Abrir portas onde se erguem muros Director: David Pontes Domingo,

omingo, 21 de Abril de 2024 • Ano XXXV • n.

n.º 12.407 • Diário • Ed. Lisboa • Assinaturas 808 200 095 • 1,90€

Bartolomeu Costa Cabralral 6 Bienal de Veneza

60.ª
Morreu o arquitecto O
Os dois Leões
que construía “a cidadee d m
de Ouro foram
através dos edifícios” p
para a Oceâniaa
Cultura, 26 Cultura, 24/25
Cu
DANIEL ROCHA

Agência
anticorrupção
tem metade
do quadro por
25 de Abril preencher
Francisco Ferreira,
o militar que parou e ainda não
no sinal vermelho
a caminho da Revolução, aplicou multas
conta a sua história Mecanismo Nacional Anticorrupção
foi criado em 2021. E continua sem
avaliação desta e de outras medidas
suscita críticas, numa altura em que
“quadro mínimo de pessoal” para o Governo ouve parceiros para deÆnir
Vasco Lourenço responder” a atribuições. Falta de novas políticas Destaque, 2 a 4

“No mundo ocidental,

o 25 de Abril está Segurança Social só tem
a ser uma referência
democrática” 50 inspectores para
P2 2600 lares de idosos
“Há cada vez mais denúncias e mais dências podem chegar a um ano.
graves”, dizem inspectores. Falta de Existem 2606 lares registados e largas
meios faz com que acções de Æscali- centenas de outros clandestinos ou
zação sejam “apenas reactivas”. Pen- sem licença Sociedade, 14/15

EUA Nuno Melo

Pacote de ajuda
à Ucrânia de 61
mil milhões de
dólares aprovado
Câmara dos Representantes dos EUA
pôs Æm a impasse de vários meses
que contribuiu para a falta de arma-
mento na Ucrânia Mundo, 20
CDS precisa
de “falar
para jovens
e mulheres”
Depois do regresso ao Parlamento e
ao Governo, CDS quer reconquistar
a direita. O 31.º congresso do partido
termina hoje Política, 10/11

PUBLICIDADE

QUEBRAMAR.COM QUEBRAMAR.COM

ISNN-0872-1548
2 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Destaque Luta contra a corrupção
Agência
anticorrupção
justifica inacção
com dificuldade em
recrutar pessoal
Menos de metade do quadro está preenchido e em 2023
Mecanismo Nacional Anticorrupção só gastou 37%
do orçamento que tinha. Não há multas aplicadas até agora
Mariana Oliveira
e Ana Henriques
A
entidade independente
criada em 2021 para preve-
nir a corrupção e promo-
ver a transparência na
acção pública nunca saiu
até hoje de um estado qua-
se letárgico. O facto de esta agência,
que dá pelo nome de Mecanismo
Nacional Anticorrupção (Menac),
ter preenchido menos de metade do
quadro de pessoal condiciona a sua
actuação, como reconhece o pró-
prio organismo. Facto é que a falta
de recursos humanos a obrigou a
adiar os projectos educativos que
deveriam ter arrancado no ano pas-
sado e também ainda não aplicou
uma única multa no âmbito da Æsca-
lização do regime geral da preven-
ção de corrupção, que veio obrigar
médias e grandes empresas a avaliar
os riscos de subornos e a adoptar
códigos de conduta e manuais de
boas práticas.
Dirigido por Pires da Graça, um
juiz conselheiro jubilado indicado
para o cargo pelo presidente do Tri-
bunal de Contas e pela procuradora-
geral da República, o Menac tem um
historial que fala por si. Foi criado
formalmente no Ænal de 2021, mas a
portaria que regula a sua instalação
saiu em Junho de 2022, no mesmo
dia em que foi nomeado o seu presi-
dente. O mapa de pessoal foi publi-
cado em Dezembro desse ano.
Apesar de a instalação deÆnitiva
ter sido decretada por portaria em
Junho do ano passado, neste momen-
to, a entidade está longe de se encon-
trar a funcionar em pleno: dos 27
lugares previstos no mapa de pes-
soal, apenas 12, menos de metade,
foram preenchidos. Porquê?
Diz esta agência que as diÆculda-
des em recrutar radicam no facto de
a lei só lhe permitir ir buscar proÆs-
sionais ao interior da administração
pública: “Há, de facto, uma diÆcul-
dade de captação de funcionários
por via deste regime [de mobilidade
interna], visto que existe a possibili-
dade de ser negada a pretensão da
mudança por parte do serviço de
origem do candidato.” Daí não exis-
tir “um quadro mínimo de pessoal
apto para responder às atribuições
do organismo”.
Já dinheiro não lhe falta. Com um
orçamento disponível para 2023 de
dois milhões de euros, o Menac não
conseguiu gastar mais de 750 mil
euros, o equivalente a uma taxa de
execução de 37,2%.
Mesmo assim, para 2024, recebeu
uma dotação de 2,5 milhões, 400 mil
dos quais para um projecto Ænancia-
do do Plano de Recuperação e Resi-
liência destinado ao desenvolvimen-
to do sistema de informação para
monitorizar a Estratégia Nacional de
Combate à Corrupção.
Uma das principais missões do
mecanismo é Æscalizar o regime
geral da prevenção da corrupção,
que obriga desde Junho passado a
que tanto organismos públicos como
médias e grandes empresas avaliem
os riscos de corrupção e suborno
associados ao seu tipo de actividade
e adoptem medidas para os reduzir.
Tal implica a elaboração de planos
de prevenção e a criação de códigos
de conduta e manuais de boas prá-
ticas que descrevam os comporta-
mentos esperados de todos os tra-
balhadores.
É igualmente obrigatória a criação
de canais internos de denúncia que
protejam os denunciantes e a nomea-
ção de um ou mais responsáveis por
estes mecanismos de prevenção.
Quem não cumprir estas obrigações
(que já existiam para os organismos
públicos) vai passar a Æcar sujeito a
multas, sanções que não existiam até
o novo regime entrar em vigor. Nas
situações mais graves, estas coimas
podem variar entre os 2000 e os
quase 45 mil euros para as pessoas
colectivas e chegar aos 3740 euros
para as pessoas singulares.
Apesar de este papel Æscalizador
ser uma das principais tarefas no
papel do Menac, que veio substituir
Menac reconhece que
a comissão à qual compete
determinar a abertura de
processos de contra-ordenação
e propor a aplicação de multas
apenas entrou em funções em
Outubro passado
“Há, de facto,
uma dificuldade
de captação de
funcionários”,
informa o Menac,
que é dirigido por
Pires da Graça
o Conselho de Prevenção da Corrup-
ção, que funcionava junto do Tribu-
nal de Contas, ainda pouco ou nada
foi feito a este nível.
Numa resposta enviada ao PÚBLI-
CO, o mecanismo anticorrupção
reconhece que a respectiva comissão
de sanções, à qual compete determi-
nar a abertura de processos de con-
tra-ordenação e propor a aplicação
de multas, apenas entrou em fun-
ções em Outubro passado. “Até ao
momento, ainda não propôs ao pre-
sidente a aplicação de coimas, mas
encontram-se em elaboração autos,
resultantes de comunicações envia-
das por inspecções-gerais ao Menac,
que poderão determinar processos
de contra-ordenação”, explica o
organismo.
O Menac sublinha ainda que tem
“privilegiado a óptica pedagógica”
junto das entidades que Æscaliza,
disponibilizando, por isso, no seu
site guias sobre como realizar planos
de prevenção de riscos, códigos de
conduta ou sobre como devem ser
ministrados programas de formação
para a integridade.
Falta canal de denúncias
Os projectos educativos que estavam
previstos arrancar no ano passado
para promover a cultura de integri-
dade e transparência ainda estão à
espera dos necessários recursos
NotíciasFlix
humanos. Isso mesmo assume o
Menac, que reconhece que as limi-
tações de pessoal “implicaram o
adiamento do lançamento de projec-
tos educativos no ano de 2023”.
Também ainda não foram criadas
as equipas de análise de processos
de corrupção e crimes conexos já
terminados, um modelo que tem
sido adoptado na área da violência
doméstica e tem permitido identiÆ#
car problemas e colmatá-los. Nem
um canal de denúncias online, ape-
sar de a agência ter recebido quatro
queixas em 2022 relativas a corrup-
ção, que encaminhou para o Minis-
tério Público, uma vez que não pos-
sui competências de investigação
criminal, e 42 no ano passado, rela-
tivas a matérias tão díspares como
contratação pública, questões labo-
rais da função pública, assédio moral
no trabalho e comportamento da
administração tributária.
O funcionamento anémico do
Menac não passou sequer desperce-
bido ao Grupo de Estados contra a
Corrupção do Conselho da Europa,
que num relatório divulgado em
Janeiro passado insta o Governo a
“tomar todas as medidas necessá-
rias para tornar plenamente opera-
cional” esta entidade, dotando-a de
um secretariado independente
recrutado por ela, “a Æm de garantir
que a prevenção e a luta contra a
RUI GAUDÊNCIO
corrupção se traduzam em actos
tangíveis”.
“O Greco recomenda que, de for-
ma prioritária, o Mecanismo Nacio-
nal Anticorrupção se torne plena-
mente operacional, através da atri-
buição de recursos apropriados”,
pode ler-se no documento, que subli-
nha a abrangência de funções do
Menac, do desenvolvimento e adop-
ção de programas e iniciativas desti-
nados a criar uma cultura de integri-
dade e transparência até à promoção
de campanhas de corrupção.
Na sexta-feira, à margem de uma
cerimónia no Porto, o presidente do
Supremo Tribunal de Justiça, Henri-
que Araújo, referiu-se à forma “mui-
to deÆcitária” como o Menac estava
a funcionar, tendo aludido ao pro-
blema da falta de meios.
Ciente deste estado de coisas, o
próprio PS, responsável pela estra-
tégia anticorrupção e pela criação do
mecanismo, prometeu no programa
eleitoral com que concorreu às legis-
lativas de Março passado que, se
ganhasse, iria dotar esta agência “de
todos os recursos necessários”. Já o
PSD inscreveu no seu programa do
Governo a reforma institucional da
agência, bem como da Entidade da
Transparência e da Entidade das
Contas e Financiamento Político,
“baseada na avaliação do seu dese-
nho e desempenho”.
Especialistas apontam falhas
Medidas lançadas em 2021
nunca foram avaliadas
Mariana Oliveira
e Ana Henriques
A
ministra da Justiça, Rita
Júdice, está a discutir com
os grupos parlamentares o
combate à corrupção, sem
que a eÆcácia do pacote de
medidas aprovado pelo
anterior Governo em 2021 tenha
alguma vez sido avaliada. O Ministé-
rio da Justiça chuta responsabilida-
des para o Mecanismo Nacional Anti-
corrupção (Menac), entidade a cargo
da qual está a elaboração de um rela-
tório de avaliação da execução das
dezenas de medidas que integram a
Estratégia Nacional Anticorrupção
2020-2024.
Facto é que o relatório não faz par-
te do plano de actividades do Menac
para este ano, o que a entidade justi-
Æca com o facto de no momento em
que foi incumbida da tarefa, através
do Orçamento do Estado para 2024,
publicado a 29 de Dezembro passa-
do, já ter aprovado o seu plano de
actividades para este ano, razão pela
qual não inscreveu o trabalho no
documento.
Ainda assim, assume-se disponível
para “prestar toda a colaboração que
for necessária” ao executivo nesta
matéria. “O balanço da estratégia
nacional anticorrupção 2020-2024
será realizado pelo Menac e transmi-
tido às autoridades competentes,
mas neste momento é prematuro
estarmos a pronunciar-nos na comu-
nicação social sobre o tema”, refere
ainda a mesma entidade. Foi por ini-
ciativa do PAN que esta avaliação foi
introduzida na lei do orçamento.
Luís de Sousa, investigador princi-
pal do Instituto de Ciências Sociais
da Universidade de Lisboa, com um
extenso currículo de estudos ligados
à corrupção, considera que não faz
sentido avançar para novas medidas
de combate à corrupção sem fazer
uma avaliação do sistema nacional
de integridade, o que, critica, tam-
bém não foi feito quando se partiu
para a Estratégia Nacional Anticor-
rupção, um pacote de medidas coor-
denado pela antiga ministra da Justi-
ça socialista Francisca van Dunem.
O investigador lamenta que seja
criada uma panóplia de entidades
sem o devido escrutínio e sem se
saber se dispõem dos recursos espe-
cializados de que necessitam ou se as
respectivas lideranças têm as com-
petências adequadas para exercer
aquelas funções. “A área da repreen-
são ainda vai fazendo o seu papel, o
principal problema reside na preven-
ção”, considera Luís de Sousa. O
investigador critica a “azáfama na
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 3
discussão de novas leis sem se avaliar
o que está para trás”. E deixa um
alerta ao novo Governo: “Cuidado
com a tentação de fazer esta discus-
são em circuito fechado.”
“Frenesim de fazer de novo”
O advogado Rui Patrício, antigo
membro do Conselho de Prevenção
da Corrupção, concorda que não faz
sentido alterar, revogar ou acrescen-
tar uma medida sem dar tempo para
aplicar e testar uma anterior, subli-
nhando que, nestas matérias, as coi-
sas carecem de tempo para produzir
efeitos. “O frenesim de fazer sempre
de novo não leva longe, como não
tem levado no passado”, avisa.
O defensor, que coordena o Baró-
metro da Aplicação da Estratégia
Nacional Anticorrupção, integrado
no Observatório Permanente da Jus-
tiça, contesta igualmente uma ideia
que diz que se criou e alimentou ao
longo dos anos: que a corrupção é o
maior problema nacional e o seu
combate o mais importante e urgen-
te desígnio.
“Não é, por muito que seja conve-
niente dizer e agir como se fosse,
para agradar a muita opinião pública
e publicada, seja para garantir apoio
político (agora à direita como no pas-
sado à esquerda). Dizer isto não signi-
Æca desvalorizar a questão da corrup-
ção, signiÆca apenas não a tratar de
modo popular e populista”, sustenta
Patrício.
O colega Nuno Brandão, que além
de advogado é professor na Faculda-
de de Direito da Universidade de
Coimbra, também critica mudanças
constantes sem uma avaliação pré-
via. “Um dos grandes problemas que
temos é que estamos sempre a mudar
as leis com a miragem de que vai
haver uma que vai resolver tudo”,
aÆrma Brandão.
Ainda é muito cedo para perceber
as consequências da introdução de
Estratégia Anticorrupção foi lançada pela então ministra Van Dunem
novas regras penais, no Ænal de 2021,
que dispensam obrigatoriamente de
pena o agente que denuncie crimes
típicos dos titulares dos cargos polí-
ticos antes da abertura do inquérito-
crime, desde que não tenha pratica-
do acto contrário aos seus deveres ou
entretanto tiver restituído a vanta-
gem que recebeu.
A pena poderá ser dispensada se,
durante o inquérito ou a instrução do
processo, o agente se tiver arrepen-
dido, devolvido o que recebeu e
“tiver contribuído decisivamente
para a descoberta da verdade”. A
ajuda para a prova dos factos ainda
pode ser valorizada até ao Æm da
audiência de julgamento, podendo
o agente, neste caso, beneÆciar de
uma redução de pena. As normas
aprovadas no pacote anticorrupção
reforçaram igualmente as inibições
do exercício de cargos e de penas de
prisão. No entanto, a forma como as
estatísticas da justiça estão feitas não
permite tirar nenhuma conclusão
sobre os efeitos das novas regras.
Em Setembro passado, a Transpa-
rência Internacional enviou uma
carta ao primeiro-ministro António
Costa em que chamava a atenção
para a inacção do Menac e instava o
chefe do Governo a levar a cabo um
escrutínio urgente e uma efectiva
implementação da estratégia anticor-
rupção lançada dois anos antes.
“O que se passa com o Menac é
sintomático da relevância política do
combate à corrupção: nenhuma.
Temos uma estratégia anticorrupção
sem directrizes ou plano de monito-
rização, ou seja, que não é imple-
mentável na prática. A Assembleia da
República aprovou leis que ninguém
Æscaliza, isto é, que não se cumprem.
E ninguém se responsabiliza: nem o
Governo, nem os partidos”, lamen-
tou na altura a directora executiva
desta organização não-governamen-
tal, Karina Carvalho.
NUNO FERREIRA SANTOS
4 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Destaque Luta contra a corrupção
Combate à corrupção: assim haja vontade política
Opinião
Nuno Torres e Óscar Afonso
S
endo o combate à
corrupção um tema cada
vez mais consensual na
sociedade portuguesa, que
esteve em destaque nas
recentes eleições
legislativas, impõe-se uma análise
breve dos principais pontos de
convergência dos programas
eleitorais das várias forças políticas,
com destaque para as três com
maior representação parlamentar.
De facto, dada a escassa maioria
relativa, o novo Governo da Aliança
Democrática (AD) terá de alcançar
compromissos em várias matérias —
nomeadamente no combate à
corrupção — para conseguir
implementar o seu programa
eleitoral, que Æcou plasmado no
programa de governo.
Dado que o programa eleitoral do
Partido Socialista enfatiza a
continuidade nas políticas de
combate à corrupção, é provável
que o Governo tenha de cooperar
com o Chega em várias medidas,
especialmente na criminalização do
enriquecimento ilícito ou
injustiÆcado. Esta é uma medida
essencial no combate à corrupção
que está presente na maioria dos
programas eleitorais, exceto no do
PS, pelo que o acordo pode
abranger vários partidos.
O problema aqui será encontrar
uma formulação que seja
constitucionalmente aceite, dado
que não seria a primeira tentativa
de implementação de uma medida
mais abrangente. Para maior
impacto, a formulação deveria
abranger também o setor privado,
como defendido num estudo da
Faculdade de Economia da
Universidade do Porto de 2023
sobre Economia Não Registada, que
estima um peso de quase 35% do
PIB em 2022.
Em 2021, o Parlamento aprovou
uma versão soft de criminalização
do enriquecimento injustiÆcado
para titulares de cargos públicos,
via “alargamento das obrigações
declarativas” e “densiÆcação do
crime de ocultação de
enriquecimento” (que já existia),
pelo que a medida preconizada no
estudo, alinhada pelo que existe em
França, é mais ampla.
Como alternativa ao
enriquecimento ilícito, o programa
da AD prevê a criação legal de
mecanismos como a “Ação Cível
para Extinção de Domínio” ou
“unexplained wealth orders”, que
consagra um mecanismo legal para
permitir que o Estado recupere
bens adquiridos ilicitamente por
particulares, independentemente
de uma condenação penal do
proprietário. O programa do Chega
parece incluir uma formulação
semelhante, pelo que poderá haver
aqui acordo.
Ainda no combate à corrupção, é
de assinalar a delação premiada e o
reforço da proteção de denúncia —,
a publicação de todas as decisões
judiciais online (AD e Chega) e o
reforço e otimização de meios
(físicos, humanos, organizacionais)
no combate, investigação e ação
penal da corrupção, que se trata de
uma temática transversal a todos os
programas eleitorais, potenciando
acordos.
Ao nível da prevenção da
corrupção, há consenso alargado
no registo e regulação do lobbying —
sendo a exceção a CDU, que
pretende ilegalizar a prática — e
generalizado no controlo de
conÇitos de interesse de titulares de
cargos públicos, com realce para o
travão às “portas giratórias”,
sobretudo quanto ao alargamento
dos “períodos de nojo”.
Embora a Iniciativa Liberal (IL)
não tenha dedicado qualquer ponto
especíÆco do seu programa eleitoral
à corrupção, considera que a
desburocratização e redução de
benefícios Æscais são essenciais ao
nível da prevenção, o que faz
sentido e é compreensível face à sua
linha programática.
Assim, e como o Governo AD e o
Chega também defendem a
desburocratização (nomeadamente
em matéria do licenciamento, uma
das áreas mais sensíveis) e a
redução dos benefícios Æscais
injustiÆcados (referida ainda pelos
demais partidos, exceto o PS),
poderá haver aqui entendimento
entre, pelo menos, a AD, Chega e IL
para prevenir a corrupção também
por esta via indireta,
desejavelmente no seio de uma
reforma alargada do Estado, para
melhorar a gestão e a eÆciência da
despesa pública. Ainda a respeito
da desburocratização, o impacto
poderá ser potenciado pelo uso de
novas tecnologias — como
inteligência artiÆcial, big data e
blockchain —, no âmbito da
digitalização do Estado, aspetos
Não faltam pontos
de convergência nas
propostas dos três
partidos mais
votados. E também
há ideias de outras
forças políticas que
merecem atenção
RUI GAUDÊNCIO
que aproximam também a AD,
Chega e IL. Já no que se refere à
implementação da “pegada
legislativa” (AD, PS, Livre e PAN) — a
publicação online das várias etapas
do processo legislativo —, o
entendimento da AD pode ser feito
com o PS.
Como para prevenir a corrupção
é preciso mudar mentalidades,
salienta-se alguma convergência
entre a AD e o Chega na educação
cívica e ética nas escolas. A
promoção da transparência,
formação e ética de conduta na
administração pública foi referida
por todos os partidos, o que poderá
gerar consensos, sendo a medida
mais inovadora a proposta da AD de
instituir o “Scoring de Ética e
Integridade” (SEI) para as entidades
públicas.
Finalmente, há medidas de
combate à corrupção defendidas
por partidos com menor expressão
parlamentar, mas que podem ter
um impacto relevante e serem
exequíveis, devendo merecer a
atenção do Governo e das principais
forças políticas na oposição:
O Æm do sigilo bancário, uma
bandeira antiga do PCP/CDU e que
poderá fazer sentido dentro de
limitações bem deÆnidas na lei, tal
como faz a Suécia, um dos países
mais avançados em matéria de
combate à corrupção, onde a
informação da declaração de IRS é
pública (medida ausente dos
programas eleitorais).
A exclusão do acesso a apoios
públicos e à contratação pública
das empresas sediadas em
paraísos Æscais, medida defendida
pelo Bloco de Esquerda e pelo
PAN. Combate à corrupção no
futebol (PAN), nomeadamente a
realização de uma auditoria a
todas as transferências de
jogadores e treinadores de futebol
ocorridas desde 2015 e a
divulgação da origem, do destino e
dos beneÆciários dos Çuxos
Ænanceiros envolvidos, bem como
da titularidade efetiva dos capitais
sociais das sociedades
desportivas.
Combate à corrupção no
Ministério da Defesa (IL) e do
Ambiente (Chega).
Há, pois, muitos consensos
possíveis para travar a corrupção,
assim haja vontade política.
Responsável pelo Gabinete
de Estudos Económicos,
Empresariais e de Políticas
Públicas (G3E2P) da Faculdade
de Economia da Universidade
do Porto (FEP); director da FEP,
sócio-fundador do Obegef
— Observatório de Economia
e Gestão de Fraude
 A REVOLUÇÃO
TAMBÉM
CHEGOU
À ESCOLA.
O PÚBLICO, em conjunto com a Fundação Belmiro de Azevedo, apresenta uma colecção
com 4 volumes que analisa a evolução do ensino em Portugal ao longo dos últimos 100
anos − 50 anos antes e 50 anos depois do 25 de Abril de 1974. A história da educação
confunde-se com a história da infância, da família e da sociedade. Não há melhor maneira
de compreender uma sociedade do que olhar para a forma como educa os seus filhos.
+7,99 € COORDENAÇÃO: DAVID JUSTINO
SÁBADO, 4 MAIO
COM O PÚBLICO
Colecção de 4 volumes. PVP unitário: 7,99 €. Preço total da colecção: 31,96 €. Periodicidade semanal ao sábado,
entre 4 e 25 de Maio 2024. Stock limitado.
6 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024

Espaço público

Os 12 magníficos de Manhattan

Q
uarenta e duas perguntas,
Editorial quatro dias, 12 jurados, sete
homens e cinco mulheres.
São estes os números que
ajudam a contar a história
do julgamento sem precedentes de
Donald Trump que terá lugar num
Sónia Sapage tribunal de Manhattan, em Nova
Iorque, nos próximos dois meses.
Mais do que os números, é
interessante conhecer a lista de
pré-requisitos que foi colocada ao
júri cuja missão é decidir se Trump é
ou não culpado de fraude para
interferir ilegalmente nas
presidenciais de 2016. A lista — a
mais exaustiva de sempre — é
composta por 42 perguntas, ainda
mais do que as 36 que constam do
questionário que os governantes
As perguntas concretas portugueses têm de preencher antes
têm uma razão de ser: de tomar posse.
Começa assim: “Sem dar
evitar vieses, distorções informações exactas sobre o seu
e sentenças endereço, diga-nos: em que bairro
pré-deÄnidas mora? Por exemplo: Upper East Side;
Lower East Side; Inwood; etc. Há
quanto tempo mora lá? Nasceu em
Nova Iorque? Se não, onde é que
morava anteriormente?”
Outro exemplo: “Leu (ou ouviu)
algum dos seguintes livros ou
podcasts de Michael Cohen ou Mark
Pomerantz? Em caso aÆrmativo,
informe-nos sobre se o que ouviu ou
leu pode afectar a sua capacidade de
ser um jurado justo e imparcial neste
caso: “Disloyal: A Memoir”;
“Revenge”; “Mea Culpa”; “People vs.
Donald Trump”.
Mais uma pergunta: “Já apoiou ou
pertenceu a algum dos seguintes
movimentos: QAnon; Proud Boys;
Oath Keepers; Three Percenters;
Boogaloo Boys (todos de
extrema-direita); ou Antifa
(abreviatura de antifascistas)?”
Desta vez, a selecção foi tão Æna
que chegou ao ponto de recolher
informações sobre os jornais que os
candidatos a um lugar no júri lêem,
os canais de televisão que costumam
sintonizar, as redes sociais que
utilizam ou os podcasts que gostam
de ouvir. Isto, além da formação, dos
hobbies ou da religião.
As perguntas concretas têm uma
razão de ser: evitar vieses, distorções
e sentenças pré-deÆnidas em clima
quase eleitoral. Mas numa sociedade
com um grau de polarização tão
elevado como a americana (e em que
o próprio Donald Trump exibe com
orgulho um extenso rol de
preconceitos), o mais fácil é
encontrar dois tipos de pessoas: as
que se sentem ou alguma vez se
sentiram atingidas pelos
comentários do anterior Presidente
ou as que estão perfeitamente
alinhadas com o seu pensamento.
A esperança foi toda colocada nos
12 magníÆcos de Manhattan
responsáveis por garantir a
imparcialidade possível num país
dividido em dois (como há cada vez
mais) e à beira de eleições. O mundo
estará de olhos postos neles.

