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Correio Braziliense – Acordo Mercosul-União Europeia:

oportunidades e desafios / Artigo / João Martins da Silva


Junior
Presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)

Depois de duas décadas de tentativas e recuos, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai


concluíram finalmente um amplo e complexo Acordo de Livre- Comércio com a União
Européia. É o primeiro acordo comercial relevante da nossa história, encerrando um
isolamento secular com o resto do mundo, num claro sinal de que despertamos,
depois de muito tempo, para as vantagens da integração econômica. Esse é um passo
de grande carga simbólica, que nos permite sonhar com outros acordos e com uma
real abertura econômica, tantas vezes obstruída por interesses de setores restritos,
que lucravam com as barreiras comerciais, ou com preconceitos ideológicos que nos
prendiam ao atraso.

O acordo chega em um momento particularmente importante. A economia brasileira


está presa em um estado de estagnação, precisando mais do que nunca do impulso
do comércio exterior para readquirir seu dinamismo perdido, o que só pode ocorrer
com uma integração mais ampla com as economias mais desenvolvidas. Ao mesmo
tempo, a liberdade de comércio e as instituições que presidem a harmonização das
regras comerciais entre os países estão sob forte ataque. Neste contexto, a conclusão
do tratado Mercosul-União Europeia é um sinal de que é possível deter a marcha para
o protecionismo e o unilateralismo. Os países envolvidos deram um grande exemplo
de que competição e colaboração podem perfeitamente conviver.

A nova realidade traz oportunidades, mas também desafios. Hoje, os europeus são
o segundo principal destino das exportações do agro brasileiro, absorvendo cerca de
18% do que vendemos ao exterior, especialmente farelo de soja, celulose, café, suco
de laranja, milho e carnes. A União Europeia é um mercado de acesso difícil e muito
protegido para os produtos agropecuários. O tratado gradativamente vai diminuir ou
eliminar certas barreiras, o que abrirá espaço para mais exportações de carne,
etanol, frutas, pescado, lácteos e tantos outros, que produzimos em condições
competitivas.

Para nos habilitarmos a esse acesso, nossos produtores terão que cuidar bem das
exigências sanitárias e ambientais que hoje interferem, às vezes de modo injusto, no
livre fluxo de mercadorias do agro. Essas exigências em si não nos causam
dificuldades, pois apesar do que às vezes se propaga, a agricultura brasileira é
ambientalmente sustentável e guarda padrões de qualidade sanitária universais. O
tratado terá mecanismos e disposições para impedir que essas questões sejam
usadas como ferramentas de pura proteção comercial.

O comércio é uma via de mão dupla e o acordo também abre o mercado brasileiro
para a produção do agro europeu. De um lado, esse é um grande ganho para o
consumidor, que se beneficiará de produtos de grande qualidade e de bom preço. Ao
mesmo tempo, será um desafio para a produção local que, até agora, tem sido
poupada da competição externa. É o caso de laticínios, dos alimentos processados,
bebidas, frutas; enfim, de uma vasta gama de produtos que os europeus desejam
nos vender e poderão fazê-lo sem o obstáculo de tarifas ou normas sanitárias
artificiais.

O nosso desafio, portanto, é duplo: aumentar e diversificar as exportações e conviver


com uma competição muito qualificada. Os grandes produtores dispõem de seus
próprios meios para superar esse desafio e vencer. Afinal, eles estão em todo o
mundo, enfrentando e vencendo as condições mais adversas e abrindo caminho para
produtores médios e pequenos que precisam também estar no mundo.

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) vai se engajar ativamente


no processo, procurando inserir pequenos e médios produtores nesse mercado, por
meio de ações de assistência técnica e gerencial para capacitá-los para a exportação.
Eles precisam adaptar seus produtos, adquirir escala e se familiarizar com o ambiente
do comércio exterior. Nosso Sistema Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) e as
iniciativas da Rede Agropecuária de Comércio Exterior (InterAgro) serão nossas
peças de apoio nesse esforço. O comércio exterior tem sido um fator de
transformação de muitas nações. Está chegando a nossa hora de experimentarmos
este caminho, que sempre deu certo em todos os lugares.

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