funcionamento do sistema respiratório, o de matemática para a produção de
sólidos geométricos... os exemplos são inúmeros. Porém as aulas ainda são
segmentadas com horários rígidos (50 minutos de aula de matemática seguidos de
50 minutos de aula de português e assim por diante). Na prática o que ocorre é que
as demais disciplinas “empurram” para artes projetos plásticos que contribuem com
a assimilação do conteúdo de sua matéria.
14

Capítulo II: UTOPIA DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR

Antes de discorrer os aspectos relevantes ao ensino das artes estipulados


pela BNCC, faz-se necessário a explicação do que é a BNCC.

A Base Nacional Comum Curricular é um documento normativo


que define o conjunto de aprendizagens essenciais que todos os alunos
devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação
Básica.
Seu principal objetivo é ser a balizadora da qualidade da educação
no País por meio do estabelecimento de um patamar de aprendizagem e
desenvolvimento a que todos os alunos têm direito!

Assim como nossa Constituição Federal, a Base Nacional Comum Curricular


é extensa e minuciosa. A BNCC é, inclusive, fruto de uma deliberação
constitucional de 1988:

Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino


fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito
aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.

Promulgada em 1988, tal determinação de fixar conteúdos mínimos para o


ensino só foi realizada trinta anos depois em 2018. Com o objetivo de atender tal
deliberação, no que diz respeito à Artes a BNCC designa que (2018, p. 195):

Ao longo do Ensino Fundamental, os alunos devem expandir seu


repertório e ampliar sua autonomia nas práticas artísticas, por meio da
reflexão sensível, imaginativa e crítica sobre os conteúdos artísticos e
seus elementos constitutivos e também sobre as experiências de
pesquisa, invenção e criação.

Ou seja, a BNCC determina que o aluno amplie sua autonomia nos seguintes
pontos: 1º nas práticas artísticas; 2º nas experiências de pesquisa; 3º nas
experiências de invenção e criação.

É exatamente estes aspectos que a Base Nacional determina que sejam


aprofundados que serão analisados.

Práticas Artísticas

Como “práticas artísticas”, no contexto escolar atual norteado pela Base,


podemos entender os trabalhos dos alunos que envolvem desde o fazer artístico
propriamente dito, até a vivência ou experimentação do aluno com a arte. O que
anteriormente era entendido apenas como um trabalho concreto, seja de pintura ou
15

de escultura, hoje é ampliado pela Base através das quatro linguagens (dança,
música, teatro e artes visuais) em várias dimensões.

As quatro linguagens são vistas com a mesma importância e de forma


integrada, não sobrepondo uma sobre a outra. As práticas artísticas que devem ser
transmitidas aos estudantes pelos seus professores devem contemplar a música o
teatro a dança e as artes visuais.

Contudo, a formação do docente não é integrada. Há um especialista para


cada uma das linguagens. Como exigir do docente em artes visuais que transmita
e inspire seus alunos em música quando muitos não sabem distinguir uma nota
musical ou ler uma partitura? Ou como exigir de um docente em dança que pintem
um retrato quando não se sabe a diferença entre um guache ou uma tinta acrílica?

Lucia Gouvêa Pimentel e Ana del Tabor Vasconcelos Magalhães (2018, p.


229), apontam, sobre essa problemática as seguintes considerações:

Consideramos que a integração entre as modalidades artísticas e


entre elas e outros campos do saber só pode ocorrer se todas elas tiverem
o mesmo valor ao se integrarem, caso contrário sempre haverá
sobreposição de uma em detrimento das outras, que serão submissas e
não poderão contribuir com a construção de conhecimento em seu campo
específico.
Integrar, portanto, significa imbricar de tal forma que novos
conhecimentos possam ser construídos preservando-se a potência de
cada um dos campos do saber envolvidos, não havendo o mais forte e o
mais fraco, mas havendo o que um e outro tem a compartilhar. Para que
isso aconteça, é necessário que o estudo de cada campo artístico seja
aprofundado, sob a orientação de um especialista.

Se apenas um docente leciona sobre diversas áreas do saber, o que


acontece é uma banalização do ensino, em questão, da arte. Apenas um
especialista em uma linguagem lecionará de maneira superficial, rasa e sem
domínio de conhecimento sobre as outras.