CARTAS AO DIRECTOR
O 25 de Abril na
toponímia de Lisboa
Existe a Ponte 25 de Abril a ligar
Lisboa a Almada. Não se encontra
porém, dentro da cidade de
Lisboa, nenhum jardim ou parque
com essa designação. O que se
encontra é o Parque Eduardo VII
com o nome de um rei inglês que
visitou Portugal no início do século
passado. Muito pelo contrário, o
parque deveria chamar-se Parque
25 de Abril e Æcaria muito bem
estando no cimo da Avenida da
Liberdade (apesar de no meio estar
a estátua do Marquês de Pombal,
um grande autocrata do século
XVIII).
Neste parque doravante 25 de
Abril deveria haver um monumento
condigno à revolução que foi o
maior acontecimento do século XX
em Portugal, o que lá está agora não
tem qualquer beleza ou imponên-
cia. Mas, além disso, Lisboa deveria
mostrar o seu reconhecimento
àqueles militares que entre 25 de
Abril de 1974 e 25 de Novembro de
1975, por vezes em convulsões,
estiveram na origem da democracia
constitucional portuguesa.
Sugeriria ainda o reconhecimento
aos militares que, não em convul-
sões, realizaram efectivamente a
ideia de Direito do Programa das
Forças Armadas, entre os mortos,
Salgueiro Maia, Melo Antunes, Otelo
Saraiva de Carvalho (sem esquecer
os radicalismos em que caiu, em
alguns momentos), António de
Spínola, Costa Gomes, Costa Braz. E
entre os vivos, Ramalho Eanes,
Vasco Lourenço, Costa Correia,
Sousa e Castro.
Jorge Miranda, Lisboa
25 de Abril
Para muitos é uma efeméride. Para
milhões foi o rebentar das
correntes que agrilhoaram,
durante anos, a voz da liberdade, o
poder de cantar livremente, o ser
igual entre todos, terem todos os
mesmos direitos, terem um Estado
que cuide de todos, sentir-se igual
entre todos. Não foi só a benesse
de termos direito a habitação,
ensino, cuidados de saúde e de
podermos escolher quem nos
governe, foi, principalmente,
podermos dizer publicamente de
quem gostamos ou não gostamos
sem que nos venham pedir contas
por isso. O 25 de Abril, com todas
as carências que possa ter,
deixou-nos a coisa mais
importante: Liberdade.
Duarte Dias da Silva, Foz do Arelho
Um adulto na sala
Em entrevista ao PÚBLICO, o
advogado Rogério Alves veio
discordar da tese reinante de que o
Ministério Público (MP) deve
explicações pela decisão do
Tribunal da Relação de Lisboa na
Operação Influencer. Não o fez sem
críticas à actuação geral do MP ao
longo dos anos (e.g., o abuso das
detenções), mas não surfou a onda
de um processo que, nesta fase,
está a correr mal à investigação.
Esta postura contrasta
gritantemente com a do Presidente
da República —o mais alto
magistrado da nação —, que
resolveu tecer comentários de café
sobre este tema, e de grande parte
do centrão (maioritariamente o PS),
ávido de vingança pelas
consequências políticas deste caso.
Não sei de que lado está a razão,
mas parece-me descabido exigir-se
da procuradora-geral da República
que se explique ou, no limite, se de-
mita porque um tribunal teve uma
posição (soberana) diferente da do
MP num processo judicial em curso.
Antes houvesse mais adultos na
sala.
Tomás Júdice, Lisboa
A situação da floresta
Continuamos sem saber o que vai
suceder com a gestão da área
Çorestal portuguesa, matas e
matos que cobrem grande parte do
território; há milhares e milhares
de hectares de encostas de serras
que foram ardendo e continuam
sem qualquer projecto nacional de
reÇorestação. As pessoas são
inquiridas sobre os mais diversos
problemas, desde as eleições ao
custo de vida — mas nunca se fez
um inquérito sobre o que as
pessoas deste país pensam sobre a
situação de abandono da área
Çorestal. À deriva liberal que
invadiu a nossa política,
privilegiando a agro-indústria e as
indústrias como a celulose, não
interessa uma Autoridade Florestal
Nacional, nem a ética proÆssional
dos engenheiros Çorestais. Na
última vez que existiram Serviços
Florestais, todo o ministério eram
pessoas ligadas à celulose... Depois
da “grande” ministra Cristas,
deu-se a morte dessa autoridade
Çorestal, e com o PS a mesma
deriva continuou até ao inenarrá-
vel ICNF. Não haverá um Governo
com consciência da gravidade da
situação e que se empenhe na
recuperação de uma nova
Autoridade Florestal Nacional? O
PSD (de quem recordamos Æguras
icónicas) sempre foi muito mais
ambientalista do que o PS, mas isso
foi noutros tempos... Não têm
coragem de recriar o serviço que
exerça a defesa, a gestão e a
renovação da nossa área Çorestal,
porque seria “mais Estado” e teria
de ser independente do controle e
da pressão da indústria do sector e
dos grandes grupos Ænanceiros
que lucram com o combate aos
incêndios.
Fernando Santos Pessoa, Faro

As cartas destinadas a esta secção têm de ser enviadas em exclusivo para o PÚBLICO e não devem exceder as 150 palavras (1000 caracteres). Devem indicar o nome, morada e contacto
telefónico do autor. Por razões de espaço e clareza, o PÚBLICO reserva-se o direito de seleccionar e editar os textos e não prestará informação postal sobre eles cartasdirector@publico.pt

ESCRITO NA PEDRA A liberdade é difícil
O exagero
é sempre a Ainda ontem
exageração de
algo que não o é
José Ortega y
Gasset
(1883-1955),
Q
Miguel Esteves Cardoso
filósofo uando ouço dizer mal do
Ministério Público, da
Procuradoria-Geral da República
ou dos magistrados, defendo-os.
O NÚMERO Se estamos a comemorar a
6,24
liberdade e o 25 de Abril,
devemos agradecer a quem, de facto e de
jure, no dia-a-dia de todos os anos, defendeu
essa liberdade dos ataques e das defesas
mais bem Ænanciadas e orquestradas.
A liberdade de expressão é um projecto
que precisa de ser regularmente mantido e
concertado. A própria deÆnição da liberdade
de expressão faz-se diariamente, caso a caso,
O sueco Armand Duplantis esta- com grande soÆsticação e grande
beleceu ontem um novo recorde diÆculdade, debatida por grandes cabeças.
do mundo do salto com vara Pisei muitas vezes o risco e muitas vezes
(6,24 metros), no meeting de fui a tribunal. É muito chato ir a tribunal:
Xiamen, China, mais um centí- espera-se muito, aguenta-se muito, perde-se
metro face à anterior melhor muito tempo, é-se obrigado a ouvir grandes
marca, que já lhe pertencia estopadas.
ZOOM IRÃO
Uma iraniana passa por uma enorme faixa anti-israelita com imagens de mísseis, em Teerão. A tensão entre os dois países
agravou-se após o ataque aéreo à embaixada iraniana na Síria que o país diz ter sido conduzido por Israel
Fui condenado três vezes e ilibado outras
quatro. O mais importante é que, nessas sete
vezes, compreendi — isto é, foi-me dado a
compreender — perfeitamente porque é que
tinha sido condenado ou ilibado. Safo ou
tramado, saí de lá satisfeito com o trabalho
que tinha dado e com a justiça, tanto do
processo como da decisão.
Leva mais tempo a concordarmos com a
condenação, claro. Em contrapartida,
Æca-se extático quando o Ministério Público
ou um juiz defende em tribunal as palavras
que escrevemos. Mas, com o tempo,
aprecia-se o direito — e a liberdade — de
acusação de quem se queixou de nós. Até
porque um dia podemos ser nós a
queixarmo-nos deles.
A questão da velocidade da justiça — tão
lenta, tão exasperante, tão injusta — é, apesar
de tudo, secundária. Quer-se que um carro
ande mais depressa porque se reconhece
que o carro anda. Assim é com o sistema
judicial: quer-se que ande mais depressa,
porque até se considera que anda bem.
De qualquer forma, a liberdade já foi
largamente exercida. A lentidão também é
um castigo: continua-se nas bocas do
mundo, julgado por todos, desprezado por
continuar em liberdade.
A liberdade é difícil e dá muito trabalho,
mas vale a pena.
ABEDIN TAHERKENAREH/EPA
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 7
A opinião publicada no jornal respeita
a norma ortográfica escolhida pelos autores
publico.pt
Lisboa (sede: editor e redacção) Porto
Edifício Diogo Cão,
Doca de Alcântara Norte
Rua Júlio Dinis,
n.º 270 Bloco A 3.º
1350-352 Lisboa
Tel. 210 111 000
4050-318 Porto
Tel. 226 151 000
DIRECTOR
David Pontes
Directores adjuntos
Andreia Sanches, Marta Moitinho Oliveira,
Sónia Sapage, Tiago Luz Pedro
Directora de arte
Sónia Matos
Directora de design de produto digital
Inês Oliveira
Editoras executivas
Helena Pereira, Patrícia Jesus
Editor de fecho
José J. Mateus
Editor de Opinião Álvaro Vieira Editor P2 Sérgio B. Gomes Online Ana Maria
Henriques, Mariana Adam, Pedro Esteves, Pedro Guerreiro, Pedro Sales Dias
(editores), Amílcar Correia (redactor principal), Carolina Amado, João Pedro
Pincha, José Volta e Pinto, Miguel Dantas, Sofia Neves (última hora); Rui Barros
(jornalista de dados); Ruben Martins, Inês Rocha (áudio); Joana Bougard (editora
multimédia), Carlos Alberto Lopes, Joana Gonçalves, Teresa Miranda
(multimédia); Amanda Ribeiro (editora de redes sociais), Ana Zayara, Patrícia
Campos (redes sociais) Política Leonete Botelho (editora), David Santiago
(subeditor), Ana Sá Lopes, São José Almeida (redactoras principais), Ana Bacelar
Begonha, Liliana Borges, Margarida Gomes, Maria Lopes, Nuno Ribeiro Mundo
Ivo Neto, Paulo Narigão Reis (editores), Bárbara Reis, Jorge Almeida Fernandes,
Teresa de Sousa (redactores principais), Rita Siza (correspondente em Bruxelas),
Alexandre Martins, António Rodrigues, António Saraiva Lima, João Ruela Ribeiro,
Maria João Guimarães, Sofia Lorena Sociedade Natália Faria (editora), Clara
Viana (grande repórter), Alexandra Campos, Ana Cristina Pereira, Ana Dias
Cordeiro, Ana Henriques, Ana Maia, Cristiana Faria Moreira, Daniela Carmo,
Joana Gorjão Henriques, Mariana Oliveira, Patrícia Carvalho, Samuel Silva, Sónia
Trigueirão Local Ana Fernandes (editora), Luciano Alvarez (grande repórter),
André Borges Vieira, Camilo Soldado, Mariana Correia Pinto, Samuel Alemão,
Teresa Serafim Economia Pedro Ferreira Esteves, Isabel Aveiro (editores), Manuel
Carvalho (redactor principal), Cristina Ferreira, Sérgio Aníbal (grandes
repórteres), Ana Brito, Luís Villalobos, Pedro Crisóstomo, Rafaela Burd Relvas,
Raquel Martins, Rosa Soares, Victor Ferreira Ciência Teresa Firmino (editora),
Filipa Almeida Mendes, Tiago Ramalho Azul Andrea Cunha Freitas (editora),
Claudia Carvalho Silva (subeditora), Aline Flor, Andréia Azevedo Soares, Clara
Barata, Nicolau Ferreira, Tiago Bernardo Lopes (multimédia), Gabriela Gómez
(infografia), Rodrigo Julião (webdesign) Tecnologia Karla Pequenino Cultura/
Ípsilon Paula Barreiros, Inês Nadais (editoras), Pedro Rios (editor Ípsilon), Isabel
Coutinho (subeditora), Nuno Pacheco, Vasco Câmara (redactores principais),
Isabel Salema, Sérgio C. Andrade (grandes repórteres), Daniel Dias, Joana
Amaral Cardoso, Lucinda Canelas, Luís Miguel Queirós, Mariana Duarte, Mário
Lopes Desporto Jorge Miguel Matias, Nuno Sousa (editores), Augusto
Bernardino, David Andrade, Diogo Cardoso Oliveira, Marco Vaza, Paulo Curado
Fugas Sandra Silva Costa, Luís J. Santos (editores), Alexandra Prado Coelho
(grande repórter), Luís Octávio Costa, Mara Gonçalves Guia do Lazer Sílvia
Pereira (coordenadora), Cláudia Alpendre, Sílvia Gap de Sousa Ímpar Bárbara
Wong (editora), Carla B. Ribeiro, Inês Duarte de Freitas P3 Inês Chaíça, Renata
Monteiro (subeditoras), Mariana Durães Terroir Ana Isabel Pereira Newsletters
e Projectos digitais João Pedro Pereira Projectos editoriais João Mestre
Fotografia Miguel Manso, Manuel Roberto (editores), Adriano Miranda, Daniel
Rocha, Nelson Garrido, Nuno Ferreira Santos, Paulo Pimenta, Rui Gaudêncio,
Alexandra Domingos (digitalização), Isabel Amorim Ferreira (documentalista)
Paginação José Souto (editor de fecho), Marco Ferreira (subeditor), Ana
Carvalho, Cláudio Silva, Joana Lima, José Soares, Nuno Costa, Sandra Silva;
Paulo Lopes, Valter Oliveira (produção) Copy-desks Aurélio Moreira, Florbela
Barreto, Joana Quaresma Gonçalves, João Miranda, Manuela Barreto, Rita
Pimenta Design Digital Alex Santos, Ana Xavier, Nuno Moura Infografia Célia
Rodrigues (coordenadora), Cátia Mendonça, Francisco Lopes, Gabriela Pedro,
José Alves Comunicação Editorial Inês Bernardo (coordenadora), João Mota,
Ruben Matos Secretariado Isabel Anselmo, Lucinda Vasconcelos
Documentação Leonor Sousa
Publicado por PÚBLICO, Comunicação Social, SA.
Presidente Ângelo Paupério
Vogais Cláudia Azevedo, Ana Cristina Soares e João Günther Amaral
Área Financeira e Circulação Nuno Garcia RH Maria José Palmeirim Direcção
Comercial João Pereira Direcção de Assinaturas e Apoio ao Cliente Leonor
Soczka Análise de Dados Bruno Valinhas Marketing de Produto Alexandrina
Carvalho Área de Novos Negócios Mário Jorge Maia
NIF 502265094 | Depósito legal n.º 45458/91 | Registo ERC n.º 114410
Proprietário PÚBLICO, Comunicação Social, SA | Sede: Lugar do Espido, Via
Norte, Maia | Capital Social €8.550.000,00 | Detentor de 100% de capital:
Sonaecom, SGPS, S.A. | Publicidade comunique.publico.pt/publicidade |
comunique@publico.pt | Tel. 210 111 353 / 210 111 338 / 226 151 067 |
Impressão Unipress, Tv. de Anselmo Braancamp, 220, 4410-350 Arcozelo,
Valadares; Empresa Gráfica Funchalense, SA, Rua da Capela de Nossa
Senhora da Conceição, 50, 2715-029 Pêro Pinheiro | Distribuição VASP –
Distrib. de Publicações, Quinta do Grajal – Venda Seca,
2739-511, Agualva-Cacém | geral@vasp.pt
Membro da APCT Tiragem média total de Março 19.099 exemplares
O PÚBLICO e o seu jornalismo estão sujeitos a um regime de auto-regulação
expresso no seu Estatuto Editorial publico.pt/nos/estatuto-editorial
Reclamações, correcções e sugestões editoriais podem ser enviadas para
leitores@publico.pt
ASSINATURAS Linha azul 808 200 095 (dias úteis das 9h às 18h)
publico.pt/assinaturas • assinaturas@publico.pt
8 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Espaço público
Cuidados paliativos
Frei Bento Domingues O.P.
Existem doenças incuráveis,
mas não existem doenças
incuidáveis. Esta é uma
distinção que nunca deve ser
esquecida nem confundida
1.
Dois acontecimentos recentes e
inapagáveis sobre a doença e o
sofrimento, a dor.
No passado mês de Fevereiro, o
Papa Francisco fez um vídeo que
podíamos resumir da seguinte
forma: existem doenças incuráveis, mas não
existem doenças incuidáveis. Esta é uma
distinção que nunca deve ser esquecida nem
confundida. O sofrimento é omnipresente e
são necessários cuidados para não ser
destrutivo. A pessoa doente precisa sempre
de cuidados médicos, humanos e espirituais
de proximidade, mesmo que a doença seja ou
não incurável.
A pior das doenças é aquela que confunde
estas duas realidades, pois colocamos o
doente diante de uma situação que parece
inultrapassável. Ao tornar esta distinção
operacional, estamos a abrir uma janela onde
se julgava um presente e um futuro sem
horizonte. Esta atitude positiva não afecta só
as pessoas doentes. Afecta a pior das doenças
que é a indiferença perante a dor dos outros.
No dia 13 deste mês, o 7Margens publicou
uma entrevista com Catarina Pazes,
presidente da Associação Portuguesa de
Cuidados Paliativos (APCP). Esta entrevista
merece ser lida, na íntegra, por muita gente
porque vem mostrar que é possível reunir
muitas mais pessoas em todos os aspectos da
vida. É muita a dor a precisar destes cuidados
e, muitas vezes, nem se sabe que existem ou
podem vir a existir.
Segundo a informação do 7Margens,
Catarina Pazes trabalha em equipa para trazer
vida a pessoas doentes, em situação de
extrema fragilidade. É enfermeira especialista
em cuidados paliativos, trabalha na Unidade
Local de Saúde do Baixo Alentejo e dedica-se
também à vida académica. Depois de ter
concluído licenciatura em Enfermagem, fez
mestrado, assim como diversas
pós-graduações, na área dos cuidados
paliativos; neste momento, frequenta o
doutoramento em cuidados paliativos na
Universidade do Porto. Reconhecida pelos
seus pares, foi eleita como presidente da
APCP para o triénio 2024-2026.
Segundo esta especialista, “os cuidados
paliativos são uma especialidade clínica, de
saúde, de alívio, de prevenção de sofrimento
que decorre de doenças. Esta é a designação
mais formal. Paliativo vem da palavra palium,
que tem um signiÆcado relacionado com
manto, proteção, cuidado; tem a ver com a
proteção, o manto que protege face ao frio, às
intempéries. São cuidados que protegem a
pessoa do sofrimento que está a acontecer e
daquele que possa vir a acontecer por causa
de uma doença grave”.
Usar a palavra “paliativo” apenas para
situações extremas da doença é um equívoco,
“porque o sofrimento não existe apenas no
Æm da vida. Como são cuidados
Os cuidados paliativos,
para responderem aos
vários aspectos do
sofrimento, têm de ser
um trabalho em equipa
RUI GAUDÊNCIO
especializados em tratar sofrimento e o
sofrimento não faz parte apenas do Ænal da
vida, não faria sentido… Mas foi assim que
eles nasceram. Os cuidados paliativos
nasceram como uma resposta aos doentes
que não tinham cura”.
O que é o sofrimento? É algo muito
individual, muito próprio de cada um e para
cada um é algo diferente. O sofrimento pode
ser físico, emocional, psicológico. Por isso é
que os cuidados paliativos, para responderem
aos vários aspectos do sofrimento, têm de ser
um trabalho em equipa. Tem de ser uma
equipa multidisciplinar, precisamente porque o
sofrimento tem multidimensões. E acaba por
ter de ser essa boa articulação, entre vários
proÆssionais, que vão responder às
necessidades das pessoas [1].
Os recursos que se gastam a destruir a vida
de pessoas e sociedades, através das guerras,
com o sofrimento e a destruição que
provocam, já era tempo de serem usados para
superar vinganças, ódios, que só aumentam a
dor no mundo.
O que fazer e como fazer? A primeira coisa é
a formação de proÆssionais que têm de
intervir, especialmente, os proÆssionais de
saúde — de medicina e enfermagem — de
serviço social e de psicologia.
Catarina Pazes é muito explícita: “Aquilo
que nós aprendemos quando fazemos a
formação em cuidados paliativos como
ferramentas para lidar com as adversidades…
quando agarramos nisso, quando vamos
aplicar isso com o doente e com a família, há
uma obrigatoriedade na verdade. Tem de ser
verdade, tem de ser completamente genuíno.
Ou seja, quando eu estou perante um doente,
que até pode ter uma doença avançada,
irreversível, e estou a trabalhar com ele a
possibilidade de ele conseguir sentir-se bem
apesar da doença, viver em pleno apesar da
doença, ser feliz apesar da doença, eu só posso
fazer isto se eu acreditar completamente que é
possível viver feliz apesar da doença. Se isto em
mim não for claro e não for verdade, não o
posso fazer, não consigo fazer este trabalho.
Exige um trabalho importante dentro de nós,
que é uma compensação enorme por termos
escolhido cuidados paliativos, porque nos
permite um contacto connosco próprios,
com a nossa fragilidade, com a nossa
vulnerabilidade” e ajudarmos quem sofre.
Tem de ser um trabalho feito com paixão.
2. Para trabalhar, neste campo, não é
indispensável perguntar se os cuidadores são
cristãos, mas que sejam competentes e
apaixonados pelo bem das pessoas, seja qual
for a situação religiosa, tanto dos que
beneÆciam como dos cuidadores.
Cristão é quem se reconhece e é
reconhecido como discípulo de Jesus de
Nazaré que passou a sua vida fazendo o bem,
como é dito nos Actos dos Apóstolos [2], ou
quando foi à sinagoga da sua terra e lhe
deram o texto de Isaías para ler que o tomou
como tarefa sua: O Espírito do Senhor está
sobre mim, porque ele me ungiu para
evangelizar os pobres; enviou-me para
proclamar a remissão aos presos e aos cegos a
recuperação da vista, para restituir a liberdade
aos oprimidos e para proclamar um ano de
graça do Senhor [3].
O capítulo 25 de S. Mateus distingue as
pessoas que cuidam das pessoas que não
cuidam, tanto sob o ponto de vista material
como afectivo. Saltou fora do esquema de
quem merece e de quem não merece, para ir
ao encontro de quem precisa de cuidados.
A liturgia deste domingo apresenta a Ægura
de Jesus como a do bom pastor que cuida das
suas ovelhas e dá a sua vida para que elas
tenham vida em plenitude [4]. O que
podemos fazer com esta linguagem? Que
Cristo e que vida cristã sugere? Não é preciso
ser grande exegeta para saber que este texto,
e outros semelhantes, não são tratados de
pastorícia, mas parábolas de acesso ao
mistério da revelação divina e ao mistério que
nós somos.
[1] Cf. Entrevista, 7Margens, 13.04.2024
[2] Act 10, 38
[3] Lc 4, 16-22
[4] Cf. Jo 10, 11-18
Escreve ao domingo

