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A RELAÇÃO ENTRE A VONTADE E A LIBERDADE A

Possibilidade de existência de liberdade, e escape ao determinismo, depende da


possibilidade de se demonstrar que a vontade dos seres racionais possui a capacidade de
não seguir o fluxo de causalidade do mundo natural. A causalidade que se observa no
mundo é tomada como universal para todos os elementos da natureza, e qualquer
tentativa de defesa da liberdade deve passar pela determinação da vontade. Na filosofia
kantiana, a solução para a disputa entre o determinismo e a liberdade, depende da
demonstração que a vontade humana pode ser determinada de maneira independente aos
fenômenos captados do mundo pela sensibilidade do sujeito possuidor de vontade.

Ferrater Mora (2001, p. 1737) ressalta que Kant não pretende escolher um lado entre a
necessidade natural dos acontecimentos dos fatos e a liberdade, mas demonstrar como é
possível que a liberdade e a necessidade natural convivam em uma mesma realidade.
Mora explica que Kant considera que ―todos os que se ocuparam do problema haviam
errado fundamentalmente por uma simples razão: ter considerado a questão da liberdade
uma questão passível de ser decidida em uma esfera única e determinada‖ (MORA,
2001, p.1737).

Assim, se concebe um mundo fenomênico que possa ser explicado plenamente pela lei
da causalidade, e ao mesmo tempo uma dimensão inteligível que interage com o homem
ao ponto de lhe fornecer uma forma de lei capaz de determinar sua vontade. A proposta
de Kant é demonstrar que é possível a universalidade da causalidade fenomênica,
observável por meio da sensibilidade, ao mesmo tempo em que é possível que a vontade
seja determinada sem a influência da sensibilidade, escapando deste fluxo de
causalidade e iniciando, na dimensão fenomênica do mundo, um novo fluxo de
causalidade. ―Kant quis conciliar a liberdade humana, como poder de
autodeterminação, com o determinismo natural que, para ele, constitui a racionalidade
da natureza‖ (ABBAGNANO, 2007, p.607).

Sua solução procura resguardar a universalidade da possibilidade de explicação


científica para todos os fenómenos ao mesmo tempo em que atribui ao sujeito a
responsabilidade pela acção. E tal solução acontece por meio da forma da lei moral
determinando a vontade do sujeito racional. Solucionar o problema da liberdade da
vontade depende do sucesso do processo argumentativo empreendido no decorrer do
período crítico que pretende estabelecer a lei moral como capaz de determinar o sujeito
para a acção, em contraponto às inclinações de comportamento geradas pela formação
de máximas que possuem conteúdo sensível. O conceito de liberdade, na medida em
que a sua realidade é demostrada por uma lei apodítica da razão prática, constitui a
pedra angular de todo o edifício de um sistema da razão pura, mesmo da razão
especulativa, e todos os outros conceitos (os de Deus e da imortalidade) que, enquanto
simples ideias, permanecem nesta sem apoio conectam-se com este [conceito] e
adquirem com ele e através dele consistência e realidade objectiva, isto é, a sua
possibilidade é provada pelo facto de a liberdade ser efetiva; com efeito, esta ideia
revela-se mediante a lei moral [CRPr, 4 e 5] (KANT, 1984, p.12).
O que mostraremos neste capítulo são os argumentos que Kant apresenta na
Fundamentação da Metafísica dos Costumes e na Crítica da Razão Prática em prol da
plausibilidade, da existência e da capacidade da lei moral determinar a vontade, o que
permite conceber um sujeito portador do atributo liberdade

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