Se “os alunos devem expandir seu repertório e ampliar sua autonomia nas
práticas artísticas” (BRASIL, 2018) deve-se expandir também sua carga horária.
Pimentel e Magalhães (2018, p.227) entendem que

Há necessidade de garantir uma carga horária mínima e objetos de


conhecimentos que possam contemplar de forma plena o processo de
ensino/aprendizagem do componente curricular Arte e suas modalidades
artísticas.
16

É certo que a Arte cria condições para se ter uma percepção ampla de
significado do ser e do mundo. E isto faz parte da visão da educação integral que
a BNCC é compromissada. Contudo, exigir a abrangência de quatro linguagens da
Arte e não fornecer as ferramentas necessárias para concretização desta
educação, é piorar a prática do lecionar artístico nas escolas.

Pesquisa

No que se refere à pesquisa, Pedro Demo (1996) em seu livro “Educar pela
pesquisa” a explica como o processo de procurar materiais que combatam a receita
pronta, alimentando a iniciativa do estudante para que gere uma interpretação
pessoal seguida de compreensão que resulte numa elaboração própria com
questionamento reconstrutivo1 sobre o senso comum.

A pesquisa é crucial na formação de conhecimento. Demo (1996, p 9) diz


ainda que:

A aula que apenas repassa conhecimento (...) não sai do ponto de


partida, e, na prática, atrapalha o aluno. (...) é equívoco fantástico imaginar
que o “contato pedagógico” se estabeleça em ambiente de repasse e
cópia, ou na relação aviltada de um sujeito copiando (professor, no fundo
também objeto, se apenas ensina a copiar) diante de um objeto apenas
receptivo (aluno), condenado a escutar aulas, tomar notas, decorar , e
fazer prova. A aula copiada não constrói nada de distintivo, e por isso não
educa mais do que a fofoca, a conversa fiada dos vizinho, o bate-papo
numa festa animada.

É exatamente com esse cenário (da aula copiada) que a Base quer, e deve,
acabar. Vê-se claramente que tal abordagem e definição de pesquisa explanada
pelo autor corrobora com a BNCC pois é abrangente, mas não superficial. Pelo
contrário, o sentido de ser abrangente é exatamente para que haja um
aprofundamento e resultado concreto.

Ao afirmar que a aula copiada não educa mais do que a fofoca Demo é
extremamente duro. Contudo, no dissertar acerca da educação é necessário sê-lo.
Caso contrário, serão criadas metodologias e apresentadas propostas para um
cenário utópico e não o real.

1 Para Pedro Demo, o questionamento reconstrutivo é o resultado da pesquisa e o objetivo


da educação. É a emancipação do estudante pelo questionamento contra a manipulação, a
condição de objeto e a ignorância.
17

E qual o cenário mínimo necessário para a pesquisa eficaz? Vale lembrar


que a prática investigativa dos estudantes contemporâneos é bem diversa de seus
docentes. A tecnologia neste campo aumentou ainda mais a distância entre as
gerações. O cenário das bibliotecas com estantes repletas de livros não satisfaz as
condições mínimas de pesquisa nos dias atuais.

O Parecer nº 8 do CNE, na Tabela 25, determina que haja, no mínimo, 30


computadores no laboratório de informática. Infelizmente a existência de um
laboratório de informática é uma realidade muito distante em muitas escolas
particulares brasileiras. Nas públicas então...

Pedro Demo aborda essa problemática afirmando que “Quando nada existe,
deve entrar o professor como motivação ininterrupta da pesquisa, multiplicando
para o aluno oportunidades de praticar a busca de materiais, que ele mesmo
procura e traz.” (DEMO, 1996, p. 33).

O papel do bom docente é adequar suas aulas aos recursos disponíveis. E


é o que ocorre. Contudo o próprio autor afirma que:

Torna-se essencial que cada escola tenha sua biblioteca sempre


renovada com livros, enciclopédias, livros didáticos de toda sorte, vídeos
e filmes, dados importantes sobre a realidade nacional, regional e local.
(DEMO, 1996, p. 33) [grifos nossos].

Importante destacar que a obra citada é de 1996. A descrição que se segue


para uma biblioteca sempre renovada foi para um contexto de acesso à informação
muito diverso do atual em 2019. Podemos transpor a colocação do autor para os
dias atuais como sendo essencial que toda escola tenha acesso à internet e
ferramentas de pesquisa tecnológicos.