Afinal, o 25 de Abril pode não ser “para sempre”
A
Esther Mucznik
Revolução dos Cravos foi um
marco fundamental na longa
história de Portugal.
Eu estava em Paris havia
cerca de oito anos e, ao chegar
a Portugal umas semanas
depois do 25 de Abril, o país fervilhava de
entusiasmo com o Æm da ditadura e com essa
coisa, até então desconhecida, chamada
liberdade.
Nem tudo eram rosas: os saudosistas do
salazarismo não tinham desaparecido e a
violência contra a democracia ainda se fazia
sentir, sobretudo no Norte do país. Os
hábitos e os costumes também não se
mudam de um dia para o outro, tal como a
iliteracia e a resignação face a uma ditadura
que se eternizou durante 48 anos, o mais
longo regime autoritário do ocidente
europeu. Mas, sobretudo entre os jovens nos
quais eu me inseria, vivia-se um clima de
esperança, de solidariedade e sobretudo de
vontade de enterrar o passado cinzento do
salazarismo.
Nasci e cresci em Lisboa até ao Ænal da
adolescência e, depois de mais de dez anos
em Israel e em Paris, sabia o que era viver em
democracia, mas também em ditadura. Em
Portugal, como parte da minoria judaica,
apesar de termos liberdade de culto, éramos
considerados um corpo estranho à sociedade
A maior conquista de Abril
A
Francisco Porto Fernandes
ntes do 25 de Abril de 1974,
Portugal era um país cinzento,
esquecido num canto da
Europa. Atualmente, estamos
na senda do projeto europeu,
por uma sociedade mais justa
e equilibrada. Os tempos mudaram, a
sociedade foi progressivamente evoluindo
e certos comportamentos foram-se
alterando. Ser homossexual já não é crime,
as mulheres têm direito ao voto, o aborto
foi despenalizado, a liberdade de expressão
é uma realidade e todos têm acesso à
educação.
e na prática socializávamos apenas no nosso
casulo. Na realidade, era como se não
fossemos verdadeiramente parte do país,
apesar de termos cidadania portuguesa e as
mesmas obrigações legais da população.
Por isso, o 25 de Abril, para além do sabor
da liberdade, foi também um espaço possível
de identiÆcação, de partilha de sonhos e de
luta pela liberdade e pela igualdade de
direitos. Liberdade política, mas também
cultural, nomeadamente relativa à moral
social, à relação homem-mulher e pela
emancipação feminina de uma forma geral.
Mas nem tudo o que é bom dura para
sempre. O que ouvimos de Pedro Passos
Coelho na apresentação do livro Identidade e
Família traz de novo a memória de uma
época que considerávamos enterrada. Uma
época em que a Mocidade Portuguesa,
estrutura criada em 1936 por Salazar e cujo
Æm, segundo o respectivo decreto-lei, era
“estimular o desenvolvimento integral da sua
capacidade física, a formação do carácter e a
devoção à Pátria, no sentimento da ordem,
no gosto da disciplina e no culto do dever
militar”. Dirigida a ambos os sexos, à secção
feminina cabia “cultivar nas Æliadas a
previdência, o trabalho colectivo, o gosto da
vida doméstica e as várias formas do espírito
social próprias do sexo, orientando para o
cabal desempenho da mulher na família…”
Organização corporativa ao estilo do
fascismo mussoliniano, a Mocidade
Portuguesa tinha, como não podia deixar de
ser, um hino e uma farda. Uma das
proclamações obrigatórias durante os
exercícios era “Quem vive? Portugal,
Portugal, Portugal! Quem manda? Salazar,
Salazar, Salazar!”
Durante o Estado Novo, o pluralismo
cultural e religioso não tinha lugar. A Religião
É precisamente na educação que
encontramos o porto seguro da liberdade e
da democracia, porque sem educação não
há liberdade. Na Crise Académica de 1969,
os estudantes ousaram “pedir a palavra”,
denunciando a ditadura. A palavra não foi
dada, Æzeram-se greves com 85% de adesão
e os estudantes tiveram um papel
fundamental para a concretização de Abril.
Se, antes da revolução, a educação era para
elites e limitada, hoje, podemos celebrá-la
como uma das principais conquistas de
Abril. Em 1974, éramos 70 mil os estudantes
do ensino superior. Hoje, somos quase 500
mil. Agora, a Ælha de um analfabeto pode
ser médica. O conhecimento constitui a
arma mais valiosa de qualquer país. A
educação desperta a consciência humana e
é a principal defesa perante os discursos
extremistas e populistas que possam
seduzir os mais desiludidos com o regime.
Mas ainda não podemos comemorar
Abril. A injustiça social coletiva persiste de
forma silenciosa para alguns, mas ressoa
Católica Apostólica Romana era, na verdade,
a única religião, não só naturalmente a
religião dominante, mas a única com
legitimidade se não legal, pelo menos social,
a única religião reconhecida. A comunidade
israelita, relativamente bem integrada e
circunscrita, era tolerada, na condição de se
manter, individual e colectivamente, à
margem da vida política, e de manter um
“low profile”…
É com o Æm da ditadura e a instauração da
democracia que esta situação começa a
mudar. O Ænal da Guerra Colonial e a
implantação de novas minorias étnicas e
religiosas em território português, a entrada
de Portugal na União Europeia e sobretudo a
liberdade de pensamento, de expressão e de
circulação de ideias fazem surgir uma nova
atitude face à diferença religiosa e cultural.
Mas a democracia tem de ser defendida,
não é necessariamente eterna. Hoje vemos
levantarem-se vozes que, sem a porem em
causa verbalmente, defendem políticas que
na realidade a vão corroendo. Baseiam-se no
A democracia tem
de ser defendida, não
é necessariamente
eterna. Hoje vemos
levantarem-se vozes
que defendem políticas
que na realidade a vão
corroendo
muito alto para os jovens deste país:
Portugal não tem tido uma visão educativa
ambiciosa e equitativa. Apesar de o número
de estudantes que beneÆciam de bolsas de
estudo de ação social ter crescido mais de
26 vezes, desde o 25 de Abril, as
desigualdades sociais ainda persistem,
assim como as disparidades que
condicionam o acesso ao ensino superior e
constrangem a mobilidade social.
Apenas 44% dos estudantes com escalão
A de ação social que concluíram o ensino
secundário conseguiram transitar para o
ensino superior. Apenas 6% dos estudantes
mais carenciados conseguiram dar entrada
naquilo a que se chama cursos de
excelência e, em Portugal, 50% dos
estudantes do ensino superior
frequentaram explicações no ensino
secundário. A escola pública tem vindo a
perder eÆcácia na resposta aos desaÆos de
aprendizagem que decorrem das
desigualdades socioeconómicas. Urge
aÆrmar o ensino superior como elevador
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 9
descontentamento das populações face a
uma desigualdade crescente, às diÆculdades
cada vez maiores de acesso a coisas
essenciais como a saúde, a educação, a
habitação. São essas diÆculdades e esse
descontentamento que levam ao descrédito
crescente da democracia e que tornam muita
gente permeável às políticas conservadoras,
ao populismo bacoco, e progressivamente à
abertura a realidades políticas autoritárias.
Exemplos não faltam, sejam eles nos EUA, na
América Latina, no Médio Oriente ou na
Europa, países onde a extrema-direita,
populista ou não, está em crescimento. Em
Portugal, segundo o estudo sobre os 50 anos
de Democracia em Portugal recentemente
apresentado, apesar de uma larga maioria de
87% defender o regime democrático, 47%
apoiariam a existência de um líder forte,
mesmo sem eleições, e 23%, segundo o que
entendi, veriam o país a crescer com ideias
de Salazar.
Este ano festejamos os 50 anos da
Revolução dos Cravos, que mudou a nossa
vida. Para quem como eu viveu em Portugal
durante a ditadura, o valor e a importância da
liberdade e da democracia são o alicerce
fundamental da vida humana. Mas não tenho
a certeza de que as gerações que nasceram no
pós-25 de Abril tenham consciência do
mesmo. A eles, e em particular às escolas,
recomendo vivamente a visita ao Museu do
Aljube em Lisboa. Para terem uma ideia do
que foi a ditadura salazarista e
simultaneamente o papel fundamental da
resistência dos milhares de homens e
mulheres, na sua maioria do Partido
Comunista, enfrentando a tortura e a morte
em nome de um Portugal livre e igualitário.
Estudiosa de temas judaicos
social e não como reprodutor das
desigualdades já preexistentes.
No dia a seguir ao ensino superior,
também não temos grandes motivos para
celebrar. Em 2011, um jovem entre os 25 e
os 34 anos com um curso superior recebia,
em média, mais 200 euros, o que
representa uma diminuição de 30% do
poder de compra dos jovens portugueses.
Portugal é um dos países da União Europeia
onde os jovens saem mais tarde da casa dos
pais, aos 30 anos, não por comodismo, mas
devido aos baixos salários associados à
crise da habitação. Consequentemente,
30% dos jovens portugueses entre os 25 e
os 34 anos emigraram. Se já tivemos a
geração à rasca, hoje o 30 é o nosso triste
fado. Somos a Geração 30.
Por uma prioridade na educação e na
juventude, ainda vamos a tempo de
cumprir Abril.
Presidente da Federação Académica
do Porto
10 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Política 31.º Congresso do CDS
Após renascer,
Nuno Melo
quer CDS a
reconquistar a
direita perdida
Sem adversários que disputem a sua
eleição, Nuno Melo será reeleito cerca
de um mês depois das legislativas que
marcaram o regresso do partido à AR
Liliana Borges
Entre a “reinvenção” e a “reconquis-
ta” do espaço perdido na direita, o
CDS reuniu-se em Viseu para reaÆr-
mar o seu regresso ao Parlamento,
mas também ao centro da vida políti-
ca. Com críticas aos que decretaram
a morte do partido, Nuno Melo quis
mostrar a casa arrumada, com as con-
tas em ordem e em melhor estado do
que aquele em que a recebeu. Com
dois deputados eleitos, o líder centris-
ta aÆrmou que o seu grupo parlamen-
tar “vale mais do que 50 deputados”
e avisou que o CDS-PP não irá abdicar
da sua sede, no Largo do Caldas, em
Lisboa. “A nossa resistência pode
mais do que qualquer soberba”,
declarou.
Nuno Melo elogiou o “partido fun-
dador do regime democrático” que
não se diminuiu com a saída da
Assembleia da República, pois “não
vive de uns fogachos parlamentares”.
Num discurso centrado nos “momen-
tos difíceis” do partido em que “não
se deitou a toalha ao chão”, o líder
centrista insistiu que há razões para
o partido “estar feliz”, pois “não é
passado”. Depois de renascer, o CDS
quer crescer e para isso terá de falar
“para jovens e mulheres” e mostrar
“a sua marca”, aberta “a correntes
liberais e conservadores”.
Insistindo que o CDS não foi “uma
muleta do PSD”, nem “uma barriga
de aluguer” nas eleições legislativas
de 10 de Março, não sendo um parcei-
ro “menor” na coligação Aliança
Democrática, Melo garantiu que “o
CDS conta e não conta pouco”. Para
o líder do partido, o CDS “não se
mede nem nunca se mediu pela
ausência de dois anos na Assembleia
da República”, recordando o momen-
to em que a placa da sala do grupo
parlamentar foi retirada das paredes.
“Há dois anos prometi-vos que o meu
primeiro acto simbólico, mas político,
seria aparafusar [a placa] naquela
parede da Assembleia da República.
Apertei-a eu, está lá. Nunca mais de
lá sairá”, aÆrmou, levantando os con-
gressistas, que aplaudiram em força
o compromisso.
Depois de o actual líder pedir para
que se falasse às mulheres, Manuel
Monteiro, um dos autores do polémi-
co livro Identidade e Família, defen-
PAULO NOVAIS/LUSA
Nuno Melo diz que o seu
grupo parlamentar
“vale mais do que 50
deputados”
deu o deputado Paulo Núncio por ser
a favor de um novo referendo à lega-
lização do aborto em plena campa-
nha eleitoral. Na sua intervenção,
Monteiro aÆrmou que “a parede” à
direita do partido “caiu” e pediu aos
centristas que defendam “a ordem e
o bem comum”. “Estávamos habitua-
dos a estar sozinhos à direita”, notou.
“Por muito que nos custe, a parede
caiu. Alguma responsabilidade segu-
ramente temos nisso, não podemos
só culpar os outros”, reconheceu. E
dedicou-se a traçar diferenças face
ao Chega ou à Iniciativa Liberal.
Para Monteiro, se há “pessoas que
recebem subsídios indevidos”, esta
Para Paulo Portas,
é preciso agarrar
a oportunidade de
“provar bem, com
competência no
serviço”, que
o partido é
necessário
 Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 11

Política

RUI GAUDÊNCIO
CDS irá acompanhar o posiciona-
Críticas ao IRS são mento do Tribunal Constitucional.
“A vida humana, quer no início da
sinal do “exotismo gestação como no Æm do seu perío-
do, continua a ser uma prioridade
dos tempos” do CDS”, disse.

P
ara o presidente do
CDS-PP e ministro de
Estado e da Defesa, Nuno
Melo, a redução das taxas
de IRS decidida pelo
executivo liderado por Luís
Montenegro corresponde
rigorosamente ao que foi
anunciado durante a
campanha eleitoral, sendo
“um sinal de coerência que só
não lê quem não quer”.
Para Nuno Melo, a polémica
em torno da redução das taxas
de IRS “ajuda a perceber o
exotismo dos tempos”. “Pelos
vistos o pecado é a coligação,
a Aliança Democrática [PSD,
CDS-PP e PPM] baixar mais os
impostos do que aquela que
era a proposta do PS”, ironizou
o centrista, à chegada do 31.º
congresso.
Para o líder centrista, “o
drama é o facto de a AD ter
reduzido mais os impostos,
nomeadamente sobre o
trabalho, do que aquela que
era a proposta do PS”, disse,
desvalorizando as críticas da
oposição à modesta redução
de IRS que foi anunciada na
sexta-feira, face aos cortes já
em vigor e que estavam
inscritos no Orçamento do
Estado para 2024, da autoria
do Governo socialista de
António Costa.
atribuição deve ser combatida, inde-
pendentemente da sua origem.
Demarcando-se ainda mais do Chega,
Monteiro disse que “a verdadeira
direita não aceita que existam movi-
mentos inorgânicos na polícia”, nem
compactua com “pessoas que amea-
çam fazer greves contra a lei”, mesmo
que defendam as forças de segurança.
E virando-se para os “amigos da Ini-
ciativa Liberal”, o ex-líder do CDS
aÆrmou que os centristas “preservam
a autonomia pessoal de cada portu-
guês, mas não confundem o indivi-
dualismo extremo com o bem da
comunidade” e rejeitam a privatiza-
ção “de tudo e mais alguma coisa”.
Quando assumiu a palavra, Paulo
Núncio também fez questão de ace-
nar com as bandeiras do CDS, como
o combate à corrupção e a valoriza-
ção e digniÆcação das Forças Arma-
das e de segurança. No rescaldo da
aprovação do primeiro pacote de
redução Æscal, o líder parlamentar
do CDS insistiu na redução dos
impostos. Sem falar directamente da
interrupção voluntária da gravidez
(IVG), Núncio defendeu o bloqueio
da lei da eutanásia, aÆrmando que o
Portas pediu “competência”
O mesmo assinalou Paulo Portas,
mas à distância. Dias depois de Pedro
Passos Coelho ter aÆrmado que a
troika não conÆava no então líder
centrista, o antigo presidente do
CDS-PP escapou-se aos microfones
dos jornalistas e não esteve presen-
cialmente no congresso do CDS-PP.
Numa mensagem gravada em vídeo,
Paulo Portas, que liderou o partido
entre 2007 e 2016, aÆrmou que o
CDS-PP é “um dos partidos resisten-
tes e persistentes e por isso fundado-
res da democracia portuguesa e
haverá sempre eleitores para o defen-
der e militantes para o proteger”.
O ex-líder centrista repetiu a men-
sagem transmitida horas antes por
Nuno Melo, avisando que é preciso
agarrar a oportunidade de “provar
bem, com competência no serviço”,
que o partido é necessário. Paulo Por-
tas assinalou que o conclave ocorre
semanas depois de os portugueses
“terem dito que querem alternância
e mudança”, alegando que “não há
democracia sem alternância”. “Todos
sabemos que quando as democracias
deixam de ter alternância se transfor-
mam numa Æcção”, avisou.
Sem se referir a outros partidos,
Portas apostou na mensagem que já
tinha repetido durante a campanha
eleitoral para defender que “na era
dos extremos” nada é mais necessário
do que “convicção com moderação”.
E pediu “competência” para “comba-
ter a demagogia”. Para isso, deixou
uma lista de encargos que passam por
apostar nos quadros do partido. Para
que o CDS não volte a “desaparecer”,
Portas insiste que o espaço centrista
deve ser “alargado”, com “doutrina”,
mas “tendo tolerância com ideias
diferentes”.
Das vozes de ex-deputados tam-
bém se ouviram avisos para não se
repetir “erros do passado” e ataques
ao anterior executivo, em particular
ao ex-ministro das Finanças. Depois
de uma semana com o actual ministro
das Finanças, Joaquim Miranda Sar-
mento, debaixo de fogo por causa da
confusão em torno dos números da
redução do IRS, os centristas ajusta-
ram o ataque ao antecessor de Miran-
da Sarmento. Cecília Meireles, uma
das centristas mais aplaudidas, ata-
cou Fernando Medina pela redução
“artiÆcial” da dívida que “arrisca pen-
sões futuras”.
Paulo Núncio, líder parlamentar do
CDS-PP, anunciou que o partido irá
pedir a audição de Medina para
conhecer as “explicações” sobre “a
redução artiÆcial da dívida com
dinheiro das pensões dos portugue-
ses”, numa referência ao relatório da
Unidade Técnica de Apoio Orçamen-
tal (UTAO).
Francisco Paupério quer conquistar pela primeira vez representação no Parlamento Europeu para o Livre
Francisco Paupério é o cabeça
de lista do Livre às europeias
Liliana Borges
O Livre, único partido com
representação parlamentar
a fazer eleições primárias
para escolher candidatos,
elegeu o biólogo de 28 anos
Depois de quase terem sido alteradas
as regras das eleições primárias do
Livre a meio do processo eleitoral,
Francisco Paupério, o candidato mais
votado na primeira volta, conÆrmou
a sua vitória ao tornar-se o candidato
com mais votos na segunda volta das
primárias. Será o cabeça de lista do
partido na corrida para o Parlamento
Europeu, a 9 de Junho. Em declara-
ções ao PÚBLICO, Francisco Paupério
diz-se “honrado” por poder encabe-
çar a lista do Livre e está conÆante na
possibilidade de o partido conquistar,
pela primeira vez, representação no
Parlamento Europeu.
Natural de Leça da Palmeira, o
investigador de 28 anos foi o número
três do Livre no círculo do Porto nas
eleições legislativas. No partido, é
ainda membro da assembleia do par-
tido desde 2022 e é relator do círculo
temático Europa. Agora, Francisco
Paupério, que se encontra a concluir
o doutoramento em Biologia Integra-
tiva e Biomedicina no Instituto Gul-
benkian de Ciência, quer levar a
“mensagem feminista, ecologista e de
esquerda europeísta até Estrasburgo
e Bruxelas e dar representação ao
Livre no Parlamento Europeu”.
Já de olhos postos na campanha e
a menos de dois meses das eleições,
Paupério disse ter Æcado “muito satis-
feito com o resultado na segunda
volta” e com o reforço “de votos inter-
nos e externos” e acredita agora na
mobilização não apenas dos militan-
tes, mas também dos simpatizantes
do Livre.
De acordo com os dados a que o
PÚBLICO teve acesso, a segunda volta
de votações das primárias abertas
terminou às 23h59 de sexta-feira e
teve a participação de 39% do colégio
eleitoral de membros e apoiantes, que
corresponde a 588 membros e apoian-
tes, e uma participação de 62% do
colégio eleitoral de inscritos externos,
que corresponde a 436 inscritos.
Os resultados, ordenados em razão
da regra da paridade, foram os seguin-
tes: Francisco Paupério (5667,75 pon-
tos), Filipa Pinto (3777,2 pontos),
Carlos Teixeira (3125,91 pontos),
Mafalda Dâmaso (3032,88 pontos),
Tomás Cardoso Pereira (2343,99 pon-
tos) e Inês Pires (2164,39 pontos).
Polémica com primárias
A eleição de Paupério ocorre depois
de a comissão eleitoral ter adiado a
votação nas primárias para a escolha
dos candidatos por 24 horas e restrin-
gir os critérios de participação na
eleição para apenas membros e
apoiantes, o que seria inédito no par-
tido. Em causa, lia-se no comunicado,
estava o “número excessivo de votos
únicos (aqueles que provêm de um
eleitor que apenas ordena um candi-
dato)” no nome mais votado: Francis-
co Paupério.
O comunicado reconhecia que o
boletim de voto “permite a ordenação
não obrigatória de seis candidatos,
mas de um número de entre 1 a 6”,
não sendo explícito que a validade do
voto dependa do voto em mais do que
um candidato, e que “o fenómeno
dos votos únicos em um único candi-
dato não é estranho ao outro tipo de
votantes que integra o colégio eleito-
ral, os membros e apoiantes”. Porém,
argumentava o órgão, os números em
eleições anteriores foram “substan-
cialmente inferiores”.
No entanto, e depois de mais de
100 membros e apoiantes terem subs-
crito um abaixo-assinado em que
apelavam a um recuo na “decisão
insensata” da comissão eleitoral, o
conselho de jurisdição decidiu rever-
ter a restrição do direito de voto na
segunda volta das primárias para as
europeias a apenas membros, consi-
derando que “não foram apuradas
condutas concretas que traduzam
uma viciação do processo”.
Na rede social X, o co-porta-voz do
Livre, Rui Tavares, escreveu que o
objectivo das primárias “é ordenar
listas e construir equipa”. “E é esta
equipa que agora vai trabalhar em
conjunto para levar a estas eleições
as ideias do único partido da esquer-
da verde europeísta em Portugal”,
declarou. Rui Tavares agradeceu ain-
da “a todas e todos os candidatos que
de forma leal e sincera se empenha-
ram nestas primárias”.
A aprovação Ænal da lista ordenada
de candidatos do Livre às europeias,
encabeçada por Paupério e em segun-
do lugar por Filipa Pinto, será oÆcia-
lizada na próxima assembleia do
partido, a 28 de Abril.
12 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Política
A mentira no debate público:
o grau zero da política
Opinião
António Costa Silva
Em 2023, apareceram no espaço
público notícias e comentários
sobre Portugal estar a ser
ultrapassado pela Roménia e ser o
pior e mais pobre país da UE, ter
um crescimento económico
desastroso e o PIB per capita mais
baixo da Europa. Estas notícias
varreram o espaço público, as
televisões, os jornais, o
Parlamento.
Entretanto, o Eurostat divulgou
os dados sobre o desempenho
económico dos países europeus
em 2023 e Portugal não foi
ultrapassado pela Roménia. O PIB
per capita português em paridade
do poder de compra é de 83% da
média da UE e o da Roménia é de
78%. Mais: Portugal não é o último
país do ranking europeu, é o 18.º
em 27 e subiu três posições em
2023. E, ao contrário da opinião
dominante, Portugal voltou a
ultrapassar a Polónia e a Hungria.
A economia portuguesa cresceu
2,3% e foi uma das que mais
cresceram na Europa em 2023:
quatro vezes acima da média
europeia.
Estes resultados não nos devem
deslumbrar porque ainda há muito
caminho a percorrer para nos
aproximarmos do pelotão da
frente. Mas são resultados
importantes porque foram obtidos
numa conjuntura internacional
adversa, com várias guerras e uma
cascata de crises simultâneas.
Estes resultados devem-se ao
dinamismo e resiliência dos
empresários e da economia
nacional; ao apoio de políticas
públicas que permitiram
salvaguardar e estimular o tecido
produtivo; ao crescimento
sustentável das exportações; à
aposta consistente nas
qualiÆcações e na inovação,
trazendo-as para o chão de fábrica;
à atração de investimento externo;
à capacidade para diversiÆcar os
motores da economia.
Os factos são devastadores e
mostram como o debate público
em Portugal está viciado por
falsidades que são debitadas
continuamente e distorcem tudo.
O escritor Mark Twain disse que
enquanto a verdade está a calçar
os sapatos, a mentira já deu duas
vezes a volta ao mundo. Num país
A Salvador Caetano construiu o veículo eléctrico APM, que estará
nos Jogos Olímpicos de Paris 2024
em que as boas notícias não são
notícia, a opinião pública é
constantemente exposta a um
turbilhão de notícias negativas que
quase nunca têm o contraponto
daquilo que o país faz bem. Há
muito talento em Portugal e o país
faz muitas coisas bem.
No âmbito das Agendas
Mobilizadoras do PRR, programa
de apoio a consórcios de
empresas, universidades,
politécnicos e centros
tecnológicos para a aposta na
inovação e na criação de novos
produtos e serviços de alto valor
acrescentado, temos uma
empresa, a Salvador Caetano, que
no âmbito da Agenda “Be Neutral”
construiu o veículo elétrico APM,
que ganhou o concurso para
fornecer parte da frota dos Jogos
Olímpicos de Paris e já está a
exportar para França; temos a
Bosch Portugal, que com a Agenda
“Illiance” criou um esquentador
elétrico instantâneo, que substitui
os convencionais e reduz a pegada
carbónica dos edifícios, bem como
soluções mais sustentáveis das
bombas de calor, que estão a
desenhar um novo paradigma
para o sector; a Technophage, que
na Agenda “Bio-Hub”, criou uma
solução com produtos biológicos
para o tratamento do pé diabético
e registou a patente, com
resultados notáveis; a Oceano
Fresco, que com a Agenda
ESTELA SILVA/LUSA
“Inovamar”, desenvolveu um
projeto pioneiro no mundo de
aquacultura sustentável, criou
uma Æleira de produção de
proteínas para a alimentação
humana com base em bivalves,
lançou na Nazaré uma
maternidade de espécies que
estavam em extinção,
posteriormente levadas para um
viveiro em mar aberto no Algarve,
que é hoje um santuário da vida
marinha; a Unbabel lidera uma
Agenda de Inteligência ArtiÆcial,
que criou uma aplicação para
apoio a doentes com esclerose
lateral amiotróÆca, aumentando a
sua capacidade de comunicação,
em que a própria voz dos doentes
é recuperada e reconstruída, o
O que se faz bem
quase nunca tem
a relevância que
deve ter porque
isso não interessa
à narrativa
dominante, à ideia
de que somos
os piores de todos
que tem efeitos psicológicos
extraordinários.
Estes são alguns exemplos do
que se faz bem em áreas de ponta
num país deformado pela
desinformação. O que se faz bem
quase nunca tem a relevância que
deve ter porque isso não interessa
à narrativa dominante, à ideia de
que somos os piores de todos. O
pensador Yuval Noah Harari disse
que a espécie humana tende a
pensar com base em narrativas e
não com base em factos, em
números e em equações. Isso é
bem visível com a contínua
disseminação da narrativa do
atraso da economia portuguesa,
apesar das mudanças em curso e
dos resultados alcançados.
A consequência da mentira é
ocultar a luz no espaço público e
torná-lo obscuro. E um espaço
público obscuro é o caminho mais
curto para minar a conÆança e a
democracia. Ao permitir o
domínio da mentira e da confusão,
parece que a verdade não
interessa. Como já ouvi “não sei se
é verdade ou mentira, mas soa a
verdade”, e como soa a verdade
aqui vamos nós.
Isto é profundamente errado e
perigoso. A verdade não pode ser
um passatempo para culto em
momentos festivos. Como disse
Hannah Arendt, a verdade é o que
nos liga a todos nas sociedades
democráticas. Sem ela, a
obscuridade impera, os factos
desaparecem, as opiniões
desligadas dos factos prevalecem,
o real não se distingue da Æcção, a
verdade é atacada pela força
esmagadora da tagarelice
mediática, que aniquila o sentido.
Sempre existiu e existirá a mentira
no espaço público, mas o que se
passa é que hoje ela impera,
dissemina-se rapidamente, o que é
facilitado pela diminuição do
pensamento critico e pelo
enfraquecimento do poder de
mediação dos media. A
fragmentação das fontes de
informação e as redes sociais
criaram um mundo atomizado em
que as mentiras e os rumores
dominam e alimentam o ódio e o
ressentimento.
A responsabilidade dos que
amam a democracia é defender
sempre a verdade e o primado dos
factos, dar luta à falsidade e pugnar
para que a vida democrática seja
sempre clariÆcada e articulada
pela razão.
Ex-ministro da Economia
Imigrantes:
Montenegro
promete maior
agilidade
Primeiro-ministro
encontrou-se com
homólogo cabo-verdiano na
Praia e abordou a questão
da demora nos vistos
O primeiro-ministro, Luís Montene-
gro, disse ontem que “o que se pode
esperar de Portugal é respeito pela
dignidade das pessoas” e maior agili-
dade em matéria de vistos para entrar
no país e tratamento do Çuxo migra-
tório. O líder do Governo português
falava numa conferência de imprensa
conjunta com o primeiro-ministro
cabo-verdiano, Ulisses Correia e Silva,
na capital do arquipélago, Praia.
Não há alteração de regras com o
novo Governo, esclareceu, conside-
rando natural que haja “regras mais
ágeis” com países com maior proxi-
midade como Cabo Verde ou outros
que falem português. “Isso não está
em causa, que fique claro”, referiu.
“Agora, infelizmente, é uma evidência
que temos acumulado problemas na
agência que substituiu o Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras [SEF] no
que toca ao atendimento e prontidão
de resposta. E isso está a prejudicar
muito as pessoas”, referiu.
Além dos problemas imediatos no
acolhimento, fomenta “a utilização
do sofrimento por redes que se apro-
veitam da vulnerabilidade para extor-
quir recursos”, acrescentou. “É inten-
ção do Governo português ter uma
política de portas que não são nem
escancaradas, nem fechadas, uma
política de regulamentação no respei-
to pelos direitos”, disse, prometendo
“mais agilidade neste processo”.
“A ideia de que podemos funcionar
sem regras é utópica, nem tem van-
tagens para quem procura qualidade
de vida”, mas, por outro lado, “a ideia
de fechar portas e frustrar a mobili-
dade” também não é viável, pelo que,
“é no equilíbrio que nos estamos a
concentrar, com mecanismos mais
ágeis”, disse. “Infelizmente, nos últi-
mos anos, a procura por soluções
mais ágeis acabou por levar ao entu-
pimento dos serviços e temos de fazer
algumas coisas” para os “desentupir”,
porque “não estão a dar uma reposta
capaz”, acrescentou.
Os líderes concordaram ainda que
Portugal vai acolher a próxima
cimeira bilateral com Cabo Verde a
19 de Novembro. Relações especiais
merecem “eventos especiais”, refe-
riu Montenegro, acrescentando que,
à margem, haverá um encontro bila-
teral entre empresários e agentes
económicos dos dois países. Lusa
 DA
TA
EN
M
AU
E

Acontinua
REVOLUÇÃO
A
ST
VI
RE
ÃO
IÇ
ED

dentro de momentos
O diálogo entre um fotógrafo que viveu de perto a Revolução de 1974 e o seu filho serve de mote a este livro de BD para
explicar de forma simples, mas rigorosa, os antecedentes deste marco histórico e as portas que o 25 de Abril abriu.
Reedição revista e aumentada 25 anos depois da sua criação, quando se comemoravam os 25 anos do 25 de Abril.
No 50.º aniversário da Revolução dos Cravos, este livro mantém a sua actualidade e pertinência,
tal como o momento histórico de que fala.
Um caminho que deve continuar a ser trilhado por todos,
neste tempo de ameaças aos direitos conquistados por Abril.
Uma revolução interior em contínuo.

BD EM
CAPA A
NAD
CARTO

+11,90€
SÁBADO, 27 ABR.

COMPRE AQUI

loja.publico.pt
14 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024

Sociedade Pendências podem chegar a um ano

Estado só tem
50 inspectores
para Ɗscalizar
se 2600 lares
cumprem a lei
Falta de inspectores leva a acções
“apenas reactivas”. Existem 2606 lares
registados, mas pelo menos mais 1500
clandestinos ou sem licença
Æscalizações são só reactivas”, diz a
Ana Dias Cordeiro
inspectora Fátima Rodrigues, que
O universo de lares registados tem preside à AISS.
vindo a aumentar, pelo menos desde Responder rapidamente a todos os
2020, e o mesmo acontece com os pedidos ou denúncias — que chegam
idosos que procuram cuidados nestas de particulares ou entidades da saú-
estruturas. Isso não se reÇecte num de, de apoio à vítima ou dos centros
qualquer reforço dos inspectores da distritais da Segurança Social, através
Segurança Social com a competência das suas equipas técnicas — é impos-
de, em acções de Æscalização, identi- sível. Há situações em que poderá
Æcarem os incumprimentos na lei na haver uma pendência a rondar um
rede de equipamentos sociais, que ano, devido à escassez de inspectores,
não se restringe a lares para idosos, e continua a responsável.
situações que podem, ou não, conÆ# “Uma priorização é garantida” para
gurar crime. Pelo contrário: este que os casos com indícios mais graves
número tem vindo a baixar. sejam logo atendidos, assegura Fáti-
Este ano, estão em actividade 50 ma Rodrigues, como os indícios que
inspectores para todo o continente revelem que os utentes podem não Inspectores têm a seu cargo ilegais para idosos, não contabilizadas e a saúde dos utentes, ou mesmo a
onde o Instituto da Segurança Social estar bem. Já se for uma residência lares, creches, amas, centros de nas 2606 registadas. E, sobretudo sua vida, podem nunca vir a ser cor-
contabiliza 2606 estruturas residen- sem licença, mas na qual as pessoas dia, entre outros equipamentos nestas, sem as inspecções, as situa- rigidas ou desocultadas. Pode ser
ciais para pessoas idosas (ERPI) regis- estão bem cuidadas, a Æscalização ções que comprometem o bem-estar falta de pessoal ou pessoal sem for-
tadas e em funcionamento (dados de não é avaliada como prioritária. mação adequada, o que, de acordo
Dezembro de 2023), com capacidade Ao retrato possível através dos com os inspectores no terreno, acon-
para 103.566 utentes. É o valor mais números, há que juntar duas agravan- Um quinto dos inspectores da Segurança Social tece com frequência e é susceptível
baixo de inspectores dedicados a esta tes. A primeira: além das 2606 estru- para fiscalizar equipamentos sociais de comprometer a segurança e os
área dos últimos seis anos, à excepção turas que funcionam, de acordo com Norte Centro LVT Alentejo Algarve Total cuidados prestados aos utentes,
de 2021, quando também só havia 50. o ISS, “ao abrigo de acordo de coope- havendo situações em que a ausência
Um concurso aberto permitiu refor- ração ou de título de autorização”, há NFES* 18 10 17 6 5 56 de cuidados pode conÆgurar um mau
2019
çar a equipa em quatro elementos no muitas centenas de lares, por todo o Total** 72 54 62 26 19 233 trato (e um crime).
ano seguinte, 2022, Æcando 54 inspec- país, sem licença ou clandestinos Pode ser ainda o estado de insalu-
tores com essa missão. (sem licença e sem quaisquer condi- NFES 16 10 15 6 5 52 bridade das instalações, ou o incum-
2020
Ainda de acordo com os dados da ções). Uma estimativa em 2020 e Total 65 51 51 24 18 209 primento das regras de higiene ou do
Associação dos Inspectores da Segu- 2021, resultante de um levantamento número de camas por quarto — com
rança Social (AISS), enviados a pedido mais exaustivo feito com o apoio da NFES 15 10 14 6 5 50 efeito no incumprimento do espaço
2021
do PÚBLICO, o número de inspecto- Protecção Civil, para garantir o trata- Total 65 51 47 23 18 204 mínimo previsto entre as camas.
res para equipamentos sociais baixou mento e a vacinação contra a covid-19 Há também situações em que não
para 51 em 2023 e para 50 já este ano, a todos os idosos em todos os lares, NFES 14 12 17 6 5 54 é cumprido o número mínimo de
2022
voltando aos valores de 2021, depois apontava para cerca de 1900 ilegais. Total 76 52 63 25 22 238 casas de banho para o universo de
de em 2019 e em 2020 ter havido, res- A segunda agravante: os 50 inspec- utentes residentes, sendo também
pectivamente, 56 e 51 inspectores. Ao tores Æscalizam não apenas lares mas NFES 14 10 16 6 5 51 frequente a sobrelotação. Ou em que
longo destes anos, as solicitações tam- também creches, amas, centros de 2023 há incumprimento dos rácios míni-
Total 72 49 64 23 22 230
bém aumentaram. dias e lares de infância e juventude, mos entre utentes e cuidadores, auxi-
“Os casos são cada vez mais fre- embora os lares para idosos represen- NFES 13 10 16 6 5 50 liares, ou proÆssionais de saúde — em
quentes, porque cada vez entram tem a grande fatia do seu trabalho. 2024 função dos requisitos obrigatórios na
Total 70 48 63 23 22 226
mais denúncias e mais graves. Já não No trabalho dos inspectores, dois lei. E podem ser detectadas falhas na
temos capacidade para fazer outro terços das inspecções realizadas (e *Núcleo de Fiscalização de Equipamentos Sociais **Não estão incluídas as chefias
regularidade das visitas da equipa
tipo de Æscalização que não seja resul- desencadeadas habitualmente por clínica ou na realização de actividades
tante de uma denúncia. As nossas denúncia) dizem respeito a estruturas Fonte: Associação dos Inspectores da Segurança Social PÚBLICO habitualmente a cargo de Æsiotera-

Reforço aprovado em 2022. Concurso não abriu
A
abertura de 35 postos de
trabalho para inspectores
que fiscalizam os
equipamentos sociais
estava prevista no mapa de
pessoal da Inspecção do
Instituto da Segurança Social
(ISS), aprovado pela instituição
sob a tutela do Ministério da
Segurança Social, em 31 de
Dezembro de 2022. Essas vagas
ainda não foram abertas, tendo
o processo ficado parado no
Ministério das Finanças, como
explica a presidente da
Associação dos Inspectores da
Segurança Social (AISS), Fátima
Rodrigues, para quem seria
urgente reforçar as equipas.
Tanto mais que a média de
idades para todo o universo de
inspectores — que inclui além
dos 50 do Núcleo de
Fiscalização de Equipamentos
Sociais, 144 que fiscalizam
contribuintes do sistema de
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 15
NELSON GARRIDO
Segurança Social e 32 para a
investigação criminais que
fazem a instrução de crimes
contra a Segurança Social — é
de 50 anos. E há actualmente 42
inspectores com mais de 55
anos, tendo sete deles entre 65
e 69 anos e 15 idades entre os
60 e os 64 anos. Só em Março
deste ano, o anterior Governo
ainda em funções publicou em
Diário da República o despacho
de descongelamento que
formaliza a aprovação do
recrutamento de inspectores
para todas as áreas de
actividade, entre as quais 35
para os equipamentos sociais.
Questionado, o ISS justifica que
o despacho do Governo anterior
“é bastante recente” e assegura
que “estão a ser avaliados e
desencadeados os
procedimentos internos
necessários para se proceder à
abertura dos concursos”.
Circulação Condicionada | A41
Na A4 e A41, de 24 de abril a 4 de maio, das 21h às 07h, realizaremos
peutas, assistentes sociais, animado- trabalhos de beneficiação do pavimento, que implicarão alguns desvios
res e outros proÆssionais, que podem e condicionamentos de tráfego nas seguintes vias de acesso:
afectar directamente a saúde física e
psíquica, com agravamento do isola- Nó Vias afetadas
mento e ausência de estímulos. Pode
A4 Sendim Acesso da A4 à A28, sentido Vila Real/Porto
ser ainda, entre outras situações, ali-
mentação indevida. Saída da A41, sentido Matosinhos/Porto
Os 50 inspectores do Núcleo de
Entrada na A41, sentido Vila do Conde/Alfena
Fiscalização de Equipamentos EN13
Sociais, de acordo igualmente com os Saída da A41, sentido Matosinhos/Vila do Conde
A41
dados enviados pelo gabinete de
Saída da A41, sentido Alfena/Vila do Conde
imprensa do Instituto da Segurança
Social, cobrem cinco regiões e 18 dis- Z.I.
Saída da A41, sentido Matosinhos/Z.I. Maia
tritos, havendo situações em que os Maia/EN14
inspectores baseados no Porto, Coim-
bra, Lisboa, Faro e Évora chegam a Os condicionamentos e desvios estarão
percorrer 250 quilómetros para ir e devidamente sinalizados nos locais.
outros 250 quilómetros para voltar, Para mais informações consulte regularmente o
no mesmo dia. As inspecções são site Ascendi utilizando o código QR ao lado, aceda a
sempre realizadas de surpresa, haven- www.ascendi.pt ou ligue 229 767 767 (24H).
do, em muitos casos, a necessidade Ascendi Grande Porto, Auto-Estradas do Grande Porto, S.A.
de voltar ao mesmo local mais de uma
vez, e de novo sem aviso prévio, para
terminar a inspecção.
Quando há matéria suÆciente para
o conselho directivo do ISS avançar
para uma ordem de encerramento, a
equipa regressa num período entre
30 a 45 dias depois de aÆxado o aviso
de encerramento para se certiÆcar Beneficiação do Pavimento
que a ordem foi cumprida. Depois
disso, não voltam, a menos que haja Aveiro Sul – Albergaria (A1)
nova denúncia. E, muitas vezes, os
lares reabrem, apesar da ordem de Durante os meses de abril a dezembro de 2024
encerramento.
Em 2020, eram 2561 ERPI com A Brisa Concessão Rodoviária (BCR) informa que irá efetuar obras de beneficiação
capacidade para 101.919 pessoas, do pavimento, no Sublanço Aveiro Sul – Albergaria (A1/IP5), da A1-Autoestrada do Norte,
números abaixo dos observados pelo que irão existir constrangimentos, por meio de implementação de cortes
de via e/ou basculamentos de tráfego.
actualmente. Este é um sector em
crescimento, sem o correspondente Os trabalhos ocorrerão durante oito meses.
reforço de pessoas para garantir o que
A Brisa agradece antecipadamente a compreensão e colaboração dos automobilistas
o Governo anterior, pela voz da ex-
e espera contribuir para reduzir eventuais inconvenientes decorrentes desta operação,
ministra do Trabalho, Solidariedade
estando certa de que os possíveis incómodos serão largamente compensados
e Segurança Social, Ana Mendes Godi-
pelo nível de qualidade, segurança e conforto que resultam de uma autoestrada
nho, prometia: que a Segurança
mais bem-adaptada às necessidades de quem a utiliza.
Social seria “completamente impla-
cável” nos casos de maus tratos a ido- Para informação de trânsito atualizada poderá consultar o site www.brisaconcessao.pt.
sos em lares, no sentido de os encer-
rar sempre que os indícios fossem
suÆcientes, e sempre relevando o
Melhoramos a pensar em si
investimento feito na requaliÆcação
das respostas sociais.
Na perspectiva dos inspectores que
todos os dias fazem este trabalho, e
alguns há longos anos, na categoria
CONHEÇA AS NOSSAS
de maus tratos, não se incluem ape-
nas insultos verbais ou agressões físi-
cas. Há circunstâncias graves decor-
rentes das instalações ou da ausência
de cuidados adequados. Num lar
licenciado, entre os que têm acordo
COLECÇÕES DE MÚSICA
de cooperação com a Segurança
Social, uma inspecção de 2014 con-
cluiu que alterações urgentes se
impunham: para mais de 90 utentes,
havia três casas de banho, o que os
obrigava a usar um bacio, colocado
nos quartos; e alguns dos quartos
tinham cinco e seis pessoas, coloca-
das em camas não articuladas, ao
contrário dos requisitos, e também
isso foi assinalado num relatório da
Segurança Social, entre outros aspec-
tos. Só oito anos mais tarde, este lar
foi objecto de nova Æscalização, moti-
vada por denúncia de familiar de um
utente: a lista de incumprimentos
mantinha-se intacta. MAIS INFORMAÇÕES: loja.publico.pt | 210 111 010

Vê aqui
o programa
ISEP | ONLINE | 22 DE ABRIL | 15h
Tecnologia e fraude
académica.
Como está o ensino superior
a lidar com o problema?
O rápido crescimento de plataformas de
Inteligência Artificial é uma nova fronteira para
a originalidade e o pensamento crítico. Como
estão as instituições de ensino, em particular as
de ensino superior, a lidar com este fenómeno?
O ensino e a avaliação tal como a conhecemos
ainda fazem sentido face a esta nova realidade?
Samuel Silva – PÚBLICO (Moderador)
Maria João Viamonte – Presidente do Instituto
Superior de Engenharia do Porto
Paulo Peixoto – Pró-reitor da Universidade
de Coimbra e membro do Instituto Internacional
para a Pesquisa e a Ação sobre Fraude
Académica e Plágio
Rodrigo Portela – Presidente da Associação
de Estudantes do ISEP
COM O APOIO DE:
16 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Sociedade
Médicos elegem quatro prioridades
para o Governo, ministra diz querer
dialogar “com lealdade”
Salários e 35 horas semanais
estão entre as questões mais
urgentes para a Fnam, cujo
conselho nacional esteve
ontem reunido
A presidente da Federação Nacional
dos Médicos (Fnam) identiÆcou
ontem como prioridades para o
encontro da próxima sexta-feira com
o Governo não apenas os salários e
as 35 horas semanais, mas também
a integração dos médicos internos
na carreira e as progressões.
Após a reunião do conselho nacio-
nal da Fnam, em Coimbra, Joana
Bordalo e Sá salientou que o grande
interesse do sindicato passa por “ter
mais médicos no Serviço Nacional
de Saúde”.
O conselho nacional esteve a
“rever as propostas” que estiveram
em cima da mesa nas negociações
com o anterior executivo do PS, dis-
se Joana Bordalo e Sá, lamentando
que este não tenha sido “capaz de
as incorporar e chegar a um acordo
razoável”.
“A proposta que adequámos ao
momento actual foi a de renegociação
da carreira médica e da tabela sala-
rial. A questão da valorização das
grelhas salariais, no sentido de repor-
mos o poder de compra, é algo pelo
qual vamos continuar a batalhar.”
Joana Bordalo e Sá exigiu também
a reposição das 35 horas semanais
para os médicos e defendeu uma
maior progressão na carreira pro-
Æssional, “seja nos concursos — e
que possam ser rápidos e imple-
mentados —, seja na progressão por
escalões”.
Por último, referiu a questão dos
médicos internos como outra das
prioridades, ao lembrar a sua eleva-
da representação entre os proÆssio-
nais do SNS, mas cujo tempo não
conta ainda para a carreira.
“Têm de ser integrados na carrei-
ra médica, isso é algo de que não
abrimos mão”, aÆrmou a líder da
Fnam.
Questionada sobre a proposta de
aumento salarial que chegaram a
apresentar ao anterior Governo
socialista, e que rondava os 30%,
Joana Bordalo e Sá evitou Æxar per-
centagens e destacou que “nunca
foi só uma questão salarial”, mas
admitiu entender ser “o necessário
para repor o poder de compra” des-
tes proÆssionais.
Já em relação ao encontro de sex-
ta-feira com a nova ministra da Saú-
de, Ana Paula Martins, a presidente
Joana Bordalo e Sá
da Fnam garantiu estar “de boa-fé”
para “iniciar um processo negocial”
e manifestou o desejo de que não
existam “negociatas ou jogadas obs-
curas” ao longo desse processo. A
reunião da Fnam com o Ministério
da Saúde está marcada para as 11h
do dia 26 de Abril.
Ministra quer “ir longe”
Também ontem, a ministra da Saú-
de aÆrmou “não ter limites a priori”
nas negociações com os sindicatos
dos médicos, enfermeiros e farma-
cêuticos, admitindo desconhecer
ainda os cadernos reivindicativos
destes proÆssionais de saúde.
“Os sindicatos, nas reuniões que
vamos fazer, apresentarão o seu
caderno de encargos e nós, com
toda a seriedade e lealdade, vamos
dialogar sobre esses cadernos de
encargos, que ainda não conhece-
mos neste momento”, disse no Ænal
da conferência “Portugal quer mais
Europa... na Saúde?”, que decorreu
na Fundação Champalimaud, em
Lisboa.
Em declarações aos jornalistas, a
ministra disse ainda ser intenção do
Governo “ir tão longe quanto for
possível”, garantindo estar disponí-
Estamos muito
empenhados
em conseguir
pontos de acordo
Ana Paula Martins
Ministra da Saúde
MATILDE FIESCHI
vel para chegar “aos consensos
necessários e possíveis”. “Estamos
muito empenhados em conseguir
encontrar pontos de acordo, por
isso não temos um limite a priori”,
aÆrmou.
Questionada sobre a recente
denúncia do Sindicato Independen-
te dos Médicos (SIM) de irregulari-
dades nos recibos de vencimento de
alguns proÆssionais que não estão
a receber o que deviam, a ministra
escusou-se a comentar, alegando
desconhecer esses casos: “Não
tenho nenhum conhecimento fac-
tual. Ao Ministério da Saúde e ao
gabinete não chegou nenhuma
informação sobre essa matéria.”
Ana Paula Martins revelou tam-
bém que, antes das reuniões sindi-
cais, irá começar a receber, a partir
de amanhã, várias ordens proÆssio-
nais, que elaboraram um documen-
to com o que consideram ser as
prioridades para a legislatura.
A Ordem dos Psicólogos é uma
das entidades que irão estar presen-
tes nessas reuniões, onde se deverá
abordar a questão das consultas de
psicologia.
No encontro na Fundação Cham-
palimaud, a ministra salientou a
importância da saúde mental e psico-
lógica como uma das prioridades do
ministério e do Governo, prometendo
reforçar até ao Ænal de 2026 o Progra-
ma Nacional de Saúde Mental.
“Queremos muito conversar
sobre as consultas de psicologia e a
sua devida integração no Programa
Nacional de Saúde Mental, que está
a [funcionar a] muito bom ritmo e
tem um projecto que já começou e
vai continuar e que nós vamos con-
tinuar a apoiar e a reforçar até ao
Ænal de 2026.” PÚBLICO/Lusa