Seja qual for a realidade de disponibilidade de ferramentas de pesquisa


escola, o que a BNCC que, e deve, é acabar com o cenário de ensino da “aula
copiada”. Verificou-se que a abordagem e definição de pesquisa por Pedro Demo
corrobora com a BNCC pois é abrangente, mas não superficial. Pelo contrário, o
sentido de ser abrangente é exatamente para que haja um aprofundamento e
resultado concreto.
18

Invenção e Criação

A criatividade está entre as competências gerais da BNCC. Tem como


objetivo que o aluno se desenvolva por completo. A capacidade de criar é inerente
a todo ser humano. Na infância é um processo natural estimulado na escola.
Estimular esse processo contribui com o desenvolvimento completo do aluno.

Oliveira (2012) afirma que “é sem dúvida muito importante que a criatividade
esteja presente no contexto escolar. (...) O ambiente escolar tanto pode promover
o desenvolvimento da criatividade quanto pode inibi-la”.

Faz-se importante frisar que a criatividade não está ligada exclusivamente


às atividades artísticas. A criatividade é a capacidade de produzir, inventar, criar,
encontrar soluções e desenvolver métodos para a solução de um problema.
Segundo Alencar (1996, p. 15), criatividade é “o processo que resulta na
emergência de um novo produto (bem ou serviço), aceito como útil, satisfatório e/ou
de valor por um número significativo de pessoas em algum ponto do tempo.”

É o famoso “pensar fora da caixa”. É uma característica que o mercado


contemporâneo busca e valoriza nos profissionais. Deve-se então, preparar os
estudantes para esse mercado.

É fato a importância do incentivo a experiências de invenção e criação.


Contudo, na prática isso pouco ocorre. Padilha aponta alguns pontos pra esse
impedimento:

As notas, competições e punições, tornam-se condicionantes do


trabalho escolar e são impeditivas de manifestação da criatividade de
professores e alunos. No que diz respeito ao domínio cognitivo, há
variáveis do ambiente escolar que se constituem bloqueios à
manifestação da criatividade. (...) Dentre elas, (...), podemos citar: os
raciocínios preconceituosos, estereotipados e as estruturas de
pensamento rígidas; os crivos austeros de análise do meio e da
sociedade; a limitação nas interações entre o indivíduo e o contexto; a
carência de informações e experiências formativas; o cultivo à
memorização e incentivo à reprodução de ideias. (PADILHA, 2019, p. 18)
[grifos nossos]

Uma rotina acadêmica condicionada à notas e reprodução de conteúdo pré-


estabelecido limita e engessa tanto o aluno quando o professor.
19

Não é possível que a Base determine que os estudantes expandam


experiências de invenção e criação quando os mesmos são cobrados por
reproduzir e não inovar. O discurso da BNCC de que as escolas devem criar
estudantes criativos, críticos, investigativos e argumentadores não funciona quando
este resultado é cobrado através de concurso por vestibulares conteudistas.
20

Capítulo III: PROCESSO DE CRIAÇÃO

Fayga Perla Ostrower (1920 - 2001) foi artista plástica atuando em diversas
linguagens, professora e teórica da Arte. Naturalizada Brasileira, Fayga atuou como
docente no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro – Brasil, no Spellman College
em Atlanta – EUA, na Slade School da Universidade de Londres – Inglaterra.

Sua vasta experiência frente a sala de aula a fez uma referência em Arte
Educação. Seu primeiro livro, “Criatividade e processos de criação” com sua
primeira edição de 1977 está hoje na 30ª edição. O tema central do livro é a
criatividade. E é baseado nesta obra de profundo conteúdo filosófico que será
explicado o processo de criação do ser humano.

Não será abordada a importância do processo criativo para a formação do


indivíduo. Esse fato já é premissa para todo educador e a Base Nacional Comum
Curricular também já parte desse pressuposto.

“Consideramos a criatividade um potencial inerente ao homem, e a


realização deste potencial uma de suas necessidades” conforme as palavras de
Ostrower (2018 p. 5). A autora afirma ainda que:

O criar só pode ser visto num sentido global, como um agir


integrado em um viver humano. De fato, criar e viver se interligam.
A natureza criativa do homem se elabora no contexto cultural.
Todo indivíduo se desenvolve em uma realidade social, em cujas
necessidades e valorações culturais se moldam os próprios valores de
vida. No indivíduo confrontam-se, por assim dizer, dois polos de uma
mesma relação: a sua criatividade que representa as potencialidades de
um ser único, e sua criação que será a realização dessas potencialidades
já dentro do quando de determinada cultura.
Assim uma das ideias básicas do presente livro é considerar os
processos criativos na interligação dos dois níveis de existência humana:
o nível individual e o nível cultural.

O nível individual e o nível cultural se inter-relacionam formando o processo


criativo. Pode-se dizer que o processo criativo forma-se na relação aluno-escola,
sendo o aluno o nível individual e a escola o nível cultural. Apesar dessa analogia
ser extremamente reducionista é passível fazê-la e analisa-la sob esta ótica a fim
de que possamos focar no que é importante para o presente trabalho: a criatividade
no contexto escolar.
21

Nível individual - aluno

Ostrower aborda o nível individual como a formação de um ser consciente-


sensível-cultural. Importante ressaltar que tais aspectos já são tomados como fatos
e não há intenção de investigar suas origens ou causas. Vejamos: (2018, p. 11)

Não temo, aqui, a pretensão de saber como como o homem


adquiriu esses característicos, nem tampouco em qual ramo dos nossos
precursores de deu a fusão de tais qualidades. Queremos constatar
apenas que ela existe há muito tempo. E mais, entendemos que
precisamente da integração do consciente, do sensível e do cultural se
baseiam os comportamentos criativos do homem.

Para compreender o nível individual é necessário compreender suas três


dimensões: Ser-sensível, Ser-consciente e Ser-cultural.

Ser sensível

Fayga inicia seu diálogo sobre o Ser-sensível alegando que ela é patrimônio
de todos os seres humanos, mesmo que em diferentes níveis. Afirma que todos
nascemos com um potencial de sensibilidade. Essa sensibilidade é uma porta de
entrada das sensações. “representa uma abertura constante ao mundo e nos liga
de modo imediato ao acontecer em torno de nós.”

A autora alega ainda que há uma parte da sensibilidade vinculada ao


inconsciente e outra que chega ao nosso consciente. Chega-se a partir dessa
premissa na definição de Percepção: “a percepção é a elaboração mental das
sensações.” Conclui-se, portanto, que o Ser sensível é a percepção.

Ser cultural

Quanto ao Ser-cultural, a autora afirma que: “O homem surge na história


como um ser cultural. Ao agir, ele age culturalmente, apoiado na cultura e dentro
de uma cultura.” (2018, p. 13)

Felippe Willian caracteriza a cultura relacionando-a com a percepção


individual (Ser-sensível para Fayga Ostrower):

Por ser um agente forte de identificação pessoal e social, a cultura


de um povo se caracteriza como um modelo comportamental, integrando
segmentos sociais e gerações à medida que o indivíduo se realiza como
pessoa e expande suas potencialidades. Entretanto, é necessário lembrar
que essa percepção individual tem grande influência por parte do grupo.
22

As escolhas selecionadas ou valorizadas pelo grupo tendem a ser


selecionadas na percepção pessoal. (2014) [grifos nossos]

Fayga (2018, p 13) define cultura:

São as formas materiais e espirituais com que os indivíduos de


um grupo convivem, nas quais atuam e se comunicam e cuja experiência
coletiva pode ser transmitida através de vias simbólicas para a geração
seguinte. [grifos nossos]

Vemos que ambos autores tratam a cultura abordando o transmitir a


gerações. É neste transmitir que a educação entra. Silva e Silva (2019), citam o
mestre Darcy Ribeiro:

Darcy Ribeiro (1972): afirma que: "[...] cultura é a herança social


de uma comunidade humana, representada pelo acervo co-participado de
modos padronizados de adaptação à natureza para o provimento da
subsistência, de normas e instituições reguladoras das reações sociais e
de corpos de saber, de valores e de crenças com que explicam sua
experiência, exprimem sua criatividade artística e se motivam para ação".
[grifos nossos]

As instituições reguladoras das reações sociais e de corpos de saber são as


escolas (e outras instituições educativas, porém para nosso objetivo podemos nos
restringir a elas). Percebemos então que o Ser-cultural age influenciando e sendo
influenciado, por diversos universos e dentre eles, o universo escolar.

Ser consciente

A partir de uma análise da evolução antropológica da raça humana, Fayga


afirma que quando o ser humano se torna consciente de sua existência individual
conscientiza-se também de sua existência social, mesmo que esse processo não
seja vivenciado de forma intelectual. O Ser-consciente é formado influenciado pela
cultura e a sensibilidade individual.

Nos processos de conscientização do indivíduo, a cultura


influencia também a visão de vida de cada um. Orientando seus interesses
e suas íntimas aspirações, suas necessidades de afirmação, propondo
possíveis ou desejáveis formas de participação social, objetivos e ideais,
a cultura orienta o ser sensível ao mesmo tempo que orienta o ser
consciente. Com isso, a sensibilidade do indivíduo é aculturada e por sua
vez orienta o faze e o imaginar individual. Culturalmente seletiva, a
sensibilidade guia o indivíduo nas considerações do que para ele seria
importante ou necessário para alcançar certas metas de vida.