Livro reúne visões de especialistas de várias áreas cientíƊcas Local
Com pressa de construir, cidades
arriscam-se a desordem urbanística
Novo livro alerta para a troca do pensamento estruturado por um “pragmatismo burocrático”.
Necessidade de aproveitar verbas do PRR na habitação e nos transportes joga a favor de empreiteiros
Samuel Alemão
A grande urgência em se construir
mais habitação e mais infra-estruturas
de transportes públicos, ditada não
apenas pela sua necessidade imperio-
sa, mas também pelo empenho em
aproveitar os prazos do seu Ænancia-
mento através do Plano de Recupera-
ção e Resiliência (PRR), pode estar a
assumir um papel determinante numa
tendência muito recente, mas que
terá começado já a fazer o seu cami-
nho: a substituição do pensamento e
do planeamento urbanísticos estru-
turados nas cidades portuguesas, em
detrimento de um “pragmatismo
burocrático” que beneÆcia o interes-
ses dos empreiteiros.
E, com isso, poderemos estar a
regressar aos piores exemplos do
urbanismo das décadas de 1970, 80 e
90. Esta é a tese central do livro “Os
Grandes Trabalhos e o Desejo da Cida-
de de Excepção” (edição Circo de
Ideias), reunindo contributos de espe-
cialistas de diversas áreas e a lançar,
na terça-feira (18h30), na Garagem
Sul, do Centro Cultural de Belém, em
Lisboa. Momento que será aproveita-
do para a realização de uma confe-
rência em torno deste tema, na qual
participarão os geógrafos João Ferrão
e Álvaro Domingues e os arquitectos
Manuel Salgado e João Nunes.
“Estamos a assistir a um grande
retrocesso, com a colocação das
empresas de construção no centro do
eixo de acção, sobretudo através da
adopção generalizada de procedi-
mentos de concepção-construção nas
grandes obras públicas, em vez de se
separarem as duas componentes. E
tal acontece com o argumento de que
é mais rápido e barato. Mas isso tem
um preço, que é o da ausência de pen-
samento”, diz ao PÚBLICO Paulo
Tormenta Pinto, um dos coordena-
dores do livro, juntamente com Ana
Brandão, os quais também participa-
rão no debate.
Coligindo visões de investigadores
e consultores de diferentes áreas
cientíÆcas, como a arquitectura, o
planeamento urbano, a arquitectura
paisagista, a sociologia, a economia
e a geograÆa, o novo volume tenta
fazer uma chamada de atenção para
o que os seus autores vêem como
uma profunda alteração em curso na
forma de pensar as cidades, em Por-
tugal. Por isso mesmo, falam no “Æm
da ‘cidade de excepção’”, substituída
por um “regresso às necessidades de
Autores salientam ausência de pensamento na construção da cidade, sob pressão de se fazer obra
sempre”, onde o que conta são, ine-
quivocamente, a eÆciência e o baixo
custo dos projectos adjudicados.
“Pensa-se nos edifícios, mas não no
espaço público”, critica Tormenta
Pinto.
Uma mudança pontuada pela pan-
demia e as dinâmicas dela surgidas e
em relação às quais só mais tarde se
conhecerão os reais efeitos. “As pes-
soas já não têm disponibilidade para
acolher os paradigmas da regenera-
ção urbana assentes em grandes
nomes da arquitectura e operações
mais estruturadas. Estão com pres-
sa”, aÆrma Tormenta Pinto, professor
do Instituto Universitário de Lisboa
(Iscte), lamentando as consequências
“O processo de
ediÄcação está a
sobrepor-se a tudo
o resto. Estamos a
esquecer o espaço
público”
de tal abordagem. “O processo de
ediÆcação está a sobrepor-se a tudo
o resto. Estamos a esquecer o espaço
público”, diz.
Deixando para trás duas décadas
marcadas por uma forma mais estru-
turada e ambiciosa de pensar as cida-
des portuguesas, assente sobretudo
no exemplo saído da Expo-98, e
depois aplicado país fora através das
ambiciosas intervenções realizadas
no âmbito do Programa Polis, uma
“nova narrativa” vai, então, impon-
do-se, assente na necessidade de
fazer muitas casas e rapidamente. E
o mesmo acontece ao nível dos siste-
mas de transportes, como as redes de
metro de Lisboa e Porto, o metrobus
de Coimbra, as linhas de ferrovia de
alta velocidade ou o novo aeroporto
de Lisboa. No fundo, concorda o aca-
démico, “as pessoas estão mais neces-
sitadas de uma resolução dos seus
problemas imediatos”.
O exemplo da Expo-98
E essa visão contrasta fortemente
com a do modelo que a precedeu,
tendo a última exposição universal do
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 17
NELSON GARRIDO
século passado, realizada na capital
portuguesa, sido um ponto-charnei-
ra. “A Expo-98 constituiu-se, de facto,
como um momento de excepção e de
atribuição de importância ao projec-
to urbano, ao fazer cidade. Houve
uma convergência nesse aspecto”,
comenta o também arquitecto, lem-
brando o efeito positivo que a mesma
teve na cidade, nas duas décadas
seguintes, com intervenções marcan-
tes como a do eixo Avenida da Repú-
blica-Marquês de Pombal, da Praça
de Espanha, do Campo das Cebolas
ou de Santa Apolónia, “com corredo-
res verdes a enquadrarem edifícios
notáveis como o novo terminal de
cruzeiros”.
Mas o efeito regenerador da Expo-
-98 também se fez sentir um pouco
por todo o território nacional, onde
os espaços públicos começaram a
ser vistos de outra maneira. Em par-
ticular nas 39 cidades em que se rea-
lizaram operações no âmbito do
Programa Polis. Paulo Tormenta Pin-
to destaca, por exemplo, as que
foram feitas em Vila Real, Vila Nova
de Gaia ou em Leiria. Um ímpeto
que, nota, foi fortemente abalado
pelas consequências da crise Ænan-
ceira iniciada em 2008. “O país, de
certa forma, parou”, comenta, ape-
sar de reconhecer que essa dinâmica
foi sendo, ainda assim, aplicada na
década anterior.
Um dos elementos centrais dessa
abordagem mais estruturada do teci-
do urbano, sentida não só em Lisboa,
como “no Porto e na maioria das
cidades médias do país, caracteri-
zou-se por uma grande preocupação
em deÆnir espaços de encontro e
socialização com trajectos de circu-
lação pedonal”. Ou seja, o automóvel
deixava de ser o elemento central,
passando-se a privilegiar novamente
“a circulação das pessoas em espa-
ços comuns que propiciam o encon-
tro, a conversa e a convivência”. O
reverso negativo, assinala o profes-
sor universitário, foi a subida dos
preços e a “expulsão dos moradores
tradicionais”. Por outras palavras, a
gentriÆcação.
E ela trouxe o problema, a que se
tem assistido com especial acuidade
nos últimos anos, da generalizada
incapacidade da classe média em
adquirir ou arrendar uma casa a
preços comportáveis. Daí, a tal
urgência de construção de habita-
ção a preços acessíveis. “Agora, os
investimentos são determinados
pela necessidade de fazer depressa,
com custos controlados, optando-se
quase sempre pela concepção e
construção em conjunto”, observa
o coordenador do livro. “Isso tem
como consequência que a decisão
sobre a escolha dos arquitectos este-
ja na mão dos construtores. Todos
os processos estão a ser resolvidos
com consórcios de construtores”,
critica, lamentando ainda o “des-
mantelamento” de entidades com
conhecimento crítico, como a Par-
que Expo.
Tudo isso, argumenta, criou um
contexto em que se deixou para trás
“a visão celebrativa, optimista e
espectacular de recuperação dos cen-
tros das cidades portuguesas das duas
décadas que se seguiram à Expo-98”.
Esse modelo, sustentam os autores
do livro, foi substituído, após a pan-
demia da covid-19, por um outro, em
que os investimentos em habitação e
em mobilidade são “marcados pela
urgência da necessidade” e a “cujo
utilitarismo falta a dimensão urbanís-
tica e arquitectónica que distinguiu o
período anterior”.
18 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Mundo Tecnologia avançada usada no campo de batalha
Na guerra,
a inteligência
artiƊcial Ɗca
à margem da lei
As preocupações recentes sobre o uso
de IA nos ataques em Gaza mostram
a necessidade de legislação para sistemas
autónomos em conÅitos militares
Karla Pequenino
Israel tornou-se o mais recente epi-
centro das preocupações sobre o uso
de inteligência artiÆcial. O país é acu-
sado de automatizar a planiÆcação
de ataques aéreos contra o Hamas,
com programas que aceitam até 20
civis como baixas colaterais por alvo
— 100 se o alvo for um comandante
daquele movimento islamista.
Segundo uma investigação recen-
te da plataforma de jornalismo inde-
pendente Local Call e da revista +972,
cerca de 37.000 palestinianos terão
sido “identiÆcados” pelo programa
que é conhecido como Lavender e
requer apenas o aval rápido de um
operador humano. As forças israeli-
tas negam as alegações e descrevem
o sistema como uma base de dados,
mas o potencial de tecnologias de
automação usadas no dia-a-dia para
acelerar ataques militares levanta
preocupações globais. A reacção do
secretário-geral das Nações Unidas,
António Guterres, é clara: decisões
de vida ou de morte “não podem ser
delegadas ao cálculo frio de algorit-
mos” — mesmo que outras decisões
já o sejam.
“É importante perceber que as
Forças Armadas já usam inteligência
artiÆcial para muita coisa”, resume
ao PÚBLICO Heiko Borchert, um dos
directores do Observatório de Defe-
sa com IA (DAIO), na Universidade
de Helmut Schmidt, em Hamburgo,
que monitoriza o uso de inteligência
artiÆcial (IA) pelas forças militares.
“As aplicações no campo de batalha
são só um exemplo; outros exem-
plos incluem o [uso de IA] para
apoiar no planeamento, em exercí-
cios de formação, serviços médicos
e logística.”
Há anos que o teatro de guerra
está a mudar, com cada vez mais
decisões nas mãos de programas
informáticos. Em 2021, as forças de
defesa israelitas admitiram que esta-
vam a utilizar IA para cartografar
túneis do Hamas. Desde 2007 que
usam um sistema antimísseis (a cha-
mada “Cúpula de Ferro”), desenvol-
vido com o apoio dos Estados Uni-
dos, para detectar e eliminar rockets
de curto alcance. Foi este sistema,
que se baseia em radar e algoritmos
soÆsticados para analisar a trajectó-
ria de mísseis inimigos, que intercep-
tou parte do ataque do Irão no últi-
mo Æm-de-semana.
Na Ucrânia, drones com IA estão a
ser usados para atacar reÆnarias de
óleo e de gás russas, reduzindo a
possibilidade de falhas causadas por
ciberataques que afectam o controlo
remoto. Alguns foram comprados à
China, que está a desenvolver drones
que usam IA para voar e identiÆcar Sigilo governamental dão apenas parte da narrativa: per-
alvos sozinhos desde 2019, e plata- “Cúpula de Ferro” Chegar aos factos, porém, não é fácil. ceber o que está a ser desenvolvido
formas de simulação de conÇitos usa sistema que se “O acesso a informações transparen- e quais os países que mais investem
desde 2017. tes e detalhadas sobre o desenvolvi- continua a ser uma incógnita.
“Em geral, o que vemos é sempre baseia em radares mento e uso de inteligência artiÆcial “Há muitas nuances quando se fala
operado, de certa forma, por huma- e algoritmos em conÇitos armados é uma tarefa da utilização de IA na guerra”,
nos”, frisa Borchert. Não há provas extremamente desaÆante”, explica expande Heiko Borchert do Obser-
de “meios informáticos que deÆnam e protegeu Israel ao PÚBLICO a consultora jurídica vatório de Defesa com IA (DAIO).
autonomamente as missões.” dos ataques do Louise Amorim Beja, que está a com- “Muitos governos não divulgam o
As acusações relativas ao Laven- pletar um doutoramento sobre a que gastam em pesquisa e desenvol-
der pintam, no entanto, um quadro Irão na semana utilização da IA na guerra na Univer- vimento, aquisição ou implementa-
onde o elemento humano apenas passada sidade de Coimbra. “Muitos dos pro- ção de IA no sector da defesa. Em
valida estratégias orquestradas por gramas e tecnologias relacionados segundo lugar, os governos combi-
sistemas letais autónomos que usam com a inteligência artiÆcial em con- nam a despesa em investigação e
tecnologias de reconhecimento texto militar são altamente classiÆ# desenvolvimento de IA com a despe-
facial, análise de dados e visão com-
Drones com IA cados [reservados] e envoltos em sa em aquisições, o que torna impos-
putacional para executar tarefas. estão ao serviço do sigilo governamental.” sível avaliar o que está a ser gasto em
“Uma missão inicialmente aprova- O aumento dos investimentos glo- desenvolver novas tecnologias.”
da por humanos pode decorrer sem
Exército bais em IA para defesa sinaliza uma Soma-se o facto de não existir uma
controlo humano. O controlo é deÆ# da Ucrânia para expansão óbvia do papel dos siste- taxonomia de despesas com IA acei-
nido como a capacidade de prever e mas autónomos nas operações mili- te internacionalmente ou regras
explicar os efeitos de um ataque.
atacar reÄnarias tares. Dados de Junho da analista de claras. “Não há uma legislação inter-
Apenas a aprovação humana [inicial] de óleo e gás mercado Spherical Insights mostram nacional especíÆca que regule a
não garante esse controlo”, argu- que o valor do mercado de IA no sec- fabricação, processamento, contro-
menta ao PÚBLICO Daan Kayser, um
da Rússia tor militar atingiu 8,4 mil milhões de lo e uso de armas autónomas letais,
especialista em armas autónomas dólares em 2022 (cerca de 7,7 mil o que cria um vácuo legal perigoso”,
que integra o comité de direcção da milhões de euros), projectando-se alerta Louise Amorim Beja.
Stop Killer Robots (inglês para “bar- uma taxa de crescimento anual de
rar robôs assassinos”), uma coliga- 14,9% até 2032. Este crescimento é Acima da lei
ção que junta 250 organizações, impulsionado, em parte, pelo Embora vários países tenham inicia-
incluindo a Amnistia Internacional aumento das tensões e conÇitos mili- tivas em curso para lidar com siste-
e a Human Rights Watch (HRW). tares em todo o mundo. Os números mas que mimetizam a inteligência

humana, a defesa é um sector que
parece estar à margem de leis inter-
nacionais. A resolução de Março da
ONU sobre IA, que visa proteger os
direitos humanos contra o uso inde-
vido da IA, não tem força legal vin-
culativa. Aplicações de IA para defe-
sa na UE estão isentas da nova legis-
lação europeia que exige dupla
validação para sistemas autónomos
de alto risco.
“A segurança nacional e a defesa
não fazem parte das competências
da UE”, justiÆca Dragos Tudorache,
um dos co-relatores da lei europeia.
“Isto não quer dizer que a IA não faz
parte da guerra e não é um tema que
tem de ser discutido.”
Tudorache realça o papel da NATO
como uma aliança militar intergo-
vernamental criada para garantir a
liberdade e segurança dos seus
membros. As perguntas enviadas
pelo PÚBLICO à organização Æcaram
por responder, com a equipa de
comunicação a encaminhar o jornal
para comunicados oÆciais sobre a
tecnologia de IA.
Em Outubro, os ministros da
NATO concordaram em criar um
conselho para avaliar o desenvolvi-
mento e o uso responsável de IA
AMIR COHEN/REUTERS
Israel
é acusado
de usar IA
para aumentar
alvos de
eventuais
ataques em
Gaza.
Cerca de
37 mil
palestinianos
terão sido
identificados
pelo programa
Lavender
pelos membros da aliança. Este gru-
po, que ainda não foi criado, deve
seguir um conjunto de princípios
deÆnidos em 2021 sobre sistemas
que respeitam o direito internacio-
nal, são robustos, têm uma opção de
desactivação, evitam viés e são ras-
treáveis. Paralelamente, em Dezem-
bro de 2023, 152 países, incluindo
Portugal, apoiaram uma resolução
da ONU para a criação de um tratado
sobre o uso especíÆco de IA em
armas letais autónomas.
Até agora, as acções concretas
resumem-se ao reconhecimento
internacional da importância do
tema. “A regulamentação é um enor-
me desaÆo, especialmente se não
compreendermos o impacto que vão
ter [no terreno]”, acautela Borchert.
“Em tempo de guerra, as tecnologias
desenvolvem-se mais rapidamente
porque ninguém quer estar em des-
vantagem e todos querem sobreviver
no campo de batalha.”
Informações recolhidas pelo
Observatório de Defesa com IA indi-
cam que a crescente autonomia de
algumas armas é motivada, em par-
te, pela necessidade de reduzir
falhas nos equipamentos devido a
interferência externa. Isto é bastan-
te claro na guerra na Ucrânia.
“Dado que a Rússia utiliza a guerra
electrónica para cortar ou interrom-
per as ligações directas entre os
meios não-tripulados e os pilotos, a
Ucrânia dá prioridade ao desenvol-
vimento de sistemas autónomos
para garantir o êxito da missão”, cla-
riÆca Borchert. “[Quando se fala em
autonomia] é importante perceber
se falamos de um sistemas que exe-
cutam uma missão de forma autóno-
ma ou de sensores e armas utilizados
no sistema que actuam de forma
independente mas com base numa
lógica pré-programada.”
A possibilidade de sabotagem
electrónica “[destaca] as vulnerabi-
lidades intrínsecas associadas à
excessiva dependência de hardware
[equipamento] militar convencional
de alto custo”, conÆrma a investiga-
dora Louise Amorim Beja.
Só que o uso de IA não elimina,
por completo, o risco de ciberata-
que. “É verdade que as armas autó-
nomas podem ser utilizadas em
ambientes onde as comunicações
estão comprometidas. Mas podem
ainda ser comprometidas por pira-
taria informática e falsiÆcação
durante esse período”, nota o espe-
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 19
AMIR COHEN/REUTERS
ABIR SULTAN/LUSA
cialista em armas autónomas Daan
Kayser que apela a uma maior trans-
parência sobre o tema das armas
autónomas.
“Robôs assassinos”
Em 2013, a coligação Stop Killer
Robots (algo como “Parar Robôs
Assassinos”) surgiu precisamente
para alertar a população em geral
para a problemática, com um nome
que soa o alarme sobre os riscos de
guerras automatizadas.
Heiko Borchert teme, no entanto,
que a referência a “robôs assassi-
nos” para discutir sistemas militares
autónomos seja alarmante e impeça
uma discussão franca sobre o tema.
“É muito importante não dar a
impressão de que já temos meios
capazes de fazer tudo de forma
autónoma, porque isso não é verda-
de”, acentua.
O comité de direcção da Stop Kil-
ler Robots, discorda: “O termo ‘robô
assassino’ é utilizado para facilitar
a compreensão do conceito pelo
público em geral. Armas autónomas
é um termo mais técnico que utili-
zamos em relatórios mais técnicos”,
racionaliza Daan Kayser. “Tecnica-
mente, estamos a falar de robôs
assassinos. Uma máquina capaz de
realizar determinadas tarefas de
forma autónoma é um robô e podem
ser programados para matar pes-
soas.”
O advento da IA generativa, que
permite produzir conteúdo original
como estratégias de combate, a par-
tir de grandes bases de dados sem
intervenção humana, acelera a
necessidade de discussões aprofun-
dadas.
“É imperativo que investigadores,
activistas e toda a sociedade se mobi-
lizem para promover uma reÇexão
profunda sobre os impactos desta
tecnologia, seja em tempos de guer-
ra ou de paz”, insiste a investigadora
Louise Amorim Beja, que destaca a
possibilidade de estas tecnologias
serem usadas por parte de regimes
autoritários, grupos militantes e
organizações terroristas. “A questão
central é encontrar um equilíbrio
entre a autonomia da IA e o controlo
humano para garantir decisões res-
ponsáveis e éticas no uso de armas
autónomas”, defende.
Aos olhos da especialista, o verda-
deiro debate é se os sistemas de IA
usados em contexto de guerra devem
exigir a contribuição directa dos
humanos para decisões em tempo
real (“Human in the Loop” — huma-
no dentro no circuito), ou se o papel
dos humanos se deve restringir à
supervisão, com intervenções em
momentos-chave (“Human on the
Loop” — humano ciente do circuito).
As supostas funcionalidades do sis-
tema Lavender, que Israel é acusado
de empregar, mostram as limitações
de um sistema que depende exclusi-
vamente da supervisão humana.
O centro de Hamburgo propõe o
uso de gémeos digitais (modelos
alimentados por IA que simulam o
campo de batalha), como uma estra-
tégia para entender o impacto de
diferentes tipos de IA em conÇitos.
“Estas ferramentas permitem ver as
consequências de diferentes tácti-
cas e regras de actuação”, sublinha
Borchert.
Ainda assim, o líder da DAIO
adverte que o debate sobre a regula-
ção não se pode focar somente na
tecnologia. Em vez disso, o foco deve
estar no que diferentes nações estão
dispostas a fazer.
“A guerra reajusta as preferências
normativas”, sustenta Borchert.
“Esta é uma mensagem fundamental
da guerra na Ucrânia e da interven-
ção de Israel em Gaza. Sob ameaça,
ambas as nações recalibraram as
regras de uso da IA no campo de
batalha. Não se trata de uma questão
tecnológica. Trata-se de uma decisão
humana”, explica.
“O debate sobre a utilização res-
ponsável da IA não se pode centrar
apenas nos riscos que podem advir
da tecnologia. Pelo contrário, deve
ter em conta quem está disposto e
preparado para ajustar os seus
padrões para se tornar mais ousa-
do.”
20 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Mundo
Irão garante resposta ao “nível máximo” mas
desvaloriza ataque que sofreu na sexta-feira
Ivo Neto
Ministro dos Negócios
Estrangeiros do Irão faz
aviso a Israel, sem falar de
retaliação por ataque na
cidade de Isfahan
O ministro dos Negócios Estrangei-
ros iraniano, Hossein Amirabdolla-
hian, aÆrmou na sexta-feira que o
Irão responderá de imediato e ao
“nível máximo” se Israel agir contra
os seus interesses. Ainda assim, o
governante desvalorizou o incidente,
insistindo que as armas usadas no
ataque não eram “realmente dro-
nes”, mas “pareciam mais brinque-
dos de crianças”. Amirabdollahian
disse ainda não ter provas concretas
de que o ataque tenha sido levado a
cabo por Israel.
“Se Israel quiser fazer outro aven-
tureirismo e agir contra os interesses
do Irão, a nossa próxima resposta
será imediata e ao nível máximo”,
disse Amirabdollahian, falando atra-
vés de um tradutor, numa entrevista
à NBC News, citada pela agência Reu-
ters. “Mas se isso não acontecer,
então isto acaba aqui. Estamos con-
cluídos.”
“Não nos foi provado que exista
uma ligação entre estes [ataques] e
Israel”, disse, acrescentando que o
Irão estava a investigar o assunto,
mas que os relatos dos meios de
Câmara dos Representantes dos EUA aprova ajuda à Ucrânia
João Ruela Ribeiro
Assistência a Kiev esteve
retida em Washington
durante quase meio ano
por falta de entendimento
no Congresso
A Câmara dos Representantes dos
EUA aprovou um pacote de ajuda à
Ucrânia no valor de 61 mil milhões de
dólares (57 mil milhões de euros),
pondo Æm a um impasse de vários
meses em que a assistência Æcou reti-
da em Washington, enquanto as for-
ças ucranianas alertavam para a falta
de armamento e munições.
O bloqueio foi superado depois de
democratas e republicanos chegarem
a acordo para a aprovação do Ænan-
ciamento de quatro pacotes diferen-
tes de apoio militar à Ucrânia, a Israel
e a vários aliados dos EUA na Ásia,
comunicação social não eram exac-
tos, de acordo com as informações
de Teerão. Segundo o mesmo res-
ponsável, os drones terão mesmo
sido lançados dentro de território
iraniano, voando alguns metros, aca-
bando por ser, depois, abatidos.
Trata-se de drones quadricópteros,
segundo explica o correspondente
do diário El País em Jerusalém, Anto-
nio Pita, citando o porta-voz do cen-
tro Espacial Nacional do Irão, Hos-
sein Dalirian. São aparelhos que
podem ser carregados com explosi-
vos e foram utilizados anteriormen-
te por Israel em território iraniano.
O registo mais recente aconteceu em
Janeiro de 2023, contra um centro
militar, também em Isfahan, onde
aconteceu o ataque de sexta-feira.
Em 2019, o mesmo tipo de drones foi
usado numa investida em Beirute, no
Líbano, contra alvos do Hezbollah,
cuja responsabildade os EUA atri-
buem à Mossad, a agência de servi-
ços secretos de Israel.
Tal como noutras situações, as
autoridades israelitas mantiveram o
silêncio nas horas que se seguiram
ao incidente. Mas, segundo escreve
o jornal The Washington Post, Tally
Gotliv, um político próximo da extre-
ma-direita do partido Likud, do pri-
meiro-ministro Benjamin Netanya-
hu , publicou uma aparente referên-
cia ao ataque nas redes sociais: “Esta
é uma manhã em que a cabeça está
erguida com orgulho. Israel é um
bem como assistência humanitária
para Gaza. Ao todo, os pacotes totali-
zam um Ænanciamento no valor de
95 mil milhões de dólares (89 mil
milhões de euros).
O acordo foi alcançado ao Æm de
vários meses em que uma minoria de
republicanos radicais rejeitava qual-
quer entendimento, exigindo medi-
das muito restritivas da imigração
como contrapartida. Apesar de ser
um grupo reduzido, muito ligado à
agenda de Donald Trump, os radicais
conseguiram travar a maioria das ini-
ciativas legislativas dos últimos seis
meses por serem fundamentais para
a curta maioria do Partido Republica-
no na Câmara dos Representantes.
O impasse foi superado depois de
o presidente da Câmara dos Repre-
sentantes, Mike Johnson, ter aceita-
do apresentar os pacotes ao plená-
rio, embora com uma avalanche de
críticas do sector radical, que amea-
país forte e poderoso. Que possamos
recuperar o poder de dissuasão.”
Pausa ou agravamento?
Já ontem, o analista político Tame
Qarmout, do Instituto para Estudos
de Pós-Graduação em Políticas Públi-
cas, em Doha, disse, em declarações
à Al Jazeera, que “esta ronda de con-
frontos directos terminou, sendo
que agora estamos de volta à realida-
de anterior de uma guerra de proxys
[por procuração]”. De acordo com
o especialista, nos próximos dias
podem voltar a registar-se confron-
tos na fronteira entre o Líbano e
Israel, a envolver o Hezbollah, ata-
Amirabdollahian não confirma que drones têm origem israelita
ça com a sua destituição.
Na votação de ontem, o pacote de
assistência à Ucrânia recebeu 311
votos a favor e 112 contra. No momen-
to da conÆrmação da aprovação,
viram-se várias bandeiras ucranianas
a serem agitadas no plenário da
Câmara, como demonstração da
enorme expectativa com que este
momento era aguardado.
Poucos minutos depois da aprova-
ção, o Presidente ucraniano
Volodymyr Zelensky saudou uma
decisão “que mantém a história no
rumo certo”. “A legislação crucial dos
EUA aprovada hoje pela Câmara irá
Mike Johnson, líder
da Câmara dos
Representantes,
discursa depois de
o pacote de ajuda à
Ucrânia ter sido
aprovado
ques dos rebeldes houthis no mar
Vermelho e ataques de grupos arma-
dos apoiados pelo Irão no Iraque e
na Síria.
Por outro lado, Simon Tisdall,
especialista em assuntos externos,
no jornal The Guardian, explica que
é “insensato pensar que o assunto
está encerrado”. “A hostilidade vis-
ceral, política e ideológica continua
a separar os dois inimigos. Ambos os
governos são afectados por divisões
internas que alimentam a imprevisi-
bilidade e a provocação. E foi aberto
um precedente sombrio. Abriu-se
uma caixa de Pandora de confrontos
directos”, justiÆca o analista.
JUSTIN LANE/LUSA
impedir a guerra de se expandir, sal-
var milhares e milhares de vidas e
ajudar as nossas duas nações a serem
mais fortes”, aÆrmou Zelensky.
O presidente do Conselho Euro-
peu, Charles Michel, também mani-
festou agrado com a aprovação do
pacote “crucial” para Kiev. “Isto
envia uma mensagem clara para o
Kremlin: aqueles que acreditam na
liberdade e na Carta da ONU vão con-
tinuar a apoiar a Ucrânia e o seu
povo”, declarou.
O pacote será ainda submetido a
votação no Senado na segunda-feira
antes se entrar em vigor, esperando-
-se nova aprovação.
Esta tranche de assistência Ænan-
ceira para a Ucrânia surge num
momento crítico para as forças mili-
tares de Kiev, que há muito se viram
sem munições para fazer frente às
investidas russas na linha da frente.
Vários analistas militares davam como
Ataque no Iraque
Na sexta-feira, uma base militar no
centro do Iraque, com tropas do Exér-
cito e antigos militares do grupo para-
militar pró-iraniano Hashed al-Shaabi
— actualmente integrado no exército
regular —, foi alvo de bombardeamen-
tos que provocaram pelo menos um
morto. O Ministério do Interior do
Iraque não conseguiu identiÆcar os
responsáveis pelo ataque aéreo, que
teve como alvo a base de Kalso.
Duas fontes de segurança garanti-
ram à Reuters que um ataque aéreo
tinha causado a explosão, que matou
um membro das Forças de Mobiliza-
ção Popular do Iraque (PMF) e feriu
outros oito. Algumas das facções das
PMF próximas do Irão participaram
em ataques com rockets e drones con-
tra forças norte-americanas no Iraque
e na Síria depois de Israel ter atacado
Gaza, mas deixaram de o fazer em
Fevereiro, quando um ataque com
recurso a drone matou três soldados
norte-americanos na Jordânia, o que
levou os EUA a efectuarem pesados
ataques aéreos no Iraque e na Síria.
Entretanto, os Estados Unidos nega-
ram ter efectuado “ataques aéreos”
no Iraque na sexta-feira, anunciou o
Comando Militar dos Estados Unidos
para o Médio Oriente (Centcom).
“Estamos cientes de relatos de que os
Estados Unidos realizaram ataques
aéreos no Iraque [na sexta-feira]. Esta
informação é falsa”, escreveu o
Centcom na rede social X.
altamente provável que a Ucrânia
pudesse perder a guerra até ao Æm do
ano caso Washington não disponibi-
lizasse mais ajuda.
As autoridades ucranianas acredi-
tam que a entrada deste Ænanciamen-
to poderá desde logo permitir repor
os stocks de munições e armamento
que se esgotaram ao longo do último
ano. Ainda assim, são muitos os desa-
Æos que devem ser superados pela
Ucrânia para conseguir resistir à inva-
são russa. Um dos principais é a escas-
sez de militares e, recentemente, Kiev
aprovou uma reforma da mobilização
militar para conseguir aumentar a
capacidade para recrutar homens e
mulheres para as Forças Armadas.
Para a estratégia da Rússia, por
outro lado, tem sido fundamental
procurar desgastar ao máximo o
apoio ocidental à Ucrânia, enquanto
aguarda pela exaustão dos seus recur-
sos humanos e materiais.