Fayga estabelece ainda uma importância dinâmica para a sensibilidade.


Vinculando-se no ser consciente para um fazer intencional e cultural, ela se
23

transforma em faculdade criadora. Conclui que, a criatividade seria a própria


sensibilidade ao ligar-se a uma atividade social significativa para o indivíduo. “No
enfoque simultâneo do consciente, cultural e sensível, qualquer atividade em si
poderia tornar-se um criar.”

Com o enfoque educacional, Duarte (2001, p. 171) destaca que quando a


educação trabalha no sensível, atinge maiores resultados no consciente. Vejamos:

Uma educação que reconheça o fundamento sensível de nossa


existência e a ele dedique a devida atenção, propiciando o seu
desenvolvimento, estará, por certo, tornando mais abrangente e sutil a
atuação dos mecanismos lógicos e racionais de operação da consciência
humana.

Outros autores também corroboram com a visão de que a criatividade é


resultado sensível-consciente-cultural. Zamboni (2012, p.28) afirma:

A criatividade está ligada à intuição, mas não é propriamente um


produto do inconsciente. (...) A criatividade é um processo de busca de
soluções interiores, mas não é claro nem ao próprio indivíduo que o
exercita; as soluções começam a tornar-se conscientes à medida que vão
ganhando uma forma, quer no desenho e cores expressos no cavalete de
um pintor, quer nas resoluções e fórmulas de um cientista.

Por todo exposto, demonstramos que o nível individual do ser humano, no


trabalho em questão o aluno, é desenvolvido pelo ser consciente-sensível-cultural
e sua produção é resultado desta formação.

Nível cultural – escola

Faz-se importante um breve parênteses antes de adentrarmos no assunto.


A BNCC é totalmente norteada na importância da valorização e respeito às culturas
e na formação cultural individual. Destacam-se abaixo suas competências gerais
para ter-se como pano de fundo:

COMPETÊNCIAS GERAIS DA BASE NACIONAL COMUM


CURRICULAR
1. Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente
construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e
explicar a realidade, continuar aprendendo e colaborar para a construção
de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.
2. (...)
3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais,
das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da
produção artístico-cultural.
4. (...)
24

5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação


e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas
práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e
disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e
exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.
6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e
apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem
entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas
alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com
liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.
7. (...)
8. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e
emocional, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo
suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar
com elas.
9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a
cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos
direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de
indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e
potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza.
10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia,
responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando
decisões com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos,
sustentáveis e solidários. [grifos nossos]

É sob esta ótica e estas competências que a BNCC foi escrita, ou seja, o
currículo escolar deve vislumbrar a importância da cultura e transmiti-la para seus
alunos como característica essencial de uma sociedade e de um indivíduo inserido
nela. E certamente a cultura é importante. Willian (2014) afirma:

Mais do que uma característica essencial de uma sociedade, a


cultura pode ser considerada como o elemento principal que difere uma
nação de outra. Os costumes, a música, a arte e, principalmente, o modo
de pensar e agir, fazem parte da cultura de um povo e devem ser
preservados para que nunca se perca a singularidade do coletivo em
questão.

Embora para Fayga, o nível cultural seja abordado no Ser cultural, ou seja,
sob a ótica do nível individual, aborda-se aqui a escola como nível cultural. Candau
(2003, p. 160) afirma que:

A escola é, sem dúvida, uma instituição cultural.


Portanto, as relações entre escola e cultura não podem ser
concebidas como entre dois pólos independentes, mas sim como
universos entrelaçados, como uma teia tecida no cotidiano e com fios e
nós profundamente articulados.

Silva e Silva (2019) alegam ainda que:

Quando se trata de cultura e educação, podemos dizer que são


estes fenômenos intrinsecamente ligados, a cultura e a educação, juntas
tornam-se elementos socializadores, capazes de modificar a forma de
pensar dos educandos e dos educadores; quando adotamos a cultura
25

como uma aliada no processo de ensino-aprendizagem estamos


permitindo que cada indivíduo que frequenta o ambiente escolar se sinta
participante do processo educacional, pois ele nota que seu modo de ser
e vestir não é mas visto como "antiético" ou "imoral", mas sim uma forma
de este se socializar com os demais colegas, alguns autores defendem a
ideia de a educação não pode sobreviver sem a cultura e nem a cultura
sem a educação.

Tendo-se a escola como instituição cultural, ou como aqui é abordado num


paralelo na linguagem de Fayga, nível cultural, precisamos compreendê-la que
como tal ela é um ambiente de desenvolvimento da criatividade. Para Oliveira e
Alencar (2012) “o contexto educacional é um dos ambientes sociais essenciais que
influenciam a constituição da subjetividade individual e, como parte dela, do
processo criativo.”

Criatividade: Resultado do processo

A partir dos conceitos apresentados por Fayga e os outros autores citados,


tem-se a criatividade como resultado da interação do ser sensível-consciente-
cultural (formador do nível individual) com o nível cultural. Ou seja, a criatividade é
resultado da relação aluno-escola.

Oliveira e Alencar (2012), nesse sentido, afirmam que:

A escola passou a ser considerada como um dos contextos que


interfere no desenvolvimento da criatividade dos indivíduos. Isso fez com
que fossem revistas práticas educacionais e propostos programas de
treinamento e estimulação da criatividade. Com referência a esse
ambiente, o professor constitui elemento chave para facilitar o
desenvolvimento do potencial criador dos alunos. Para tanto, a escola
precisa ser um espaço que cultive e valorize as ideias originais de seus
educadores, oportunizando o desenvolvimento e o desabrochar de
habilidades que muitas vezes esse profissional desconhece possuir.

As dificuldades para que a escola seja este espaço foram abordadas no


capítulo anterior. E uma proposta para a superação destas dificuldades será
apresentada mais adiante.
26

Capítulo IV: ABORDAGEM TRIANGULAR

A Abordagem Triangular para o ensino das Artes é uma proposta


apresentada por Ana Mae Barbosa. Uma das pioneiras em Arte Educação no Brasil,
Ana Mae apresentou sua proposta triangular em seu livro “A imagem no ensino da
Arte” e até hoje é amplamente debatido.

Pretende-se aqui, em linhas gerais, estabelecer um comparativo da proposta


triangular com os pontos que a BNCC propõe que que os estudantes ampliem seus
conhecimentos.

Ana Mae (2001) propõe que:

A ação educativa do professor de Artes mediada pela Abordagem


Triangular organiza o currículo entrelaçando o fazer artístico, a
contextualização da arte/imagem e a leitura de forma que sejam
representados tanto as necessidades, interesses e desenvolvimento do
aluno como oferecendo ao próprio ensino outros valores de forma a
contribuir para a cultura.

Pode-se então traçar um paralelo entre os pontos triangulares de Ana Mae


e da BNCC:

Abordagem Triangular: BNCC


O currículo deve promover no aluno: Os alunos devem expandir e ampliar:
Fazer artístico Práticas artísticas
Conhecimento / contextualização Pesquisa
Percepção / análise Invenção / Criação

Apesar da comparação realizada, na abordagem triangular, a análise de


cada ponto não pode ser feita de maneira isolada ou dicotômica pois não há uma
hierarquia entre eles tampouco podem ter resultado concreto isoladamente. Ana
Mae assim explica sucintamente este processo:

É necessário que se estabeleça uma ponte entre o trabalho prático


da arte como processo de desenvolvimento individual e pessoal e o
trabalho de ver e apreciar a arte como produto da atividade do artista. Na
Educação, os modos de ver a arte de dentre o e de ver a arte de fora se
completam. Devemos, portanto, educar os estudantes em Arte e através
da Arte, possibilitando-lhes não só o fazer artístico mas também o contacto
programado com a obra de Arte adulta. (1990)
27

Capítulo V: PROPOSTA PEDAGÓGICA

Foi exposto até agora, quanto ao ensino das Artes, alguns aspectos para
reflexão: os entraves do lecionar das Artes, as diretrizes da BNCC e o respaldo
teórico filosófico da Arte Educação diante desse cenário.

Contudo o objetivo dessa dissertação é propor uma solução prática para


aumentar o interesse dos alunos do Ensino Fundamental II na disciplina de Artes.
Para tanto, devemos antes entender as características e anseios desses alunos
específicos, desta geração, para somente então conseguir propor uma abordagem
educacional que os atinja por completo.

Os jovens do Ensino Fundamental II tem de 11 a 15 anos. São os jovens da


“Geração Z”. O que isso significa?