ETA visitou campanha basca e os
seus herdeiros até podem vencer
Sofia Lorena
Resultados do EH Bildu,
que pode ser a formação
mais votada, não permite
excluir surpresas nas
eleições de hoje
Os pedidos de desculpa às vítimas
“das acções armadas da ETA” foram-
se sucedendo ao longo dos anos,
muitas pela voz de Arnaldo Otegi,
secretário-geral da aliança indepen-
dentista de esquerda Euskal Herria
Bildu (EH Bildu), ex-membro da ETA
e ex-líder do Batasuna, o ilegalizado
braço político da organização. Na
campanha para as eleições de hoje,
voltaram, com o candidato do Bildu,
Pello Otxandiano, a pedir “perdão”
pela possibilidade de ter “ferido a
sensibilidade das vítimas” ao recusar
chamar organização terrorista ao
“grupo armado”.
Apesar dos protestos dos outros
partidos e das associações de vítimas,
o tropeção com o passado não deve-
rá ter custos eleitorais. Aliás, a coliga-
ção formada em parte pelos herdei-
ros do Batasuna pode, pela primeira
vez, ultrapassar o Partido Nacionalis-
ta Basco (PNV) em votos (e eleitos),
mas a política de pactos ditará, com
grande probabilidade, uma reedição
da aliança entre os nacionalistas de
centro-direita do PNV e o Partido
Socialista do País Basco PSE-EE).
Os resultados das autonómicas
mais disputadas em décadas no País
Basco deverão encerrar em si dois
paradoxos.
“Porque é que os bascos se deixam
governar pela direita quando se
dizem de esquerda”, pergunta, em
título, a jornalista Marta Monforte
Jaén, no diário digital infoLibre. A
questão não é nova e terá várias res-
postas, mas passa pelo facto de o
PNV recusar assumir-se como um
partido de direita (apesar das raízes
democratas-cristãs e do conservado-
rismo), ao mesmo tempo que os seus
eleitores se identiÆcam como de cen-
tro-esquerda, como a maioria da
sociedade.
E se é verdade que o PNV está no
poder há mais de 40 anos (interrom-
pidos apenas pelos três anos de
governo do socialista Patxi López,
apoiado pelo Partido Popular), só
governou sozinho nas primeiras
duas legislaturas, aliando-se ora com
pequenos partidos da esquerda
soberanista (como o Eusko Alberta-
suna, entretanto absorvido pelo Bil-
du) ora com os socialistas.
O segundo, e principal, paradoxo,
foi alvo de várias análises e surge resu-
mido no título de um artigo de Anto-
nio Ruiz Valdivia, correspondente
político do mesmo diário: “O grande
paradoxo do 21A: um parlamento
mais pró-soberania, uma cidadania
menos pró-independência.”
Com a subida do Bildu, a represen-
tação de independentistas, eleitos
pelo Bildu e pelo PNV, deverá ultra-
passar os 70% do parlamento (actual-
mente é de 69%). De acordo com a
última sondagem da empresa 40dB
(para o jornal El País e para a rádio
Cadena Ser), os dois partidos podem
chegar aos 58 deputados, mais de
77% da assembleia de 75 lugares. Isto
quando o apoio à independência
está em níveis historicamente bai-
xos, com 22% dos inquiridos no últi-
mo Sociómetro, publicado em Março
pelo governo basco, a quererem
separar-se de Espanha.
Treze anos depois da renúncia ao
terrorismo e à luta armada e 12 anos
depois do primeiro reconhecimento
da “dor causada às vítimas” por parte
do Batasuna, nem a independência é
uma prioridade nem a memória mais
ou menos longínqua da violência da
ETA inÇui nas intenções de voto.
Na lista das preocupações dos bas-
cos questionados pelo governo, em
Fevereiro, o emprego (insegurança
laboral) aparece em destacado pri-
meiro lugar (48%) seguido pela situa-
ção do serviço de saúde (35%) e pela
habitação (25%). O serviço de saúde
basco foi um dos grandes temas de
campanha do Bildu.
“Vivemos uma tensão tão grande
com a ETA que a ressaca reduziu o
impulso soberanista”, admitiu, em
entrevista ao El País, Imanol Prada-
les, candidato a lehendakari (presi-
dente) do PNV. “Outros apostaram
na ruptura e agora vieram para as
posições do PNV”, aÆrmou, numa
referência ao Bildu.
“Sou legitimamente pró-indepen-
dência, mas não estou a propor a
independência. Há pessoas no EH
Bildu que não são independentistas,
são federalistas, mas todos estamos
de acordo em respeitar a livre deci-
são da sociedade basca”, resumiu
Otxandiano no debate organizado
pelo jornal El Diario Vasco a uma
semana da votação.
Questionado sobre possíveis pactos
com o Bildu, Pradales disse que pode-
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 21
Mundo
H.BILBAO/EUROPA PRESS VIA GETTY IMAGES
riam “chegar a acordos sobre a língua
basca e o autogoverno, mas não sobre
questões de segurança, política indus-
trial, Æscalidade, habitação…”. Todos
“estes elementos”, sublinhou, “aca-
bam por impedir um acordo de gover-
nabilidade”. Mas “de governabilida-
de”, disse ainda, “falaremos a partir
do dia 22”.
Um possível pacto entre o PNV e o
Bildu, que Pradales quase descarta
sem o fazer, seria a solução de gover-
nação mais fácil, mas uma aliança
entre o PNV e o PSE, como a que está
no poder, poderia também chegar à
maioria absoluta, sendo que isso nem
sequer é preciso — para ser eleito à
segunda votação, um candidato a
lehendakari só precisa de ter mais
deputados a votar em si do que nou-
Imanol Pradales, candidato tros pretendentes.
do Partido Nacionalista Basco,
recusa pactos com o Bildu Socialistas como escudo
que levem a “um acordo No papel de terceira força, Eneko
de governabilidade” Andueza, candidato do PSE, defen-
deu em todos as oportunidades a
utilidade do voto nos socialistas.
Questionado sobre as “consequências
de um parlamento com um movimen-
to pró-soberania muito forte”, alertou
que “haverá um momento em que EH
Bildu e PNV convergirão para o objec-
Pello Otxandiano tivo que os une: a independência”.
teve de pedir Para os socialistas, os últimos anos
tornaram particularmente difícil
“perdão” depois equilibrar as opções assumidas no
de ter recusado País Basco, onde o Bildu se mantém
como inimigo, com as novas regras
chamado da política nacional, onde a coliga-
terroristas à ETA ção PSOE-Sumar (que se sucedeu à
ARNAITZ RUBIO/EUROPA PRESS VIA GETTY IMAGES
aliança com o Podemos) tenta nor-
malizar a aproximação aos indepen-
dentistas de esquerda, catalães e
bascos (para aprovar leis, negociar
orçamentos e, Ænalmente, somar
votos para governar).
Nuances nem sempre fáceis de
explicar e exploradas a cada oportu-
nidade pelo PP. “Há três maneiras de
votar Bildu. A forma directa é com
um boletim do Bildu; a forma enco-
berta é com um boletim do PSOE; e
a forma diferida é votar no PNV”,
aÆrmou o líder nacional dos conser-
vadores, Alberto Nuño Feijóo, na
campanha basca.
Em Madrid, o tropeção de Otxan-
diano trouxe alguma tensão acrescida
às relações entre o PSOE de Pedro
Sánchez e o Bildu, mas nada que
tenha chegado para pôr em causa os
acordos no Congresso. Mesmo com a
possível vitória do Bildu, não se ante-
cipam consequências imediatas na
governação em Espanha. Mas com
um Governo que depende de uma
aliança tão vasta, Sánchez só voltará
a respirar fundo depois das eleições
catalãs (antecipadas) de 12 de Maio.
22 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Economia “Simplex do urbanismo”
Fundos
aceleram
venda de
imóveis sem
licença de
utilização
Ordem dos Notários vai pedir
ao Governo alteração do diploma
conhecido por “Simplex do urbanismo”
Risco é elevado para os compradores
Rosa Soares
Há anúncios de casas à venda com a
informação “sem licença de utiliza-
ção”, ou simplesmente com a abre-
viatura (“sem LU”). Ou ainda com as
indicações: “A escriturar ao abrigo
do Simplex” ou “a regularizar no
âmbito do Simplex da construção”.
Em alguns anúncios, o PÚBLICO
veriÆcou que os preços parecem
atractivos, mas os imóveis precisam
de obras (têm várias décadas) e
podem “esconder” riscos elevados
para o comprador, decorrentes da
falta de licenciamento e não só.
Os riscos são ainda maiores nos
imóveis à venda que não têm licença
de utilização, mas em que essa infor-
mação não é prestada ao compra-
dor, porque não é obrigatória. Isto
porque as escrituras passaram a
poder ser feitas sem a apresentação
desse documento, exigindo-se, ape-
nas, que conste do contrato uma
declaração de que “o imóvel pode
não dispor de títulos urbanísticos”,
uma terminologia pouco acessível
ao cidadão comum e que não res-
ponde à questão de fundo, a de se
saber se o imóvel está ou não licen-
ciado.
A ausência de LU não é, assim,
uma simples formalidade burocrá-
tica, uma vez que pode signiÆcar
que se trata de construções ilegais,
que podem ser demolidas no futuro,
ou que não respeitaram as regras de
construção, podendo obrigar a
obras profundas ou mesmo à sua
demolição total. A que acrescem
outros riscos, como os decorrentes
de uma eventual alteração da lei,
que poderá condicionar futuras
revendas, quando os potenciais
compradores precisarem, por exem-
plo, de crédito bancário para a sua
aquisição, uma vez que a maioria
das instituições bancárias está a con-
dicionar essa concessão à apresen-
tação desse documento.
A venda de grande parte desses
imóveis está a ser feita de forma ace-
lerada por fundos de investimento,
que, por sua vez, os adquiriram aos
bancos, integrados nas carteiras de
“créditos não produtivos” (non-per-
forming loans, ou NPL, na sigla em
inglês). As instituições bancárias
também têm estado a acelerar a alie-
nação desses imóveis, boa parte dos
quais recebida em processos de
insolvência de devedores.
O certo é que, até ao início de Mar-
ço, estes activos diÆcilmente pode-
riam ser colocados no mercado,
tendo em conta que as instituições
de crédito não os “legalizaram”. No
entanto, com o polémico Decreto-lei
n.º 10/2024, do anterior Governo,
passaram a poder ser transacciona-
dos. O diploma, inserido no pacote
Mais Habitação, entrou em vigor no
início de Janeiro, mas a alteração
relativa ao Æm da obrigatoriedade
de apresentação da LU só começou
a 4 de Março.
Pedido de alteração da lei
Entre as entidades que têm alertado
para os perigos do diploma criado
pelo anterior Governo, está a Ordem
dos Notários (ON), que se prepara
para pedir a revogação da norma
que “desprotege os cidadãos”.
Em declarações ao PÚBLICO, o
Alteração sobre fim da bastonário Jorge Batista da Silva
obrigatoriedade de adiantou que “o pedido de alteração
apresentação da LU vigora vai ser feito em Maio”. Para isso, a
desde 4 de Março Ordem vai iniciar uma discussão
interna, com vista a apresentar uma
proposta, “já em texto de lei”, em
que, “no essencial, se pretende que
volte a ser obrigatório, no momento
da transmissão do imóvel e se o
adquirente for um particular, que
seja consultada a entidade munici-
Ordem deu pal no sentido de saber se o imóvel
instruções está ou não licenciado”.
Entretanto, e com o propósito de
a notários para dar maior protecção aos particula-
que informassem res, “a ON deu instruções para que
os notários nas compras e vendas
os
os cidadãos dos informassem os cidadãos dos
inform
tes
riscos inerentes riscos inerentes à compra de
imóveis não licenciados e
imóve
à compra de Æzessem constar das escritu-
Æzesse
imóveis não ras, sempre que não fosse
ras
exibida licença, a declara-
exi
licenciados ção do vendedor relativa
Jorge Batista da Silva à existência
ex ou inexistên-
Bastonário cia da mesma, pois assim
da Ordem dos Notários torna-se uma condição de
torn
negócio e, caso o vendedor tenha
mentido, o comprador poderá, pelo
menos, reclamar uma indemniza-
ção”.
De referir que é possível fazer
transacções de imóveis sem LU, mas
nesses casos essa informação era
expressamente referida na escritura
e os riscos daí decorrentes eram do
comprador.
Escritura pública
Questionado sobre a importância de
este tipo de transacção ser feito atra-
vés de uma escritura pública ou de
um documento particular autentica-
do (DPA), por advogados ou solicita-
dores, o responsável destaca que,
“se os vendedores mentirem na
declaração que Æzeram perante um
notário, para além da indemnização,
incorrem, também, em ilícito punido
criminalmente”.
“A escritura pública continua a
ser a melhor opção para os cidadãos
que pretendam realizar um negócio,
deixando as preocupações jurídicas

referentes ao contrato para um ter-
ceiro imparcial (o notário), que não
tem qualquer tipo de vinculação
com os bancos, imobiliários ou qual-
quer outra pessoa, pois a lei assim
o obriga e a sua função é zelar pela
legalidade e pelos direitos de todas
as partes”, assegura Jorge Batista da
Silva.
Acrescenta ainda que “as escritu-
ras públicas integram os arquivos
públicos e, por isso, independente-
mente do que aconteça, o contrato
original estará sempre preservado
caso seja necessário, nomeadamen-
te para ser apresentado em tribunal,
em caso de litígio”.
“Esquizofrenia” legislativa
O bastonário da ON defende que
não é a declaração que resolve o
problema dos atrasos e da burocra-
cia dos licenciamentos entre as
câmaras e quem constrói. “Estamos
a falar de um dia útil”, assegura.
A propósito da desburocratiza-
ção, refere que, “já depois de terem
MANUEL ROBERTO
sido apontados vários problemas ao
diploma, o anterior executivo apro-
vou uma portaria regulamentar
[Portaria n.º 71-B/2024, de 28 de
Fevereiro] que, na prática, obriga as
câmaras a emitir uma coisa que se
chama resposta à comunicação pré-
via, que tem todos os elementos de
uma licença de utilização”.
“Portanto, nós temos um legisla-
dor que é um bocado esquizofréni-
co, porque por um lado acabou com
a obrigatoriedade do controlo da
licença de utilização, mas agora
obriga às câmaras, quando é cons-
truída uma casa nova, a responder
com informação de uma licença de
utilização”, refere.
Com aquela portaria, que alguns
juristas consideram que é ilegal, e
que está a gerar problemas de inter-
pretação nas autarquias, “o legisla-
dor foi além da própria lei, o que
não se pode fazer, mantendo-se o
verdadeiro problema, que é a ine-
xistência do controlo no momento
da transmissão”.
Directiva em falta sobre venda
de créditos “é da maior importância”,
alerta Banco de Portugal
Rosa Soares
Portugal atrasado
na transposição do diploma
que regula venda
de créditos à habitação
e ao consumo a fundos
A venda de créditos em incumpri-
mento, classiÆcados de “créditos
não produtivos” (non-performing
loans, ou NPL, na sigla em inglês), a
fundos tem assentado num vazio
legal, deixando os cidadãos menos
protegidos, nomeadamente no caso
de empréstimos à habitação em que
o valor do imóvel dado em garantia
supera, em muitos casos, o montan-
te da dívida. A situação — que resul-
ta na perda dos imóveis pelas famí-
lias afectadas — melhorará com a
Directiva 2021/2167, que Portugal
ainda não transpôs para o direito
nacional e que o Banco de Portugal
(BdP) considera tratar-se de “uma
iniciativa regulatória da maior
importância”.
Isso porque o diploma “vem esta-
belecer um quadro regulatório claro
e coerente para a cessão [cedência]
de créditos (e de contratos de crédi-
to) a terceiros que tenham sido con-
cedidos por instituições de crédito”,
adianta o supervisor bancário.
Em resposta a questões colocadas
pelo PÚBLICO sobre o actual vazio
legal que deixa as famílias despro-
tegidas na venda de créditos a fun-
dos — o prazo expirou a 28 de
Dezembro de 2023, sendo que
outros países já adaptaram as suas
leis há três e quatro anos —, o super-
visor bancário reconhece que a
directiva “tem como propósitos
principais fomentar o mercado
secundário de NPL e garantir uma
adequada protecção dos mutuários/
devedores”.
Pela sua importância, o regulador
assinala “a necessidade de salva-
guardar a neutralidade da cessão
para o devedor (...), prevendo-se
que o quadro de protecção do deve-
dor decorrente dos regimes nacio-
nal e europeu aplicável ao contrato
de crédito não seja prejudicado em
virtude da cessão”.
Reforça a instituição liderada por
Mário Centeno que se “trata de uma
norma de enorme relevância, aten-
dendo a que a aplicação do referido
quadro de protecção do devedor
actual pressupõe a existência de
uma instituição mutuante e a sua
manutenção enquanto credora, o
que faz com que a cessão para um
terceiro se possa traduzir, na práti-
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 23
ca, numa perda de protecção para
os devedores”.
Outro aspecto importante pren-
de-se com o momento a partir do
qual uma instituição bancária pode
vender um crédito por si concedido,
sendo que há relatos de vendas
quando os particulares ainda estão
a tentar pagar.
Fundos sem supervisão
Esclarece o BdP que a directiva apli-
ca-se a créditos classiÆcados como
NPL, em conformidade com o Regu-
lamento (UE) n.º 575/2013, mas “pre-
vê-se a possibilidade de os Estados-
membros imporem, no direito nacio-
nal, restrições à transferência dos
referidos créditos não produtivos,
inclusive limitando a transferência a
contratos de crédito vencidos há
mais de 90 dias ou que já se encon-
trem resolvidos nos termos do direi-
to nacional”. Uma possibilidade que,
mesmo que o legislador nacional
acautele, chegará tarde na maior
parte dos casos, tendo em conta a
“limpeza” que os bancos já Æzeram
neste domínio.
Um dos problemas que se têm
veriÆcado actualmente na venda ou
cedência de créditos prende-se com
Em causa está
a protecção das
famílias: há relatos
de vendas
de créditos
quando os
particulares ainda
estão a tentar
pagar a dívida
Banco de Portugal é liderado por Mário Centeno
Economia
a falta de informação prestada ao
devedor, que em muitas situações
não é assegurada nem pelo banco
nem pela sociedade de recuperação
de créditos para quem os fundos de
investimento transferem a gestão
das carteiras. Relativamente a este
aspecto, o BdP destaca a salvaguar-
da, no diploma, dos deveres de
informação a prestar ao devedor
sobre a cessão, “bem como o dever
de nomeação de uma entidade habi-
litada a exercer actividades de ges-
tão de créditos”.
“A estas entidades (conhecidas por
“gestores de créditos” ou servicers)
estará atribuída a função de se rela-
cionarem com os clientes tendo em
vista assegurar a cobrança dos cré-
ditos, em nome e por conta do adqui-
rente de créditos”, refere, acrescen-
tando que, “pela sua importância,
os servicers estão sujeitos a um regi-
me de autorização e supervisão, nos
termos da directiva”.
Sobre o modelo de negócio da
compra de carteiras de crédito, que
é dominado por grandes fundos de
investimentos — parte deles sediada
em paraísos Æscais —, que por sua
vez os revendem a servicers, que
também podem revender ou trans-
ferir para outros, a directiva não
traz novidades, reforçando, contu-
do, a responsabilidade das socieda-
des gestoras. Sobre esta questão,
esclarece o supervisor, “não existe
em Portugal qualquer regime de
autorização dessas entidades”, e
essa autorização dos adquirentes
“não está prevista (nem é permiti-
da) na directiva”, estabelecendo-se,
no entanto, “que os servicers estarão
sujeitos a um regime de autorização
e que actuam em nome e por conta
dos adquirentes”.
NELSON GARRIDO
24 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Cultura Archie Moore e Mataaho Collective distinguidos
O triunfo
dos artistas
indígenas
na Bienal
de Veneza
Os Leões de Ouro e uma menção especial
atribuídos a criadores indígenas
cristalizaram um dos statements
da curadoria desta edição. Uma
celebração da diversidade num país
politicamente em contramão
Mariana Duarte
Poucas horas depois de o artista abo-
rígene Archie Moore ter sido anuncia-
do ontem o vencedor do Leão de
Ouro da 60.ª edição da Bienal de Arte
de Veneza para melhor representação
nacional, as Ælas à porta do Pavilhão
da Austrália iam crescendo, mesmo
apesar da chuva.
“Pedimos muitas desculpas por
estarem à espera, mas temos de con-
trolar o número de pessoas que
podem estar dentro do pavilhão. Não
pode estar muito cheio porque a
ideia é experienciar um memorial.
Obrigada pela vossa paciência e pelo
vosso interesse”, explicava aos visi-
tantes um dos coordenadores do
pavilhão.
Encaixado num recanto discreto
dos Giardini, rodeado de arvoredo e
de um sossego muito pouco comum
no alvoroço semi-insuportável que
caracteriza esta bienal, o Pavilhão da
Austrália foi transformado por
Archie Moore num cubo preto, efec-
tivamente mais próximo de um
memorial, ou mesmo de um peque-
no e estilizado cemitério, do que de
um espaço convencional de exposi-
ção. Lá dentro, sob uma luz ténue,
sente-se um silêncio carregado,
vêem-se rostos pensativos.
Em kith and kin, o artista de ascen-
dência Kamilaroi e Bigambul, radica-
do em Queensland, construiu um
memorial dedicado aos povos nati-
SIMONE PADOVANI/GETTY IMAGES
vos aborígenes através de um vastís-
simo mapa genealógico que conecta
as pessoas indígenas das chamadas
primeiras nações da Austrália, abran-
gendo mais de 2400 gerações e
65.000 anos de uma história feroz-
mente estilhaçada e dilacerada não
só pelo genocídio posto em marcha
a partir de 1770 pelo projecto colo-
nial britânico como pelas mais recen-
tes políticas de encarceramento em
massa de indígenas australianos,
sendo que muitos deles morrem sob
custódia policial.
Apesar dos povos das primeiras
nações representarem apenas 3,8%
da demograÆa da Austrália, repre-
sentam 33% da população prisional,
uma das taxas mais altas a nível
mundial, a par de países como os
Estados Unidos, onde a maioria das
pessoas encarceradas é também
racializada. “A história da Austrália
está inextricavelmente ligada ao
sistema de encarceramento. A colo-
nização britânica estabeleceu-se
através de colónias penais”, aponta
o artista na folha de sala da exposi-
ção, traçando as sequelas desse cional”, materializa-se em Veneza linhagem, expandindo depois o identiÆcar o declínio das línguas e
período no presente. através de duas obras. Primeiro, uma mapa a dezenas e dezenas de pes- dos dialectos das primeiras nações
Iniciado há seis anos por Archie exaustiva — e impressionante — esque- soas indígenas. Vemos os nomes de australianas durante o período colo-
Moore, instigado por um interesse em matização de laços familiares e afec- cada um/uma, seja através dos seus nial (de 700 sobraram cerca de 160,
desbravar arquivos genealógicos, em tivos, inscrita a giz branco nas paredes nomes originais nas línguas nativas, segundo o dossier informativo da
particular os da sua família (a mãe do pretas do pavilhão. seja através das “alcunhas” em exposição), devido à proibição do
artista é Kamilaroi e Bigambul, o pai Nesta colossal “árvore genealógica inglês, muitas delas termos derroga- uso desses dialectos e ao massacre
escocês-britânico), o projecto kith and ancestral” desenhada à mão, proces- tórios e racistas introduzidos pelas de uma fatia signiÆcativa da popula-
kin, considerada “a primeira grande so que levou cinco semanas, Archie forças coloniais. ção indígena. Em algumas partes
exposição do artista a nível interna- Moore começa com a sua própria Ao longo do gráÆco, é possível desta cartograÆa, encontramos qua-