Garotas e garotos da Geração Z, em sua maioria, nunca


conceberam o planeta sem computador, chats, telefone celular. Por isso,
são menos deslumbrados que os da Geração Y com chips e joysticks. Sua
maneira de pensar foi influenciada desde o berço pelo mundo complexo e
veloz que a tecnologia engendrou. Diferentemente de seus pais, sentem-
se à vontade quando ligam ao mesmo tempo a televisão, o rádio, o
telefone, música e internet. Outra característica essencial dessa geração
é o conceito de mundo que possui, desapegado das fronteiras
geográficas. Para eles, a globalização não foi um valor adquirido no meio
da vida a um custo elevado. Aprenderam a conviver com ela já na infância.
Como informação não lhes falta, estão um passo à frente dos mais velhos,
concentrados em adaptar-se aos novos tempos. (JORDÃO, 2016)

Ou seja, uma proposta efetiva para essa geração deve obrigatoriamente ser
uma proposta pedagógica tecnológica.

A interatividade também é característica enraizada nesta geração. São


jovens que fazem várias coisas ao mesmo tempo. Ao invés de puni-los e tentarmos
moldá-los a pensar uma coisa de cada vez, devemos passar os conteúdos da
maneira que eles estão habituados a pensar e agir.

Sendo assim, não podemos mais falar de conteúdos isolados. Precisamos


de uma vez por todas aplicar a tão falada interdisciplinaridade. Muito já foi discorrido
sobre a interdisciplinaridade. Pombo, Guimarães e Levy (1994) assim falam:

Na própria literatura especializada não há uma definição unívoca


do conceito de interdisciplinaridade.
28

Por exemplo, Jean Luc Marion (1978) define a


interdisciplinaridade como a “cooperação de várias disciplinas no exame
de um mesmo objeto”.
Por seu lado, para Piaget (1972), a interdisciplinaridade aparece
como “intercâmbio mútuo e integração recíproca entre várias disciplinas
(... tendo) como resultado um enriquecimento recíproco”.
Palmade (1979) vai mais longe, propondo que por
interdisciplinaridade se entenda “a integração interna e conceitual que
rompe a estrutura de cada disciplina para construir uma axiomática nova
e comum a todas elas, com o fim de dar uma visão unitária de um setor
do saber”.
Quer isto dizer que, tomando como base apenas três definições,
damo-nos conta, imediatamente, de como o significado da palavra
interdisciplinaridade é objeto de significativas flutuações: da simples
cooperação de disciplinas ao seu intercâmbio mútuo e integração
recíproca ou, ainda, a uma integração capaz de romper a estrutura de
cada disciplina e alcançar uma axiomática comum. [grifos nossos]

A própria BNCC aponta como uma de suas ações:

Decidir sobre formas de organização interdisciplinar dos


componentes curriculares e fortalecer a competência pedagógica das
equipes escolares para adotar estratégias mais dinâmicas, interativas e
colaborativas em relação à gestão do ensino e da aprendizagem;

Ou seja, a interdisciplinaridade tem o papel de dinamizar e tornar mais


interativo as relações de ensino. Projetos STEAM2 e Makers3 tentam assumir este
papel. Contudo, ainda são realizados de maneira isolada e à parte das aulas
“tradicionais”. Eles devem ser ampliados para que tomem maior significado.

Sabe-se o que deve ser feito. A problemática apontada agora é: Como?


Como transformar o currículo segmentado em um currículo verdadeiramente
interdisciplinar? Como modificar a relação ensino aprendizagem baseada na aula
copiada para uma relação interativa? Como relacionar conteúdos se os professores
continuam dando aulas individuais disciplinares e não por projetos ou conteúdos?
Como trabalhar a diversidade de materiais plásticos de maneira prática num
contexto cibernético?

Já foi mais do que explanado que as aulas expositivas devem ser


repensadas pois não estão atingindo o objetivo amplo educacional de formação de
indivíduos críticos. Uma proposta então, é que estes conteúdos que são colocados

2 STEAM é uma inovadora metodologia que mistura conceitos de Ciência, Tecnologia,

Engenharia, Artes e Matemática (sigla em inglês) para trabalhar essas diferentes áreas de uma
maneira conjunta no desenvolvimento de um mesmo projeto. (SPONTE, 2018)
3 O Movimento Maker traz a concepção de “colocar a mão na massa” e no ditado de “é na

prática que se aprende”. Ou seja, é criar diferentes espaços de aprendizagem que proporcionem
novas experiências ativas. (AMANDA AVELINO, 2018)
29

nas lousas e livros didáticos sejam levados para as tecnologias através de


aplicativos e jogos.