DR
O projecto kith and kin, do
artista aborígene Archie Moore,
vencedor do Leão de Ouro da
60.ª edição da Bienal ; em baixo
Mataaho Collective, colectivo
de mulheres sediado na Nova
Zelândia, da etnia Maori, que
recebeu o Leão de Ouro da
exposição internacional, e a sua
instalação de grande escala
Takapau (em cima à direita)
Mais do que um
ajuste de contas,
kith and kin é um
acto de amor,
empatia,
reconciliação.
Archie Moore
demonstra a
importância de
decifrar a história e
tirar uma série de
acontecimentos da
invisibilidade
drados em branco — talvez uma refe-
rência ao apagamento destas comu-
nidades, através de assassinatos, das
mortes por doenças introduzidas
pelos colonizadores, pela opressão
de um sistema prisional racista
patrocinado pelo Estado. E, de uma
perspectiva mais global, aos buracos
da historiograÆa hegemónica, onde
estas narrativas são propositadamen-
te ocultadas.
Desarmadilhar a história
A outra peça de kith and kin encontra-
se no centro do pavilhão. Uma estru-
tura que se assemelha ao Memorial
do Holocausto, em Berlim, onde estão
500 pilhas de documentos — de dife-
rentes tamanhos, como se se tratas-
sem de sepulturas — compostas maio-
ritariamente por inquéritos coronais
sobre mortes de indígenas australia-
nos em prisões, de anos recentes.
Esta obra é circundada por uma espé-
cie de piscina, onde os visitantes se
podem ver reÇectidos (ou confronta-
dos?), sem conseguirem realmente
ler os documentos expostos.
Mais do que um ajuste de contas,
kith and kin é um acto de amor,
empatia, reconciliação. Através de
uma atitude construtiva, e não reac-
tiva, e munido de uma investigação
aprofundadíssima, Archie Moore
demonstra a importância de deci-
frar a história e tirar uma série de
acontecimentos da invisibilidade,
pois só assim será possível conhecer
o outro, aceitar o outro, não ver na
diferença uma ameaça, para assim
conviver num mundo que deveria
ser de todos.
Utopias em plena sintonia com a
premissa de Estrangeiros em todo o
lado, a exposição principal desta
Bienal de Veneza, ela própria uma
tentativa do curador brasileiro Adria-
no Pedrosa em ampliar o entendi-
mento da história e trazer à tona
múltiplas identidades e experiências
através da produção artística.
Este desarmadilhar do passado
para re-imaginar futuros serve tam-
bém de base a uma série de projectos
dos pavilhões nacionais desta edição
que seguem epistemologias indíge-
nas ou ancestralidades não-eurocên-
tricas, entre eles Portugal, Países
Baixos (a cargo de um colectivo de
agricultores e artistas do Congo),
Benim (em estreia na bienal), Singa-
pura, Brasil ou Estados Unidos, que
pela primeira vez são representados
por um artista indígena a solo, Jeèrey
Gibson, membro da tribo Mississippi
Band of Choctaw Indians e também
de ascendência Cherokee. Por coin-
cidência, minutos antes de chegar-
mos ao Pavilhão da Austrália cruzá-
mo-nos com uma cerimónia de nati-
vo americanos à porta do Pavilhão
dos Estados Unidos (também ele
com a fachada transformada num
mural de arte indígena, como o Pavi-
lhão Central dos Giardini), num cír-
culo de dança para onde os visitantes
da bienal foram convocados.
Coincidência, ou não. Nesta 60.ª
Bienal de Veneza, a edição com o
maior número de “continentes,
regiões, etnias e artistas indígenas de
sempre”, aÆrmou Adriano Pedrosa,
os artistas de povos originários (tan-
tas vezes vistos como “estrangeiros”
nos seus países) estão a revelar-se
como os grandes protagonistas. Uma
das menções especiais da exposição
internacional calhou a La Chola
Poblete, artista da Argentina que
aborda as heranças do colonialismo
e as experimentações de género a
partir de uma perspectiva trans e
indígena, e que já teve uma exposi-
ção a solo na Kunsthalle Lissabon no
ano passado.
Já o Leão de Ouro da exposição
internacional, o segundo galardão
mais importante de Veneza, foi tam-
bém para a Oceânia, mais precisa-
mente para o Mataaho Collective,
colectivo de mulheres sediado na
Nova Zelândia, da etnia Maori (que,
de resto, está representada por
outros/as artistas na exposição prin-
cipal).
É da autoria deste colectivo Taka-
pau (2022), a instalação de grande
escala à entrada do Arsenale, obser-
vável e mutante a partir de várias
perspectivas. Composta por um
emaranhado de Æbras e tecidos ins-
pirado num tapete tradicionalmen-
te utilizado em cerimónias do povo
M ori, especialmente durante o
parto, esta obra (muito longe de ser
a mais entusiasmante da exposição
internacional…) tem por trás da sua
criação “camadas e camadas de tra-
balho invisíveis, levado a cabo todos
os dias por trabalhadores/as fre-
quentemente negligenciados/as”,
assinalaram duas das artistas do
colectivo no discurso de agradeci-
mento do prémio.
Esta distinção atribuída ao Mataa-
ho Collective cristaliza outros state-
Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 25
ments da linha curatorial de Adriano
Pedrosa nesta bienal: atenção ao
têxtil, que, para o curador brasilei-
ro, está intimamente conectado
com “as práticas de artistas popula-
res e de artistas indígenas”, disse o
também director artístico do Museu
de Arte de São Paulo (MASP) ao
PÚBLICO, numa curtíssima entre-
vista. Evita aÆrmar que o têxtil se
trata de uma “tendência”, mas reco-
nhece que está a ganhar “prepon-
derância” no mundo da arte, apesar
de o ver ainda como “um meio um
pouco estrangeiro” face ao cânone.
“O interesse em artistas populares
e indígenas é algo bastante presente
na programação do MASP como um
todo”, acrescentou ao PÚBLICO,
sublinhando ainda que já há alguns
anos, em 2009, fez no MAM – Museu
de Arte Moderna de São Paulo uma
exposição também intitulada
Estrangeiros em todos os lugares,
mas em língua tupi.
Progresso e hipocrisia
Se não há dúvidas de que os palma-
rés de Veneza têm vindo a tornar-se
cada vez mais num statement político
por valores progressistas e pela plu-
ralidade — há dois anos, duas mulhe-
res negras, a britânica Sonia Boyce e
a norte-americana Simone Leigh,
Æzeram história ao conquistar pela
primeira vez os principais prémios
da bienal —, por outro lado esses
posicionamentos têm acontecido
numa Itália que vai em contramão.
Sobretudo este ano. Todas as premis-
sas de Adriano Pedrosa — da celebra-
ção de artistas migrantes, refugiados,
racializados ou queer à defesa de um
mundo sem fronteiras — entram em
conÇito directo com as políticas de
extrema-direita do governo de Gior-
gia Meloni, naturalmente represen-
tado na Bienal de Arte de Veneza.
MARCO ZORZANELLO
Pietrangelo Buttafuoco, o novo
presidente da bienal — que fez car-
reira como jornalista e comentador
da direita conservadora e integrou a
Fronte della Gioventù, a ala jovem
do partido neo-fascista MSI —, agra-
deceu a Pedrosa na cerimónia de
entrega dos palmarés “por ter cons-
truído uma viagem que transmite o
exacto espírito deste tempo” (resta
saber que espírito, segundo a sua
perspectiva). Já o ministro da Cultu-
ra italiano, Gennaro Sangiuliano,
aÆrmou que “identidades, liberda-
des e cidadania” são “palavras-cha-
ves” desta bienal, sendo a arte um
“garante” da forma como nos pode-
mos “relacionar com os outros” e
que nos leva “de um estado primário
à evolução”. Declarações proferidas
poucos dias depois de ter criticado
ferozmente as acções de boicote ao
Pavilhão de Israel, comentando que
Israel “não só tem o direito de expri-
mir a sua arte como tem o dever de
dar testemunho do seu povo, preci-
samente num momento como este,
em que foi atingido por terroristas
impiedosos”. Sabe um pouco a hipo-
crisia, diríamos.
Sangiuliano aproveitou ainda para
assinalar, em resposta a um artigo
publicado no jornal americano The
New York Times, que Adriano Pedro-
sa teve “total liberdade de actuação”,
acrescentando que a bienal assim
continuará, “livre”. O PÚBLICO ten-
tou perguntar ao curador brasileiro
qual o sentimento de montar uma
bienal num país cujo Governo vai
contra tudo aquilo que a sua curado-
ria propõe, mas a entrevista foi inter-
rompida nesse preciso momento
para passar a vez a outro jornalista.
No entanto, em várias entrevistas,
Pedrosa disse que o Governo de
Meloni “nunca tinha interferido no
seu projecto”.
26 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Cultura
Morreu o arquitecto que construía
“a cidade através dos edifícios”
Obituário
Daniel Dias
Bartolomeu Costa Cabral
(1929-2024) Desenhou (com
Teotónio Pereira) o Bloco
das Águas Livres e edifícios
de várias instituições de
ensino superior
O arquitecto Bartolomeu Costa
Cabral, nome importante do
segundo modernismo português,
morreu ontem, aos 95 anos, no
Hospital São José, onde dera
entrada no mesmo dia. Foi vítima
de uma infecção pulmonar,
segundo revelou a família ao
PÚBLICO.
Colaborador de Nuno Teotónio
Pereira e Nuno Portas nos anos
1950 e 1960, e companheiro da
pintora Menez durante cerca de
três décadas, até à morte da
importante artista em 1995,
projectou, ao longo do seu
percurso, edifícios como a sede da
Sociedade Portuguesa de Autores,
em Lisboa, a biblioteca e o Museu
de Lanifícios da Universidade da
Beira Interior, na Covilhã, a Escola
Superior Agrária do Instituto
Politécnico de Bragança, o edifício
dos laboratórios e oÆcinas da
Escola Superior de Tecnologia de
Tomar e a Escola de Engenharia da
Universidade do Minho, em
Guimarães.
O Bloco das Águas Livres,
edifício habitacional em Lisboa que
desde 2012 se encontra classiÆcado
como monumento de interesse
público, é uma das obras
marcantes da sua carreira.
Juntam-se-lhe nessa lista, por
exemplo, a Escola Básica do
Castelo, também na capital, perto
do Castelo de São Jorge, ou a Casa
de Taipa, uma residência privada
em Beja.
Doou, em 2019, o seu espólio à
Fundação Marques da Silva, no
Porto.
Nascido em Lisboa a 8 de
Fevereiro de 1929, estudou
Arquitectura na então designada
Escola de Belas-Artes de Lisboa
(actual Faculdade de Belas-Artes da
Universidade de Lisboa). Ainda não
terminara o curso quando
começou a trabalhar no atelier de
Nuno Teotónio Pereira, outro
nome preponderante da
arquitectura portuguesa, falecido
em Janeiro de 2016 a poucos dias
de completar 94 anos.
Os dois colaboraram no desenho
do Bloco das Águas Livres, no Rato,
em 1953. “Foi uma obra feita
quando éramos muito novos.
Resultou muito bem. Tem muita
coisa original”, considerou
Teotónio Pereira em 2012, quando
o prédio foi classiÆcado como
monumento de interesse público.
Explicando de onde vinha a
pretensa originalidade do projecto,
Teotónio Pereira comentou que, na
década de 1950, os apartamentos
em Lisboa tinham uma divisão
convencional. “Juntámos num
único espaço a sala de visitas e a
sala onde a família se reunia e
chamámos-lhe ‘sala de estar’. É um
espaço maior”, disse.
“Em qualquer sítio onde se está,
há grandes planos de vidro abertos
para o exterior, o que mostra uma
grande sabedoria dos arquitectos.
Há várias possibilidades de fuga”,
referiu, também por ocasião da
classiÆcação do edifício, José Pedro
Croft, escultor português que
chegou a morar no Bloco das Águas
Livres.
Entre o Ænal da década de 1950 e
o início da seguinte, Bartolomeu
Costa Cabral dedicou-se ao
desenho da Escola Básica do
Castelo, organizando-a em torno
de um pátio dentro de um
quarteirão consolidado. “Há aqui
um pensamento e uma relação
com o exterior”, disse
recentemente ao PÚBLICO Rui
Mendes, um de vários arquitectos
que assinaram uma carta
contestando o concurso público
para a requaliÆcação da escola que
a Câmara de Lisboa lançou no
início deste ano.
Defendiam nomes como Álvaro
Siza, Fernanda Fragateiro, Inês
Lobo e Manuel Aires Mateus, por
exemplo, que,
independentemente da
necessidade de obras, o concurso
estava assente em critérios que
levariam a uma transformação da
escola e não à sua manutenção. Foi
entregue apenas uma proposta, e
por Gonçalo Byrne, arquitecto que
também havia assinado a carta.
Dimensão nacional
Ainda no início dos anos 1960,
Costa Cabral voltaria a trabalhar na
área da habitação social,
projectando fogos nos Olivais Sul
com Nuno Portas e Nuno Teotónio
Pereira. A sede da Sociedade
Portuguesa de Autores começou a
ser desenhada mais tarde, em 1971.
Dois anos depois, iniciaria o
pensamento acerca de espaços da
DR
futura Universidade da Beira
Interior.
“As universidades são a sua
grande obra”, considera André
Tavares, arquitecto e investigador
que destaca sobretudo o
envolvimento de Costa Cabral com
a Universidade da Beira Interior, a
Escola Superior de Tecnologia de
Tomar e a Universidade do Minho,
em três projectos que “mostram
bem a dimensão nacional” do seu
trabalho.
“Nesses projectos, vêem-se
muito bem o rigor da construção e
uma organização da economia do
projecto que permite excelentes
resultados construtivos: os
edifícios aguentam bem o passar
do tempo e são muito generosos do
ponto de vista da sua fruição, com
corredores largos e percursos
interiores e exteriores agradáveis”,
diz ao PÚBLICO.
André Tavares defende que uma
característica presente nestes
projectos — e em outros como o
Bloco das Águas Livres — é a ideia
de “construir a cidade através dos
edifícios”. “Ou seja, o edifício não
vale apenas por si só; não é a
procura pelo edifício genial. É, sim,
a capacidade que ele tem de
construir o nosso quotidiano
colectivo, de organizar a cidade e a
forma como a habitamos.”
Na lista de obras essenciais de
Bartolomeu Costa Cabral, André
Tavares insere também a Casa de
Taipa, uma residência privada em
Beja, projectada no início do
milénio. O uso de taipa local (terra
argilosa) para construir as paredes,
preterindo do tijolo ou do betão
armado, vem possibilitar uma
relação diferenciada “com o lugar e
o clima”. “Criam-se espaços com
uma qualidade própria, que
reagem à luz e ao sol de um modo
PEDRO ELIA
muito especial.”
André Tavares defende que está
presente em todo o trabalho de
Costa Cabral, independentemente
das diferentes tipologias dos
diversos edifícios que projectou, “a
ideia de obra pública”. “Um
arquitecto, esteja a projectar uma
universidade, blocos residenciais
ou casas, trabalha para todos. É um
técnico que domina as condições
da construção para mediar a
relação entre os promotores das
obras e [aqueles que usufruem dos
espaços]. Isto faz muita falta nos
dias que correm, em que quem
desenvolve os projectos são os
construtores, os promotores das
obras, e os arquitectos só são
Bloco das Águas Livres é monumento de interesse público em Lisboa chamados no Æm para ‘fazer giro’.”
 A obra emblemática de Maria Lamas sobre
as MULHERES PORTUGUESAS. Um retrato
extraordinário e revolucionário do nosso
país, feito por uma mulher empenhada nos
movimentos de defesa dos direitos das
mulheres, agora reeditado como há 75 anos,
em 1948, em 15 fascículos mensais, com
capa dura, os ferros de estampagem
originais e o restauro integral das imagens.
Guarde este documento histórico dedicado
«a todas as mulheres portuguesas (…) que
reflecte o grande sonho de um mundo mais
harmonioso e iluminado de fraternal amor»,
como era o desejo da autora.

FASCÍCULO 11

EDIÇÃO MENSAL +12,90€

1ª QUARTA DE CADA MÊS EM BANCA
PARA AQUISIÇÃO PARCIAL OU TOTAL
TO
DOS FASCÍCULOS, CONTACTAR
COLECCOES@PUBLICO.PT
28 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Desporto Modalidade vai estrear-se no programa dos Jogos em Paris
“Só no ano
passado é
que comecei
o breaking
a tempo
inteiro”
Vanessa Marina A B-girl quer estar
na estreia olímpica da modalidade e
ajudar a acabar com alguns preconceitos
Entrevista
Marco Vaza
Vanessa Marina, a B-girl Vanessa,
chama-lhe “dancinha”, mas o
breaking é muito mais que isso. É
dança, é desporto, é confronto, é
um estilo de vida. E, em Paris
2024, será modalidade olímpica. A
portuguesa já é uma das melhores
B-girls do mundo, mas vai ter de
lutar por um lugar nos Jogos nas
duas provas de qualiÆcação, em
Xangai (16 a 19 de Maio) e em
Budapeste (20 e 23 de Junho). Ao
PÚBLICO, a atleta/bailarina de 32
anos fala da oportunidade que é
ter o palco olímpico para desfazer
preconceitos de uma modalidade
que só precisa de um pouco de
chão para ser praticada. E do seu
próprio percurso de vida, que
começou no ballet, passou pelo
chão da Gare do Oriente e por
Londres, onde, até há um ano,
ainda trabalhava num restaurante.
Usando uma terminologia do
breaking, a batalha por um lugar
nos Jogos Olímpicos está a chegar
ao momento decisivo.
Exactamente. A batalha pelos
últimos lugares dos Jogos vai
consistir nestas duas últimas
classiÆcações, em que, de 40,
passam dez. Da média dessas duas
classiÆcações, as dez melhores
juntam-se às seis que já estão
qualiÆcadas.
Dez lugares para 40 candidatas.
Qual é o seu nível de esperança
na qualiÆcação?
Sei que é difícil. Tivemos um
tempo de preparação maior até
agora, tempo para descansar e
tempo para preparar coisas novas.
Acho que esta primeira
competição, em Maio, vai ser um
choque para toda a gente,
principalmente porque é a
primeira — e todos querem ter logo
um bom lugar em Xangai. Para
nós, europeus, será um pouco
mais difícil porque estaremos a
viajar para o futuro e teremos de
lidar com o jet-lag. Vou tentar ir
dois dias antes da competição. Não
estar longe de casa ajuda-me. Vou
estar a competir com as melhores
do mundo e tenho de ter orgulho.
O breaking é uma disciplina
popular e universal. O que é que
tem a ganhar em estar nos Jogos
Olímpicos?
Vai acabar com alguns
preconceitos em relação ao que é.
Tornou-se uma coisa superpositiva
feita por jovens e para jovens e
teve inclusão de pessoas mais
velhas e crianças. Temos uma
nova geração brutal e acho que vai
dar uma plataforma para pessoas
que não conheçam — pode ser
praticada desde que haja um
bocadinho de chão.
“Agressividade sem violência” é
um conceito-base do breaking.
Como é que isto se manifesta
numa batalha?
Dizemos que, nas batalhas, o que
conta é a intenção, ou seja, tentar
fazer o público acreditar na nossa
mensagem sem poder falar e sem
tocar — quem toca é
desclassiÆcado. Há uma
acumulação energética muito
grande e torna-se superexplosivo,
e pode ter alguma intenção
perante o oponente, queremos
sempre mostrar que queremos
ganhar. É como uma luta, mas não
se pode tocar. Vai muito para lá
dos próprios movimentos. Há
muita gente que consegue ganhar
com intenção e conÆança, mesmo
que os movimentos não sejam
100% bem executados.
Intimidar é a palavra certa?
Diria que é tentar intimidar o
adversário. Se quero ser um
bocadinho agreste, quando estou
a batalhar, não importa quem é o
adversário, eu sou a melhor, eu
vou dançar tão bem que tu vais
querer desistir. Mas, no Ænal do
dia, somos todos amigos.
Os breakers consideram-se
arthletes. Considera-se mais
artista ou atleta?
As duas partes têm equidade.
Estudei desporto — para personal
trainer — e desde pequenina
pratiquei dança. Sempre levei os
dois muito iguais, sem um não há
o outro. Só a dança, não dá
resultado — e para esta
modalidade é preciso estar muito
em forma. Como rapariga, senti
que teria de ser mais do que
dançar e por isso investi na parte
atlética.
A Vanessa é de Leiria, foi
estudar para Lisboa. Como é que
surgiu esse interesse pela dança
e, depois, como foi essa decisão
de fazer disso a sua vida?
Sempre tive contacto com o ballet
desde pequenina — comecei aos
três anos. Pratiquei durante toda a
adolescência, até me tornar uma
adolescente assim meia rebelde,
na altura dos videoclips de R&B,
Destiny’s Child, Justin Timberlake,
que eu tentei imitar. Em Leiria,
abriu uma aula de hip-hop que eu
experimentei. Quando comecei a
viajar pelo país, percebi que havia
modalidades especíÆcas para a
mistura que eu fazia. Em 2012,
comecei a dedicar-me
especiÆcamente ao break, quando
fui para Lisboa para me licenciar
em dança. Comecei a praticar na
Gare do Oriente com o meu
melhor amigo, o B-boy Jordan. Foi
ele que me ensinou tudo. Depois,
fui para Londres e evoluí imenso.
Quando se inscreveu no curso
de dança clássica e
contemporânea, que ideia tinha
para o futuro?
Queria fazer parte de uma
companhia de dança
contemporânea. Quando comecei
no breaking, nunca pensei que
poderia vir a ser uma proÆssão a
tempo inteiro.
Como é que era dançar na rua,
nesses tempos em que esteve em
Lisboa?
O meu pai dizia que eu ia limpar o
chão do Oriente. Houve um rapaz
que entrou no nosso grupo, a
nossa “crew” , por nos ver ali a
dançar. Conhecemos muita gente
porque estávamos mesmo ali à
entrada do metro, de vários países
— conseguimos ir formando uma
rede internacional. Mostrou-me
muito da vida.
Algum problema com as
autoridades?
Nada. Desde que não tivéssemos a
música muito alta, não nos
incomodavam.
E a decisão de ir para Londres,
como é que aconteceu?
Queria ingressar numa companhia
de contemporâneo. Foi um
 Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 29

Desportod
DR HUGO DELGADO/EPA
trabalhava lá em part-time. Isto
acontece em muitas modalidades.
Portugal devia investir mais no
I Liga
desporto e na cultura. Jornada 30
RioAve-Arouca 1-1
Agora, já consegue ser Moreirense-Gil Vicente 0-1
proÆssional? Boavista-E. Amadora 1-1
Sim. No ano passado, mudei-me Sp. Braga-Vizela 2-1
para cá, como atleta de elite. Com Desp. Chaves-Estoril 15h30, SPTV
Famalicão-Portimonense 15h30, SPTV
o apoio da Red Bull e da Adidas, e Casa Pia-FC Porto 18h, SPTV
do Comité Olímpico, consigo fazer Sporting-Vitória SC 20h30, SPTV
isto a tempo inteiro. Farense-Benfica seg, 20h15, SPTV
Há uma grande amplitude de J V E D M-S P
idades entre quem pratica esta 1 Sporting 29 25 2 2 84-27 77
modalidade. A Vanessa está 2 Benfica 29 22 4 3 65-23 70
algures no meio. Tem 3 Sp. Braga 30 18 6 6 62-41 60
adversárias adolescentes que 4 FC Porto 29 18 5 6 53-23 59
começaram mais novas e que 5 Vitória SC 29 17 6 6 45-29 57
não têm a sua formação. Como é 6 Arouca 30 13 5 12 51-40 44
que essa formação se manifesta Vítor Carvalho foi titular no meio-campo do Sp. Braga 7 Moreirense 30 12 7 11 30-34 43
nas suas “dancinhas”? 8 Famalicão 29 8 11 10 31-36 35