Isso mesmo. Aplicativos. A palavra que desperta e instiga a curiosidade dos


jovens são os aplicativos. Porque não repensar o currículo de cada série de
maneira única, lançada como um aplicativo ou jogo? Jogos educativos estimulam
a tomada de decisões quando fazem com que o aluno precise solucionar problemas
e refletir de maneira crítica para avançar de fase. Já existem diversos softwares e
aplicativos educacionais. Contudo, cada um abrange uma disciplina ou área do
conhecimento de maneira isolada e pontual.

A ideia não é impossível de aplicação, mas certamente requer um trabalho


docente em equipe. Os laboratórios Makers e STEAM ganhariam mais significado.

A organização do currículo por projetos de trabalho não é utópica. Mas não


pode ser pontual. Deve ocorrer de maneira a englobar todo o currículo.

A arte então passa a ser a prática das soluções encontradas nos projetos,
exercitando assim a criatividade e ampliando e efetivando o concretizar da
educação.
30

CONCLUSÃO

No decorrer deste Trabalho de Conclusão de Curso foi analisada a realidade


contemporânea da docência artística no Ensino Fundamental II. Problemáticas
como resultados em vestibulares, cargas horárias enxutas, número elevado de
alunos em sala, falta de espaço físico adequado, falta de interação efetiva entre
professores para aplicação de projetos interdisciplinares foram apontados. Neste
cenário, surge ainda a Base Nacional Comum Curricular.

Assim como nosso texto constitucional, a BNCC é de altíssimo padrão mas


carecedora de aplicação. O documento secciona o ensino das Artes em quatro
linguagens: Artes Visuais, Dança, Música e Teatro passando a denominar Artes
Integradas. Estipula ainda que tal área de conhecimento deve explorar “as relações
e articulações entre as diferentes linguagens e suas práticas, inclusive aquelas
possibilitadas pelo uso das novas tecnologias de informação e comunicação.” e que
“o componente curricular de arte deve garantir aos alunos o desenvolvimento de
algumas competências específicas” que fora discutido no presente trabalho.

Percebeu-se que, tais resultados exigidos e norteados pelo BNCC para a


educação brasileira é utópico diante do nosso sistema de ensino conteudista,
precário e não reflexivo. Muito se tem feito no sentido de alterar essa realidade. A
própria produção da BNCC é prova disso. Contudo, a forma de cobrar resultados
dos estudantes permanece a mesma: vestibulares com conteúdos que devem ser
decorados. Não há uma análise de currículo para o ingresso nas universidades.
Fala-se que a educação deve desenvolver o espírito crítico nos alunos mas
continuamos avaliando-os com o funil do vestibular.

Para melhor exemplificar os dados explanados neste trabalho, a tabela


abaixo ilustra suas relações.
31

BNCC Processos de Abordagem Problemáticas Soluções


criatividade Triangular para execução propostas
(não pode ser
seccionada)
Ampliar da - Espaço Um único
prática artística Ser sensível Fazer físicos espaço
inadequados interdisciplinar
- Falta de -
docentes
especialistas
Pesquisa Ser cultural Contextualizar Avaliações -
conteudistas
- Falta de Aplicativos e
Invenção e docentes jogos para
Ser Percepção /
criação especialistas. utilização em
consciente análise
projetos
- Carga horária interdisciplinares
insuficiente que abranjam a
totalidade do
currículo e
dessa maneira
as aulas se
dariam em um
espaço com
vários
professores.

Foi analisado o processo criativo de Fayga Ostrower de maneira pontual e


simplificada aplicando a proposta à realidade do lecionar as Artes.

Ana Mae Barbosa, anos antes da BNCC, já estudou e aplicou uma


abordagem eficaz na docência artística. Sua proposta é para que o ensino seja feito
de maneira abrangente no fazer / contextualizar / analisar imagens e seus signos.

Dentro dessa realidade a proposta para aumentar nos alunos o interesse


pelas artes foi que o ensino seja realizado através de projetos interdisciplinares
tecnológicos. Além disso o embasamento teórico disciplinar deve ser realizado
através da pesquisa individual do aluno e direcionado pelo professor. Embasada
no estudo de Pedro Demo “Educar pela Pesquisa”, na metodologia da “Abordagem
Triangular” de Ana Mae Barbosa e na “Construção do Processo Criativo” de Fayga
Ostrower foi proposto um ensino através de projetos didáticos que abranjam a
totalidade do currículo realizado através das tecnologias e mídias que fazem parte
do dia a dia dos alunos.
32

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