Sp. Braga afunda Vizela

O contemporâneo, por exemplo, 9 Casa Pia 29 8 8 13 29-41 32
deu-me um trabalho de chão 10 Farense 29 8 7 14 38-41 31
muito grande — o breaking é feito 11 Rio Ave 30 5 16 9 32-38 31
muito no chão. É algo que muitas
não têm. Nunca tive um passado
acrobático e, por isso, a dança
deu-me um conhecimento do
corpo completamente diferente da
e pressiona FC Porto 12 Gil Vicente
13 Boavista
14 Estoril
15 Estrela Amadora
30
30
29
30
8
7
8
6
7
9
5 16
11 13
15
14
37-48 31
35-56 30
43-50 29
32-46 29
16 Portimonense 29 7 6 16 32-62 27
ginástica, não tão rígido, mais uma 17 Desp. Chaves 29 5 7 17 28-60 22
ligação entre o emocional e o 18 Vizela 30 4 10 16 29-61 22
físico. O ballet deu-me uma noção Crónica de jogo Sp. Braga 2
Zalazar 53’ e 85’ Próxima jornada Gil Vicente-Arouca,
de movimento que as meninas
Casa Pia-D. Chaves, E. Amadora-Farense,
mais novas não têm.
Diogo Cardoso Oliveira Benfica-Sp. Braga, Vitória SC-Boavista,
Numa “battle”, qual é a Portimonense-Moreirense, Vizela-Rio Ave,
proporção entre aquilo que é Zalazar entrou ao intervalo Vizela 1 Estoril-Famalicão, FC Porto-Sporting
ensaiado nos treinos e aquilo e fez tudo o que houve Essende 50’
que é improviso?
relacionado com golos: II Liga
Nunca acontece a 100% reproduzir
o que fazemos no treino. Temos de marcou dois para o Sp.
Estádio Municipal de Braga. Jornada 30
moderar o nosso nível de Braga e deu um ao Vizela Espectadores 12.932 Feirense-Leixões 1-1
adrenalina. Tento ser muito Penafiel-Paços Ferreira 1-1
estratégica e, claro, trazer amigos O Sp. Braga-Vizela de ontem era Sp. Braga Matheus; Víctor Gómez, Torreense-União Leiria 0-3
choque muito grande. Como tinha novos para verem os meus treinos. importante para todos. Os primeiros Paulo Oliveira, Niakaté, Borja; João Santa Clara-Tondela 1-0
Moutinho (Pizzi, 88’), Vítor Carvalho Oliveirense-Belenenses 11h, SPTV
de pagar a renda da casa, comecei Ter sempre músicas diferentes, poderiam chegar ao terceiro lugar, (Zalazar, 46’); Álvaro Djaló (Rony Ac. Viseu-Mafra 14h, SPTV
a trabalhar num restaurante, mesmo as que não goste — não “sacudindo” a pressão do Vitória e Lopes, 71’), Ricardo Horta, Bruma (Abel Länk Vilav.-Marítimo 15h30, SPTV
desviei-me um bocadinho do meu posso perder só porque não gosto “sufocando” o FC Porto, obrigando Ruíz, 71’ a87’); Banza (Cher Ndour, Nacional-Benfica B seg, 18h, SPTV
foco porque tinha de ganhar da música. No treino, tento os portistas a vencerem hoje para 88’). Treinador Rui Duarte AVS-FC Porto B qua, 20h15, SPTV
dinheiro. Comecei a ir a aulas de aprender a lidar com as regressarem ao pódio. Já os vizelenses J V E D M-S P
Vizela Ruberto a63’; Tomás Silva,
break à noite e a praticar com imprevisibilidades. Tentar estão, em cada jogo, a lutar pela vida, Jota, Anderson, Lebedenko; Diogo 1 Santa Clara 30 18 9 3 40-17 63
pessoal. Evoluí, comecei a viajar e competir com pessoas de estilos rodando em último lugar, a oito pon- Nascimento, Samu a41’; Lokilo, 2 AVS 29 19 2 8 43-28 59
a pedir folgas no trabalho para diferentes, para tentar responder tos da zona de salvação. Quina a17’ (Hugo Oliveira, 84’), Soro
3 Nacional 29 16 8 5 51-31 56
representar o meu estilo. Fiquei da melhor maneira. Nesta A equipa de Rui Duarte venceu por (Matheus Pereira, 73’) ; Essende.
Treinador Rubén de la Barrera 4 Marítimo 29 14 9 6 42-24 51
nove anos em Londres, ia fazer pergunta/resposta, tentar ir 2-1, depois de ter tirado do banco 5 Paços Ferreira 30 12 9 9 35-27 45
dez o ano passado. Foi onde eu sempre ao desconhecido, atingir Zalazar, que revolucionou o jogo: Árbitro André Narciso (AF Setúbal) 6 Tondela 30 11 12 7 41-37 45
decidi que queria fazer mesmo pontos que são desconfortáveis. marcou os dois do Sp. Braga e “ofere- VAR Hélder Carvalho (AF Santarém) 7 Torreense 30 11 8 11 35-33 41
isto. Onde é que vai buscar ceu” o do Vizela. Se era golo, era cria- 8 FC Porto B 29 11 7 11 44-37 40
Nesses nove anos, esteve sempre inspiração? ção de Zalazar. 9 Mafra 29 10 9 10 33-32 39
a trabalhar no restaurante? Gosto muito de ver desenhos Na primeira parte, o Sp. Braga Pelo menos, em teoria. Na prática, 10 União de Leiria 30 10 9 11 41-35 39
Sim. A certa altura, passei de animados, Ælmes da Disney. Gosto dominou, mas não circulou a bola o “perfume” técnico do médio come- 11 Ac. Viseu 29 8 14 7 31-30 38
tempo inteiro a part-time. Em dos movimentos do basquetebol. com velocidade suficiente para fazer çou por valer uma perda de bola em 12 Benfica B 29 10 7 12 36-38 37
2022, o primeiro ano de Nesta modalidade temos de ser o “dançar” o bloco denso do Vizela. zona defensiva, aos 51’, que deixou o 13 Penafiel 30 10 5 15 27-35 35
qualiÆcação olímpica, ainda mais originais possível. Horta, como segundo avançado, não Vizela em situação de finalização — 14 Leixões 30 6 14 10 24-33 32
Qual é o tamanho dessa lista de apareceu em zonas de finalização e houve golo de Essende. 15 Oliveirense 29 7 9 13 29-43 30
movimentos e poses? os jogadores mais recuados também Voltemos umas linhas atrás e recor- 16 Feirense 30 7 6 17 26-43 27
Muito grande. Tenho pequenos não o solicitaram entre linhas. demos os predicados de Zalazar. Aos 17 Belenenses 29 5 8 16 22-48 23
sets e combinações. Cerca de 40. Sobravam, assim, as vias mais bási- 53’, uma perda de bola do Vizela num 18 Länk Vilaverd. 29 6 3 20 24-53 21
São gavetas que abrimos no cas através de cruzamentos, já que os pontapé de baliza encontrou Zalazar
criativos Bruma e Djaló raramente na área, que finalizou facilmente a Próxima jornada União Leiria-Penafiel,
momento.
Mafra-Oliveirense, Marítimo-Feirense,
Há estilos de breaking? Qual é o
Temos uma nova seu?
tiveram espaço para embalarem em
um contra um.
recuperação de bola de Banza.
Com Zalazar, o Sp. Braga parecia
Leixões-Länk Vilav., Torreense-Ac. Viseu,
Tondela-Benfica B, FC Porto B-Santa Clara,
geração brutal e acho Não há estilos. Há um repertório O aparecimento de Zalazar junto à mais perto de vencer o jogo, mas tam- Belenenses-Nacional, Paços Ferreira-AVS

que os Jogos Olímpicos de movimentos que deÆne o

breaking e temos de ser originais.
nos vão dar Costumamos dizer que um B-boy
uma plataforma para tem de ser reconhecido pela sua
sombra, não pode ser igual a
pessoas que não ninguém. Eu sou a Vanessa-style.
conheçam a modalidade ninguém é igual a mim.
linha lateral, para entrar para a segun-
da parte, foi uma notícia pouco sur-
preendente. Era preciso mais “perfu-
me” em zonas de criação, mais velo-
cidade a circular, mais técnica para
passes verticais. E Zalazar poderia
trazer tudo isto.
bém mais perto de o perder, tal era o
espaço em redor de Moutinho. Entre MELHORES MARCADORES
uma coisa e outra prevaleceu a pri-
I Liga
22 golos Viktor Gyökeres (Sporting)
meira, já que foi a maior chegada à 21 golos Simon Banza (Sp. Braga)
área de Zalazar que permitiu ao
médio finalizar, aos 85’, uma boa joga-
II Liga
23 golos Nenê (AVS)
da entre Moutinho e Horta. 15 golos Wendel Silva (FC Porto B)
30 • Público • Domingo, 21 de Abril de 2024
Desporto
Bernardo Silva não precisa
de redenção. Mas redimiu-se
Marco Vaza
Depois do penálti ridículo
que contribuiu para a saída
da Champions, o criativo
português marcou o golo
da vitória sobre o Chelsea
O Manchester City saiu da Liga dos
Campeões por várias razões. Porque
jogou com o Real Madrid — e o Real
Madrid vive para jogar a Champions.
Porque não teve qualquer golo do
seu gigante nórdico, Erling Haaland.
Porque não foi competente a desem-
patar a eliminatória nos penáltis. E,
nesta componente, saltou à vista
Bernardo Silva, o jogador que todos
os treinadores gostariam de ter nes-
tes momentos. O internacional avan-
çou para o segundo penálti do City e
falhou, mas não foi o falhanço em si
que se destacou. Foi a forma como o
falhou. Bernardo levantou a bola e
rematou para o meio. Lunin, o guar-
da-redes do Real, nem se mexeu para
a agarrar.
Foi um daqueles momentos que
nunca esperaríamos de Bernardo
Silva, mas ninguém o culpou pela
eliminação. Nem Pep Guardiola.
“Disse que queria bater e é um joga-
dor conÆável. Fez um grande jogo”,
declarou o treinador catalão. Ontem,
Bernardo Silva, o jogador que não
precisa de redenção, redimiu-se do
penálti falhado frente ao Real, mar-
cando o golo que qualiÆcou o City
para a Ænal da Taça de Inglaterra em
Wembley, num triunfo por 1-0 sobre
o Chelsea. Os “citizens” podem já não
conseguir igualar a tripla conquista
do ano passado — Premier League,
FA Cup e Champions —, mas ainda
podem chegar à “dobradinha”. Gra-
ças a Bernardo.
Em mais um confronto entre os
azuis claros de Manchester e os azuis
escuros de Londres, uma das narra-
tivas era a de Cole Palmer, a grande
revelação da época do futebol inglês,
voltar a encontrar-se com a equipa
que o formou e de onde saiu para o
Chelsea a troco de 47 milhões de
euros. Na antevisão do jogo, Guar-
diola até admitiu que não queria que
ele saísse, mas revelou que Palmer
já queria sair há duas épocas.
Como teria sido a época de Palmer
se tivesse Æcado no City? Nunca sabe-
remos. Mas sabemos que, num Chel-
sea ainda em construção, ele tornou-
se na maior Ægura (23 golos e 13 assis-
tências), chegou à selecção inglesa
e, entre tanto dinheiro mal gasto
pelos londrinos nos últimos tempos,
os tais 47 milhões parecem uma não precisou de muito tempo para
pechincha. pensar antes do remate certeiro que
Mas Palmer não seria a Ægura de valeu a passagem à Ænal. Este, sim,
um jogo que esteve condenado ao era o Bernardo Silva que o mundo
empate durante mais de 80 minutos. inteiro conhece, o Sr. Fiabilidade, “o
A equipa de Pochettino bem resistiu sonho de jogador para qualquer trei-
e teve as melhores hipóteses de mar- nador”, como disse em tempos
car, o City ainda parecia, de certa Guardiola.
forma, preso ao passado recente da Para o internacional português, foi
eliminação europeia e não desenvol- um enorme suspiro de alívio e, em
via. E quando o jogo já parecia enca- certa medida, uma consolação pelo
minhar-se para mais 30 minutos de que acontecera na quarta-feira pas-
futebol (e, quem sabe, desempate sada. “Depois de uma semana muito
nos penáltis), o City conseguiu a sua frustrante para nós e para mim em
vantagem. particular, sinto-me muito feliz. Se
Doku agitou na esquerda, encami- jogas pelo Manchester City, jogas de
nhou a jogada para De Bruyne e o três em três dias e, assim, tens sem-
belga meteu a bola na pequena área. pre a hipótese de corrigir as coisas.
O guarda-redes Petrovic tentou tirá- Tentámos tudo, apesar de estarmos
la dali, mas a bola não foi para muito cansados. Estamos em mais
muito longe. Bernardo uma Ænal e temos mais uma hipótese
Silva andava por per- de ganhar mais um troféu. Estou
to e, com a baliza feliz pelo golo, mas a forma
à sua mercê, como a equipa reage à adver-
sidade é sempre a melhor”,
declarou o internacional
português à BBC.
Se esta será a última
época de Bernardo Sil-
va no Manchester City,
só saberemos daqui a
um mês, depois de os
“citizens” disputarem
em Wembley a Ænal
da FA Cup contra o
vencedor do Coven-
try-Manchester Uni-
ted deste domingo.
Fala-se do interesse
do Barcelona (que
não deve ter dinheiro
para pagar os míse-
ros 50 milhões que
JAN KRUGER/GETTY IMAGES
constam na cláusula
de rescisão) e do
PSG (esses têm
d i n h e i ro ) , m a s ,
aconteça o que acon-
tecer, Bernardo Silva
já deixou a sua marca
nos “citizens”.
A cumprir a sua séti-
ma época em Manches-
ter, o jogador formado
no BenÆca já ganhou
tudo o que tinha a ganhar
— 14 títulos, entre eles cin-
Bernardo co títulos de campeão
Silva festeja inglês, uma Liga dos Cam-
o gol o peões e um Mundial de clu-
decisivo bes. Marcou 67 golos, fez 41
assistências e, da forma
como festejou o golo contra o
Chelsea, a saltar e a bater no lado
esquerdo do peito (onde está o
emblema), aquele penálti falhado
foi apenas um acidente.
Max Verstappen
dá 100.ª pole
position à Red
Bull no GP China
O piloto neerlandês Max Verstappen
conquistou ontem a pole position
para o Grande Prémio da China
(arranca hoje, às 8h00), a 100.ª da
escuderia Red Bull no Mundial de
Fórmula 1, quinta prova da tempo-
rada.
O tricampeão mundial, que antes
vencera a corrida sprint, garantiu o
melhor tempo da qualiÆcação com
o tempo de 1m33,660s, Æcando na
segunda posição o mexicano Sérgio
Pérez, companheiro de equipa de
Verstappen, a 0,322 segundos,
garantindo a dobradinha para a equi-
pa austríaca.
O espanhol Fernando Alonso
(Aston Martin) foi terceiro, a 0,488
segundos, num dia em que foi san-
cionado com 10 segundos de penali-
zação na corrida sprint, por ter sido
considerado culpado por uma
pequena colisão com o compatriota
Carlos Sainz, da Ferrari, que acabou
Max Verstappen
alcançou a 36.ª
pole position da
carreira, a sexta
consecutiva, o
terceiro melhor
registo da história
por provocar a desistência do pró-
prio Alonso, com um furo na roda
dianteira direita do Aston Martin.
Na grelha de partida seguem-se os
dois McLaren, de Lando Norris e
Oscar Piastri, e só depois os dois Fer-
rari, de Charles Leclerc e Carlos
Sainz. O espanhol apanhou um susto
na segunda de três fases da sessão
(Q2), com um despiste.
No entanto, a equipa conseguiu
recuperar o carro e Carlos Sainz reto-
mou a sessão, perdendo para o com-
panheiro de equipa por apenas
0,008 segundos.
A surpresa do dia acabou por ser
a eliminação do britânico heptacam-
peão do Mundo Lewis Hamilton
(Mercedes) logo na Q1, Æcando no
18.º lugar, depois de ter garantido a
segunda posição na corrida sprint,
horas antes.
A pole position de ontem foi a 36.ª
da carreira de Max Verstappen, que
passa a somar seis poles consecuti-
vas, o terceiro melhor registo da his-
tória da competição, a par de Ayrton
Senna, Nikki Lauda, Mikka Hakki-
nen, Nico Rosberg e Nigel Mansell.
O recorde de pole positions conse-
cutivas continua a pertencer ao bra-
sileiro Ayrton Senna, tendo sido
estabelecido na temporada de
1989.
 Público • Domingo, 21 de Abril de 2024 • 31

Desporto
Atletismo
Paris2024: Pichardo Atletismo Duplantis bate recorde mundial da vara pela oitava vez
aumenta missão
lusa para 41 atletas
TINGSHU WANG/REUTERS
O campeão olímpico Pedro
Pichardo garantiu um lugar nos
Jogos Olímpicos Paris2024, ao
superar os 17,22 metros no triplo
salto do meeting de Xiamen,
aumentando a missão lusa para
41 atletas. Pichardo começou o
concurso na Liga Diamante com
17,38 metros, garantindo os
mínimos. No última tentativa
saltou 17,51m, juntando-se a
Pedro Buaró, Samuel Barata,
Susana Godinho, Isaac Nader,
João Coelho, Auriol Dongmo,
Ana Cabecinha e Irina Rodrigues.

Basquetebol
FC Porto vence
clássico com “leões”
e lidera fase regular
O FC Porto deu, ontem, no
Dragão Caixa, com o triunfo
(86-72) sobre o Sporting, na 21.ª
jornada, um passo importante O sueco Armand Duplantis mundial, bateu o recorde do norte-americano (o também 6,17 metros, destronando
para garantir o primeiro lugar estabeleceu, ontem, no mundo do salto com vara pela altleta de salto com vara Greg o francês Renaud Lavillenie
da fase regular da Liga nacional “meeting” de Xiamen, que oitava vez, melhorando em um Duplantis) e de mãe sueca (a (6,16m), que havia batido o
de basquetebol. Os “azuis e decorre na China, referente à centímetro a anterior melhor antiga atleta do heptatlo e salto recorde de Serguei Bubka.
brancos” somam agora 38 Liga Diamante de atletismo, um marca mundial de 6,23m, que em altura Helena Duplantis), Agora, em Xiamen, prova de
pontos, os mesmos que o novo recorde do mundo do salto detinha desde as Ænais da Liga tornou-se recordista do mundo abertura da Liga de Diamante,
Benfica, que recebeu e derrotou com vara, a partir de agora de Diamante de 2023, disputadas pela primeira vez em 2020, o atleta sueco superou o
o CD Póvoa, pot 101-77. A Æxado nos 6,24 metros. em Setembro, em Eugene, nos tendo melhorado, norte-americano Sam Kendricks,
Oliveirense consolidou a O campeão olímpico de Estados Unidos. sucessivamente, a marca desde segundo classiÆcado, com 5,82
terceira posição, ao impor-se Tóquio2020, um prodígio sueco, Actual bicampeão mundial, então. Nessa ocasião, em metros, tendo o chinês Huang
em Oliveia de Azeméis, por que desde muito cedo (17 anos) Armand “Mondo” Duplantis, de Fevereiro de 2020, Duplantis Bokai alcançado a terceira
78-73, ao Portimonense. se revelou um saltador de classe 24 anos, nascido da união de pai bateu o recorde mundial com posição, com 5,72 metros.

Andebol Voleibol Motores Ténis

Sporting bate Benfica “Águias” em vantagem Thierry Neuville ganha Dupla Francisca
e “dragões” vencem após primeiro embate terreno a Elfyn Evans e Matilde Jorge vence
ABC em Braga para decisão do título no Rali da Croácia Ladies Oeiras Open
O Sporting bateu, ontem, no O Benfica adiantou-se, ontem, Thierry Neuville (Hyundai) foi o As irmãs Francisca e Matilde
Pavilhão João Rocha, o rival no arranque da discussão final mais rápido do segundo dia do Jorge conquistaram o título de
Benfica (37-28) em jogo da 2.ª do campeonato português Rali da Croácia, quarta prova do pares do Ladies Oeiras Open
ronda da fase de apuramento masculino de voleibol, ao vencer Mundial, com 2h09m46s, (125 WTA), ao derrotarem a
do campeão. Um triunfo o Sporting por 3-1, no primeiro ficando Elfyn Evans (Toyota) a dupla Harriet Dart e Kristina
incontestável, apesar do jogo do “play-off”, disputado no 4,9s e Sébastien Ogier (Toyota) a Mladenovic. As vimaranenses
equilíbrio inicial, em que os Pavilhão n.º 2 da Luz. 11,6s. Neuville marca de forma bateram as segundas cabeças
“leões” chegaram a dispor de 11 Os tetracampeões nacionais provisória os 18 pontos de série com parciais de 6-0 e
golos de vantagem na parte venceram os “leões” por 25-22, correspondentes à vitória de 6-4, tornando-se as primeiras
final (23-13 ao intervalo). O 21-25, 27-25 e 25-17. O Sporting, ontem, que precisa ainda portuguesas a conquistarem
Sporting soma 39 pontos, mais que chegou pela última vez ao confirmar, tendo de terminar a um título WTA em pares.
oito que as “águias”. A quatro título nacional na época de prova croata. Hoje disputam-se Francisca e Matilde somaram
dos “leões”, o FC Porto venceu 2017-18, recebe na quinta-feira, quatro especiais, com a “power nos “courts” de terra batida do
(24-26) o ABC, em Braga, dia 25, as “águias”, no Pavilhão stage” final a distribuir 15 pontos Jamor o 15.º título da carreira
somando o segundo triunfo. João Rocha (16h). pelos 15 mais rápidos. a jogarem juntas.
Domingo, 21 de Abril de 2024
BARTOON LUÍS AFONSO
Como Passos tenta ensinar Montenegro a governar
Anacrónica
A
Ana Sá Lopes
entrevista de Pedro
Passos Coelho ao
podcast de Maria João
Avillez, Eu Estive Lá,
do Observador, é
uma das melhores
peças dos últimos tempos. Passos
Coelho não dava uma entrevista
desde que abandonou a liderança
do PSD e as suas aparições têm
sido raras.
É verdade que o lançamento do
livro “da família” e a entrevista
aparecem em duas semanas
consecutivas. Parece uma “teoria
da conspiração” mas
efectivamente não é. Como
explicou a autora, o objectivo era
pôr o entrevistado a falar do
“governo da troika” e o início de
Abril é o aniversário da chamada
do FMI e restantes instituições
pelo governo Sócrates em 2011.
Agora, o que Passos vem
dizendo — já sabíamos que
defendia a coligação com o Chega,
mas sinalizou o facto novamente
PÚBLICO, Comunicação Social, SA. Todos os conteúdos do jornal estão protegidos por Direitos de Autor ao abrigo da
legislação portuguesa, da União Europeia e dos Tratados Internacionais, não podendo ser utilizados fora das condições de
uso livre permitidas por lei sem o consentimento expresso e escrito da PÚBLICO, Comunicação Social, S.A.
Discordar é liberdade,
aproveite-a
Na compra de uma assinatura, ofereça um mês gratuito a um amigo
Sim, mesmo aquele com quem nem sempre concorda
CONTACTE-NOS: assinaturas.online@publico.pt • 808 200 095 (dias úteis das 9h às 18h)
no lançamento do famoso livro — é estratégia consegue pôr-se de pé que Montenegro não goste, Pedro
que pode ser ele, efectivamente, o de maneira mais eÆcaz no cargo Passos Coelho deve mostrar a sua
“grande líder” da direita de líder do PSD do que de estratégia alternativa para o PSD e,
portuguesa, se Montenegro não se Presidente da República. Embora eventualmente, convencê-lo da
puser a pau e optar por se um Presidente da República sua bondade. O ex-ministro
entender com o Chega. também possa inÇuenciar termina o raciocínio de uma forma
Se este Governo AD, sem estratégias (e até ser eleito com os curiosa — “As pessoas questionam
maioria parlamentar, durar o que votos dos que contribuíram para as razões para Pedro Passos
se espera (pouco), se Montenegro os 50 deputados do Chega). Coelho intervir, esquecendo que
insistir na recusa de acordos com Evidentemente, para já, o que ele não tem é razões para não
o Chega, é quase impossível que o Passos Coelho quer é inÇuenciar intervir. Pelo contrário.”
futuro não passe por uma estratégias. Uma entrevista que Ou seja, Pedro Passos Coelho
candidatura de Passos Coelho à Miguel Relvas, antigo braço quer meter na cabeça de
liderança do PSD, e novas eleições direito de Passos Coelho e Montenegro que, havendo uma
em que no programa do partido também ele contra “cordões maioria de direita (com o Chega)
estará a aliança com o Chega. sanitários”, deu à TDM (Televisão na Assembleia da República, mais
Na entrevista a Maria João de Macau) por estes dias, é vale fazer explodir as linhas
Avillez, o antigo primeiro-ministro signiÆcativa. Relvas assume que vermelhas e associar-se a Ventura
não é particularmente simpático “as pessoas entendem a para encontrar estabilidade, sob
com o “Luís”, como o tinha sido intervenção de Pedro Passos pena de fazer implodir essa
em Faro durante a campanha. Coelho como sendo fora do maioria a curto prazo.
Aliás, comete a deselegância de normal, como se fosse algo Se Montenegro negar-se a seguir
aÆrmar que se não fosse ele,
Passos, a indicá-lo para a liderança
Passos quer meter premeditado ou contra alguém”.
O ex-ministro não concorda e
os conselhos — é verdade que
baseou a sua campanha no “não é
parlamentar, Montenegro nunca na cabeça de faz “o desaÆo de inverter a não”, embora também a tenha
teria chegado a primeiro-ministro.
Reconhece a evidência de que a
Montenegro que, premissa”: “E se Pedro Passos
Coelho fala por sentir,
sustentado numa grande descida
de impostos — Passos Coelho
“criatura” (eis como vê havendo uma simplesmente, que não tem razões estará cá para mostrar como se
Montenegro) se afastou do
“criador”, mas aí, elegantemente,
maioria para estar em silêncio? Se é o seu
partido que voltou ao poder ao Æm
faz. E, ao ter-se colocado muito
mais à direita (mesmo nos
admite que é normal as coisas parlamentar de de nove anos e se é a gente que costumes, onde não era), o
mudarem.
Tal como tinha Æcado evidente
direita (com o trabalhou com ele que assume,
agora, responsabilidades
próprio Passos pode sonhar em
captar algum eleitorado do Chega.
no lançamento do livro e agora na Chega), mais vale governativas, por que razão Aguardam-se os próximos
entrevista, Pedro Passos Coelho
tem uma estratégia de poder e de
fazer explodir as haveria de se resumir ao
silêncio?”.
capítulos da novela à direita.
um regresso ao poder. E essa linhas vermelhas Traduzindo Relvas: por muito Jornalista
ASSINE JÁ
ASS
publico.pt/assinaturas